Acórdão Nº 5045231-53.2022.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 08-09-2022

Número do processo5045231-53.2022.8.24.0000
Data08 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5045231-53.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

PACIENTE/IMPETRANTE: ROGÉRIO LUÍS DA SILVA JÚNIOR (Paciente do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: MARCOS PAULO POETA DOS SANTOS (Impetrante do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca da Capital

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado pelo defensor Marcos Paulo Poeta dos Santos, em favor de ROGÉRIO LUÍS DA SILVA JÚNIOR, afirmando estar ele(a) sofrendo constrangimento ilegal em virtude de ato supostamente ilegal praticado pelo Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca da Capital nos autos 50581348520218240023.

Sustenta o impetrante, em resumo, que os argumentos utilizados pelo juízo a quo para justificar a prisão não são suficientes, eis que inexiste fundamentação concreta acerca da necessidade da medida, bem como ausentes os requisitos autorizadores da segregação cautelar previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal.

Destaca que, sob a sua ótica, "o Douto Magistrada por 04 (quatro) vezes fundamentou pela manutenção da prisão preventiva do paciente com fundamentações genéricas baseadas única e exclusivamente na gravidade abstrata do delito. E, ainda que ausentes quaisquer meios de prova capazes de associar o paciente à conduta descrita no tipo penal que lhe é imputado, é indevidamente mantido segregado por um período totalmente desproporcional à suposta conduta por ele praticado".

Afirma que "sequer há indícios efetivos de autoria do paciente, que teria apenas sido mencionado em pipo supostamente referente à organização criminosa PGC, ressaltando-se que sequer existem elementos que corroborem a versão de que 'tampa de Solemar' seria mesmo o vulgo do paciente".

Cita julgamento proferido por este e. Tribunal no Habeas Corpus 50375304120228240000, referente a ação penal diversa, em que houve reconhecimento do excesso de prazo para formação culpa, "tendo em vista a extensa demanda do Juízo".

Termina dizendo que "com base no conjunto probatório formulado nos presentes autos, restou-se comprovado que as suposições formuladas pela Autoridade Policial, que ensejou a instauração do referido processo, não puderam ser confirmadas. Haja vista que, com o fim da instrução processual, não foram produzidas quaisquer novas provas capazes de associar o paciente à prática delitiva que lhe é imputada".

Nesses termos, justifica estarem presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, motivo pelo qual requer a concessão da ordem em liminar, expedindo-se consequentemente alvará de soltura em favor do(a) paciente, e, ao final, a concessão definitiva da ordem (ev. 1).

Indeferida a liminar e requisitadas as informações de praxe (ev. 8), às quais constam no ev. 10, os autos ascenderam a Douta Procuradoria-Geral de Justiça que, em parecer lavrado pelo(a) Exmo(a). Sr(a). Carlos Henrique Fernandes opinou pela denegação da ordem (ev. 13).

É o relato do necessário.

VOTO

De início, registro que o habeas corpus é remédio constitucional que visa tutelar a liberdade corpórea do indivíduo, o seu direito de locomoção. Não é ele, pois, instrumento adequado para se discutir as provas ou a inocência do paciente, cingindo sua análise tão somente à ilegalidade ou não de ato constritivo de liberdade de locomoção.

Nesse passo, destaca Paulo Rangel:

A discussão sobre os elementos de prova ou sobre a inocência do réu é matéria a ser discutida no curso do processo, perante o juiz de primeiro grau, e não na ação de habeas corpus, sob pena de haver supressão de instância (Paulo Rangel. Direito Processual Penal. 24. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2016, p. 1.080).

No mesmo sentido, Guilherme de Souza Nucci leciona:

A ação de impugnação (habeas corpus) não se destina a analisar o mérito de uma condenação ou a empreender um exame acurado e minucioso das provas constantes dos autos. É medida urgente, para fazer cessar uma coação ou abuso à liberdade de ir, vir e ficar. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 1027).

A propósito, "no procedimento do habeas corpus não se permite a produção de provas, pois respectiva ação constitucional tem por objetivo sanar ilegalidade verificada de plano, não sendo possível aferir autoria e materialidade delitivas" (AgRg no RHC n. 154.367/PA, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 19/4/2022, DJe de 22/4/2022).

É o que se extrai da orientação do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. NEGATIVA DE AUTORIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DA AÇÃO DELITUOSA. PERICULOSIDADE SOCIAL. 1. Na via do habeas corpus, não há como se discutir a negativa de autoria e a ausência de provas, pois demandariam o reexame aprofundado do conjunto fático-probatório que compõe o processo principal. O envolvimento ou não do agente no delito que lhe é imputado é matéria cuja análise é reservada à ação penal, bastando, para justificar a prisão cautelar, haver indícios de autoria, o que, in casu, aconteceu, como detalhadamente demonstrado pelo Magistrado de primeiro grau.[...] 4. Ordem de habeas corpus denegada. (HC n. 715.127/CE, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 8/3/2022, DJe de 15/3/2022 - grifado)

O entendimento adotado nessa Corte não destoa:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006). PRISÃO PREVENTIVA. DISCUSSÕES MERITÓRIAS, NEGATIVA DE AUTORIA E AVENTADA DESTINAÇÃO DOS ENTORPECENTES PARA USO PRÓPRIO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. ESTREITA VIA DE COGNIÇÃO DO HABEAS CORPUS QUE NÃO PERMITE A DISCUSSÃO APROFUNDADA SOBRE O MÉRITO DA PROVA. NÃO CONHECIMENTO. O Habeas Corpus é um remédio constitucional de natureza excepcionalíssima que serve estritamente para aferir a legalidade do comando que privar ou ameaçar privar a liberdade de locomoção do indivíduo, não sendo possível a análise exaustiva das provas e das peculiaridades do caso concreto. Assim, teses como negativa de autoria ou destinação dos entorpecentes não podem ser conhecidas nesta estreita via de cognição. [...] ORDEM NÃO CONHECIDA. (TJSC, Habeas Corpus Criminal n. 5050900-24.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, Quinta Câmara Criminal, j. 14-10-2021 - grifado).

Portanto, a afirmativa de que "restou-se comprovado que as suposições formuladas pela Autoridade Policial, que ensejou a instauração do referido processo, não puderam ser confirmadas" (ev. 1), por equivaler a negativa de autoria, não pode ser conhecida por esta Corte, pois refere-se ao mérito da ação penal, exigindo uma incursão aprofundada na prova, sabidamente inviável na via estreita do writ.

Feito este apontamento, infere-se do presente remédio constitucional e também dos autos de origem que o(a) paciente está sendo processado(a) criminalmente, juntamente com outros 6 indivíduos. em tese, por infração ao disposto no art. 2º, §§ 2º, e 4º, incs. I e IV, da Lei n. 12.850/13 (ev. 1 - 50581348520218240023).

Após o recebimento da denúncia, ocorrido em 02.08.21, o(a) paciente teve a sua prisão preventiva decretada, em vista da necessidade de salvaguardar a garantia da ordem pública, diante das circunstâncias do crime e da existência de indícios concatenados da possibilidade de reiteração delitiva. A decisão foi proferida pelo Juiz de Direito Elleston Lissandro Canali nos seguintes termos (ev. 4 dos autos de origem):

Trato, neste ponto, da representação pela decretação da prisão preventiva dos acusados Leonam Rodrigo Mendes Lobato, Jeferson Meneghel, Gustavo Jacinto, Luiz Henrique Corrêa Júnior, Rafael Matos dos Prazeres e Rogério Luís da Silva Júnior formulada pelo Ministério Público de Santa Catarina (evento 1, parecer/promoção/manifestação Ministério Público 2, item 2).

DO DECRETO PRISIONAL.

No caso concreto, trata-se de investigação relacionada ao Auto de Prisão em Flagrante n. 5053012-91.2021.8.24.0023, lavrado em face do acusado Sidnei Adriano, que em 25/06/2021 foi preso em flagrante delito após assumir a propriedade de uma carta manuscrita oriunda do sistema prisional, que foi apreendida em posse do acusado Leonam Rodrigo Mendes Lobato, contendo instruções e comandos de integrantes da organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC.

Segundo consta na Denúncia, o acusado Sidnei Adriano estava em liberdade há poucos dias quando foi abordado juntamente com o acusado Leonam Rodrigo Mendes Lobato, que estava em posse do manuscrito, sendo que o acusado Sidnei Adriano revelou em seu interrogatório nos autos do APF n. 5053012-91.2021.8.24.0023 que tinha a tarefa de entregar a carta para uma pessoa de vulgo "Maquinista".

De acordo com a Denúncia, na carta apreendida contém instruções e ordens de integrantes da organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense que estão reclusos no sistema prisional para os integrantes que estão em liberdade, esse tipo de comando é chamado de "salve" pelos faccionados.

Extrai-se do Auto de Prisão em Flagrante n. 5053012-91.2021.8.24.0023, que por meio do sistema SISP foi verificada a identidade dos demais acusados que foram mencionados no manuscrito apreendido em posse dos acusados Sidnei Adriano e Leonam Rodrigo Mendes Lobato.

Neste ponto, oportuno mencionar que o Primeiro Grupo Catarinense, como já registrado em outros feitos que tramitam nesta Unidade Criminal, a organização criminosa, à qual os investigados estariam vinculados, surgiu em 2003 a pretexto de se rebelar contra as condições carcerárias dos detentos na Penitenciária da Capital, muito embora essa revolta, de maneira absolutamente ilegítima, tenha voltado seu foco para a prática de crimes. Pelo que se tem conhecimento, o grupo possui um estatuto que rege suas atividades e uma estrutura de hierarquia e poder bem definidos.

O Primeiro Ministério é composto por...

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