Acórdão Nº 5045259-55.2021.8.24.0000 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 18-11-2021

Número do processo5045259-55.2021.8.24.0000
Data18 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5045259-55.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO

AGRAVANTE: COOPERATIVA DE CREDITO RURAL COM INTERACAO SOLIDARIA DE DION AGRAVADO: ITALIA MARIA BARICHELLO

RELATÓRIO

Cooperativa de Crédito Rural com Interação Solidária - CRESOL Evolução interpôs agravo de instrumento de decisão interlocutória proferida na "Execução de Título Extrajudicial" n. 0302118-94.2018.8.24.0002 deflagrada em desfavor de Itália Maria Barichello, na qual o magistrado de origem reconheceu a impenhorabilidade de imóvel de propriedade da executada, nos seguintes termos:

A executada alega a impenhorabilidade da referida área rural, que possui 11.5019 ha, pois se enquadra como pequena propriedade rural trabalhada pela família.

A CRFB/1988 estabelece:

Art. 5º. [...]

XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;

Igualmente preconiza o CPC:

Art. 833. São impenhoráveis:

[...]

VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;

A Lei 8.629/1993 definiu a propriedade rural como aquela de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento (art. 4º, II, a). No caso concreto, o imóvel pertencente à executada possui natureza rural e é inferior a um módulo fiscal do Município de Dionísio Cerqueira/SC1.

Além disso, as fotografias e documentos trazidos autos (eventos 76 e 77) demonstram que a propriedade é utilizada para produção agrícola e criação de animais, sendo, portanto, trabalhada pela família.

Por fim, registre-se que a parte exequente não se desincumbiu do ônus de demonstrar que a propriedade não é utilizada para o sustento da família da executada, não afastando a presunção juris tantum favorável ao pequeno proprietário rural.

Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. DECISÃO QUE RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DE BENS IMÓVEIS. INSURGÊNCIA DA PARTE EXEQUENTE. INSURGÊNCIA CONTRA O RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, ESTA CONSIDERADA ATÉ QUATRO MÓDULOS FISCAIS. INSUBSISTÊNCIA. CABE AO CREDOR A COMPROVAÇÃO DE QUE A PROPRIEDADE NÃO É TRABALHADA PARA O SUSTENTO DA FAMÍLIA. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM FAVORÁVEL AO PEQUENO PROPRIETÁRIO RURAL. ENCARGO NÃO DESINCUMBIDO PELA PARTE CREDORA. IMPENHORABILIDADE ABSOLUTA DECRETADA COM ACERTO NA ORIGEM, POIS PREENCHIDOS REQUISITOS. ART. 5º, XXVI, DA CF E ART. 833, VIII, DO CPC. "6. O próprio microssistema de direito agrário (Estatuto da Terra; Lei 8.629/1993, entre outros diplomas) entrelaça os conceitos de pequena propriedade, módulo rural e propriedade familiar, havendo uma espécie de presunção de que o pequeno imóvel rural se destinará à exploração direta pelo agricultor e sua família, haja vista que será voltado para garantir sua subsistência. 7. Em razão da presunção juris tantum em favor do pequeno proprietário rural, transfere-se ao exequente o encargo de demonstrar que não há exploração familiar da terra, para afastar a hiperproteção da pequena propriedade rural." (REsp 1408152/PR, rel.: Ministro Luis Felipe Salomão. J. em: 1-12-2016). IMPENHORABILIDADE. IMÓVEL OFERECIDO EM HIPOTECA. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL PRODUTIVA FAMILIAR. ART. 5º, XXVI, DA CF, ARTS. E DA LEI N. 8.009/90 E ART. 833, VIII, DO CPC/15. IMPOSSIBILIDADE DE CONSTRIÇÃO JUDICIAL. CARACTERIZAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA. PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5008067-88.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 15-04-2021).

Por fim, registra-se que o oferecimento do imóvel rural em garantia hipotecária à dívida exequenda, não afasta a impenhorabilidade do bem, uma vez que, de acordo com o atual entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, a pequena propriedade rural, trabalhada pela família, é impenhorável, ainda que o bem tenha sido oferecido em garantia hipotecária pelos seus proprietários:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL OFERECIDA EM GARANTIA HIPOTECÁRIA. IMPENHORABILIDADE. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar é impenhorável, mesmo quando oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1361954/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/05/2019, DJe 30/05/2019).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA. IMÓVEL RURAL. PEQUENA PROPRIEDADE. EXPLORAÇÃO EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. IMPENHORABILIDADE. REQUISITOS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A pequena propriedade rural, trabalhada pela família, é impenhorável, ainda que dada pelos proprietários em garantia hipotecária para financiamento da atividade produtiva. Precedentes. 2. O acórdão recorrido asseverou que o imóvel dado em garantia hipotecária se enquadra no conceito de pequena propriedade rural, assim como há indícios robustos de que o bem é explorado em regime de economia familiar, por meio do qual o executado obtém a renda necessária para seu sustento. Rever tais conclusões demandaria o reexame de provas. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. Não estão presentes os requisitos cumulativos necessários para a majoração dos honorários sucumbenciais prevista no art. 85, § 11, do CPC/2015 (cf. AgInt nos EREsp n. 1.539.725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 9/8/2017, DJe 19/10/2017). 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1428588/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2019, DJe 16/05/2019).

Diante deste panorama, considerando que a proteção à dignidade da família se sobrepõe à da propriedade, direitos igualmente resguardados constitucionalmente, impõe-se o reconhecimento da impenhorabilidade, dado que o bem imóvel sobre o qual recaiu a constrição judicial é absolutamente impenhorável, por se tratar de pequena propriedade rural (vide TJSC, Apelação Cível n. 0300821-22.2016.8.24.0067, de Anchieta, rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 29-10-2020).

Ante o exposto, defere-se o pleito para declarar a impenhorabilidade do Lote Rural n. 85, da gleba n. 09, inscrito na matrícula n. 6.295 do CRI de Dionísio Cerqueira/SC.

Intimem-se, o exequente, inclusive, para requerer o que entender de direito, sob pena de suspensão/arquivamento.

Cumpra-se. (evento 83 dos autos de origem)

Sustenta a cooperativa de crédito agravante que: a) não há provas de que o imóvel em questão seja o único de propriedade da agravada, ou que nele reside; b) não restou igualmente comprovado que o imóvel é trabalhado pela unidade familiar para sua subsistência; c) o imóvel foi oferecido em hipoteca para garantia da Cédula Rural Hipotecária exequenda, renunciando, assim, a executada à impenhorabilidade do imóvel; d) subsidiariamente, caso se entenda pela impenhorabilidade do imóvel, esta seja restrita à residência da executada; e) "deve haver a análise do pleito sob a ótica da razoabilidade e da proporcionalidade, pois não podem os direitos individuais se sobreporem aos direitos da coletividade" (evento 1, doc. 1, p. 18 do recurso), mormente diante da recusa da agravada em promover acordo para composição da dívida existente. Forte em tais argumentos, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 1).

Inicialmente distribuído à relatoria do Desembargador Sebastião César Evangelista, o recurso foi redistribuído a este relator em razão do julgamento do recurso n. 4015145-74.2018.8.24.0900 (evento 11).

Constatada a ausência de pedido de caráter suspensivo ou antecipatório (evento 13), foi determinada a intimação da parte agravada que apresentou contrarrazões (evento 19).

Vieram-me, então, conclusos os autos.

É, no essencial, o relatório.

VOTO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela cooperativa de crédito, de decisão interlocutória proferida na "Execução de Título Extrajudicial" n. 0302118-94.2018.8.24.0002 deflagrada em desfavor de Itália Maria Barichello, na qual o magistrado de origem reconheceu a impenhorabilidade do imóvel de Matrícula n. 6.295 do Registro de Imóveis da comarca de Dionísio Cerqueira - SC, cuja propriedade registral pertence à agravada.

Alega a embargada que a impenhorabilidade do imóvel constrito nos autos da execução deve ser afastada porquanto ausente prova de que se trata de único imóvel de propriedade da agravada, utilizado para sua residência e para atividade rurícola de subsistência. Ademais, o bem foi oferecido em garantia hipotecária da dívida executada, configurando renúncia à impenhorabilidade do imóvel.

Pois bem.

O imóvel de Matrícula n. 6.295 do Registro de Imóveis da comarca de Dionísio Cerqueira - SC foi objeto de penhora nos autos da execução de origem, que tem por objeto a cobrança do valor de R$ 122.034,77 (Cento e vinte e dois mil e trinta e quatro reais e setenta e sete centavos), em 17/8/2018, decorrente do alegado inadimplemento do acordado na Cédula Rural Hipotecária n. 1600-2010-0610-000009, de 12/05/2010 (evento 1, doc. 10 da origem).

O título exequendo encontra-se garantido pela hipoteca de segundo grau do imóvel de Matrícula n. 6.295 do Registro de Imóveis da comarca de Dionísio Cerqueira - SC sobre o qual recai a controvérsia deste agravo de instrumento, uma vez que sobre ele foi lavrada penhora.

É cediço que o art. 5º, inc. XXVI, da Constituição Federal assegura que "a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu...

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