Acórdão Nº 5045648-40.2021.8.24.0000 do Primeira Câmara de Direito Público, 29-03-2022

Número do processo5045648-40.2021.8.24.0000
Data29 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5045648-40.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador PEDRO MANOEL ABREU

AGRAVANTE: ROSILENE CATARINA ALVES ADVOGADO: GLAUCO ARTUR RIBEIRO DE ASSUNCAO (OAB SC039880) ADVOGADO: ALTEMAR ALVES VALENZUELA (OAB SC033639) AGRAVADO: MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS AGRAVADO: SECRETARIO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO URBANO - MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS - FLORIANÓPOLIS MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Rosilene Catarina Alves interpôs agravo de instrumento em face da decisão interlocutória que, nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato do Secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano de Florianópolis, indeferiu o pedido liminar que visa obter liminar para suspender ordem administrativa de demolição de obra.

Irresignada, sustenta a agravante ter havido violação do devido processo legal, pois a ordem demolitória do prédio situado na Servidão Portugália, lote 15, Praia dos Ingleses, Florianópolis/SC, teria ocorrido sem que lhe fosse dada ciência.

Verbera já ter efetuado pedido de regularização do imóvel junto ao Município de Florianópolis e que, quanto ao imóvel estar ou não habitado, juntou aos autos documentos comprobatórios da entrega das chaves de duas unidades residenciais do edifício, no ano de 2020.

Afirma, no mais, que o ato demolitório foi obstado graças à decisão emitida nos autos do Agravo de Instrumento n. 5032098-75.2021.8.24.0000, interposto pelos moradores do prédio.

Pede a antecipação da tutela recursal e o provimento final do recurso, para suspender a decisão administrativa que determinou a demolição da construção, até o julgamento do mandado de segurança.

Em exame de admissibilidade, em que se pedia também antecipação de tutela recursal, foi este pedido considerado prejudicado por ter sido concedida liminar nos autos do agravo de instrumento n. 5032098-75.2021.8.24.0000, em que figuram como agravantes Alessandra Oliveira da Silva e outros.

Em sede de contrarrazões, o Município agravado pugnou pelo desprovimento do recurso.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Dra. Sonia Maria Demeda Groisman Piardi, manifestou-se pelo desprovimento do agravo.

Este é o relatório.

VOTO

Sem delongas, a matéria contida no presente agravo foi objeto de decisão por esta Corte nos autos do agravo de instrumento n. 5032098-75.2021.8.24.0000, em que figuram como recorrentes, os compradores do imóvel edificado sob a responsabilidade da ora agravante.

Aliás, a esse respeito, percebendo que a agravante não havia esclarecido, na peça inaugural do recurso, qual a sua relação jurídica com o imóvel em testilha, o signatário solicitou esclarecimentos no mesmo pronunciamento que considerou prejudicado o pedido de antecipação de tutela, por ter sido a ordem deferida no agravo suso referido. E aludidos esclarecimentos vieram aos autos no Evento 19, Pet 1. Transcreve-se-os, para melhor eludicação:

Excelência, conforme já deduzido no próprio despacho do Evento 12, a Recorrente vem informar que sua participação no imbróglio persiste formalmente em razão do contrato apresentado aos autos, que lhe imputou a obrigação de edificar o imóvel com unidades autônomas, em troca do direito de vendê-las no futuro.

Sendo assim, a Agravante, por questões de mera formalidade contratual, foi apontada como proprietária da obra pelo Município de Florianópolis, porém, é imperioso assinalar que a Recorrente é comerciante e que, em razão disso, a execução da obra não pode ser considerada de sua atribuição técnica.

Dessa feita, cumpre reforçar sua legitimidade ativa para impetração do mandado de segurança em questão, em virtude de que o ato coator debatido foi a si direcionado pelo Município de Florianópolis/SC em razão do referido contrato de permuta.

Em suma, pelo que se vê da resposta, a ora recorrente afirma não ser responsável técnica pela obra e nem, tampouco, proprietária, como se o texto contido no petitório pudesse conformar, ou manter algum tipo de relação jurídica que a afastasse, ou da condição de responsável técnica, ou da condição de proprietária, ou ao menos da condição de responsável civil por eventuais prejuízos causados a terceiros e/ou a coletividade.

Todavia, basta examinar o contrato de permuta constante do evento 1, contrato 3, dos autos originários, para ver que figura como Permutante Credora Cleideane Terezinha Machado, possuidora do imóvel denominado Lote 15, situado na localidade denominada Praia dos Ingleses (clásula 1.), objeto agora desta ação demolitória da Prefeitura de Florianópolis. Além disso, a Permutante Credora, isto é, Cleideane, deixou claro que o aludido imóvel era fruto de posse de sua titularidade e exercício, e que os Permutantes Devedores (a ora agravante e outro) tinham conhecimento dessa circunstância e que havia um pedido de usucapião do bem.

Em linhas simples e a título de esclarecimento, embora não se possa dizer que o possuidor seja, de fato, proprietário, age ele como se o fosse. Em suma, no mínimo, a ora recorrente tem vínculo jurídico com o imóvel em testilha na condição de responsável por edificar no terreno de posse da Permutante Credora. E se não é a responsável técnica, ao menos ficou encarregada de construir. Os Permutantes Devedores, que são, naquele ajuste Alexandre Minikowsky Marinho e Rosilene Catarina Alves, ora recorrente, ficaram encarregados de edificar e de buscar as autorizações construtiva necessárias, entre outros aspectos, junto ao Município.

Dito isso, colhe-se, como razão de decidir, eis que os argumentos do recurso são praticamente os mesmos, a decisão da lavra do signatário exarada nos autos agravo de instrumento n. 5032098-75.2021.8.24.0000:

Na espécie, os agravantes acima nominados vieram a esta Corte tentar obter providência de natureza cautelar, a fim de suspender os atos demolitórios iniciados pela Municipalidade, que em primeira instância lhes fora negada pelo julgador, sob o fundamento de que não havia irregularidade ou ilegalidade detectadas no ato administrativo atacado.

A matéria é grave e urgente, pois em jogo estão o devido processo legal e o correto ordenamento da cidade. Do mesmo modo que não se admite a eventual violação ao contraditório e à ampla defesa, não se pode também admitir a permanência de edificações em descompasso com as regras construtivas, notadamente as clandestinas. Na exata medida em que transcorre o o tempo, cria-se a indevida impressão de que não há consequências para a clandestinidade das construções, fazendo com que essa e outras surjam, além de estampar a indevida ideia de que o tempo é capaz de consolidar ou autorizar a permanência de edificações irregulares. A esse respeito, aliás, colhe-se importante excerto do voto exarado no REsp n. 1783692/PB, rel. Min. Hermann Benjamim, j. 13.08.2019, naquilo que tem relevo para a solução da presente controvérsia:

Inexiste incompatibilidade mortal entre direito a moradia e direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a ponto de a realização de um pressupor o sacrifício do outro, falso dilema que nega a própria essência ética e jurídica do direito à cidade sustentável (Lei 10.257/2001, art. 2°, I). No direito a moradia convergem a função social e a função ecológica da propriedade. Por conseguinte, não se combate nem se supera miserabilidade social com hasteamento de miserabiliadde ecológica, mais ainda porque água, nascentes, margens de rios, restingas, falésias, dunas e manguezais,entre outros bens públicos ambientais supraindividuais escassos,finitos e infungíveis, existem somente onde existem. Já terreno para habitação não falta, inclusive nas grandes metrópolis: o que careceé vontade política para enfrentar o vergonhoso deficit habitacional brasileiro, atribuindo-lhe posição de verdadeira prioridadenacional.

Dito isso, o agravo, como se verá, merece ser desprovido.

O principal argumento dos agravantes é formal: dizem não lhes ter sido conferido o direito ao contraditório e à ampla defesa no processo administrativo. Nada obstante, afirmam, em complemento, que o imóvel era habitado e lhes serve de moradia.

Verberam ter aforarado a presente ação contra o Município, buscando evitar a demolição dos imóveis cuja posse dizem ter adquirido de boa-fé. Dizem que a medida extrema administrativa ordenada pelo agravado, sem que se tenha instalado o contraditório e...

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