Acórdão Nº 5046060-51.2021.8.24.0038 do Quarta Câmara Criminal, 18-05-2023

Número do processo5046060-51.2021.8.24.0038
Data18 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5046060-51.2021.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: FABRICIO DE AUGUSTINHO (ACUSADO) E OUTRO ADVOGADO(A): WILLIAN PICKLER BATISTA (OAB SC032904) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Joinville, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Marcos Roberto Morais e Fabrício de Augustinho, imputando-lhes a prática do delito capitulado no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, ao primeiro, por 36 (trinta e seis) vezes, enquanto, ao segundo, por 20 (vinte) vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:
Os denunciados, na condição de sócios-administradores de 'HAPTUS SOLUÇÕES INDUSTRIAIS LTDA.', CNPJ n. 13.508.611/0001-97 e Inscrição Estadual n. 25.638.006-6, estabelecida na Rua Benjamin Constant, n. 3130, Galpão 3, Bairro Costa e Silva, em Joinville, deixaram de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 86.181,75 (oitenta e seis mil cento e oitenta e um reais e setenta e cinco centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, montante superior ao valor do próprio capital social integralizado da empresa, locupletando-se ilicitamente mediante esse tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação por meio do PGDAS-D (Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional - Declaratório) quanto aos meses de apuração de abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2018 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2019, documentos geradores da Dívida Ativa n. 200003310798, inscrita em 03/06/2020.
Ainda, o denunciado Marcos, isoladamente, na condição de sócio-administrador da empresa supracitada, deixou de efetuar, no prazo legal, também o recolhimento de R$ 122.000,27 (cento e vinte e dois mil reais e vinte e sete centavos) a título de ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante esse tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação por meio do PGDAS-D quanto aos meses de maio, junho, outubro e novembro de 2016, janeiro, fevereiro, março, maio, junho, julho, agosto, novembro e dezembro de 2017 e janeiro, fevereiro e março de 2018, documentos geradores da Dívida Ativa n. 200003310798, inscrita em 03/06/2020.
É de se registrar que os débitos relacionados aos meses de apuração de maio e junho de 2016 foram objetos do Parcelamento n. 004, o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 19/08/2016 a 17/05/2017. Também os débitos relacionados aos meses de apuração de maio, junho, outubro e novembro de 2016 e janeiro, fevereiro e março de 2017 foram objetos do Parcelamento n. 005, o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 17/05/2017 a 22/06/2018. Ainda, os débitos relacionados aos meses de apuração de dezembro de 2017 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto e setembro de 2018 foram objetos do Parcelamento n. 006, o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 01/11/2018 a 25/02/2019. Por fim, os débitos relacionados aos meses de apuração de maio, junho, outubro e novembro de 2016, janeiro, fevereiro, março, maio, junho, julho, agosto, novembro e dezembro de 2017 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2018 foram objetos do Parcelamento n. 007, o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 25/02/2019 a 14/07/2019, tudo conforme preceitua o §2º do art. 83 da Lei n. 9.430/96, com nova redação dada pelo art. 6º da Lei n. 12.382/11 (vide extratos anexos) (Evento 1, DENUNCIA1, autos originários).
Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedentes os pedidos formulados na denúncia, para condenar Marcos Roberto Morais e Fabrício de Augustinho, cada qual, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime aberto, substituída por uma medida restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, fixados no mínimo legal, pela prática do crime previsto no art. 2º, II da Lei n. 8.137/90, por 36 (trinta e seis) vezes, em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP) (Evento 432, SENT1, autos originários).
A defesa dos acusados opôs embargos declaratórios (Evento 439, EMBDECL1), que foram rejeitados pelo Magistrado a quo (Evento 444, SENT1, autos originários).
Inconformados com a prestação jurisdicional, o réus interpuseram apelação criminal, mediante a qual postularam a absolvição pela atipicidade da conduta, "tendo em vista que se trata de ICMS próprio da sociedade devidamente declarado pelos Apelantes, sem meios de apropriação fraudulenta", e "em decorrência da inconstitucionalidade da prisão por dívida civil, declarando incidentalmente a inconstitucionalmente o art. 2º, inciso II da Lei 8.137/90".
Subsidiariamente, no tocante à dosimetria da pena, requereram a aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, "c", do Código Penal, o afastamento da continuidade delitiva, com a fixação da pena no seu mínimo legal e a substituição por medidas restritivas de direitos (Evento 451, APELAÇÃO1, autos originários).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 458, CONTRAZAP1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Rogério A. da Luz Bertoncini, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 10, PROMOÇÃO1)

VOTO


1 De início, o pedido que visa à aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, "c", do CP não deve ser conhecido, pois desprovido de qualquer argumentação.
Sabe-se que a admissibilidade do recurso depende do preenchimento de alguns requisitos legais, "para que a utilização das vias recursais não se transforme em instrumento de abuso de direito ou de mera satisfação de curiosidade acadêmica" (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2017. p. 966).
Assim, conquanto a argumentação da defesa no âmbito do processo penal possa ser exígua, exige-se, ao menos, explanação acerca do pedido formulado, de modo a possibilitar que a parte contrária ofereça as contrarrazões, sob pena de não conhecimento por afronta ao princípio da dialeticidade.
Sobre o assunto, já decidiu esta Corte:
APELAÇÕES CRIMINAIS - ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (ART. 35, CAPUT, DA LEI N. 11.343/096), PARTICIPAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (ART. 2º, §§ 2º E 3º, DA LEI N. 12.850/13) E CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 244-B DA LEI N. 8.069/90) - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - RECURSOS DAS PARTES. RECURSO DOS ACUSADOS. PLEITO ABSOLUTÓRIO - FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA - OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL - NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. Não deve ser conhecida por ofensa ao princípio da dialeticidade recursal a insurgência que se resume a um pedido meramente genérico, desacompanhada de qualquer fundamentação concreta/específica no corpo das razões recursais a fim de embasar tal pretensão.[...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0009391-96.2015.8.24.0005, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. em 20/10/2022 - grifou-se).
Dito isso, uma vez que o requerimento acima mencionado foi apresentado genericamente, despido de mínima fundamentação concreta, o recurso não pode ser conhecido no ponto.
No mais, presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do reclamo.
2 A defesa requer a absolvição dos acusados, sustentando, em síntese, a atipicidade da conduta por falta de dolo e a inconstitucionalidade do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90.
Contudo, razão não lhe assiste.
Em que pese não existir insurgência no ponto, destaca-se que a materialidade e autoria delitivas estão comprovadas de forma segura, consoante se extrai da Dívida Ativa n. 200003310798 (Evento 1, NOT_CRIME2, fls. 3-4), dos extratos PGDASD correspondentes (Evento 1, NOT_CRIME2, fls. 6-41) e das cópias das 2ª, 3ª e 4ª alterações contratuais da pessoa jurídica (Evento 1, NOT_CRIME2, fls. 60-92), bem como da prova oral coligida.
O delito em questão consiste na conduta de não repassar ao Estado aquilo que lhe é de direito por força de lei - máxime nos casos em que trata de tributos indiretos -, em que o consumidor final é quem, de fato, efetua o seu pagamento, de modo que o sujeito passivo da obrigação figura somente como mero intermediário.
Dessa maneira, o fato de os apelantes terem deixado de recolher aos cofres públicos ICMS subsome-se ao comando normativo contido no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, in verbis:
Art. 2º Constitui crime da mesma natureza:
II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
Sobre o crime em tela, colhe-se do escólio de Ricardo Antonio Andreucci:
No dispositivo em análise, muito assemelhado à apropriação indébita, o retentor do tributo ou contribuição (sujeito ativo) é mero substituto tributário, retendo o imposto devido de terceiros e assumindo, por imposição legal, a obrigação de recolhê-lo aos cofres públicos. É verdadeiro depositário do valor, devendo entregá-lo ao Fisco (Legislação penal especial. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 375).
Logo, o encargo tributário é pago antecipadamente pelo consumidor final, de modo que o empresário figura como mero arrecadador e depositante dos valores pertencentes ao Fisco.
Nesse sentido, cita-se:
PENAL. PROCESSUAL...

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