Acórdão Nº 5049687-35.2023.8.24.0930 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 21-03-2024

Número do processo5049687-35.2023.8.24.0930
Data21 Março 2024
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5049687-35.2023.8.24.0930/SC



RELATOR: Juiz CLAUDIO EDUARDO REGIS DE FIGUEIREDO E SILVA


APELANTE: LIGIANE DE SOUSA PEREIRA (AUTOR) APELANTE: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU) APELANTE: GRASIELA CRISTINA ALVES DE MOURA (INTERESSADO) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Grasiela Cristina Alves de Moura, procuradora da parte autora, e Crefisa S.A. Crédito, Financiamento e Investimentos, interpuseram recursos de apelação contra a sentença proferida pelo 10º Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário, que julgou procedentes os pedidos formulados na ação revisional n. 5049687-35.2023.8.24.0930, nos seguintes termos (evento 18, SENT1 ):
[...]
LIGIANE DE SOUSA PEREIRA, ajuizou(zaram) demanda em face de CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, objetivando discutir as cláusulas de contrato(s) bancário(s), bem como postulando a restituição/compensação dos valores cobrados a maior.
A instituição financeira, em contestação, refutou as postulações deduzidas na petição inicial e sustentou a legalidade dos encargos pactuados.
Após o regular trâmite, vieram os autos conclusos.
FUNDAMENTAÇÃO
Julgo o processo antecipadamente, porquanto contém substrato probatório suficiente para a formação do convencimento do juízo acerca da matéria, consoante art. 355, I, do CPC.
Os bancos em suas atividades encontram-se vinculados à norma protetiva dos consumidores, nos moldes do artigo 3º, §2º, da Lei 8078/90 (CDC).
Nesse sentido preceitua o verbete sumular nº. 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições fi nanceiras."
Aliás, neste mesmo rumo, é remansosa a jurisprudência Catarinense: (Apelação Cível n.º 99.017191-4, de Chapecó. Relator : Des. Pedro Manoel Abreu).
Assim, adota-se essa teoria que mais se amolda com o espírito do Código de Defesa do Consumidor, de forma que outra interpretação o tornaria imprestável para os fins a que foi criado.
As demandas cuja controvérsia gira em torno da revisão de contratos, por via de regra, dispensam a produção de outras provas além do próprio instrumento negocial e de seus aditivos e complementos, inexistindo justificativa para prolongamento da instrução processual, em detrimento do princípio constitucional da celeridade, estampado no art. 5º, LXXVIII, da CRFB.
Cabe asseverar ainda que, costumeiramente, é dispensável a realização de perícia nesta modalidade de demanda, porquanto tais lides ordinariamente versam questões exclusivamente de direito, sendo de se diferir a apuração de eventual saldo remanescente, em favor de qualquer das partes, à posterior fase de cumprimento, mediante cálculos aritméticos.
Sobre o tema, a Corte Catarinense já decidiu que "a não realização de prova pericial, indeferida implicitamente pelo julgamento antecipado da lide, não gera qualquer cerceamento à defesa da autora do pleito revisional de contrato bancário, quando se tem que, em demandas desse jaez, a apreciação judicial é restrita a um confronto entre as disposições contratuais e os preceitos legais atinentes à hipótese" (TJSC, AC 2006.017025-7, Trindade dos Santos, 22.06.2006).
DO MÉRITO
Juros Remuneratórios
Segundo entendimento sedimentado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, os juros remuneratórios podem ser superiores a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassem a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil. Tanto é que os integrantes do Grupo de Câmaras de Direito Comercial deste egrégio Tribunal de Justiça editaram alguns enunciados sobre o assunto. Veja-se:
I - Nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12 % (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil. [...] IV - Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.
No mesmo sentido, o verbete sumular n. 648 do Supremo Tribunal Federal (que culminou na edição da Súmula Vinculante n. 7 e a Súmula n. 296 do Superior Tribunal de Justiça): "A norma do §3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar."
Aliás, oportuno registrar excerto do voto da Minª. Nancy Andrighi, prolatado no Resp n. 1061530-RS: "a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos".
Destaco que o Custo Efetivo Total (CET) não é o parâmetro de comparação com a taxa média de mercado, porquanto ultrapassa o percentual de juros, para fins de englobar todas os demais encargos incidentes na contratualidade, conforme a Resolução 3.517/2007 do Conselho Monetário Nacional. Notadamente, o referido índice não é adequado para verificação da onerosidade, pois tal análise deve ser resolvida individualmente para cada suposta irregularidade contratual, sob pena de resultado incongruente. No ponto, aliás, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina orienta que é "descabida a utilização da taxa prevista no contrato correspondente ao custo efetivo total anual para aferição da abusividade dos juros remuneratórios, porquanto ela representa não somente a remuneração do capital, mas todos os encargos e despesas incidentes na operação, nos termos da Resolução n.º 3.517/2007, do Banco Central do Brasil" (TJSC, AC 2012.043020-0, Paulo Roberto Camargo Costa, 07.08.2014).
Acrescento que as instituições financeiras, desde que devidamente constituídas e reconhecidas pelos órgãos oficiais, por via de regra não precisam de autorização específica do Conselho Monetário Nacional para contratação de juros em níveis superiores aos permitidos às demais pessoas jurídicas não fiscalizadas pelo Bacen, ressalvados casos específicos previstos em lei, a exemplo das cédulas de crédito industrial, rural e comercial, apesar do disposto no art. 4º, IX, da Lei 4.595/1964. Isto porque a referida entidade regulamentar e fiscalizadora não exerceu a atribuição administrativa de fixar limite à remuneração do capital, deixando o equilíbrio do sistema financeiro à livre atuação do mercado. Daí que somente quando se tratarem de notas e cédulas de crédito rural, comercial e industrial, será necessário que a casa bancária comprove (art. 373, II, do CPC) que obteve prévia autorização do Conselho Monetário Nacional para exigir juros remuneratórios acima de 12% ao ano, conforme interpretação sistemática dos arts. 5º do Decreto-lei 413/1969, da Lei 6.840/80 e 22 do Decreto 22.626/33 (Lei da Usura).
Assevero, ainda, ser possível a variação da taxa de juros na administração de cartões de crédito, porquanto as instituições financeiras não podem antever os custos de captação de recursos para concessão dos financiamentos referentes a cada período mensal, sendo natural que calculem seus custos operacionais e margem de lucratividade de acordo com as variações de mercado. Tal procedimento é normal e aceitável, desde que o consumidor seja prévia e devidamente informado dos encargos incidentes sobre a linha de crédito que estão disponibilizados para o período subsequente (mediante indicação prévia nas faturas mensais, por exemplo), de modo que possa avaliar a viabilidade e onerosidade da contração de novos financiamentos, prestigiando o princípio da informação estampado nos arts. 6º, III, 46 e 52, I e II, do Código de Defesa do Consumidor (cf. TJSC, AC 2008.000727-3, Jorge Schaefer Martins, 28.07.2008).
No caso dos autos, a parte autora celebrou contratos de empréstimo em maio de 2017 e junho de 2017 com taxa de juros de 987,22% ao ano e 666,69% ao ano respectivamente.
Dessa forma, impõe-se a limitação da taxa de juros pactuada eis que superiores a taxa média autorizada pelo BACEN á época da contratação (132,64% ao ano e 124,97% ao ano).
Dos encargos moratórios
Em razão dos excessos constatados nos encargos da normalidade em alguns dos contratos celebrados e diante das peculiaridades do caso concreto, resta descaracterizada a mora devendo, por consequência ser afastada a exigência dos encargos moratórios, até o recálculo do débito, adequando-o aos parâmetros da revisão contratual.
A propósito (TJSC, Apelação Cível n. 2009.059926-7, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Dinart Francisco Machado, j. 23-06-2015).
Da repetição do indébito
A repetição de indébito não é senão a restituição do que foi pago sem ser devido, apresentando-se como sanção da regra de que não é permitido a ninguém enriquecer injustamente às custas de outrem.
Observa-se que na hipótese dos autos, encontram-se presentes os pressupostos para o êxito da demanda, uma vez que ao desvirtuar o cálculo dos encargos contratuais, o saldo devedor onerou além do devido as parcelas exigíveis.
Esse desvirtuamento refletiu-se nas prestações subsequentes e assim sucessivamente.
Aliás, é entendimento dominante no STJ que "Tratando-se de relação de consumo ou de contrato de adesão, a compensação/repetição simples do indébito independe da prova do erro (Enunciado 322 da Súmula do STJ)" (STJ, 2ª Seção, rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, REsp 1.255.573/RS, j. 28-8-2013).
Não é demais ressaltar que o pagamento deve ocorrer na forma simples, pois, consoante entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, "para ocorrer em dobro, deve haver inequívoca prova de má-fé" (AgRg no Resp 916008/RS, relª. Minª. Nancy Andrighi, j. 14.06.2007).
Neste trilhar, tendo em vista que "a readequação do saldo devedor não acarreta a obrigação de devolver em dobro o valor exigido a maior, mas tão-somente de compensar o excesso, na forma simples, com o respectivo saldo devedor...

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