Acórdão Nº 5049894-96.2020.8.24.0038 do Segunda Câmara Criminal, 25-05-2021

Número do processo5049894-96.2020.8.24.0038
Data25 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 5049894-96.2020.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: PEDRO FRANCISCO SUZENA JUNIOR (AGRAVADO) ADVOGADO: THIAGO YUKIO GUENKA CAMPOS (DPE)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de agravo de execução penal intentado pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, não conformado com o teor da decisão do Evento 213 do PEP 0051395-25.2010.8.24.0038 (eproc), por meio da qual o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Joinville deferiu progressão ao regime semiaberto e autorizou saídas temporárias em favor do Apenado Pedro Francisco Suzena Júnior.
Sustenta o Agravante que a nova redação do art. 112 da Lei de Execução Penal, dada pela Lei 13.964/19, não exige a reincidência específica para que sejam aplicadas as frações mais graves à progressão de regime, bastando a de natureza genérica.
Pondera que, no caso, não deve ser aplicada a fração de 40% sobre a pena do crime equiparado a hediondo, mas a de 60%, nos termos do art. 112, caput, VII, da Lei de Execução Penal.
Aponta que a redação do referido dispositivo "não caracteriza, por si só, a reincidência específica, já que a expressão 'reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado'" faz "referência ao condenado que se tornou reincidente por ter incorrido na prática de crime hediondo ou equiparado", que diante do "contexto e as razões que motivaram a elaboração do Pacote Anticrime, a interpretação supramencionada se acoberta de ainda maior lógica", e que "qualquer margem de interpretação diversa que o artigo 112, inciso VII, da LEP possibilite é facilmente superada com a análise global do cenário trazido pela nova redação, sobretudo no que tange ao impacto no ordenamento jurídico brasileiro".
Concluiu que o Agravado "não preencheu o requisito temporal para a concessão da progressão ao regime menos rigoroso, o qual será implementado apenas em 6-9-2022".
Sob tais argumentos, requer "o provimento do presente recurso, a fim de reformar a decisão que deferiu a progressão do apenado ao regime semiaberto" (eproc, Evento 1, doc1 do agravo na origem).
Pedro Francisco Suzena Júnior ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (eproc, Evento 13 do agravo na origem).
O Doutor Juiz de Direito manteve a decisão resistida (eproc, Evento 15 do agravo na origem).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça José Eduardo Orofino da Luz Fontes, posicionou-se pelo provimento do agravo (Evento 6)

VOTO


O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.
1. O Agravado Pedro Francisco Suzena Júnior cumpre pena de 18 anos e 10 meses de reclusão, em razão das seguintes condenações, listadas na sequência cronológica dos fatos:
1) Ação Penal 0041150-23.2008.8.24.0038, pena de 5 anos e 4 meses de reclusão, pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, II, do Código Penal, com redação anterior à Lei 13.654/18, ocorrido em 13.8.08, trânsito em julgado dia 9.8.10 (eproc, Evento 1 do PEP);
2) Ação Penal 0815812-04.2014.8.24.0038, pena de 5 anos e 4 meses de reclusão, pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, II, do Código Penal, com redação anterior à Lei 13.654/18, ocorrido em 9.10.14, trânsito em julgado dia 27.7.16 (eproc, Evento 193 do PEP);
3) Ação Penal 0003779-10.2017.8.24.0038, pena de 8 anos e 2 meses de reclusão, pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, ocorrido em 17.3.17, trânsito em julgado dia 5.12.18 (eproc, Evento 194 do PEP).
Na condenação 1 (fato ocorrido em 13.8.08) o Agravante era primário e assim foi reconhecido na sentença. Na condenação 2 (fato em 9.10.14) foi considerado reincidente, por conta da solidificação da condenação 1 em 9.8.10. Ao tempo da condenação 3 (fato em 17.3.17) a condenação 2 era definitiva (27.7.16).
O Agravado Pedro Francisco Suzena Júnior, então, é reincidente específico em crimes violentos (praticou roubo após ser condenado por roubo) e reincidente genérico em crime equiparado hediondo (praticou tráfico após condenações por roubo).
Vigia, na época do crime equiparado a hediondo pelo qual Pedro Francisco Suzena Júnior cumpre pena, o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90, com redação dada pela Lei 11.464/07, que dispunha que "a progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo (hediondos e equiparados), dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente".
Especificamente quanto a estas frações da progressão de regime o Superior Tribunal de Justiça orienta que, "ante a unificação das penas, a condição de reincidente do apenado determina o cumprimento de 3/5 sobre o total", de modo que "não há falar em aplicação do percentual de 2/5 para a progressão de regime, em relação à primeira condenação, pois, unificadas as penas, conforme determina o art. 111 da LEP, a reincidência deve incidir sobre o somatório das penas e não apenas na segunda condenação", pois "pacificou entendimento no sentido de que a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum ou específica. Assim, havendo reincidência, ao condenado deverá ser aplicada a fração de 3/5 da pena cumprida para fins de progressão do regime" (HC 427.803, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 4.10.18).
O posicionamento é adotado pelas cinco Câmaras Criminais deste Tribunal de Justiça: Recursos de Agravo de Execução 0001652-65.2018.8.24.0038, Primeira Câmara Criminal, Rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 2.8.18; 0004136-53.2018.8.24.0038, Segunda Câmara Criminal, Rel. Des. Norival Acácio Engel, j. 5.6.18; 0006122-76.2017.8.24.0038, Terceira Câmara Criminal, Rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, j. 31.10.17; 0003438-18.2016.8.24.0038, Quarta Câmara Criminal, Rel. Des. Jorge Schaefer Martins, j. 20.10.16; e 0009795-58.2018.8.24.0033, Quinta Câmara Criminal, Rel. Des. Luiz Neri Oliveira de Souza, j. 27.9.18.
Todavia, em 23.1.20, entrou em vigor a Lei 13.964/19, que expressamente revogou o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90 (art. 19) e fixou novos percentuais para a progressão de regime na Lei de Execução Penal, a qual passou a centralizar a matéria.
Dispõe o atual art. 112 da Lei de Execução Penal:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.
§ 1º Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
§ 2º A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes.
§ 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente:
I - não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
II - não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente;
III - ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;
IV - ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;
V - não ter integrado organização criminosa.
§ 4º O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo.
§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006.
§ 6º O cometimento de falta grave durante a execução da pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do requisito objetivo terá como base a pena remanescente.
Diante disso, ainda que não tenha havido recrudescimento do montante de pena a ser cumprido, uma vez que 60% e 3/5 são duas formas distintas de referência a uma mesma porção, a Legislação atual prevê essa fração "se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado", o que deu início ao debate quanto à natureza da recidiva ali tratada, pois a interpretação literal do dispositivo indica que se trata da reincidência específica em delitos desta natureza. Afinal,...

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