Acórdão Nº 5050267-93.2021.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Público, 06-12-2022

Número do processo5050267-93.2021.8.24.0038
Data06 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5050267-93.2021.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador PEDRO MANOEL ABREU

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU) APELADO: ANTONIO CARLOS RIBEIRO DE CAMPOS (AUTOR) ADVOGADO: Ronaldo do Carmo Marinho (OAB SC026340)

RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra sentença que, em sede de Ação Acidentária, reconheceu o direito de ANTONIO CARLOS RIBEIRO DE CAMPOS ao auxílio-acidente a contar da cessação do auxílio-doença.

Em sua insurgência o INSS aduz, preliminarmente, estar ausente o interesse processual da parte autora em razão de inexistir requerimento administrativo prévio de auxílio-acidente ou pedido de prorrogação do auxílio-doença. Pede, assim, que o feito seja extinto sem resolução do mérito ou, subsidiariamente, que a concessão do benefício se dê a partir da data da citação.

No mais, o recorrente busca a alteração da RMI do benefício, pois alega que sua concessão se dará durante a vigência da Medida Provisória 905/2019, a qual previa que o auxílio-acidente deveria corresponder a "50% (cinquenta por cento) do benefício de aposentadoria por invalidez a que o segurado teria direito".

Por fim, pede a isenção das custas processuais, inclusive das despesas com distribuidor e contador do foro de Joinville.

Com as contrarrazões, ascenderam os autos.

Este é o relatório.

VOTO

Nega-se provimento ao recurso.

1) Interesse processual

Quanto ao tema, assim sustenta o recorrente:

O INSS não teve a oportunidade de avaliar a parte autora APÓS A CONSOLIDAÇÃO DAS SUPOSTAS SEQUELAS, ou seja, não houve negativa administrativa apta a configurar interesse de agir. Constata-se que, no caso em questão, o benefício fora cessado pela chamada "alta programada".

[...]

Na ausência de prévio requerimento, não há conduta alguma por parte da Administração Pública. Logo, não resta caracterizada lesão ou ameaça de direito. Já na cessação pela "alta programada", sem pedido de prorrogação, o INSS concedeu justamente aquilo que o segurado pretendia, sendo que a cessação do auxílio-doença somente se deu por uma conduta imputada ao próprio autor (falta de pedido de prorrogação).

Veja-se que não há pretensão resistida alguma por parte do INSS, que concedeu o auxílio-doença conforme o prognóstico elaborado pelo médico da autarquia. A culpa da cessação é exclusivamente do segurado, que não formulou o pedido de prorrogação.

Ou seja, o INSS imputa ao segurado a responsabilidade pela não implantação do benefício, alegando que o interesse processual somente estaria presente se houvesse prévio requerimento administrativo ou pedido de prorrogação do auxílio-doença.

Pois bem.

Em relação ao requerimento extrajudicial, o tema foi objeto de amplos debates, tendo-se firmado o entendimento de que não é necessário esvaziar a via extrajudicial. E assim se concluiu, em síntese, a partir da compreensão de que o INSS, ao conceder o auxílio-doença, toma ciência da incapacidade e deve diligenciar na entrega do melhor benefício ao segurado.

O entendimento encontra amparo em julgado do Supremo Tribunal Federal - RE 631.240 (confirmado pelo Tema 350 daquela Corte) - no qual restou expressamente consignado que:

Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo.

Considera-se, pois, que nas situações como a presente, a autarquia já teve oportunidade de avaliar as condições de saúde do segurado, estando apta, em tese, a identificar as limitações que autorizam a implantação do auxílio-acidente. Se não o fez, tem-se que a conduta do INSS configura o não acolhimento da pretensão.

Também no julgamento do referido RE 631.240, o relator, Min. Roberto Barroso, deixou clara a extensão da tese lançada:

As principais ações previdenciárias podem ser divididas em dois grupos: (i) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão etc.); e (ii) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidade mais vantajosa, restabelecimento, manutenção etc.).

No primeiro grupo, como regra, exige-se a demonstração de que o interessado já levou sua pretensão ao conhecimento da Autarquia e não obteve a resposta desejada. No segundo grupo, precisamente porque já houve a inauguração da relação entre o beneficiário e a Previdência, não se faz necessário, de forma geral, que o autor provoque novamente o INSS para ingressar em juízo.

Desse modo, entende-se que a cessação do auxílio-doença implica na negativa, ainda que tácita, do auxílio-acidente. E daí porque se torna desnecessária nova provocação extrajudicial como condição ao ingresso em juízo.

Única limitação que se impõe é temporal. É que em sessão do dia 14.10.2020, o colendo Grupo de Câmaras de Direito Público deste Tribunal, sem afastar as conclusões acima expostas, estabeleceu que

Decorridos cinco anos da cessação do pagamento do auxílio-doença, o pedido judicial de sua conversão em auxílio-acidente depende de prévio requerimento administrativo. (Ata n. 217)

Buscou-se, na ocasião, salvaguardar os interesses do segurado em sintonia com as regras processuais de utilidade e necessidade, evitando-se, assim, "demandas temporalmente muito distantes dos fatos, o que exige a possibilidade de um novo posicionamento administrativo, haja vista a perspectiva saliente de alteração da situação de saúde". (TJSC, Apelação n. 0300784-44.2018.8.24.0028, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, j. 10.11.2020)

Reforçando a exposição, cita-se:

APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ACIDENTÁRIA. AUXÍLIO-ACIDENTE. EXEGESE DO ARTIGO 485, I E VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NA ORIGEM. RECURSO DO REQUERENTE. INTERESSE PROCESSUAL EVIDENCIADO. AÇÃO AJUIZADA ANTES DE DECORRIDO PRAZO QUINQUENAL DESDE A CESSAÇÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. DESNECESSIDADE DE NOVO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RESSALVA FEITA PELO STF EM REPERCUSSÃO GERAL. ADEMAIS, ENTENDIMENTO DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO DESTA CORTE DE JUSTIÇA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA RETOMADA DA MARCHA PROCESSUAL. Consoante uniformização de entendimento em deliberação do Grupo de Câmaras de Direito Público, reunido em sessão realizada na data de 14-10-2020, "decorridos cinco anos da cessação do pagamento do auxílio-doença, o pedido judicial de sua conversão em auxílio-acidente depende de prévio requerimento administrativo". Na hipótese, houve a fluência de menos de 5 (cinco) anos entre o último pagamento do auxílio-doença e a data de aforamento da demanda visando à concessão de auxílio-acidente, situação que viabiliza o processamento da pretensão, independentemente de novo requerimento administrativo. [...] (TJSC, Apelação n. 0308463-29.2016.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 20-05-2021). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000878-81.2021.8.24.0025, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Diogo Pítsica, Quarta Câmara de Direito Público, j. 7.4.2022).

E ainda:

JUÍZO DE RETRATAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ACIDENTÁRIA. RECONHECIMENTO DA AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SENTENÇA QUE EXTINGUE O PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. DECISÃO QUE VAI AO ENCONTRO DO ENTENDIMENTO FIRMADO PELO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO EM INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA N. 5004663-29.2021.8.24.0000 (TEMA 24). AÇÃO PROPOSTA APROXIMADAMENTE DEZ ANOS APÓS A CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO ANTERIOR. EXTINÇÃO DA AÇÃO DE PLANO ANTES MESMO DA CITAÇÃO DA PARTE CONTRÁRIA. AUSÊNCIA DE DEFESA DE MÉRITO E INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. APELO DA AUTORA DESPROVIDO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO. (TJSC, Apelação n. 5000029-34.2019.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa...

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