Acórdão Nº 5051703-53.2022.8.24.0038 do Quinta Câmara Criminal, 13-04-2023

Número do processo5051703-53.2022.8.24.0038
Data13 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5051703-53.2022.8.24.0038/SC



RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER


APELANTE: JANIO BOLL JUNIOR (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofertou denúncia em face de JANIO BOLL JUNIOR, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, inciso V, ambos da Lei n. 11.343/2006, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (evento 1 da ação penal):
No dia 14 de novembro de 2022, o denunciado JANIO BOLL JUNIOR, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, trouxe com ele e transportou, entre os Estados do Paraná e Santa Catarina, para posterior venda a terceiros, aproximadamente 316kg (trezentos e dezesseis quilos) da substância entorpecente maconha, utilizando-se, para tanto, do veículo Renault Kangoo, cor branca, placas ONY 6411, em cujo interior estavam os blocos/fardos do entorpecente.
Por volta das 22h55min do dia 14 de novembro de 2022, na Rodovia BR 101, próximo ao Km 26, bairro Pirabeiraba, em Joinville/SC, Policiais Rodoviários Federais, com informações de que um veículo com características similares estava transportando drogas, visualizaram o automóvel Renault Kangoo, cor branca, placas ONY 6411, quando então deram voz de parada, o que foi acatado.
Na sequência, os Policiais Rodoviários realizaram buscas no interior do veículo, quando então localizaram e apreenderam os fardos de maconha que o denunciado trazia consigo e transportava no interior do automóvel.
Além disso, foram apreendidos em posse do denunciado dois aparelhos celulares, os quais eram oriundos e/ou utilizado para a prática do tráfico de drogas.
Ressalta-se que o denunciado praticou o tráfico de drogas interestadual, tendo em vista que a viagem se iniciou em Tijucas do Sul, Estado do Paraná, com destino a São José, Santa Catarina, mas terminou em Joinville, Santa Catarina.
Destaca-se que a substância apreendida é entorpecente e pode causar dependência física e psíquica, sendo elencadas na Portaria n. 344/1998 da Secretaria da Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde como de uso e comercialização proibidos em todo o Território Nacional.
A denúncia foi recebida (evento 5 da ação penal), o réu foi citado (evento 19 da ação penal) e apresentou defesa (evento 22 da ação penal).
A defesa foi recebida e, não sendo o caso de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução e julgamento (evento 37 da ação penal).
Na instrução foram inquiridas as testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, bem como o réu foi interrogado (evento 97 da ação penal).
Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais orais (evento 97 da ação penal), sobreveio a sentença (evento 102 da ação penal) com o seguinte dispositivo:
Ante o exposto, diante das elucidações apresentadas e da legislação penal, especial e processual penal aplicável à espécie, JULGO PROCEDENTE o pedido constante na denúncia ofertada pelo Ministério Público no evento 1, para condenar JANIO BOLL JUNIOR, acima qualificado, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime semiaberto, e ao pagamento de 583 dias-multa, no valor de seu mínimo legal, por infração ao artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso V, ambos da Lei 11.343/06, somados aos ditames da Lei dos crimes hediondos.
Inconformado o réu interpôs recurso de apelação (evento 108 da ação penal) e os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.
Nesta instância, oa acusado apresentou suas razões de apelação (evento 9), onde, em preliminar, sustenta nulidade das provas obtidas através da busca veicular e a ilicitude das provas obtidas através dela, com a consequente absolvição do apelante em razão da ausência de provas. No que tange à dosimetria, pugna pelo reconhecimento do tráfico privilegiado.
Apresentadas as contrarrazões, com requerimento de conhecimento e o desprovimento do recurso (evento13).
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Kátia Helena Scheidt Dal Pizzol manifestando-se pelo conhecimento e provimento do apelo defensivo, para absolver o réu JANIO BOLL JUNIOR, por não existirem provas válidas para condená-lo pelo crime do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, ou, subsidiariamente, pelo reconhecimento da existência de dúvidas que lhe beneficia, conforme art. 386, VII, do CPP (evento 17)

VOTO


Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Como sumariado, trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo réu Janio Boll Junior, o qual busca a reforma da sentença proferida pela MM. Juíza de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Joinville, que condenou-o ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime semiaberto, e ao pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor de seu mínimo legal, por infração ao artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso V, ambos da Lei 11.343/2006.
1 - Preliminar de nulidade da busca veicular
O apelante sustenta, em sede preliminar, ocorrência de nulidade da busca veicular, porquanto realizada desamparada da fundada suspeita exigida pela legislação processual.
Aduz o recorrente "Em que pese terem informado que receberam uma suposta denúncia através do setor de inteligência, os agentes federais sequer conseguiram explicar em detalhes o conteúdo e a origem dessa informação, bem como não fora apresentado qualquer documento probatório que indicasse a existência dessa suposta denúncia" (evento 9).
Acrescenta que solicitou à Polícia Rodoviária Federal informações sobre a existência de qualquer informação/denúncia envolvendo o veículo abordado, cuja resposta consta no processo e tem o seguinte teor: "Em atenção à solicitação de informações do veículo envolvido em Boletim de Ocorrência n. 1461624221114225519, informa-se que não foram encontrados registros além dos já presentes no referido boletim de ocorrência em sistemas utilizados por esta instituição" (evento 99 da ação penal).
Conclui, então, que não havia qualquer indicativo concreto de que o ora apelante estaria transportando entorpecente a bordo do veículo em questão, de modo que a busca pessoal/veicular não poderia ter sido realizada
Razão não lhe assiste.
Cediço que "A disciplina que rege a busca e a abordagem veicular tem tratamento jurídico semelhante ao dado à busca pessoal, regida pelo art. 240 do Código de Processo Penal. Exige-se a presença de fundada suspeita de que a pessoa abordada esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papeis que constituam corpo de delito, ou, ainda, quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar" (AgRg no HC n. 770.281/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 4/10/2022).
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça possui firme posição no sentido de que: "[...] 'Exige-se, em termos de standard probatório para busca pessoal ou veicular sem mandado judicial, a existência de fundada suspeita (justa causa) - baseada em um juízo de probabilidade, descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto - de que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou de outros objetos ou papéis que constituam corpo de delito, evidenciando-se a urgência de se executar a diligência.' (RHC n. 158.580/BA, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 19/4/2022, DJe 25/4/2022.) [...]" (AgRg no HC n. 759.681/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 14/2/2023, DJe de 17/2/2023).
A inadmissibilidade de prova obtida por meios ilícitos está prevista no art. 5º, inciso LVI, da Constituição Federal e art. 157, caput, do Código de Processo Penal, in verbis:
Art. 5º, LVI, CF - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;
Art. 157, CPP. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
No caso concreto, o policial rodoviário federal Edson Cipriano declarou na Delegacia de Polícia recebimento de informações sobre um veículo Renault Kangoo, cor branca, estaria entrando no Estado de Santa Catarina com ilícitos. Ao visualizarem automotor com as características indicadas, efeturam a abordagem e de imediato visualizaram a quantidade de maconha no seu interior, 316kg. Na entrevista o condutor disse ter pegado o carro em Tijucas do Sul/PR e o levaria até um posto de combustíveis em São José/SC, bem como que receberia R$ 3.000,00 (três mil reais) pelo serviço de transporte (evento 1, vídeo 5, autos 5051041-89.2022.8.24.0038).
Sob o crivo do contraditório, o policial Edson Cipriano "relatou que realizou a abordagem do automóvel e de imediato o réu disse que tinha maconha dentro do carro; que o réu disse que pegou o veículo já carregado em Tijucas do Sul/PR e levaria para a cidade de São José/SC, bem como receberia cerca de R$ 3.000,00; que o réu estava trafegando sentido Curitiba-Florianópolis; que a droga estava dentro do compartimento de carga do carro; que recebeu informação de que um veículo com aquelas características estaria transportando entorpecentes sentido sul; que a informação veio do setor de inteligência, mas não tem acesso ao sistema deles; que o réu foi colaborativo com a guarnição" (evento 96, vídeo 1, da ação penal - transcrição extraída da sentença) - grifou-se.
Em seu depoimento colhido na etapa inquisitorial, o policial rodoviário federal Fernando Wasilewski afirmou terem recebido solicitação para abordarem este veículo, então aguardaram a passagem dele por volta do Km 19. Indagado, não soube indicar se era denúncia anônima, pois a informação chegou ao setor em que o depoente labora por meio da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT