Acórdão Nº 5052031-62.2021.8.24.0023 do Primeira Câmara Criminal, 11-11-2021

Número do processo5052031-62.2021.8.24.0023
Data11 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5052031-62.2021.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: MATHEUS ROQUE DA CONCEICAO (RÉU) ADVOGADO: ALESSANDRO MARCELO DE SOUSA (OAB SC016856) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público da comarca de FLORIANÓPOLIS ofereceu denúncia em face de Matheus Roque da Conceição, dando-o como incurso nas sanções do artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006 e artigo 16, § 1º, inciso IV, da Lei 10.826/2003, em razão dos seguintes fatos:

No dia 18 de junho de 2021, por volta das 19h40min, policiais militares estavam em rondas a pé e se deslocaram, em área de mata, do Morro Santa Vitória para o Morro do 25, nesta Capital, quando avistaram um indivíduo não identificado em atitudes suspeitas, andando rapidamente para cima do Morro, mas em razão da distância ele não foi abordado.

Em seguida, visualizaram um veículo parado na frente da residência, situada na Rua São Vicente de Paula, n. 845, bairro Agronômica, e o denunciado MATHEUS ROQUE DA CONCEIÇÃO entregando um torrão de maconha à pessoa que estava no interior do carro.

Ato contínuo, os policiais desceram para realizar a abordagem, mas o veículo empreendeu fuga - dispensando o entorpecente pela janela - e o denunciado MATHEUS ROQUE DA CONCEIÇÃO correu para dentro da residência, onde foi abordado.

Realizadas buscas no interior do imóvel, dentro do quarto do denunciado os militares localizaram mais entorpecentes, instrumentos utilizados no tráfico de drogas e R$767,00 (setecentos e sessenta e sete reais) em espécie, dinheiro proveniente da mercancia ilícita.

Ao todo foram apreendidos 17 (dezessete) comprimidos de cor rosa mais fragmentos, 22 (vinte e dois) comprimidos de cor verde e 18 (dezoito) comprimidos de cor azul mais fragmentos, todos contendo MDMA e MDA; 1 (uma) porção de inflorescências, totalizando 127,7g (cento e vinte e sete gramas e sete decigramas), 3 (três) porções de resina de cor castanha, totalizando 77,4g (setenta e sete gramas e quatro decigramas) e 14 (quatorze) porções de erva, totalizando 3.325,0g (três mil e trezentos e vinte e cinco gramas) de cannabis sativa (maconha); e 1 (uma) porção de pó branco, totalizando 5,3g (cinco gramas e três decigramas) de cocaína. Ademais, foram apreendidos 10 (dez) rolos de plástico filme, 2 (duas) balanças de precisão, 2 (duas) facas e 2 (dois) pacotes contendo diversas embalagens de plástico.

Ainda no quarto do denunciado, os policiais encontraram 1 (um) revólver da marca Taurus, calibre .38 especial, com número de série suprimido, dentro de uma mochila, além de 31 (trinta e uma) munições de calibre .38 e 8 (oito) munições de calibre 9mm, tudo conforme auto de exibição e apreensão e auto de constatação n. 3028/2021 (evento 1, fls. 12-13 e 16 do processo relacionado).

Nesse contexto, na data e local assinalados, tem-se que o denunciado MATHEUS ROQUE DA CONCEIÇÃO trazia consigo, guardava e expunha à venda, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para fins de comercialização, fornecimento e distribuição, as drogas listadas acima, substâncias essas tóxicas, capazes de causar dependência física e psíquica, de uso proscrito em todo o território nacional.

Ainda, o denunciado MATHEUS ROQUE DA CONCEIÇÃO possuía arma de fogo com numeração suprimida e as munições mencionadas, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (evento 1/PG - em 21-6-2021).

Sentença: a juíza de direito Mônica Bonelli Paulo Prazeres julgou procedente a denúncia para:

CONDENAR o réu MATHEUS ROQUE DA CONCEIÇÃO, nascido em 19/05/1999, filho de MARIA LUCIA MACHADO e IRINEU ROQUE DA CONCEIÇÃO, já qualificado, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 08 (oito) anos de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 510 (quinhentos e dez) dias-multa, cada dia no valor mínimo de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, por infração ao artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e artigo 16, §1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/03, na forma do art. 69 do Código Penal.

NEGO ao acusado o apelo em liberdade.

Além do montante de pena aplicado, as circunstâncias da prisão também não recomendam a concessão da liberdade, a fim de que seja resguardada a ordem pública (Evento 61):

Sem embargo, mesmo que inexistam anotações criminais (MATHEUS aparentemente não foi denunciado pelos fatos envolvendo a violência doméstica), é cediço que a existência de bons predicados pessoais e sociais (obrigação moral de qualquer cidadão, em verdade) não eclipsa a necessidade da prisão preventiva a bem da ordem pública, face a latente gravidade concreta dos delitos ora cometidos.

De fato, poucas vezes um único indivíduo foi preso com tamanha quantidade e diversidade de drogas, além de arma de fogo com numeração suprimida e munições, todas em depósito na própria residência onde, segundo os relatos dos policiais, estaria também comercializando as drogas.

Não custa lembrar: o denunciado foi preso em flagrante depois de ser flagrado mantendo em depósito na residência pelo menos 4 (!) tipos de entorpecentes (22 comprimidos de cor verde e 18 comprimidos de cor azul mais fragmentos, todos contendo MDMA e MDA; 14 porções de erva, totalizando mais de três quilos de maconha e 1 porção de pó branco, totalizando 5,3g (cinco gramas e três decigramas) de cocaína).

Consta ainda a apreensão do que aparenta ser a droga "skunk" (maconha com alto teor de THC), ou seja, 1 (uma) porção de inflorescências, totalizando 127,7g (cento e vinte e sete gramas e sete decigramas), bem como da droga "haxixe", nas 3 (três) porções de resina de cor castanha (substancia extraída das folhas da maconha), totalizando 77,4g (setenta e sete gramas e quatro decigramas).

Aí a destacada gravidade do delito: a quantidade e diversidade de entorpecentes apreendidos e depositados na residência onde, segundo os policiais, era também realizada a venda ou provável distribuição.

Assim, a distribuição daquela quantidade de drogas certamente teria imenso potencial danoso, pois abasteceria por dias os pontos de vendas de drogas situados naquela localidade.

Essa quantidade e diversidade de entorpecentes, aliás, permite inferir, em primeira análise, que o denunciado não seja um simples traficante de drogas de "primeira viagem" e que perpetrou o crime premido por dificuldades financeiras. Insisto que na residência também foram apreendidos pelo menos quatro tipos de entorpecentes (sem considerar o provável skunk e o haxixe), circunstância pouquíssimas vezes flagrada no cotidiano da Vara Criminal da Comarca.

É presumível, portanto, que realizasse há algum tempo o delito, distribuindo a granel e conforme a necessidade de outros traficantes e usuários.

E da conduta flagrada, evidente, decorre o incremento da violência e todos os conhecidos malefícios sociais advindos do tráfico.

Sobreleva, ainda, a apreensão da arma raspada na casa, com farta munição, inclusive para outros tipos de artefatos bélicos (como as munições para pistola calibre 9mm).

Penso, sinceramente, que a garantia da ordem pública "não se restringe às medidas preventivas de irrupção de conflitos e tumultos, mas abrange também a promoção daquelas providências de resguardo à integridade das instituições, à sua credibilidade social e ao aumento da confiança da população nos mecanismos oficiais de repressão às diversas formas de delinquência". (STJ. RHC 30105/MG. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. J. 28/06/2011).

Estimo que nenhuma medida cautelar substitutiva à prisão seja suficiente.

Mesmo o monitoramento eletrônico não seria bastante portanto. A prisão, reafirmo, é imprescindível para a garantia da ordem pública, mormente ante os indicativos de probabilidade de reiteração criminosa.

A garantia da ordem pública, como se diz, refere à preservação de uma situação de paz (sensação de segurança), necessária para a realização dos princípios fundamentais, consoante doutrina Aharon Barak (The judge in a democracy. Princeton: Princeton University Press, p. 75).

O mero acompanhamento de sua trajetória em sua zona de autorização não parece adequado a sua efetiva contenção, cabendo sim sua retirada do convívio social, ainda que momentaneamente.

Expeça-se PEC provisório.

A multa será paga de acordo com o art. 50 do Código Penal.

Custas na forma legal pelo condenado.

DETERMINO a destruição das drogas, do saco zip, das balanças de precisão, das facas e o perdimento do numerário apreendido em favor do FUNAD (arts. 63, §1º, e 72 da Lei n. 11.343/06).

DETERMINO, também, a remessa da arma e munições ao Comando do Exército local (evento 102/PG - em 16-8-2021).

Trânsito em julgado: foi certificado o trânsito em julgado da sentença para o Ministério Público (evento 116/PG - em 25-8-2021).

Recurso de apelação de Matheus Roque da Conceição: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) houve violação ao princípio do non bis in idem, porque a apreensão de arma de fogo foi utilizada para negar o benefício do § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 e para condenar o agente pelo crime previsto no art. 16, § 1º, IV, da Lei 10.826/2003, de modo que esse vício deve ser sanado;

b) o agente deve ser absolvido do delito da Lei de Armas, ante a falta de comprovação do dolo, uma vez que ele não sabia que também havia armamento bélico na mochila que aceitou guardar para um terceiro com o qual o agente possuía dívida relacionada à aquisição de drogas, o que autoriza a sua absolvição e, subsidiariamente, a desclassificação para o tipo do art. 14 da Lei 10.826/2003, na medida em que o apelante desconhecia a existência de arma com numeração suprimida dentre o armamento descoberto;

c) a negação do benefício previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 pautou-se em argumentos inerentes ao crime de tráfico de drogas e também inidôneos, haja vista que a Togada de origem mencionou a apreensão de arma de fogo, o que já constituiu motivação bastante para condenar o agente pelo referido delito, e também destacou a quantidade de...

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