Acórdão Nº 5053246-45.2021.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Público, 08-11-2022

Número do processo5053246-45.2021.8.24.0000
Data08 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5053246-45.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

AGRAVANTE: IRIO HEIDEMANN AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Irio Heidemann contra a decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa n. 5003741-55.2021.8.24.0010, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra Neuseli Junkes Costa, Centro Comunitário Alto Rio Dos Índios, Robson Romagna Lunardi e o ora Agravante, na qual o Juiz Titular da 1ª Vara Cível da Comarca de Braço do Norte indeferiu o pedido de liberação dos valores bloqueados na conta corrente do Agravante, em razão do deferimento da medida de indisponibilidade dos bens dos acionados até o valor de R$ 117.304,40 (cento e dezessete mil, trezentos e quatro reais e quarenta centavos) (Eventos 3 e 15, Eproc/PG).

O Agravante aduziu que foram bloqueados da sua conta corrente da Instituição Financeira Cresol Encosta da Serra Geral (Agência 2011-7, Conta n. 003.452-5) os valores de R$ 13.252,88 (treze mil, duzentos e cinquenta e dois reais e oitenta e oito centavos) e de R$ 1.130,71 (mil, cento e trinta reais e setenta e um centavos), os quais são oriundos do seu trabalho e de sua esposa, que são agricultores, tratando-se de verba de natureza alimentar.

Afirmou que não há como anexar contracheque, carteira de trabalho ou outro documento que comprove a renda familiar que não seja o bloco de notas de produtor rural bem como que não emite nota de alguns valores, pois também comercializa pequenos itens na comunidade, tais como leite, queijo, verduras e produção caseira.

Asseverou, outrossim, que todos os valores bloqueados são impenhoráveis, pois se tratam de recebimento de valores em razão do trabalho desempenhado como agricultor e de aplicação de poupança, os quais somados não ultrapassam a quantia de 40 (quarenta) salários-mínimos, restando configurada a hipótese de impenhorabilidade prevista no art. 833, inc. X, do Código de Processo Civil.

Ao final, pugnou pelo conhecimento e provimento do reclamo, com a consequente liberação da quantia bloqueada da sua conta corrente em razão da decisão vegastada (Evento 1, Eproc/SG).

Em monocrática da lavra deste Subscritor foi deferido o pedido de concessão de justiça gratuita bem como rejeitado o pleito de concessão de efeito suspensivo ao reclamo (Evento 14, Eproc/SG).

O Agravado apresentou contraminuta (Evento 22, Eproc/SG).

Na sequência, sobreveio pedido de reconsideração da decisão constante no Evento 14, Eproc/PG (Evento 27, Eproc/SG).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. Alexandre Herculano Abreu, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso de Agravo de Instrumento (Evento 29, Eproc/PG).

Ato contínuo, este Subscritor, em adendo ao disposto no art. 10 do Código de Processo Civil, oportunizou a manifestação das partes acerca das possíveis implicações da Lei n. 14.230/21 ao caso em comento (Evento 30, Eproc/SG).

O Agravado defendeu a irretroatividade da denominada Nova Lei de Improbidade Administrativa (Evento 34, Eproc/PG).

O Centro Comunitário Alto Rio dos Índios peticionou nos autos defendendo a aplicação retroativa da Lei n. 14.320/2021. Também aventou as preliminar de prescrição intercorrente e defendeu a rejeição da inicial ou a improcedência da ação bem como a liberação dos valores bloqueados na conta do agravante (Evento 37, Eproc/PG).

O Procurador de Justiça Alexandro Herculado Abreu reiterou o parecer anterior (Evento 40, Eproc/PG).

Posteriormente, o Recorrente peticionou nos autos pleiteando a liberação dos valores bloqueados em sua conta corrente em razão do advento da Lei Estadual n. 18.319/2021, a qual prevê, no art. 37, a remissão dos débitos não tributários oriundos de recursos repassados pela Lei n. 13.334/2005, ''inclusive os decorrentes de ressarcimento ou devoluções e multas, aplicados pelo Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE/SC), inscritos ou não em dívida ativa, inclusive os ajuizados, até o dia 30 de novembro de 2021, cujo valor inicial seja inferior a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por processo'' (art. 37, caput, Lei n. 18.319/2021) (Evento 42, Eproc/PG).

Instado a se manifestar, o Ministério Público Estadual pugnou ''pela manutenção da tutela antecipada quanto à indisponibilidade de bens - acertadamente deferida pelo Togado de primeiro grau - medida totalmente pertinente e cabível no presente caso, como forma de preservação à segurança jurídica e ao interesse público, não devendo incidir, in casu, as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/2021 na Lei de Improbidade Administrativa (n. 8.429/92)'' (Evento 47, Eproc/PG).

É o relato do essencial.

VOTO

1. Admissibilidade:

O recurso é tempestivo, adequado e preenche os requisitos de admissibilidade recursal, razão pela qual comporta conhecimento.

2. Legislação Aplicável:

De início, impende esclarecer que a decisão vegastada foi proferida no dia 21-9-2021 e o presente recurso de Agravo de Instrumento foi interposto em 1-10-2021, ou seja, antes da entrada em vigor da Lei n. 14.320, em 25-10-2021, a qual alterou significativamente a Lei n. 8.429/1992.

Contudo, diferentemente do entendimento adotado por este Subscritor nos recursos de Apelação Cível (Nesse sentido: Apelação n. 5027635-44.2019.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, j. 4-10-2022), nos quais têm sido aplicadas as alterações implementadas na Lei n. 8.429/1992 após o advento da Lei n. 14.3208/2021, em se tratando de recurso de Agravo de Instrumento, que se cinge em aferir o acerto ou não da decisão agravada, o recurso será analisado com base no texto em vigor na data da prolação da interlocutória, sob pena de se incorrer em supressão de instância.

É da Jurisprudência:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDEFERIMENTO DE CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL. EXAME DA MATÉRIA À LUZ DA REDAÇÃO ORIGINAL DA LEI N. 8.429/92, VIGENTE AO TEMPO DOS FATOS. EXISTÊNCIA, NOS AUTOS, DE INDÍCIOS DE CONDUTAS CONFIGURADORAS, EM TESE, DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA, PORÉM, DE DANO CONCRETO AO ERÁRIO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE INDISPONIBILIDADE DE BENS MANTIDO. MEDIDA CAUTELAR EXTREMA, DEVENDO SER APLICADA COM CAUTELA. RECURSO DESPROVIDO."[...]. A DETERMINAÇÃO DE INDISPONIBILIDADE DE BENS É MEDIDA EXTREMA QUE REQUER PRUDÊNCIA E DEVE SER TOMADA EM SITUAÇÕES EXCEPCIONALÍSSIMAS, NÃO SENDO CABÍVEL QUANDO NÃO COMPROVADA A EXISTÊNCIA DE DANO OU DE PROVEITO PATRIMONIAL DO DEMANDADO." (TJSC, AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 4015673-63.2016.8.24.0000, DA CAPITAL, REL. DES. JAIME RAMOS, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, J. 05-06-2018). RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 4032155-18.2018.8.24.0000, DE FRAIBURGO, REL. VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, J. 19-11-2020). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 8000224-42.2018.8.24.0900, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 7-6-2022).

Mais:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MONTANTE RECEBIDO DO FUNDO DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL INVESTIDO DE FORMA PRETENSAMENTE ILÍCITA PELOS RÉUS. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI N. 8.429/1992 VIGENTE À ÉPOCA. PROBABILIDADE DO DIREITO DEVIDAMENTE DEMONSTRADA. APROVAÇÃO DAS CONTAS POR PARTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DE SANTA CATARINA. AUSÊNCIA DE PREJUDICIALIDADE. ART. 21, II, DA LEI DE IMPROBIDADE. RECURSO INTERPOSTO ANTERIORMENTE À PUBLICAÇÃO DA LEI N. 14.230/2021. ANÁLISE DO ACERTO/DESACERTO DA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA RECORRIDA. EVENTUAL APLICAÇÃO DAS INOVAÇÕES LEGISLATIVAS E PEDIDOS DE LIBERAÇÃO DE BENS OU VALORES SOB O FUNDAMENTO DE IMPENHORABILIDADE DEVEM SER REQUERIDOS NA ORIGEM, SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INDISPONIBILIDADE MANTIDA. PRECEDENTES. RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5002646-20.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Artur Jenichen Filho, Quinta Câmara de Direito Público, j. 28-6-2022).

No mesmo norte, em caso semelhante, manifestou-se esta Terceira Câmara de Direito Público:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REALIZAÇÃO DE SUPOSTAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO FRAUDULENTAS NA CONDIÇÃO DE GERENTE DO BANCO DO BRASIL. DECISÃO ANTERIOR À LEI N. 14.230/2021 QUE DETERMINA O BLOQUEIO DE BENS DO RÉU PARA GARANTIA DE EVENTUAL CONDENAÇÃO AO RESSARCIMENTO DO PREJUÍZO DO ERÁRIO. POSSIBILIDADE. INDÍCIO DA PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO. EXISTÊNCIA DO "FUMUS BONI IURIS". NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA RESTRIÇÃO. ALEGADO EXCESSO DE EXECUÇÃO NÃO DEMONSTRADO. AVENTADA A NECESSIDADE DE RECONHECIMENTO DA COISA JULGADA FORMADA EM AÇÃO TRABALHISTA. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NESTA FASE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA SOB PENA DE ESGOTAMENTO DO MÉRITO DA DEMANDA ORIGINÁRIA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO

Nos termos do art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, e do art. 7º, parágrafo único, da Lei Federal n. 8.429, de 02/06/1992, havendo indícios da prática de improbidade administrativa, cabe o deferimento liminar de medida cautelar para indisponibilidade e bloqueio de bens de propriedade do réu que sejam suficientes para o ressarcimento dos prejuízos causados ao erário (Agravo de Instrumento n. 5057615-82.2021.8.24.0000, rel. Des. Jaime Ramos, j. 3-5-2022).

E, do Corpo do Aresto, extraem-se os seguintes excertos:

[...] Não se olvida que a Lei Federal n. 14.230, de 25.10.2021, que alterou vários dispositivos da Lei Federal n. 8.429/92, trouxe novos contornos à decretação da indisponibilidade de bens em ação de improbidade administrativa (art. 16 e seus parágrafos), podendo eventualmente alcançar o caso dos autos para alguma modificação na situação em favor da parte agravante, porém, essa questão não pode ser resolvida neste agravo de instrumento, porque...

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