Acórdão Nº 5056550-52.2021.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 11-11-2021

Número do processo5056550-52.2021.8.24.0000
Data11 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5056550-52.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER

REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: WANDERLEI DERETTI (Impetrante do H.C) PACIENTE/IMPETRANTE: EDUARDA DEYSIARA DOS SANTOS (Paciente do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Joinville

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus impetrado pelo advogado Wanderlei Deretti em favor de Eduarda Deysiara dos Santos, denunciada pela apontada prática dos crimes tipificados nos arts. 121, § 2º, I e IV, e 211, ambos do Código Penal, e art. 2º, § 2º e § 4º, I e IV, da Lei 12.850/2013.

Em síntese, sustentou o impetrante que a paciente vem sofrendo constrangimento ilegal por parte do Juízo de Direito da Vara do Tribunal do Júri da comarca de Joinville, que decretou a sua prisão preventiva, a despeito de não estarem presentes os requisitos legais.

Argumentou inicialmente que a denunciada possui um filho com apenas cinquenta dias de vida, em fase de amamentação, de maneira que sua figura é imprescindível para os cuidados deste.

Afirmou que não há indícios suficientes da autoria e prova da materialidade delitivas, porquanto inexistem nos autos elementos categóricos que possam servir de supedâneo para incriminá-la, uma vez que "para que seja processado o delito de homicídio sem a presença do cadáver, faz-se imprescindível que outros meios de prova demonstrem, de modo inequívoco, a materialidade delitiva, o que não se afigura, in casu" (sic, fls. 3 do evento 1.1).

Aduziu também que, por se tratar de paciente lactante e encontrar-se em estado puerperal, inclui-se no grupo de risco daqueles mais suscetíveis a complicações em caso de contaminação pelo novo coronavírus.

Mencionou a Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça, a qual sugere aos magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem, dentre outras medidas, a reavaliação das prisões provisórias, nos termos do art. 316 do Código de Processo Penal, priorizando-se mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco.

Pugnou, pois, por provimento liminar, para que fosse revogado o comando constritivo e, ao final, pela concessão definitiva da ordem.

Subsidiariamente, requereu a substituição da segregação cautelar por prisão domiciliar, ainda que com outras medidas cautelares diversas.

Recebida a pretensão por este magistrado, o pleito antecipatório restou indeferido.

Após a prestação das informações solicitadas à autoridade acoimada de coatora, remeteu-se o feito à douta Procuradoria-Geral de Justiça, a qual, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Humberto Francisco Scharf Vieira, opinou pelo conhecimento do mandamus e denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

De início, importa consignar que o habeas corpus constitui-se em remédio constitucional destinado exclusivamente à aferição da legalidade ou não do ato tido por coator, permanecendo fora do raio de seu objeto qualquer discussão a respeito do mérito da causa.

Outrossim, sabe-se que deverá ser concedida a correlata ordem sempre que alguém sofrer, ou se achar ameaçado de sofrer, violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (Constituição Federal, art. 5º, LXVIII).

Posto isso, é certo que a legitimidade da prisão preventiva depende da configuração de algum dos requisitos do art. 313 do Código de Processo Penal, de maneira cumulada com as condições autorizadoras do respectivo art. 312, quais sejam: os pressupostos da prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria, consistentes no fumus comissi delicti, e os fundamentos da imprescindibilidade de salvaguarda da ordem pública ou econômica, da instrução criminal ou da aplicação da lei penal, com a evidência do perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, o que perfaz o periculum libertatis.

Em que pese a argumentação tecida pelo impetrante, razão não lhe assiste.

Infere-se dos autos que a paciente foi denunciada pela apontada prática dos crimes de homicídio, qualificado pela torpeza do motivo e emboscada, ocultação de cadáver e organização criminosa armada, com envolvimento de adolescentes e conexão com outras organizações criminosas independentes, porquanto, na condição de integrante do Primeiro Grupo Catarinense - PGC, intermediava o contato entre os correlatos membros e, no dia 27 de junho de 2020, conforme previamente acordado com alguns destes e valendo-se do relacionamento que mantinha com o ofendido Gabriel Lucas da Cunha Patene, atraiu-o até sua residência, sob o pretexto de que participariam de uma festa, mas posteriormente o conduziu até um local onde outros integrantes da referida facção já estavam aguardando.

Lá, por ter supostamente delatado alguns participantes do PGC à polícia, Gabriel Lucas da Cunha Patene, como forma de punição, foi rendido e assassinado pelas pessoas presentes, dentre as quais os corréus Jonatan dos Santos e Cristiano Ribeiro, após o que teve seu cadáver ocultado em lugar até então desconhecido.

Diante de tais notícias, sua prisão preventiva foi decretada pela Togada a quo, sob os bem lançados fundamentos:

[...]A representação merece deferimento.Dispõe o art. 311 do Código de Processo Penal: "Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial".O decreto de prisão preventiva é cabível, uma vez que a pena máxima cominada ao tipo penal supera 4 anos e o denunciado é reincidente (art. 313, I e II, do CPP).O fumus comissi delicti é exteriorizado pelo recebimento da denúncia operado linhas atrás.Por outro lado, o periculum libertatis é evidente, sendo que a prisão preventiva dos agentes justifica-se como garantia da ordem pública.Apesar de não se existir um conceito preciso para a "garantia da ordem pública", a hodierna jurisprudência que a segregação do agente é possível nas hipóteses de periculosidade social do agente, que é constatada pela gravidade concreta da conduta ou pela possibilidade de reiteração criminosa.Nesse sentido:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO PREVENTIVA. ESPECIAL GRAVIDADE DA CONDUTA. FUNDADO RECEIO DE REITERAÇÃO DELITIVA. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. ALEGADA FALTA DE CONTEMPORANEIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA.

1. No caso, a decretação da prisão preventiva dos Pacientes não se mostra desarrazoada ou ilegal, tendo sido amparada na gravidade concreta da conduta - os Réus teriam matado a vítima mediante diversos disparos de arma de fogo, em via pública, por disputas pelo mercado de tráfico de drogas, tendo os disparos chegado a atingir outro homem e uma criança. Tais circunstâncias são aptas a justificar a segregação cautelar para garantia da ordem pública.

2. Ademais, a Corte Estadual destacou a possibilidade concreta de reiteração delitiva, salientando que o Acusado GABRIEL PEREIRA LIMA "registra condenações definitivas pela prática dos delitos de porte ilegal de arma de fogo, roubo majorado e tráfico de drogas, bem como responde, hoje, a outros processos criminais pelos crimes de homicídio qualificado, receptação, adulteração de sinal identificador de veículo automotor, ocultação de cadáver, associação para o tráfico de drogas, corrupção de menor majorada e integração de organização criminosa majorada". Ressaltou também que ANDRÉ DE LIMA VELASCO "possui condenação definitiva pela prática de tráfico de drogas e responde a dois outros processos criminosos pelo cometimento de crimes de roubo majorado", o que também justifica a segregação cautelar como garantia da ordem pública.

3. A jurisprudência da Suprema Corte é no sentido de que "a gravidade em concreto do delito, ante o modus operandi empregado, e a reincidência delitiva permitem concluir pela periculosidade social do paciente e pela consequente presença dos requisitos autorizadores da prisão cautelar, elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, em especial para garantia da ordem pública" (STF, AgRg no HC 176.246, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/11/2019, DJe 18/11/2019).

4. No tocante à alegada falta de contemporaneidade entre os fatos e a segregação cautelar, consignou o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, "apesar de os fatos sub judice datarem de dezembro de 2016, de lá para cá, estando os recorridos em liberdade, voltaram a se envolver na prática de novos ilícitos graves", de modo que ainda subsistiria o periculum libertaris. Tais circunstâncias impedem o reconhecimento do suposto constrangimento ilegal apontado pela Defesa. Precedente.

5. Ordem de habeas corpus denegada. (STJ, HC n. 533.443/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 02/06/2020, DJe 15/06/2020)

No caso dos autos, há gravidade concreta nas condutas atribuídas aos denunciados, diante das circunstâncias e do modus operandi com o qual o crime, em tese, foi praticado.Os elementos de prova coligidos no inquérito policial, sobretudo nos relatórios e laudos de extração de dados dos celulares indicam que a vítima teria delatado integrantes da facção criminosa num processo envolvendo o crime de tráfico de drogas. Por tais razões, Gabriel foi "decretado" pelo PGC.Conforme pontuado pelo Parquet "EDUARDA DEYSIARA DOS SANTOS convidou Gabriel para que fosse até sua residência, com o intuito de atraí-lo para a emboscada que culminaria em sua morte. Pouco tempo depois dele ter chego, ela o levou ao...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT