Acórdão Nº 5056643-15.2021.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 22-06-2022

Número do processo5056643-15.2021.8.24.0000
Data22 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Público
Classe processualAção Rescisória (Grupo Público)
Tipo de documentoAcórdão
Ação Rescisória (Grupo Público) Nº 5056643-15.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA

AUTOR: OESTE RURAL PARTICIPACOES S/A AUTOR: ANTONIO ARI JUNG RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Antônio Ari Jung e Oeste Participações S/A propuseram ação rescisória contra o acórdão de relatoria da Exma. Sr.ª Des.ª Bettina Maria Maresch de Moura lavrado por ocasião do julgamento em que a 3ª Câmara de Direito Público desta Corte negou provimento à remessa e ao recurso de apelação que interpuseram à sentença de parcial procedência da Ação Civil Pública n. 0900038-60.2018.8.24.0018, que lhes moveu o Ministério Público do Estado de Santa Catarina com o escopo de viabilizar a demolição de dois barracões industriais edificados em APP, sobre curso d'água mediante canalização irregular. Destacam que o aresto se fundamenta em erro de fato que assim descrevem (e. 1; págs. 5-10):

O Código de Processo Civil prevê a admissibilidade de ação rescisória quando a decisão rescindenda tiver sido fundamentada em erro de fato que possa ser verifica-do nos autos (art. 966, VIII, NCPC).Neste segmento, compreende-se como erro de fato as decisões que, em sua fundamentação, ignoram fatos/situações que efetivamente ocorreram.Sob esta perspectiva, nota-se que o acórdão rescidendo FUNDAMENTOU-SE EM ERRO DE FATO VERIFICADO AOS AUTOS desconsiderar alguns pontos extremamente relevantes ao deslinde da questão.Primeiramente, é de se destacar que em 2008 foi instaurado Termo Circunstanciado em face de Maria Nair Florão e Eloir Antonio Peretti pela suposta prática do crime ambiental tipificado no art. 48 da Lei nº 9.605/98. Referido crime ambiental teria sido praticado na propriedade localizada justamente na Rua Pará, nº 756-D, Bairro Maria Goretti, Chapecó/SC, onde teriam sido realizadas obras de canalização de curso de água e terraplanagem, impedindo a regeneração natural de vegetação.Maria Nair Florão e Eloir Antonio Peretti eram os proprietários do imóvel hoje de titularidade dos Autores.Naquela ocasião o MPSC entendeu inexistir a materialidade do crime imputado, promovendo o arquivamento do Termo Circunstanciado, em razão do fato de que a área em questão é urbana, não havendo lá árvores nem vegetação em estado de regeneração natural, de modo que não houve nenhum óbice à regeneração.Ademais, destacou o Órgão Ministerial ponto bastante interessante, no sentido de que "no entorno do terreno onde houve a canalização de curso d'água existem várias outras construções, havendo deste modo ausência de mata ciliar em vários pontos do local [...]".A situação do local já era esta no ano de 2008.Ademais disto, dos laudos providenciados pelos então proprietários se destaca que na região foi apontada a ausência de mata ciliar no entorno do banhado e residências próximas já edificadas, ressaltando que a urbanização do local ocorreu anteriormente à resolução do CONAMA nº 303/2002 que classificou o curso d'água em comento como APP.Os então proprietários, Maria Nair Florão e Loreni Terezinha Florão inclusive obtiveram a concessão pela Municipalidade do Alvará de Aprovação de Parcelamento do Solo nº 2734/2008.Em 22/12/2010 foi concedido pelo Município de Chapecó o Alvará de Construção, com a devida aprovação do projeto submetido a análise.Também foi outorgado Atestado de Habite-se pela BPM de Chapecó com referência a um dos barracões e vigência a partir de 24/02/2011.Houve o Parecer de Aprovação do Projeto nº 4654/DVS/11 em 21/03/2011 emitido pelo Departamento de Vigilância Sanitária da Prefeitura Municipal de Chapecó.O Município de Chapecó/SC, outrossim, não somente vinha cobrando IPTU dos Autores, como também alugou referidos barracões de 02/05/2016 a 30/04/2021.Todos estes fatos foram devidamente confirmados pelo Juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública de Chapecó na fundamentação da sentença rescindenda.Ainda assim, em uma análise errônea dos fatos somente levou em consideração o fato de a área ser considerada APP nos termos do Código Florestal.Ressalte-se não se tratar de edificações esparsas construídas irregularmente. São inúmeras edificações que se ergueram na região ao alvedrio da população e sem qualquer fiscalização por parte do Município.Destaca-se que o Imposto Predial Territorial Urbano é exigido de todos os moradores, apesar de estes terem promovido construções em área supostamente non aedifícandi.A aplicação da penalidade decorrente da desobediência à falta do alvará é desmedida: a perda integral da construção. Entretanto, para que seja imposta a demolição deve ser cabalmente demonstrada a má-fé resultante do desrespeito ao embargo administrativo.Seriam casos em que o particular, advertido ainda no início da obra, aposta somente no fato consumado, crendo que, tanto mais intensa a ofensa urbanística menos provável será a reação.O caso concreto é muito distinto deste exemplo: não somente foram outorgados todos os alvarás pela Municipalidade, o próprio MPSC determinou arquivamento de ação penal sobre os mesmos fatos em relação aos antigos proprietários e o Município de Chapecó ainda alugou o imóvel!Trata-se, outrossim, como já esclarecido, de região já bastante urbanizada. Há inúmeras outras construções, residências, prédios. Evidente que o impacto da demolição seria muito mais negativo do que a permanência da construção, já consolidada, como tantas outras.O Bairro Maria Goretti num geral se trata de uma área urbana consolidada e seu povoamento foi estimulado pelo município de Chapecó.Em situações semelhantes do TRF4 tem aplicado o Princípio da Proporcionalidade ao reconhecer a inviabilidade da demolição das edificações:[...]A complexidade da situação e o alto impacto social desaconselham a demolição peremptória de todas as edificações, que certamente representaria medida desproporcional e este fato sequer foi objeto de análise na sentença rescindenda.Assim, ao julgar parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo MPSC e determinar a demolição dos barracões de propriedade dos Autores, o Julgador deu causa à presente ação rescisória, com base no art. 966, VIII do CPC, eis que fundamentou sua decisão de modo contrário as provas produzidas aos autos, ignorando a devida proporcionalidade a ser considerada no caso concreto, até porque se trata de região já amplamente habitada.

Clamam a antecipação da tutela para que se suspenda a demolição pretendida e, ao final, a procedência da rescisória de modo a se prover o apelo que interpuseram para julgar improcedente o pedido formulado na ação civil pública.

O Exmo. Sr. Des. Pedro Manoel Abreu determinou a emenda à inicial de modo a viabilizar a redistribuição do feito a este Grupo de Câmaras (e. 9).

Emendada (e. 15), os autos foram redistribuídos e o pedido de tutela provisória foi indeferido (e. 22) em decisão contra a qual a impetrante opôs embargos de declaração (e. 30).

Citado, o Ministério Público Estadual apresentou resposta em que postula o indeferimento da inicial ou, sucessivamente, a improcedência dos pedidos iniciais (e. 29).

Os aclaratórios foram contra-arrazoados (e. 33).

Vieram os autos à conclusão para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade. Passa-se à análise das suas razões.

O acórdão rescindendo tem a seguinte ementa:

APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM FACE DO MUNICÍPIO DE CHAPECÓ E DE PARTICULARES. CONSTRUÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - APP. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DOS PARTICULARES.APELOINVIABILIDADE DA ORDEM DE DEMOLIÇÃO. INSUBSISTÊNCIA. EDIFICAÇÃO SOBRE O CURSO D'ÁGUA, MEDIANTE CANALIZAÇÃO IRREGULAR DO CÓRREGO. OBRAS REALIZADAS SEM AUTORIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS E AO ARREPIO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL (LEI N. 12.727/2012). URBANIZAÇÃO DA REGIÃO QUE, POR SI SÓ, NÃO AUTORIZA A CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE APP. PREJUIZOS AMBIENTAIS COMPROVADOS ATRAVÉS DE LAUDOS. DEMOLIÇÃO E RECUPERAÇÃO DO ECOSSISTEMA QUE SE IMPÕEM. DECISUM MANTIDO.REEXAME NECESSÁRIO.RESPONSALIDADE SOLIDÁRIA, DE EXECUÇÃO SUBSIDIÁRIA, PELA DEMOLIÇÃO E RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA, PELO ENTE MUNICIPAL. OMISSÃO NO DEVER DE FISCALIZAR. VIOLAÇÃO ÀS NORMAS PROTETIVAS DO MEIO AMBIENTE. EXEGESE DO ARTIGO 23, INCISO VI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA, EM REMESSA NECESSÁRIA.

O voto da eminente relatora tem a seguinte...

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