Acórdão Nº 5058134-51.2022.8.24.0023 do Segunda Câmara Criminal, 27-09-2022

Número do processo5058134-51.2022.8.24.0023
Data27 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5058134-51.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: LUCAS DE LIRA DOS REIS (ACUSADO) ADVOGADO: MARIANA GUIMARAES CASCAES (OAB SC045359) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na Comarca da Capital, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Lucas de Lira dos Reis, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, nos seguintes termos:

No dia 5 de abril de 2022, por volta das 6h48, o denunciado Lucas de Lira dos Reis mantinha em depósito, no interior da sua residência (servidão São Patrício, bairro Canasvieiras), para fins de comércio ilícito, 29 porções de cocaína em pó (7,0g), além de 2 simulacros de arma de fogo, R$ 138,00 reais em espécie e $ 510,00 pesos argentinos (ev. 1, P_Flagrante1, p. 9).

Fato ocorrido nesta Capital. A cocaína é substância capaz de causar dependência física e psíquica, tem seu uso proscrito no território nacional (ev. 10) e se destinava ao comércio ilícito, como se verificou em razão da quantidade e forma de compartimentação da droga apreendida, além das circunstâncias de apreensão, juntamente com alto valor em espécie, somadas à investigação em curso envolvendo aquela residência no tráfico ativo da região (Evento 1).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito julgou procedente a exordial acusatória e condenou Lucas de Lira dos Reis à pena de 1 ano e 8 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, e 166 dias-multa, substituída a privativa de liberdade por restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de valor equivalente a 2 salários mínimos, pelo cometimento do delito previsto no art. 33, caput, c/c seu § 4º, da Lei 11.343/06 (Evento 84).

Insatisfeitos, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Lucas de Lira dos Reis deflagraram recursos de apelação.

Nas suas razões de insurgência, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina objetiva o expurgo da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, sob alegação de que a dedicação de Lucas de Lira dos Reis a atividades criminosas restou comprovado nos autos (Evento 100).

Lucas de Lira dos Reis, por sua vez, objetiva a decretação da sua absolvição ao sustentar quadro de anemia probatória quanto à autoria do fato, sobretudo diante da nulidade da confissão informal obtida por Agentes Estatais, em tese, mediante abuso de autoridade (Evento 11).

As Partes ofereceram contrarrazões recursais pelo conhecimento e desprovimento do reclamo da adversa (Eventos 114 e 14).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Jorge Orofino da Luz Fontes, manifestou-se pelo conhecimento dos apelos e provimento somente do aforado pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina (Evento 17).

VOTO

Os recursos preenchem os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual devem ser conhecidos.

1. Preliminarmente, o Acusado Lucas de Lira dos Reis suscitou a ilicitude da obtenção de sua versão informal, argumentado que fora ameaçado de forma velada a confessar a propriedade da droga apreendida.

Reconhece-se que um dos Policiais Militares (não identificado), ao ingressar na edificação, proferiu os seguintes dizeres ao Acusado: "O gurizão, ei, já vamo bater a real pra ti, isso aqui pode evoluir, nós tamo no meio do nada" (Evento 70, doc1, 5min40s)", o que pode, em tese, configurar abuso de autoridade tipificado no art. 13 da Lei 13.869/19 e merece a devida apuração.

Ocorre que esse fato foi posterior à apreensão do entorpecente e dos demais itens encontrados na residência em que o Acusado pernoitava sozinho, conforme as mídias do Evento 70.

Dessa forma, ainda que tenha ocorrido eventual ilicitude para obtenção da suposta confissão informal, tal eiva seria incapaz de macular a prisão em flagrante, justificada pelo fato de que o Acusado foi surpreendido no mesmo cômodo que significativa quantia de droga (7g de cocaína), embalada de forma individual e própria para a venda a usuários, juntamente com dinheiro nacional e estrangeiro em notas miúdas e moedas, além de simulacros de arma de fogo (Evento 1, doc1, p. 3-7).

Ademais, salienta-se que a suposta confissão informal não foi utilizada como meio de prova para a condenação de Lucas de Lira dos Reis em Primeiro Grau de Jurisdição, conforme se extrai da leitura da sentença resistida (Evento 84). O que houve foi a mera transcrição dos depoimentos dos Agentes Públicos, sem que a versão em tese fornecida a eles por Lucas de Lira dos Reis integrasse os elementos de convencimento do Magistrado Sentenciante.

A propósito:

1. A jurisprudência desta Corte tem entendido que: Evidenciado que a confissão informal do réu somente foi explicitada na transcrição dos depoimentos dos policiais condutores, não tendo, todavia, sido utilizada em momento algum para embasar a condenação, sequer citada pelo magistrado sentenciante, deve ser afastada a possibilidade de reconhecimento da atenuante do art. 65, III, "d", do Código Penal (AgRg no AREsp 1.599.610/MG, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/2/2020, DJe de 12/2/2020). 2. Na hipótese em exame, ainda que os depoimentos dos policiais que efetuaram o flagrante tenham feito alusão a suposta confissão informal dos réus de que haviam adquirido os entorpecentes para revenda, em sede inquisitorial o paciente permaneceu em silêncio e, em juízo, negou categoricamente qualquer envolvimento com a droga encontrada em uma sacola carregada por seu sobrinho que estava a seu lado, assim como negou ter participado do furto da arma de fogo, admitindo apenas guardar a arma a si entregue pelo perpetrador do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT