Acórdão Nº 5059260-45.2021.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Civil, 14-06-2022

Número do processo5059260-45.2021.8.24.0000
Data14 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5059260-45.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador FERNANDO CARIONI

AGRAVANTE: JEPLAN PARTICIPACOES S/A (Sociedade) AGRAVADO: FURTADO NETO ADVOGADOS ASSOCIADOS

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Jeplan Participacoes S.A. contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de Joinville, Dr. Uziel Nunes de Oliveira, que, nos autos da Ação de Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica e Embargos Declaração n. 5032298-02.2020.8.24.0038, acolheu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica inversa (Eventos 21 e 45 dos autos principais).

Inconformada, a agravante sustentou que: a) a devedora da dívida executada não tem direito sobre os bens integralizados do seu capital social; b) a executada em questão integralizou apenas R$ 2,00 (dois reais) de cota social; c) o restante do capital social foi integralizado com três imóveis de propriedade do pai da executada, atualmente falecido; d) foi instituído usufruto vitalício em favor da Sra. Erna e que, enquanto ela estiver viva, todos os bens, lucros e frutos são e devem lhe ser destinados; e) em nenhum momento a constituição da pessoa jurídica teve algum propósito de ludibriar credores; f) a decisão agravada está equivocada ao atribuir o fruto do resultado de aluguel dos imóveis, considerando que o verdadeiro fruto é o lucro que as quotas sociais geram após descontadas todas as despesas inerentes à atividade; g) a devedora não lhe faz parte do quadro social; h) porque a devedora não é sócia, não é possível a desconsideração da personalidade jurídica; i) não restaram comprovados cabalmente os requisitos para a desconsideração da personalidade em questão; j) ainda que se restasse caracterizada a insolvência da devedora, e, assim, a fraude, seria necessária a presença do "consilium fraudis", de modo que deveria ser demonstrado que o Sr. João tinha conhecimento do estado patrimonial da devedora, o que não há nenhuma prova nesse sentido nos autos, sem esquecer que não existe herança de pais vivos, pelo que, como se conclui, a sua constituição ocorreu dentro dos ditames da boa-fé; k) a cautelar de arresto é de ser deferida na demonstração de risco concreto, o que não foi evidenciado no caso em testilha; l) não cabe a verba de advogado em incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Requereu: a) efeito suspensivo; no mérito, b) a reforma da decisão ora agravada para declarar a impossibilidade da desconsideração da personalidade jurídica inversa, ou, b.1) a exclusão dos honorários sucumbenciais, ou, b.2) limitar os arrestos apenas sobre o lucro líquido distribuídos em razão das quotas sociais que advém do recebimento dos aluguéis recebidos dos imóveis integralizados no capital social. (evento 1)

Nesta instância, foi indeferido o efeito suspensivo (evento 13).

Oposição de embargos de declaração pela agravante (evento 18).

Contrarrazões aos aclaratórios (evento 21).

Contraminuta ao agravo (evento 22).

VOTO

Versa sobre recurso de agravo interposto da decisão que acolheu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica inversa.

Pelo que dos autos consta, o escritório de advocacia agravado, nos idos de 2016, ingressou com cumprimento de sentença contra Marilú Correa da Costa, visando o recebimento de honorários de R$ 7.866,28 (sete mil, oitocentos e sessenta e seis reais e vinte e oito centavos).

Embora inúmeras as tentativas de localização de bens, inclusive, com o auxílio do Poder Judiciário, tais como BacenJud, RenaJud, InfoJud etc., que, ao que parece, não se harmonizava com a demonstração de riquezas da devedora, extraídas notadamente de suas redes sociais, como, por exemplo, residência em bairro nobre de Joinville e/ou segunda casa em Campo Alegre, em todo o caso, o agravado não obteve sucesso na satisfação do seu crédito.

Nada obstante, depois de indas e vindas, foi descoberto que a devedora administrava uma "holding" de conglomeração familiar, na qual já fez parte do seu quadro social, juntamente com o seu falecido pai, pelo que, só então, foi dado conta de o por quê do seu esvaziamento patrimonial.

E tal pessoa jurídica constituída é a ora agravante.

Como bem enfatiza o Código Civil, "a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores" (nesse sentido, art. 49-A).

Deveras, ensina Maria Helena Diniz que "A pessoa jurídica é uma realidade autônoma, capaz de direitos e obrigações, independentemente de seus membros, pois efetua negócios sem qualquer ligação com a vontade deles" (Código civil comentado. Coord. Regina Beatriz Tavares da Silva. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 57)

Diante desse véu protetivo próprio das pessoas jurídicas, não demorou para que ela fosse utilizada para outros propósitos, que não o "[...] instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos", como enfatiza o parágrafo único do já transcrito artigo 49-A do Código Civil.

Não à toa lembra Rizzatto Nunes que:

"A capacidade imaginativa do ser humano, muitas vezes utilizada para praticar o bem, de outras é gasta na operação de todo tipo de fraude e enganação. Com a criação da ficção da pessoa jurídica separaram-se rigidamente as pessoas dos sócios da personalidade jurídica da pessoa jurídica. O direito formal, como devia sê-lo no caso, sempre deixou patente a hirta separação existente, inclusive no que respeitava à assunção de responsabilidades, a formação do patrimônio etc. Acontece que o indivíduo, que não é inocente, passou a usar sua capacidade...

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