Acórdão Nº 5061565-02.2021.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 30-03-2022

Número do processo5061565-02.2021.8.24.0000
Data30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Público
Classe processualMandado de Segurança Cível (Grupo Público)
Tipo de documentoAcórdão
Mandado de Segurança Cível (Grupo Público) Nº 5061565-02.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

IMPETRANTE: IARA CARMO DE OLIVEIRA IMPETRADO: Superintendente - INSTITUTO DE PREVIDENCIA SOCIAL DOS SERVIDORES PUBLICOS DO MUNICIPIO DE FLORIANOPOLIS - Florianópolis IMPETRADO: INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO MUNICÍPIO DE FLORIANOPÓLIS - IPREF IMPETRADO: PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS - SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS - FLORIANÓPOLIS IMPETRADO: ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Iara Carmo de Oliveira impetrou mandado de segurança, com pedido liminar, contra ato praticado pelo Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE), e pelo Superintendente do Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Florianópolis (IPREF), materializado na Portaria n. 397, de 21/9/2021, com efeitos a partir de 1º/10/2021, expedida pelo IPREF em cumprimento à determinação do Tribunal de Contas Estadual (Processo @APE 16/00481849), que fez cessar os efeitos da Portaria n. 225, de 27/7/2016, que concedeu a aposentadoria à impetrante a contar de 1º/8/2016.

Alega que "a aposentadoria concedida é composta por vencimentos relativos ao cargo efetivo que ocupava e pelas gratificações incorporadas por função ou cargo de confiança"; que essas verbas (vencimento e gratificações) "formam a base de cálculo para o adicional por tempo de serviço (triênio), concedido à razão de 6% a cada três dos 37 (trinta e sete) anos de serviço público prestados pela impetrante"; que, no entanto, em 23/9/2021, tomou conhecimento de que, por força da Portaria n. 397/2021, se "iniciou, arbitrariamente, desde julho de 2021, ilegal redução em seus proventos, com alteração na base de cálculo de seus triênios percebidos mensalmente", ou seja, o valor relativo à função gratificada incorporada foi excluído da base de cálculo dos triênios, sem que à impetrante tenha sido oportunizado o direito de exercer o contraditório e ampla defesa, circunstância que malfere o art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal; o art. 50, da Lei Federal n. 9.784/1999; o art. 489, § 1°, do Código de Processo Civil; o art. 21, do Decreto-Lei federal n. 4.657/1942 (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro); e o art. 2º, do Decreto federal n. 9.830/2019.

Entende que está configurada "a decadência do direito de a Administração Pública realizar a revisão/redução do pagamento da referida vantagem, uma vez que, na hipótese concreta, o pagamento do adicional da função gratificada é feito à servidora impetrante, ininterruptamente, desde 1992 até a presente data (fichas financeiras anexas - doc. 04), ou seja, há mais de 29 anos, sem que a servidora (que sempre recebeu de boa-fé) tenha convergido para a ocorrência de qualquer irregularidade"; que tendo transcorrido "quase três décadas do pagamento contínuo, sem qualquer questionamento sobre sua regularidade, inquestionável a incorporação ao patrimônio jurídico da impetrante"; que, por isso, "há de ser reconhecido o direito à manutenção da vantagem em razão da evidente decadência administrativa em relação ao ato de supressão, sob pena de violação ao art. 54 da Lei 9.784/99".

Defende, com base no princípio da isonomia, a aplicação das decisões deste Tribunal de Justiça prolatadas nos Mandados de Segurança ns. 4017377-14.2016.8.24.0000 e 5003598-67.2019.8.24.0000, transitadas em julgado, em que se reconheceu a decadência administrativa.

Sustenta que, nos termos do art. 203, da Lei Complementar Municipal n. 63, de 23/9/2003, foi resguardado o direito adquirido dos servidores do IPUF, "inclusive em relação à base de cálculo dos triênios".

Requereu:

a) o deferimento da liminar para suspender os efeitos da Portaria n. 397/2021, e determinar que o valor da "função gratificada incorporada" seja reincluído na base de cálculo dos triênios;

b) a concessão definitiva da ordem para anular os efeitos da Portaria n. 397/2021, que excluiu a "verba função gratificada incorporada da base de cálculo do adicional triênio nos proventos de aposentadoria da impetrante, mantendo-se hígida a Portaria 0225/2016";

c) "que os efeitos patrimoniais decorrentes da concessão da segurança retroajam à data em que praticados os atos impugnados".

O exame do pedido liminar foi postergado para depois das informações.

Ciente da impetração, o Estado de Santa Catarina requereu seu ingresso no feito.

Notificado, o Presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE) prestou informações em que afirma que o registro do ato de aposentadoria da impetrante foi denegado devido à existência de "pagamento de proventos a maior, uma vez que a verba 'função gratificada incorporada' está incidindo sobre o cálculo do adicional triênios, contrariando o art. 63 da Lei Complementar Municipal nº 063/2003"; que, nos termos da Súmula Vinculante 3, do Supremo Tribunal Federal, a alegada ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa não deve prosperar em relação à Corte de Contas.

Diz que "a irregularidade ventilada no processo de controle externo que embasou a denegação do registro do ato de aposentadoria não foi propriamente o recebimento da rubrica 'função gratificada incorporada', mas, sim, o 'pagamento de proventos a maior, uma vez que a verba função gratificada incorporada' está incidindo sobre o cálculo do adicional triênio, contrariando o art. 63 da Lei Complementar Municipal n. 063/2003'"; que, embora a impetrante alegue que percebe a 'função gratificada incorporada', "ininterruptamente, desde o ano de 1992", a documentação acostada ao processo não deixa dúvida de que "a agregação da função gratificada incorporada foi sacramentada através da Portaria 0035/2009, em 05 de março de 2009".

Sustenta que, em relação ao julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, não está configurada a decadência (TEMA 445/STF), porque "a aposentadoria foi publicada no Diário Oficial em 01/08/2016, tendo adentrado na Corte de Contas em 18/10/2016, sob protocolo 18002/2016, o qual originou os autos de controle externo: APE 16/00481849", e o Tribunal Pleno, na sessão de 25/11/2019, proferiu a Decisão Definitiva 1117/2019, ou seja, a decisão foi proferida dentro do prazo de cinco (5) anos.

Enfatiza que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou "no sentido da ausência de fluência do prazo decadencial do art. 54 da Lei 9.784/99 e pela inaplicabilidade do Princípio da Irredutibilidade de vencimentos nos casos onde for constatado o pagamento de vantagem sem base legal, a saber no MS 36449 AgR"; que a decisão prolatada no Mandado de Segurança n. 4008012-33.2016.8.24.0000, indicado pela impetrante, não pode ser aqui aplicada porque as demandas não são idênticas.

Alega que "a pretensão deduzida pelo Impetrante pode conduzir a uma interferência no regular exercício das competências constitucionais titularizadas por este Tribunal de Contas", motivo pelo qual prequestiona os arts. 70, 71, inciso III, e 75 da Constituição Federal, e o art. 59, inciso III, da Constituição Estadual.

O Superintendente do Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Florianópolis (IPREF) também prestou informações afirmando que não é possível "o restabelecimento do adicional de tempo de serviço para 6%", porque "o Estatuto dos Servidores (LC CMF n° 63/2003) passou a regulamentar tal matéria reduzindo a porcentagem para 3% (três por cento)"; que, por determinação do Tribunal de Contas do Estado, excluiu o valor da "função gratificada incorporada" da base de cálculo do adicional por tempo de serviço, sobretudo porque a Administração Pública está vinculada ao princípio da legalidade previsto no art. 37, "caput", da Constituição Federal.

Com vista dos autos, a douta Procuradoria-Geral da Justiça, com base em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Narcísio G. Rodrigues, opinou pela "concessão da ordem de segurança, a fim de que sejam anulados os efeitos da Portaria n. 397/2021, mantendo-se hígido o ato de inativação da impetrante (Portaria n. 225/2016) em todos os seus termos".

VOTO

O inciso LXIX do art. 5º da Constituição Federal, reproduzido pelo art. 1º, da Lei Federal n. 12.016, de 7/8/2009, efetivamente garante a todos a concessão de "mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".

Porém, o direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança deve vir comprovado desde logo com a impetração, porquanto nessa via processual não se admite dilação probatória para a sua comprovação.

HELY LOPES MEIRELLES, acerca do que se deve entender por direito líquido e certo, ensina:

"Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança" (Mandado de Segurança. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 37).

VICENTE GRECO FILHO, acerca da impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança, leciona:

"O pressuposto do mandado de segurança, portanto, é a ausência de dúvida quanto à situação de fato, que deve ser provada...

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