Acórdão Nº 5062053-54.2021.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Público, 18-10-2022

Número do processo5062053-54.2021.8.24.0000
Data18 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5062053-54.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS AGRAVADO: JEAN CARLOS DA SILVA

RELATÓRIO

O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs agravo de instrumento, com pedido de atribuição de efeito suspensivo, contra decisão que, nos autos do Cumprimento de Sentença n. 0310305-36.2017.8.24.0064, indeferiu o pedido de cobrança dos valores devidos pela parte autora nos próprios autos do cumprimento de sentença.

Sustenta que pretende a cobrança de valores pagos à parte agravada por força de tutela antecipada que determinou implantação de benefício previdenciário, a qual foi posteriormente revogada; que nos termos da decisão agravada, os valores pagos a título de antecipação de tutela posteriormente modificada somente seriam restituíveis mediante ajuizamento de ação própria, ou seja, tal decisão equivale a negar o direito do INSS de promover o competente cumprimento de sentença; que, todavia, no julgamento do Tema 692 (REsp 1.401.560) o STJ firmou tese no sentido de que a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos; que a decisão que impede o cumprimento de sentença contraria o disposto no artigo 523 e seguintes do CPC, o qual autoriza/determina o cumprimento de sentença quando se tratar de obrigação de pagar/restituir.

Requereu, então, a concessão de efeito suspensivo para que se determine o prosseguimento do cumprimento de sentença, nos próprios autos, até decisão final do presente recurso.

O pedido de efeito suspensivo foi deferido.

Após o oferecimento das contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de atribuição de efeito suspensivo, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra decisão que, nos autos do Cumprimento de Sentença n. 0310305-36.2017.8.24.0064, indeferiu o pedido de cobrança dos valores devidos pela parte autora nos próprios autos do cumprimento de sentença.

Antes de adentrar na análise de mérito do presente recurso, cabe registrar que, como consabido, a via processual recursal do agravo de instrumento serve para o combate de decisões proferidas nos juízos originários, de forma que o exercício da instância recursal cinge-se a apreciar o acerto ou o desacerto da decisão recorrida, estando obstruído o exame de questões não tratadas pelo Juízo de origem, sob pena de caracterizar supressão de instância e ofensa ao duplo grau de jurisdição.

A propósito:

O agravo de instrumento constitui recurso que se presta tão só a apreciar o acerto ou desacerto da decisão vergastada, no momento em que foi proferida, razão pela qual é vedado ao juízo ad quem examinar elementos que não foram ainda apreciados pelo juízo de origem, sob pena de indevida supressão de instância e ofensa ao duplo grau de jurisdição. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0011014-79.2016.8.24.0000, de Blumenau, Rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. em 10.05.2018).

O agravo de instrumento segue direcionado à análise do acerto ou desacerto da decisão agravada, de modo que apenas os tópicos submetidos ao crivo do juízo de origem poderão ser conhecidos. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4005669-64.2016.8.24.0000, de Joinville, Rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, Segunda Câmara de Direito Civil, j. em 22.03.2018).

Pois bem.

Sustenta o agravante que a cobrança de valores pagos à parte agravada por força de tutela antecipada que determinou implantação de benefício previdenciário, a qual foi posteriormente revogada, consoante o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos.

Com razão o instituto agravante, no que tange ao seu direito à devolução dos valores pagos por força da antecipação de tutela depois revogada.

Tempos atrás o Superior Tribunal de Justiça formou sua jurisprudência no sentido de que eram irrepetíveis as parcelas recebidas pelo segurado do INSS, que geralmente é pessoa de parcos recursos financeiros, a título de benefício previdenciário ou acidentário implantado por força de tutela antecipada, no caso de revogação desta, por se tratar de benefício substitutivo da renda de subsistência familiar, de caráter alimentar, e recebido de boa-fé.

Esses Julgados tinham supedâneo no que dizia o parágrafo único do art. 130, da Lei n. 8.213/1991, na sua redação original anterior à Lei n. 9.528/1997, que assim dizia:

"Art. 130. Os recursos interpostos pela Previdência Social em processo que envolvam prestações desta lei, serão recebidos exclusivamente no efeito devolutivo, cumprindo-se, desde logo, a decisão ou sentença, através de processo suplementar ou carta de sentença.

"Parágrafo único. Ocorrendo a reforma da decisão, será suspenso o benefício e exonerado o beneficiário de restituir os valores recebidos por força da liquidação condicionada."

A parte final do "caput" desse artigo e seu parágrafo único foram declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, na ADI 675:

"Previdência Social: L. 8.213/91 (Plano de Benefícios): suspensão cautelar, em ação direta, por despacho do Presidente do STF, no curso das férias forenses, da parte final do caput do art. 130 (que determina o cumprimento imediato de decisões relativas a prestações previdenciárias, ainda que na pendência de recursos) e do seu parágrafo único que, na hipótese da reforma da decisão, exonera o beneficiário de 'restituir os valores recebidos por força da liquidação condicional': referendum, por voto de desempate, do despacho presidencial." (STF, ADI 675 MC, Relator(a): SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 06/10/1994, DJ 20-06-1997 PP-28467 EMENT VOL-01874-01 PP-00159).

Esse art. 130 e seu parágrafo único depois foram totalmente alterados pela Lei n. 9.528/1997, passando a ter redação completamente distinta do que até então dizia, de modo que, ainda que tivesse sido considerado constitucional, não mais serve para isentar o segurado da restituição dos valores recebidos por força de tutela antecipada depois revogada.

Diante da multiplicidade de recursos interpostos pelo INSS contra as decisões que negavam a restituição dos valores recebidos pelo segurado por força de tutelas antecipadas depois revogadas, o Superior Tribunal de Justiça, com base no art. 543-C do Código de Processo Civil, introduzido pela Lei n. 11.672/2008, afetou a matéria para julgamento sob a sistemática de recursos repetitivos, acerca do Tema 692, no Recurso Especial n. 1.401.560/MT, julgado em 03.09.2014, em que, no acórdão da 1ª Seção publicado no DJe de 13.10.2015, tendo como Relator o Ministro Sérgio Kukina, definiu a seguinte tese jurídica: "A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos."

Veja-se a ementa:

"PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO.

"O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária.

"Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a 'contrario sensu', o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária (declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675) dispensava.

"Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. Recurso especial conhecido e provido."

Abre-se um parêntese para esclarecer que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Tema 799 de Repercussão Geral (ARE n. 722.421/MG...

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