Acórdão Nº 5062192-06.2021.8.24.0000 do Quarta Câmara de Direito Público, 10-03-2022

Número do processo5062192-06.2021.8.24.0000
Data10 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5062192-06.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador ODSON CARDOSO FILHO

AGRAVANTE: SORAYA LEMOS ERPEN BROERING AGRAVADO: ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Na comarca de Lages, o Estado de Santa Catarina ajuizou a Execução Fiscal n. 0800577-04.2008.8.24.0039 em face de Lactoplasa Indústria de Lacticínios do Planalto S/A, mediante apresentação da Certidão de Dívida Ativa (CDA) n. 8000311800, emitida em 3-3-2008, por ter o contribuinte deixado de efetuar, total ou parcialmente, o recolhimento do ICMS relativo às operações tributáveis por ele mesmo escrituradas no livro registro de apuração do tributo e declarado na DIME, visando à satisfação de crédito no valor de R$ 291.672,77 (duzentos e noventa e um mil, seiscentos e setenta e dois reais e setenta e sete centavos).

Foi determinada a citação (Ev. 11 dos autos originários), mas antes que houvesse tentativa de cumprimento do ato, o exequente informou que, segundo se constatou nos autos n. 0800602-17.2008.8.24.0039, a empresa deixara de funcionar em seu domicílio fiscal, razão pela qual requereu o redirecionamento do feito executivo em face dos sócios-gerentes, Giovani Broering e Soraya Lemos Erpen Broering (Ev. 16-17 dos autos originários).

O pleito - interpretado como se fosse de desconsideração da personalidade jurídica - foi indeferido (Ev. 25 dos autos originários).

Após petição de reconsideração do credor, foi determinada a citação dos sócios para manifestação nos termos do art. 135 do CPC (Ev. 31 dos autos originários).

Citada (Ev. 40 dos autos originários), Soraya opôs exceção de pré-executividade, arguindo a prescrição intercorrente; a nulidade da execução fiscal pela ausência de CDA e pela falta de citação da empresa; a ocorrência de sucessão empresarial; a impossibilidade de redirecionamento em face da peticionante e de penhora dos bens da empresa executada (Ev. 43 dos autos originários).

Após impugnação do Estado, que também juntou aos autos a CDA n. 8000311800 (Ev. 51 dos autos originários), a magistrada a quo recebeu a exceção de pré-executividade como impugnação ao pedido formulado pelo exequente de desconsideração da personalidade jurídica, rejeitando-a, e deferiu o pleito de redirecionamento da execução em face dos sócios-administradores, Soraya e Giovani (Ev. 64 dos autos originários), decisão complementada pela rejeição dos embargos de declaração opostos por Soraya (Ev. 78 dos autos originários), o que ensejou a interposição do presente agravo de instrumento.

A recorrente verbera, em síntese, a nulidade da decisão de Evento 78 por carência de fundamentação; a nulidade da decisão de Evento 64 tanto por deficiência de fundamentação quanto em razão de preclusão pro judicato e, no mérito, aponta para a nulidade da execução fiscal por inexistência de citação da empresa Lactoplasa até o momento; a ausência de tentativa de citação no correto endereço da devedora, na cidade de Urubici, e a falta de apresentação nos autos da certidão do Oficial de Justiça, referida pela togada singular; a ocorrência da prescrição, em razão da ausência de citação da empresa e do decurso de 15 anos desde o fato gerador do tributo; a ausência de CDA, carecendo o feito de objeto; a impossibilidade de redirecionamento, já que Soraya não é sócia da executada, mas tão somente diretora, não exercendo tal cargo, ademais, na data do fato gerador do ICMS; a plena atividade da devedora e a existência de patrimônio; a sucessão empresarial, com aquisição da Lactoplasa pela empresa Chocoleite; e quanto ao perigo de dano, o evidente prejuízo à agravante, que será citada para pagamento de débito tributário pelo qual não é responsável.

Pelas razões de Evento 7, deferi a almejada carga suspensiva.

Houve contrarrazões (Ev. 17).

Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça pela ausência de interesse de intervir na causa (Ev. 20).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo, está fundado a partir da natureza do interlocutório combatido (art. 1.015, parágrafo único, do CPC), as hipóteses legais (art. 1.016 e ss. do CPC) foram contempladas e a recorrente efetuou o recolhimento do preparo, razão pela qual o agravo merece ser conhecido.

A agravante pretende, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade das decisões de primeiro grau - tanto daquela que recebeu a exceção de pré-executividade como impugnação ao pedido de desconsideração da personalidade jurídica, rejeitando-a, e deferiu o redirecionamento da execução fiscal, quanto da que não acolheu os embargos de declaração - por carência de fundamentação, assim como da inserta no Evento 64 dos autos originários, por ter deixado de observar a preclusão pro judicato, ao ditar ser prescindível a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica quando decisão anterior já o instaurara.

Entendo, porém, ser desnecessária a análise das prefaciais aduzidas, com fulcro no art. 282, § 2º, do CPC - segundo o qual "quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta" - uma vez que a decisão de mérito é favorável à recorrente.

Pretende a agravante, nesse aspecto, de um lado, ver extinta a execução fiscal, ventilando teses de nulidade pela ausência de CDA e pela falta de citação da pessoa jurídica executada, acarretando, inclusive, a prescrição; de outro, busca o afastamento do redirecionamento do feito executivo com fulcro no art. 135, III, do CTN, sustentando a falta de tentativa de citação da devedora no seu endereço na cidade de Urubici; a não apresentação da certidão do Oficial de Justiça a partir da qual se presumiu a dissolução irregular; a plena atividade da devedora; a existência de patrimônio; a sucessão empresarial da Lactoplasa pela Chocoleite e a ocorrência do fato gerador em data anterior ao exercício de gerência pela agravante, que, na verdade, era mera diretora da empresa.

Com razão, mas em parte!

De saída, registro, ao encontro do que já fora observado pela togada singular (Ev. 64 dos autos originários), que a CDA n. 8000311800 foi apresentada pelo Estado no Evento 51 dos autos originários e em se tratando de execução fiscal que originalmente tramitava em meio físico e depois foi digitalizada é de se concluir que o título executivo não constava dos autos até então porque fora extraviado.

Daí não ser possível acolher a tese da recorrente de que a execução fiscal em comento careceria de objeto nem se vislumbra, pela juntada no decorrer do feito, prejuízo à agravante, já que não se trata de CDA nova ou substitutiva da original - haja vista a correspondência entre o número constante da exordial e aquele referido no título e a data de emissão deste - e foi oportunizada à agravante manifestação sobre o documento antes que sobreviessem as decisões ora combatidas.

Por sua vez, a arguição de nulidade da execução fiscal pela inexistência de citação da Lactoplasa é premissa para arguir também a prescrição do crédito tributário, razão pela qual procedo à sua análise conjunta.

Estabelece o art. 174, caput, do Código Tributário Nacional, que "a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva", enquanto o parágrafo único elenca causas de interrupção da prescrição, dentre as quais a citação, na redação original do inc. I, e o despacho que determina a citação, conforme alteração provocada pela Lei Complementar n. 118/2005.

No caso, conforme histórico do lançamento constante da CDA, trata-se de crédito com origem na ausência, total ou parcial, de recolhimento do ICMS relativo às operações tributáveis escrituradas pelo próprio contribuinte no livro registro de apuração do tributo e declarado na DIME, relativo ao período de 1/2006 a 4/2006 (Ev. 51, INF84, dos autos originários).

A Execução Fiscal n. 0800577-04.2008.8.24.0039, por sua vez, foi ajuizada e distribuída em 25-3-2008 (Ev. 2 dos autos originários), mas o despacho determinando a citação de Lactoplasa Indústria de Lacticínios do Planalto S/A somente foi proferido em 17-11-2010 (Evento 4 dos autos originários) e sem que tivesse havido sequer tentativa de citação, o Estado pugnou pelo redirecionamento da execução fiscal em face de Giovani Broering e Soraya Lemos Erpen Broering, ora agravante, a partir da Súmula n. 435 do STJ, considerando o teor da certidão lavrada por Oficial de Justiça nos autos n. 0800602-17.2008.8.24.0039, também execução fiscal movida pela Fazenda Pública estadual em desfavor da Lactoplasa (Ev. 16-17 dos autos originários).

Nesse contexto, cumpre referir que, a partir das teses firmadas pela Corte Superior no julgamento, pela sistemática dos recursos repetitivos, do Tema n. 444, este Órgão Fracionário passou a entender que, para o redirecionamento da execução fiscal, não se exige a prévia citação da pessoa jurídica executada (cf. TJSC, Agravo de Instrumento n. 4017392-46.2017.8.24.0000, de Laguna, de minha relatoria, Quarta Câmara de Direito Público, j. 29-10-2020).

A possibilidade de emprego de prova emprestada - nesse caso, a certidão do Oficial de Justiça -, extraída de outra execução fiscal em trâmite contra a mesma pessoa jurídica executada também deve ser referendada, até porque, tratando-se de processos que não tramitam sob segredo de justiça, o advogado tem o direito de "examinar, em cartório de fórum e secretaria de tribunal, mesmo sem procuração, autos de qualquer processo, independentemente da fase de tramitação, assegurados a obtenção de cópias e o registro de anotações", o que se aplica também aos processos eletrônicos (art. 107, I e § 5º, do CPC).

Esclarecidos esses aspectos, observa-se que a Fazenda Pública, ao pretender o redirecionamento da execucional, nunca deixou de impulsionar o feito; o longo lapso entre o petitório de 8-12-2011 (juntado aos autos em 9-1-2012) e a efetiva citação da sócia-gerente, ora agravada, em 24-11-2016 (Ev. 40 dos autos originários), é imputável exclusivamente ao Poder Judiciário, já que, entre o...

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