Acórdão Nº 5063213-17.2021.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 13-01-2022

Número do processo5063213-17.2021.8.24.0000
Data13 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5063213-17.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER

PACIENTE/IMPETRANTE: MARIA MARGARIDA SCHRANK (Paciente do H.C) PACIENTE/IMPETRANTE: CLAUDIA TEREZINHA BARON DE SOUZA (Impetrante do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Única da Comarca de Palmitos

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus impetrado pela advogada Cláudia Terezinha Baron de Souza em favor de Maria Margarida Schrank, presa e denunciada pela apontada prática dos crimes tipificados nos arts. 121, § 2°, III e IV, e 211 do Código Penal, em concurso material.

Em síntese, sustentou a impetrante que a paciente vem sofrendo constrangimento ilegal por parte do Juízo de Direito da Unidade de Divisão Judiciária da comarca de Palmitos, que converteu em preventiva a sua prisão em flagrante e posteriormente indeferiu seu pedido de substituição por prisão domiciliar, pois não indicou fato concreto apto a justificar a medida extrema, bem como não estão presentes os requisitos legais.

Afirmou que "[...] a decisão ora guerreada reconheceu que o delito previsto no art. 211 do CP, não autoriza a decretação da prisão preventiva, porém, sob o argumento de que pelo simples fato de passar a ser investigada pelo delito previsto no art. 121, do CP, a prisão preventiva é cabível e assim fora decretada" (sic, fls. 4 da inicial).

Asseverou que as provas até então produzidas foram colhidas sem o crivo do contraditório e a constrição da sua liberdade não pode se basear nas palavras de testemunha que é suspeita de ter cometido o delito contra a vida.

Salientou que o pronunciamento atacado está baseado apenas na gravidade do delito e do suposto modus operandi, não apresentando justificativa plausível e concreta acerca da real necessidade da custódia cautelar.

Aduziu que "[...] a medida cautelar excepcional não possui contemporaneidade entre o fato delituoso imputado (homicídio) e a prisão, visto que o crime foi supostamente cometido no ano de 2019, sendo que durante este lapso temporal a paciente não esteve envolvida em nenhuma atividade ilícita" (sic, respectivas fls. 5).

Ponderou que a investigada é primária, não ostenta antecedentes e possui residência fixa.

Pugnou, pois, por provimento liminar, para que fosse revogado o comando constritivo e, ao final pela concessão definitiva da ordem ou subsidiariamente, sua substituição por medidas cautelares diversas.

Requereu, ainda, a fixação de "[...] honorários advocatícios em razão dos serviços prestados na qualidade de defensoria dativa, conforme nomeação efetuada no APF 50017572520218240046" (sic, fls. 13 da impetração).

Recebida a pretensão por este magistrado, o pleito antecipatório restou indeferido.

Após a prestação das informações solicitadas à autoridade acoimada de coatora, remeteu-se o feito à douta Procuradoria-Geral de Justiça, a qual, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Hélio José Fiamoncini, opinou pela concessão da ordem.

É o relatório.

VOTO

De início, importa consignar que o habeas corpus constitui-se em remédio constitucional destinado exclusivamente à aferição da legalidade ou não do ato tido por coator, permanecendo fora do raio de seu objeto qualquer discussão a respeito do mérito da causa.

Outrossim, sabe-se que deverá ser concedida a correlata ordem sempre que alguém sofrer, ou se achar ameaçado de sofrer, violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (Constituição Federal, art. 5º, LXVIII).

Na espécie, o mandamus preenche apenas em parte os seus requisitos de admissibilidade, de maneira que deve ser conhecido unicamente na correlata extensão.

Isso porque não há interesse de agir da impetrante quanto ao pedido de gratuidade da justiça, porquanto a presente ação constitucional já possui essa isenção, nos termos do art. 5º, LXXVII, da Carta da República, in verbis: "são gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania".

Em igual tom, prevê o art. 4°, inciso VI, da Lei Estadual local 17.654/2018:

Art. 4º Observadas as isenções previstas em lei, a Taxa de Serviços Judiciais não incidirá em:[...]VI - processos de habeas corpus e de habeas data e, na forma da lei, nos atos necessários ao exercício da cidadania;

Logo, não é de ser conhecido o writ neste aspecto.

Posto isso, é certo que a legitimidade da prisão preventiva depende da configuração de algum dos requisitos do art. 313 do Código de Processo Penal, de maneira cumulada com as condições autorizadoras do respectivo art. 312, quais sejam: os pressupostos da prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria, consistentes no fumus comissi delicti, e os fundamentos da imprescindibilidade de salvaguarda da ordem pública ou econômica, da instrução criminal ou da aplicação da lei penal, com a evidência do perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, o que perfaz o periculum libertatis.

Em que pese a argumentação tecida pela impetrante, razão não lhe assiste.

Infere-se dos autos que a paciente foi presa em flagrante - e posteriormente denunciada - pela apontada prática dos crimes de homicídio, qualificado pelo emprego de asfixia e utilização de recurso que teria dificultado a defesa do ofendido, e ocultação de cadáver, em concurso material, porquanto entre a noite de 6-9-2019 e o dia de 8-9-2019 teria desferido diversos golpes com uma barra de ferro em Adriano André Honef, com quem mantinha um relacionamento amoroso, enquanto este estava dormindo, e, posteriormente, com o uso de um cobertor, o sufocado até a morte. Em seguida, envolveu o corpo na reportada coberta e ocultou o cadáver ao enterrá-lo em uma cova aberta aos fundos de sua propriedade rural, bem assim escondeu a motocicleta que a vítima utilizou naquele período para ir até a sua residência. Os crimes e a autoria delitiva permaneceram sem serem revelados por mais de dois anos.

Assim que encontrada a ossada e o automotor do ofendido e identificados com mais evidência os indícios da responsabilidade de Maria Margarida Schrank, esta foi presa em flagrante e o ato foi homologado e convertido em prisão preventiva pelo Togado a quo sob os bem lançados fundamentos:

1. A homologação da prisão em flagrante depende da observância do procedimento legal e de indicativos da situação de flagrância, conforme arts. 301 a 310 do CPP.Sobre o procedimento, verifico que o Auto de Prisão em Flagrante (APF) está instruído com termos retratando a oportunidade de oitiva do conduzido e de duas testemunhas, documento referindo a possibilidade de comunicação do ato para pessoa indicada e, ainda, nota de culpa, consoante arts. 304 a 309 do CPP.Adicionalmente, há indicativos de que a conduzida foi abordada em situação de flagrante real (ou próprio), quando estava cometendo a infração penal, na forma do art. 302, I, do CPP. Isso porque o delito do art. 211 do Código Penal é permanente, de modo que estava em execução até a localização da ossada, que ocorreu momentos antes da prisão da investigada.A materialidade está demonstrada pelas fotografias anexas ao boletim de ocorrência, que indicam a localização de uma ossada humana, envolta em um cobertor, enterrada em cova rasa. Por outro lado, as circunstâncias da localização do corpo (na propriedade da investigada, após seu companheiro ter indicado o local exato em que estavam o corpo e a motocicleta, com confirmação - ainda que parcial - da investigada de que apontou a localização para seu companheiro) representam indícios suficientes de autoria do delito previsto no art. 211 do Código Penal, especialmente neste momento incipiente.Portanto, afasto o requerimento de relaxamento e HOMOLOGO a prisão em flagrante da conduzida.2. Considerando os termos do art. 310, §§ 3º e 4º, do CPP, do art. 8º da Recomendação nº 62/2020 do CNJ e da Resolução Conjunta GP/CGJ/GMF nº 03/2020, diante da pandemia da Covid-19, dispenso a realização de audiência de custódia e passo a analisar, de imediato, a possibilidade de concessão de liberdade provisória, a necessidade de conversão do flagrante em prisão cautelar (art. 310 do CPP) e o pedido de decretação de prisão preventiva, formulado pela autoridade policial e pelo Ministério Público.Segundo o artigo 312 do CPP, "a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado".Ademais, "será admitida a decretação da prisão preventiva: I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência" (art. 313, caput, do CPP).É preciso lembrar, ainda, que "a prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada" (art. 282, § 6º, do CPP).No caso concreto, a imputação exclusiva do delito do art. 211 do Código Penal não autoriza a decretação da prisão preventiva, pois a pena máxima do crime é de 3 anos de reclusão. Além disso, a investigada é primária e o delito não foi praticado em violação de medidas cautelares ou protetivas.Ocorre que, após a prisão em flagrante, a requerida passou a ser investigada também em relação à suposta prática do homicídio da pessoa cuja ossada foi encontrada. O delito do art. 121 do Código Penal...

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