Acórdão Nº 5063939-88.2021.8.24.0000 do Terceira Câmara Criminal, 14-12-2021

Número do processo5063939-88.2021.8.24.0000
Data14 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5063939-88.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

PACIENTE/IMPETRANTE: BOANERGES RODRIGUES DE OLIVEIRA (Paciente do H.C) ADVOGADO: ARTHUR NUNES BARCELLOS (OAB ES026751) PACIENTE/IMPETRANTE: LEVI LUIZ DA COSTA BARROS (Paciente do H.C) ADVOGADO: ARTHUR NUNES BARCELLOS (OAB ES026751) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: ARTHUR NUNES BARCELLOS (Impetrante do H.C) ADVOGADO: ARTHUR NUNES BARCELLOS (OAB ES026751) IMPETRADO: Juízo da 2ª Vara da Comarca de Jaguaruna

RELATÓRIO

1. Trata-se de habeas corpus impetrado por Arthur Nunes Barcellos em favor de Boanerges Rodrigues de Oliveira e Levi Luiz da Costa Barros, respectivamente, 67 e 27 anos de idade, diante de decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Jaguaruna que, nos autos da Ação Penal n. 50038988520218240282, decretou a prisão preventiva dos pacientes, denunciados em razão da prática, em tese, dos crimes tipificados nos arts. 54 da Lei n. 9.605/98, em concurso material (artigo 69 do Código Penal) com a conduta descrita no preceito penal incriminador do artigo 32, § 1º-A, da Lei 9.605/98, por 48 vezes, combinado com § 2º do artigo 32 da Lei 9.605/98, por 4 vezes.

Relatou o impetrante que o paciente Boanerges Rodrigues foi preso em flagrante em 19.10.2021, mas lhe foi concedida a liberdade provisória mediante a fixação das seguintes medidas cautelares: "a) proibição de mudança de endereço sem prévia comunicação ao juízo; e b) comparecimento a todos os atos do processo".

Aduziu, em suma, que não houve descumprimento das medidas em relação ao paciente Boanerges Rodrigues, uma vez que os impetrantes comunicaram a mudança de endereço na audiência realizada no dia 03.11.2021 e também na petição do Evento 97. No ponto, sustentou que "o paciente Boanerges explicou especificamente em depoimento em audiência no evento nº. 78 do processo nº. 5003649-37.2021.8.24.0282 os motivos pelo qual teve que realizar as mudanças de residência, sempre priorizando o bem-estar dos animais".

Após relatório minucioso sobre os fatos ocorridos no processo, sustentou que não há risco de reiteração delituosa, porque a decisão está "alicerçada em suposta denúncia presente em evento 29, documento P_FLAGRANTE2, fls. 5-8, onde uma pessoa que se identifica como Cristina Wobeto, entrou em contato com a Delegacia de Polícia de Jaguaruna via aplicativo WhatsApp e teria enviado relato acerca da ação dos pacientes nos municípios de Rancho Queimado e Santa Amaro da Imperatriz, enviando também e-mail com relatos dos supostos fatos, imagens, vídeos e prints de celular.". Contudo, segundo o impetrante, "tais afirmações, apresentadas desta forma, via aplicativo, sem qualquer tipo de assinatura, com fotos, vídeos e prints de tela de celular são elementos muito frágeis para serem tomados como verídicos e provas em um processo desse grau de importância, onde está em baila o bem-estar animal e a liberdade de cidadãos que sempre cumpriram suas obrigações. Sem elementos comprobatórios mais robustos, tal relato, anexado no Inquérito Policial nº. 5003649-37.2021.8.24.0282 e tratado por este douto juízo como prova inconteste a ponto de ensejar decreto de prisão preventiva, não passa de meras ilações apócrifas".

Disse, ademais, que os animais que estavam sob os cuidados do paciente Levi, diante de sua prisão e mediante decisão liminar na Ação Civil Pública n. 5003898- 85.2021.8.24.0282 estão sob a tutela do Município de Jaguaruna, razão por que não há risco de reiteração.

Afirmou, outrossim, que, "Com relação ao narrado em evento nº. 110 do processo nº. 5003649- 37.2021.8.24.0282 faz-se necessário informar que a propriedade onde reside o paciente Levi e, consequentemente os animais, é grande, possuindo em torno de 5 (cinco) mil metros quadrados, o que pode ensejar a permanência do Sr. Levi em algum local da propriedade longe o suficiente para que não possa ser escutado o chamado".

Ainda argumentou que "no caso em tela, tendo em vista a mudança fática da situação do acusado, qual seja a sua mudança de endereço do paciente Boanerges, para local há mais de 1.750 (mil setecentos e cinquenta) quilômetros de distância dos animais e do local dos fatos, a prisão preventiva do paciente Levi e a determinação da imediata transferência dos animais para a guarda do Município de Jaguaruna, não há o que se falar em manutenção do pedido de prisão preventiva para garantia da instrução criminal".

Destacou que "a proibição de mudança estipulada pelo douto juízo é sem prévia comunicação ao juízo, e não prévia autorização do juízo para a mudança. Dessa forma, a primeira obrigação do paciente Boanerges junto ao douto juízo era apenas de comunicar previamente a sua mudança, o que ocorreu nos autos do processo nº. 5003649-37.2021.8.24.0282 em evento nº. 78, quando em audiência realizada em 03 de novembro de 2011, entre os minutos 34:00 e 36:30 há a manifestação da advogada, sobrinha do paciente, que comunica a Ilustre Representante do Ministério Público assim como ao Douto Juízo a intenção do Paciente em se mudar para o Estado do Espírito Santo, onde reside sua família, a fim de que possa ter todo o apoio emocional, psicológico e financeiro para atravessar este grave problema que estava enfrentando, assim como também informa para a Ilustre Representante do Ministério Público e o Douto Juízo de que o companheiro do paciente Boanerges, o paciente Levi, permaneceria na propriedade cuidando e zelando pelos animais. Questionado posteriormente pela Ilustre Representante do Ministério Público sobre esta intenção na mesma audiência, o paciente a confirma".

Ao argumento de que "o paciente Boanerges é pessoa idosa, atualmente possuindo 67 (sessenta e sete) anos, aposentado por invalidez, que não tomou ainda a dose de reforço contra a Covid-19, sendo assim pessoa em grupo de risco e extremamente vulnerável ao novo coronavírus, correndo risco absoluto se ingressar em um estabelecimento prisional" e de que "o paciente Levi também se encontra de forma desnecessária em estabelecimento prisional, também sujeito aos riscos da Covid-19, principalmente exposto a possibilidade de adquirir a nova variante Omicron, muito mais contagiosa, e que já se encontra presente em todos os continentes", destacou a possibilidade de substituição da prisão preventiva por domiciliar.

Por fim, requereu, até mesmo liminarmente, a concessão da ordem, com vistas à revogação da prisão do paciente Levi Luiz da Costa Barros e a expedição de salvo-conduto em relação ao paciente Boanerges Rodrigues de Oliveira ou à substituição por medidas cautelares diversas (CPP, art. 319).

A liminar foi indeferida por este Relator (Evento 12) e foram solicitadas informações ao juízo a quo, prestadas no Evento 21.

Em 06.12.2021, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça que, por parecer do Procurador de Justiça Rui Arno Richter, manifestou-se pela denegação da ordem (Evento 25); retornaram conclusos em 10.12.2021.

VOTO

1. De início, consigna-se que Boanerges Rodrigues de Oliveira e Levi Luiz da Costa Barros foram denunciados pela suposta prática dos crimes previstos nos arts. 54 da Lei n. 9.605/98, em concurso material (artigo 69 do Código Penal) com a conduta descrita no preceito penal incriminador do artigo 32, § 1º-A, da Lei 9.605/98, por 48 vezes, combinado com § 2º do artigo 32 da Lei 9.605/98, por 4 vezes, pelos fatos assim narrados:

"1. CONTEXTUALIZAÇÃO

A fim de uma melhor compreensão dos atos delituosos que serão detalhados na sequência, curial delimitar algumas circunstâncias. No dia 19 de outubro de 2021, o denunciado Boanerges Rodrigues de Oliveira foi autuado em flagrante delito, pois foi identificado como proprietário de um canil clandestino, localizado na residência dele, situada esta, por sua vez, na Rodovia BR-101, s/n, próximo ao posto de combustível "A. Nunes", município de Jaguaruna, onde se configurou maus tratos a 48 cachorros. Esses, a seu turno, com a seguinte individualização1:

RaçaMachoFêmeaSpitz Alemão11Akita21Sem Raça Definida (SRD)33Pastor Malinoá23Border Collie64Cane Corso24Husky Siberiano77Samoieda01

(Relatório de Atendimento in loco na propriedade de B. Rodrigues de Oliveira, em Jaguaruna, SC em anexo)

Na oportunidade, o denunciado Levi Luiz da Costa Barros foi nomeado como depositário fiel dos cães, que permaneceram no local.

Entrementes, empós, foi revelado que o denunciado Levi Luiz da Costa convive em união estável com o denunciado Boanerges Rodrigues de Oliveira, e com este atuava em conjunto nos atos que resultaram maus tratos aos animais e poluição. Inclusive, o primeiro se identifica como proprietário de alguns dos cachorros que estão no local.

2. CRIME DE POLUIÇÃO

Dito isso, em data com início não apurada, mas certamente a partir de 7 de agosto de 2021 (data da comunicação aos policiais civis da existência do canil clandestino) até o dia 29 de outubro de 2021 (data da última vistoria), os denunciados Boanerges Rodrigues de Oliveira e Levi Luiz da Costa Barros, de forma contínua, em atuação conjunta, mediante divisão de tarefas, bem como união de esforços e soma de desideratos, no imóvel onde residem, situado na Rodovia BR-101, s/n, próximo ao posto de combustível "A. Nunes", município de Jaguaruna, causaram poluição em níveis capazes de resultar em danos à saúde humana.

Para tanto, de comum acordo e durante o convívio decorrente da união estável que eles mantém entre si, os denunciados Boanerges Rodrigues de Oliveira e Levi Luiz da Costa Barros instalaram no local um canil clandestino com 48 cachorros, em uma estrutura improvisada, no qual ambos eram responsáveis, bem como realizavam as tarefas decorrentes das atividades do manejo com animais, com dever legal de adotar todas providências sanitaristas para evitar qualquer tipo de poluição, ainda mais que atuavam no ramo como profissionais, pois possuem canil registrado com o nome de "Kennel Von Heller" perante a Liberty Cinofilia Brasileira (Organização não governamental que tem como objeto principal...

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