Acórdão Nº 5065042-33.2021.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 16-12-2021

Número do processo5065042-33.2021.8.24.0000
Data16 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5065042-33.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

PACIENTE/IMPETRANTE: FABIO VENICIO VIEIRA (Impetrante do H.C) PACIENTE/IMPETRANTE: ANDREW CARLOS BATISTA DOS REIS (Paciente do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Criminal da Comarca de Brusque

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado pelo advogado Fabio Venicio Vieira, em favor de Andrew Carlos Batista dos Reis, preso desde o dia 26.08.2021 pela suposta prática dos crimes descritos no artigo 157, § 2º, inciso II, do Código Penal e artigo 244-B, caput, do ECA, apontando como autoridade coatora o Juízo da Vara Criminal da Comarca de Brusque.

Sustentou o impetrante, em resumo, que os argumentos utilizados pelo juízo a quo para justificar a prisão não são suficientes, eis que inexiste fundamentação concreta acerca da necessidade da medida, bem como ausentes os requisitos autorizadores da segregação cautelar previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal.

Ponderou que "o fato do indiciado, ora Paciente, ter sido preso em sua residência (sem ter se evadido como os demais denunciados), sem qualquer resistência, bem como, que absolutamente nada de ilícito fora apreendido com este, e ainda, asseverando, prontamente prestou todos os esclarecimentos e indagações a autoridade policial responsável, bem como, que desde o inicio da marcha processual veio aos autos com advogado devidamente constituído, por si já ensejam uma considerável alteração no contexto fático apresentado pela autoridade policial quando da representação pela sua prisão".

Prosseguiu dizendo que o decreto preventivo é a ultima ratio, sendo que a regra geral é que o indivíduo responda um processo criminal em liberdade, em consonância com o princípio da presunção de inocência, ao passo que sua decretação deverá se dar em decisão fundamentada e quando as medidas cautelares não se mostrarem suficientes.

Ressalvou que "mesmo sendo o Paciente COMPROVADAMENTE um jovem de bem, que tem todas as suas atividades diárias voltadas para prática de atividades lícitas, buscando sempre trabalhar para seu próprio sustento e de sua família, pessoa íntegra, PRIMÁRIO e SEM QUALQUER ANTECEDENTE, além de residir em RESIDÊNCIA FIXA, apresentando, inclusive, vínculo com o distrito da culpa, ainda assim, o Nobre Magistrado a quo preferiu mantê-lo segregado".

Alegou, ainda, "em que pese este não ser o momento e o meio para apreciação de mérito, mas, com todo respeito, tendo o Nobre Magistrado de piso feito alguns apontamentos quanto a este (o mérito) é imprescindível que se observe que no próprio relato da autoridade policial, bem como no relato prestado pelo denunciado, que a participação/conduta deste nesta suposta empreitada criminosa, ao que tudo indica, em uma analise preliminar, fora a de ajudar a Vítima, eis que este simplesmente o colocou dentro do carro desta e o levou até uma farmácia, deixando inclusive o veiculo desta no local, e somente o fez, por que era vizinho no prédio da suposta autora dos fatos e agressora, e observou (escutou os barulhos) o ocorrido, impedindo, inclusive, até mesmo um pior desfecho da situação".

Inobstante, advertiu "que o Paciente é o único dentre os demais Denunciados (e os prováveis autores dos fatos apurados) que encontra-se enclausurado, estando os demais em locais incertos ou não sabidos, o que por si acarreta em grande prejuízo para este, estando a marcha processual pendente da manifestação dos demais, o que por evidente atrasará em muito a conclusão desta ação penal, e por tanto, a aplicação da lei penal ao reais autores do ilícito".

Reafirmou que "O Paciente veio aos autos por meio de defensor constituído, possui residência fixa, inclusive no distrito da culpa, é casado e possui dois filhos, um inclusive recém nascido, exerce trabalho lícito, condições estas que, certamente o seguram na Comarca onde reside, não havendo como sugerir o perigo de fuga ou algo que o valha".

De outro lado, sustentou que "a manutenção do Paciente no sistema carcerário atual, que conforme Vossas Excelências tem conhecimento, constitui em razão da superlotação carcerária, bem como pelo ainda perigo real ocasionado pela propagação da COVID-19, ofensa à dignidade humana, pois não oferecem condições adequadas aos presos condenados, quiçá aos provisórios que aguardam julgamento".

Por fim, alegou que a prisão preventiva não guarda a necessária homogeneidade com o resultado final do processo, sob o argumento de que "diante das características pessoais do Paciente, aliadas as circunstâncias fáticas, é plenamente possível que a fixação da pena seria no patamar mínimo legal".

Nesses termos, justificou estarem presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, motivo pelo qual requereu a concessão da ordem em liminar, expedindo-se consequentemente alvará de soltura em favor do paciente. Alternativamente, a imposição de medidas cautelares diversas da prisão previstas no art. 319 do CPP (evento 1).

Indeferida a liminar e dispensada as informações (evento 7), os autos ascenderam a Douta Procuradoria-Geral de Justiça que, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese, manifestou-se pela denegação da ordem (evento 11).

VOTO

Ab initio, registro que o habeas corpus é remédio constitucional que visa tutelar a liberdade corpórea do indivíduo, o seu direito de locomoção. Não é ele, pois, instrumento adequado para se discutir as provas ou a inocência do paciente, cingindo sua análise tão somente à ilegalidade ou não de ato constritivo de liberdade de locomoção.

Nesse passo, destaca Paulo Rangel:

A discussão sobre os elementos de prova ou sobre a inocência do réu é matéria a ser discutida no curso do processo, perante o juiz de primeiro grau, e não na ação de habeas corpus, sob pena de haver supressão de instância (Paulo Rangel. Direito Processual Penal. 24. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2016, p. 1.080).

A propósito, "no procedimento do habeas corpus não se permite a produção de provas, pois essa ação constitucional deve ter por objeto sanar ilegalidade verificada de plano, por isso não é possível aferir a materialidade e a autoria delitiva". (RHC 101.367/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/11/2018, DJe 26/11/2018).

É o que se extrai da jurisprudência desta Corte de Justiça:

HABEAS CORPUS - PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA - PACIENTE DENUNCIADO PELA PRÁTICA, EM TESE, DO CRIME PREVISTO NO ART. 24-A DA LEI MARIA DA PENHA. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA - NEGATIVA DE AUTORIA - MATÉRIA AFETA AO MÉRITO DA AÇÃO PENAL - NÃO CONHECIMENTO. A autoria delitiva envolve questão de mérito e não pode ser discutida na via estreita do writ, que não admite aprofundado exame de provas ou dilação probatória. [...] ORDEM CONHECIDA EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO, DENEGADA. (TJSC, Habeas Corpus Criminal n. 5000236-86.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Getúlio Corrêa, Terceira Câmara Criminal, j. 19-01-2021).

Daí porque, a veracidade ou não dos fatos narrados, bem como as provas da autoria delitiva serão apuradas no momento oportuno, uma vez que, durante a instrução processual, haverá a possibilidade de dilação probatória para ambas as partes, defesa e acusação, lhes oportunizando o amplo debate.

Portanto, estes temas não podem ser conhecidos por esta Corte, pois referem-se ao mérito da ação penal, exigindo uma incursão aprofundada na prova, sabidamente inviável na via estreita do writ.

De igual modo, o argumento de que a prisão preventiva não guarda a necessária homogeneidade com o resultado final do processo, sob o argumento de que "diante das características pessoais do Paciente, aliadas as circunstâncias fáticas, é plenamente possível que a fixação da pena seria no patamar mínimo legal", não pode ser conhecida.

In casu, insofismável que tal questão envolve exame exaustivo de provas, cujo trabalho é pertinente ao magistrado a quo, que julgará o mérito da ação penal.

Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO [...] RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. ANÁLISE FÁTICO-PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE NA VIA ELEITA [...] É inadmissível o enfrentamento da alegação acerca negativa da autoria delitiva, bem como de reconhecimento do tráfico privilegiado no presente momento, ante a necessária incursão probatória, incompatível com a via estreita do habeas corpus [...] (STJ, HC 647.903/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 20/04/2021, DJe 26/04/2021).

E este egrégio Tribunal não destoa:

HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADO PELA PRÁTICA EM TESE DO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES (ARTS. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06). PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PREENCHIDOS OS PRESSUPOSTOS DO ARTIGO 312 DO CPP. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. NECESSIDADE DA SEGREGAÇÃO PARA GARANTIA DA ORDEM...

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