Acórdão Nº 5067850-74.2022.8.24.0000 do Segunda Câmara de Direito Público, 28-03-2023

Número do processo5067850-74.2022.8.24.0000
Data28 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Instrumento Nº 5067850-74.2022.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA


AGRAVANTE: RUBENS SERGIO CZIECELSKI AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


Trata-se de agravo por instrumento interposto em causa própria por Rubens Sergio Cziecelski contra decisão proferida pelo juízo da Vara da Fazenda Pública, Acidentes do Trab. e Registros Púb. da Comarca de Rio do Sul, que, em ação civil pública por atos de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Estadual (autos n. 5001886-69.2022.8.24.0054), afastou as preliminares de ausência de interesse processual, carência de ação e inexistência de dolo frente à minuta do acordo de não persecução civil, bem como de decadência para a propositura da ação.
Em suas razões de insurgência, sustenta: a) os registros pontos anexados no evento 1 (ANEXOSPET11) demonstram inequivocadamente que o agravante desempenhou a função para o qual foi designado; b) não houve incorporação indevida de valores ao seu patrimônio, já que o cargo para o qual foi designado é de 35h semanais (Agente de Controle Interno), e o seu cargo de origem 20h semanais (Advogado), tendo recebido apenas a diferença alusiva ao período; c) pode ser alterada a carga horária do servidor, de forma excepcional e temporária, conforme permissivos legais; d) não houve má-fé ou dolo; e e) foi exaurido o prazo decadencial de 365 dias corridos para a conclusão do inquérito, hipótese de extinção do feito, nos termos do art. 487, II, do CPC.
Requereu a concessão de efeito suspensivo e, ao final, o provimento do recurso.
O pedido de efeito suspensivo foi indeferido (Evento 11, DESPADEC1).
O reclamo foi contra-arrazoado (Evento 19, PROMOÇÃO1-3).
O douto Procurador de Justiça Andreas Eisele opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 24, PROMOÇÃO1).
Este é o relatório

VOTO


1. Admissibilidade
Conheço do recurso, porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade previstos nos artigos 1015 e 1017 do CPC.
2. Agravo por instrumento
A decisão impugnada, que rejeitou as preliminares suscitadas, bem como a arguição de decurso do prazo decadencial, recebeu a inicial, com base nos seguintes fundamentos (Evento 23, DESPADEC1, autos originários):
"I. Preliminares de ausência de interesse processual, carência de ação e dolo para configurar condutas ímprobas ante a minuta de acordo de não persecução civil.
Os argumentos apresentados na petição inicial e as provas documentais acostadas possibilitam compreender quais as condutas praticadas por cada requerido para demonstrar indícios da prática de atos de improbidade administrativa que importaram em enriquecimento ilícito e causaram prejuízos aos cofres públicos quando, em conjunto, o requerido Marcionei realizou a nomeação do requerido Rubens para cargo de agente de controle interno por meio da Portaria n.467/17 que, além de aumentar a carga horária semanal, majorou os vencimentos com base no cargo público de advogado ocupado.
Os elementos probatórios apresentados e a descrição das condutas praticadas foram considerados, por este magistrado, como preenchedores da petição inicial, como determina o art.17, §6º, incisos I e II, da Lei n.8.429/92, conforme decisão lançada no Evento 3, diga-se irrecorrida pelos requeridos. E, por assim, estarem cumpridos os requisitos especiais da petição inicial, entendo inexistir carência de ação alegada pelo requerido Rubens por, como dito, o autor ministerial cumpriu as condições legais previstas no Código de Processo Civil, além dos requisitos da lei específica (Lei n.8.429/92).
A Lei n.8.429/92 dispõe claramente que a ação de improbidade administrativa será proposta pelo órgão ministerial (art.17, caput) e, se na investigação preliminar, avaliou existirem indícios de atos de improbidade administrativa praticados pelos requeridos Rubens e Marcionei com base em documentos e depoimentos, logo, nota-se o afastamento da alegação do requerido Rubens de ausência de interesse processual.
Consigna-se, ademais, que a proposta de acordo de não persecução civil ofertada pelo órgão ministerial ocorreu antes das alterações da Lei n.14.230/2021, qual promoveu significativas alterações, e, se terminada a investigação preliminar, o órgão ministerial propôs a ação judicial com tipificação diversa, não é causa de ausência de interesse processual porque, ao meu ver, a proposta encaminhada não vincula o enquadramento legal na propositura da demanda judicial e, também, com as modificações os atos investigados poderiam ser melhor enquadrados noutro dispositivo legal.
A ausência de dolo aventada como preliminar para importar na extinção da demanda por falta de interesse processual diante da consideração apontada exclusivamente para fins de acordo de não persecução civil não deve ser acolhida uma vez que o dolo é elemento subjetivo a caracterizar o ato de improbidade administrativa, sendo necessário para fins de tramitação, a presença de indícios, o que é o caso na demanda. A efetiva presença do dolo é condição que será melhor analisada e investigada como elemento de mérito.
Por todo exposto, a ação por ato de improbidade é modalidade adequada para investigação se os atos praticados pelos requeridos enquadram-se como ímprobos, devendo seguir a tramitação por estarem presentes os elementos e índicos mínimos para investigação dos atos imputados aos requeridos como infringentes da Lei de Improbidade Administrativa.
As preliminares de ausência de interesse processual, carência de ação e inexistência de dolo frente à minuta do acordo de não persecução civil alegadas pelo requerido Rubens devem ser REJEITADAS.
II.Decadência do inquérito civil.
Os requeridos Rubens e Marcionei alegam a ocorrência da decadência para propositura da ação por o inquérito civil extrapolar o prazo para conclusão introduzido pela Lei n.14.230/21 na Lei de Improbidade Administrativa com prorrogações excessivas, devendo ser extinto o processo com resolução de mérito por perder o órgão ministerial o poder investigatório sobre as condutas praticadas pelos agentes públicos.
A Lei n.14.230/2021 acresceu nova regra na Lei n.8.429/92, sobre o inquérito civil para investigação de atos violares da improbidade administrativa:
"Art. 23. A ação para a aplicação das sanções previstas nesta Lei prescreve em 8 (oito) anos, contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência. (...)
§2º O inquérito civil para apuração do ato de improbidade será concluído no prazo de 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias corridos, prorrogável uma única vez por igual período, mediante ato fundamentado submetido à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica.
§3º Encerrado o prazo previsto no § 2º deste artigo, a ação deverá ser proposta no prazo de 30 (trinta) dias, se não for caso de arquivamento do inquérito civil."
Em comentário acerca dos prazos previstos neste dispositivo, o doutrinador Marçal Justen Filho enfatiza:
"O prazo de trinta dias deve ser reputado como não peremptório. Não é cabível reputar que, decorridos esses trinta dias, tornar-se-ia vedado o exercício do direito de ação. Essa interpretação é incompatível com a regra do caput do art. 23, que fixa prazo prescricional de oito anos. (...)
Logo, deve-se reputar que o referido prazo apresenta uma natureza administrativa. Há um dever administrativo de o órgão ministerial ajuizar a ação no prazo de trinta dias, depois de completado o limite temporal para a conclusão do inquérito civil. (...)
As considerações anteriores conduzem também à conclusão de que o prazo previsto para a conclusão do inquérito administrativo apresenta natureza administrativa. Não há cabimento em determinar que, decorrido o prazo de trezentos e sessenta cinco dias (ou do seu dobro, em caso de prorrogação), o inquérito civil estaria automaticamente extinto.
É perfeitamente cabível que o prazo referido seja insuficiente para a apuração dos fatos pertinentes. Se e enquanto não estiver consumada a prescrição, é cabível o desenvolvimento de atividade investigativa. Seria um despropósito argumentar que o inquérito seria encerrado automaticamente decorrido o prazo limite, mas o prazo prescricional somente se aperfeiçoaria depois de decorridos oito anos." (in Reforma da Lei de Improbidade Administrativa: Comentada e Comparada 1ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2022, p.253 - sem grifo no original).
No caso em apreço, o inquérito civil n.06.2018.00002377-4 foi instaurado em 17.4.2018 (Evento 1 - Anexos 2, pp.1/4) e prorrogado por despacho do órgão ministerial em 26.4.2019 (Evento 1 - Anexos 5, p.1), em 2.5.2020 (Evento 1 - Anexos 30, pp.1/4) e em 17.6.2021 (Evento 1 - Anexos 71, pp.1/6), sendo que a ação judicial foi protocolada em 1.2.2022. Como assinalado acima da doutrina, é inviável a aplicação do prazo de conclusão do inquérito civil como causa de extinção da demanda judicial nesta situação.
Isso porque o inquérito iniciou antes da vigência das alterações trazidas pela Lei n.14.230/2021, qual entrou em vigor em 25.10.2021 (art.5º), e a ação foi proposta quase 4 meses após a alteração legislativa indicada. Além do mais, o inquérito civil é procedimento facultativo previsto à disposição do Ministério Público para investigação dos ilícitos praticados (art.22 da Lei n.8.429/92). Desta forma, a preliminar de decadência arguida pelos requeridos Rubens e Marcionei deve ser AFASTADA.
III.Prosseguimento da demanda.
A Lei de Improbidade Administrativa - Lei n.8.429/92, com as alterações da Lei n.14.230/21, prevê quanto ao procedimento da ação judicial: "Art.17. (...) §10-C. Após a réplica do Ministério Público, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal...

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