Acórdão Nº 5069726-63.2020.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Público, 05-10-2021

Número do processo5069726-63.2020.8.24.0023
Data05 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5069726-63.2020.8.24.0023/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5069726-63.2020.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FERNANDO BOLLER

APELANTE: FELIPE BUZZI SPERDUTTI (AUTOR) APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuidam-se de apelações simultaneamente interpostas, de um lado por Felipe Buzzi Sperdutti, e de outro por Estado de Santa Catarina, em objeção à sentença prolatada pelo magistrado João Batista da Cunha Ocampo Moré - Juiz de Direito titular da Vara de Direito Militar da comarca da Capital -, que na Ação Declaratória n. 5069726-63.2020.8.24.0023, decidiu a lide nos seguintes termos:

Trata-se de "Ação de Procedimento Comum Cível" ajuizada por FELIPE BUZZI SPERDUTTI em face do ESTADO DE SANTA CATARINA.

[...]

No caso em apreço, busca o autor a anulação da questão 23 da prova objetiva aplicada no certame público para ingresso no Curso de Formação de Cabos da Polícia Militar de Santa Catarina, regido pelo Edital 056/DIE/2019.

[...]

O autor alega que "o Art. 169 citado por tal assertiva não tipifica aquela conduta, e que tal conduta é tipificada por Resolução do CONTRAN 453, que não está prevista no edital 056/DIE/2019" e conclui que o gabarito da banca (letra B) não só considerou como certa uma assertiva errada, como a referida Resolução não se encontra listada no conteúdo programático.

Contudo, percebe-se que a matéria cobrada na questão está prevista no Manual Brasileiro de Fiscalização (Resoluções n. 371 e 561 do CONTRAN e as suas posteriores alterações), listadas no anexo II do Edital n. 056/DIE/PMSC/2019, ou seja, não houve divergência entre o conteúdo previsto no instrumento editalício e o cobrado na prova objetiva em apreço.

Também não se constata flagrante teratologia da simples leitura da questão. Vale frisar que a interpretação errônea da questão pelo candidato não é motivo para anulá-la, sobretudo porque redigida de forma inteligível e nos limites do conteúdo programático constante do edital.

Nesse ponto, destaca-se a fundamentação do Des. Ronei Danielli em caso análogo, que entendeu que os anexos atualizados das Resoluções do CONTRAN estavam previstos no edital do certame, verbis:

Num primeiro momento, a tese de fuga do edital parece robusta, entretanto, consoante alegado pela autoridade coatora em sua manifestação, a informação sobre a configuração da infração de trânsito do art. 169 do CTB, quando da direção de motocicleta sem viseira consta no volume I do anexo I da Resolução n. 371/2010 do CONTRAN (Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito), diploma este previsto no instrumento convocatório. [...]. Considerando que nos anexos da versão atualizada do referido manual, há sim a hipótese de infração a que faz referência a questão n. 23, não se verifica a ilegalidade apontada" (AI n.5004446-54.2019.8.24.0000/SC, j. 11/11/2019).

Cumpre dizer que o Tribunal de Justiça vem adotando como razão de decidir os argumentos do ilustre Desembargador Ronei Danielli para rechaçar a anulação da questão 23, razão pela qual se filia este juízo também ao posicionamento da Corte Catarinense.

Ante o exposto, JULGAM-SE PROCEDENTES os pedidos formulados por FELIPE BUZZI SPERDUTTI.

Condena-se a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios em favor da parte contrária, estes fixados no montante de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), à luz do art. 85, §§2º e 8º, CPC.

Malcontente, Felipe Buzzi Sperdutti aduz que:

11. Assim, uma vez que o Poder Judiciário pode intervir em questões de concursos, quando houver ilegalidade ou "fuga de edital", é que o Recorrente vem através desta argumentar o motivo da ilegalidade da questão 23.

12. A questão 23 deve ser anulada, por não possuir resposta correta a ser assinalada, ela assim previa:

[...]

13. Há erro material no item IV da referida questão, pois há a afirmação de que a ação de conduzir motocicleta utilizando capacete com película na viseira de proteção é infração de trânsito capitulada no art. 169 do CTB, sendo que tal item foi considerado correto porque o gabarito fornecido pela banca foi de que "Todas as afirmações estão corretas".

14. Todavia, tal assertiva está errada. Isso porque, tal infração, de forma alguma se encaixa na capitulação do artigo mencionado, que é bastante abrangente e serve para punir condutas relacionadas à desatenção do condutor com a segurança do trânsito, desde que para a conduta específica praticada não exista enquadramento específico. Esta é, inclusive, a orientação contida no Volume I do Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, legislação prevista no conteúdo programático do certame.

15. Nesse sentido, o próprio Manual prevê que o enquadramento correto para o "condutor que dirige motocicleta, motoneta, ciclomotor, triciclo motorizado de cabine aberta e quadriciclo motorizado com viseira ou óculos de proteção em desacordo com o estabelecido pelo Contran" é a infração capitulada no artigo 244, I, do CTB.

16. No caso presente, como sequer havia alternativa que pudesse ser considerada correta levando em conta a incorreção do item IV, não há dúvidas de que a questão merece ser anulada.

17. Em referida questão a banca examinadora indicou como certa a assertiva "B" (todas as afirmações estão corretas). Entretanto, a infração disposta no item IV da questão não se encaixa na capitulação do artigo nele mencionado. O art. 169 do CTB serve para punir condutas relacionadas à desatenção do condutor com a segurança do trânsito, desde que para a conduta específica praticada não exista enquadramento específico. Citou-se no decisum: "Esta é, inclusive, a orientação contida no Volume I do Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, legislação prevista no conteúdo programático do certame".

18. Aliás, o próprio Manual referido prevê que o enquadramento correto para o "condutor que dirige motocicleta, motoneta, ciclomotor, triciclo motorizado de cabine aberta e quadriciclo motorizado com viseira ou óculos de proteção em desacordo com o estabelecido pelo Contran" é a infração capitulada no art. 244, I, do CTB.

19. Logo, nem a assertiva "B" e nem uma outra poderiam ser assinaladas pelo candidato como corretas.

20. Na espécie, ficou demonstrado o erro material na aplicação da prova objetiva, na questão 23, ante nenhuma assertiva que pudesse ser assinalada. Tal circunstância viola a isonomia dos candidatos e indica flagrante ilegalidade na interpretação proposta.

Nestes termos, clama pelo conhecimento e provimento do apelo.

Já o Estado de Santa Catarina, a seu turno, argumenta que:

A doutrina e a jurisprudência já consolidaram o entendimento de que a intervenção do Poder Judiciário em concursos públicos e processos de seleção em geral está limitada ao exame da legalidade, sendo vedada qualquer outra interferência, em especial para aferir critérios de avaliação ou, de forma direta ou indireta, substituir a própria banca examinadora.

No caso dos autos não houve nenhuma ilegalidade quanto ao posicionamento da banca. O que a parte recorrida realmente deseja com a presente demanda é rever os critérios utilizados pela banca na correção das questões, pretensão essa que não pode prosperar.

[...]

Portanto, não sendo caso de violação à literal disposição de lei ou de exigência não prevista no edital, não pode o Poder Judiciário interferir nos critérios de avaliação da Banca Examinadora.

Ipsis verbis, brada pelo conhecimento e provimento do recurso.

Embora regularmente intimadas, ambas as partes deixaram fluir in albis o prazo para contrarrazões.

Em Parecer do Procurador de Justiça Newton Henrique Trennepohl, o Ministério Público opinou pelo não conhecimento da insurgência interposta pelo Estado, e pelo conhecimento e desprovimento do recurso contraposto por Felipe Buzzi Sperdutti.

Em apertada síntese, é o relatório.

VOTO

Ab initio, consoante bem observou o Procurador de Justiça Newton Henrique Trennepohl, revela-se evidente o erro...

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