Acórdão Nº 5075599-44.2020.8.24.0023 do Quarta Câmara de Direito Público, 11-08-2022

Número do processo5075599-44.2020.8.24.0023
Data11 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5075599-44.2020.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: SUPERMERCADO WKAMP LTDA (IMPETRANTE) APELANTE: SUPERMERCADO WKAMP LTDA - EPP (IMPETRANTE) APELANTE: SUPERMERCADO WKAMP LTDA - EPP (IMPETRANTE) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - ESTADO DE SANTA CATARINA - FLORIANÓPOLIS (IMPETRADO)

RELATÓRIO

Na comarca da Capital, Supermercado Wkamp Ltda impetrou mandado de segurança contra ato atribuído ao Diretor de Administração Tributária do Estado de Santa Catarina.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença (Evento 8):

SUPERMERCADO WKAMP LTDA - EPP (matriz e filiais) impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato administrativo atribuído ao DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, vinculado à SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA DE SANTA CATARINA, requerendo o seguinte:

a) conceder a tutela de evidência, determinando que as Autoridades Coatoras se abstenham de obrigar as Impetrantes de incluir o ICMS na base de cálculo do próprio ICMS.

[...]

c) julgar procedente o presente mandado de segurança para declarar a inconstitucionalidade e a ilegalidade da determinação de inclusão, na base de cálculo da do ICMS, dos valores referente ao próprio ICMS, por afronta aos artigos Art. 145, parágrafo 1 e parágrafo 5º do artigo 150, ambos da Constituição Federal.

d) com a procedência do mandado de segurança, declarar o direito das Impetrantes em efetuar a compensação ou restituição dos valores indevidamente recolhidos nos 05 (cinco) anos anteriores ao ajuizamento da ação, bem como aqueles recolhidos no curso da demanda e enquanto a Impetrante realizar operações mercantis que lhe imponham essa obrigação e que dela fizer uso e puder se beneficiar durante o exercício de sua atividade, valendo-se dos mesmos índices de correção adotados pela Fazenda Nacional para cobrança de seus créditos (Selic) (e.1).

É o relatório.

A inicial foi indeferida nos seguintes termos (Evento 8, 1G):

Ante o exposto, INDEFIRO a petição inicial e, por via de consequência, JULGO EXTINTO o processo sem resolução do mérito, à míngua de direito líquido e certo, o que faço com fundamento no art. 10 da Lei nº 12.016/2009 c/c art. 485, I do CPC e art. 5º, LXIX, da CF, c/c Súmula 266/STF e Tema 430/STJ.

CONDENO a parte impetrante somente ao pagamento da taxa de serviços judiciais (CPC, art. 82, caput).

Sem honorários advocatícios (Lei nº 12.016/2009, art. 25).

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Certificado o trânsito em julgado e observadas as formalidades legais, ARQUIVEM-SE os autos definitivamente.

Irresignado, Supermercado Wkamp Ltda recorreu. Argumentou que a) o mandado de segurança é a via eleita adequada para discussão da matéria, porquanto não se trata de discussão de lei em tese; b) a cobrança do ICMS com a inclusão do próprio tributo em sua base de cálculo ("cálculo por dentro") é inconstitucional e afronta princípios constitucionais tributários; e c) o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 574.706 (Tema 69) deve ser observado (Evento 19, 1G).

Com contrarrazões (Evento 25, 1G), os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 7).

É o relatório.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, porquanto tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade.

Recebo-o em seus efeitos legais.

A Carta Magna do Brasil, em seu artigo 5º, LXIX, confere ao mandado de segurança status de garantia fundamental, sendo que sua impetração busca evitar ou interromper ilegalidade ou abuso de poder perpetrado por autoridade pública - termos replicados no artigo 1º da Lei Nacional n. 12.016/2009, a qual procedimentaliza o manejo do remédio constitucional.

Conforme preconizam os dispositivos legais mencionados:

Art. 5º, CF. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

Art. 1o , Lei n. 12.016/2009. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

Sobre os pressupostos do mandamus, leciona Enrico Francavilla:

A garantia do mandado de segurança e toda a sua eficiência dependem de liquidez e certeza do direito. Não é por outra razão que a lei tira o rigor do rito para colocá-lo na capacidade de provar. O direito só poderá ser certo se o quadro dos fatos sobre o qual deve incidir mostrar-se claro e comprovado para o julgador da segurança.

No mandado de segurança não cabem fases probatórias decisivas para a produção da prova oral e da prova técnica. A instrução se concentra no ato da impetração, como que unindo as fases postulatória e instrutória em uma só, para usar a classificação comum a toda doutrina sobre as etapas do processo e sobre a divisão ordinária da sequência entre pedir e provar (VILLA, E. F. MANDADO DE SEGURANCA. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017).

Complementando, é dos ensinamentos de José Miguel Garcia Medina e Fábio Caldas de Araújo:

O mandado de segurança é ação civil que constitui uma garantia constitucional individual e coletiva para a tutela dos direitos fundamentais relativo às liberdades públicas albergadas pelo art. 5.º da CF/1988. Seu manejo está indissociavelmente atrelado ao status activus processualis e é manifestação do direito de resistência do cidadão contra os atos ilegais e abusivos praticado pelo poder público (Mandado de segurança individual e coletivo [livro eletrônico] : comentários à Lei 12.016/2009 / José Miguel Garcia Medina, Fábio Caldas de Araújo. -- 2. ed. rev., atual. e ampl. -- São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2021).

Delineada assim a questão, a despeito de apontar ilegalidades na forma em que a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é realizada pelo Estado de Santa Catarina, o remédio constitucional sub examine visa reconhecer o direito da impetrante em "efetuar a compensação ou restituição dos valores indevidamente recolhidos nos 05 (cinco) anos anteriores ao ajuizamento da ação, bem como aqueles recolhidos no curso da demanda" (Evento 1, p. 14, 1G).

Em outras palavras, a alegada inconstitucionalidade da cobrança não é o pedido principal do mandamus, mas se afigura como a própria causa de pedir e não objetiva discutir a lei em tese.

Desta feita, destaco que o reclamo comporta provimento no tópico, pois não há falar em inadequação da via eleita, eis que nos termos da jurisprudência catarinense:

"Não se sujeita ao embargo do enunciado da Súmula 266, do Supremo Tribunal Federal, o mandado de segurança que, em caráter preventivo, busca neutralizar os efeitos concretos da aplicação da lei tributária. [...]" (TJSC, Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2009.012198-5, de Criciúma, rel. Des. Newton Janke, j. 09-02-2010). (TJSC, Apelação Cível n. 0301966-55.2016.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 22-08-2019).

Por tais razões, cumpridos os pressupostos legais, o recebimento do petitório inaugural é medida impositiva.

A controvérsia, ademais, cinge-se tão somente sobre matéria jurídica, condição que, com base na teoria da causa madura, possibilita o julgamento do mérito neste grau jurisdicional.

Ex vi do artigo 1.013, §3º, I, do Código de Processo Civil:

Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.[...]

§ 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485;

De acordo com os ensinamentos de Angélica Arruda Alvim, Araken de Assis e Eduardo Arruda Alvim:

O art. 1.013 trata também da "possibilidade de julgamento de mérito pelo tribunal, independentemente de reenvio dos autos à primeira instância nos seus verdadeiramente didáticos §§ 3º e 4º. Com isso, ganha-se em celeridade, eficiência, economia processual e segurança jurídica. (ALVIM, A. A.; ALVIM, A. A.; ASSIS, A. D.; ALVIM, E. A. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017)

Os doutrinadores Lenio Luiz Streck, Alexandre Reis Siqueira Freire, Dierle Jose Coelho Nunes e Leonardo Jose Ribeiro Coutinho Cunha complementam:

O CPC/2015 ampliou as hipóteses em que o tribunal poderá diretamente examinar o mérito da causa. É o que prescrevia o art. 515, §3º, do CPC/73, que possibilitava o julgamento pelo tribunal diante de sentenças terminativas (CPC/1973, art. 267) que tratavam de "matéria exclusivamente de direito" e que simultaneamente estivessem "maduras" para apreciação. A nova regra processual possibilita o julgamento diretamente pelo tribunal quando a causa estiver em "condições de imediato julgamento". Isso amplia o alcance do dispositivo, já que não se limita à "matéria exclusivamente de direito". Dessa forma, o CPC/2015 previu o julgamento da causa diretamente pelo tribunal quando, além da hipótese da reforma da sentença que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, a decisão decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir [...] (FREIRE, A. R. S.; NUNES, D. J. C...

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