Acórdão Nº 5078736-34.2020.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 11-03-2021

Número do processo5078736-34.2020.8.24.0023
Data11 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 5078736-34.2020.8.24.0023/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA


AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: DARLAN SOUZA DE OLIVEIRA (AGRAVADO)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de agravo em execução penal interposto pelo Ministério Público do Estado, contra decisão de proferida no processo de execução criminal 00055450920198240045, por meio da qual o juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Florianópolis readequou a fração referente a progressão de regime de DARLAN SOUZA DE OLIVEIRA para efeito de progressão de regime, estabelecendo a necessidade de resgate de 2/5 da reprimenda imposta por crimes hediondos, muito embora reconhecida a reincidência.
Em suas razões, o agravante requer a reforma da decisão. Argumenta que as alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19 não modificaram os parâmetros para progressão de regime, de modo o apenado, não reincidente específico, deverá resgatar 60% (3/5) da sua condenação pela prática de crime hediondo ou equiparado, a fim de ser transferido para regime menos rigoroso, consoante interpretação do art. 112, VII, da Lei n. 7.210/84, incluído pela Lei n. 13964/19 (eventos 1 e 7).
Apresentadas às contrarrazões (evento 10) e mantida a decisão objurgada (evento 12), os autos ascenderam à esta Corte.
Com vista, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo(a) Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, posicionou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 10).
É o relato do necessário

VOTO


Infere-se do presente recurso e também dos autos principais que o Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Florianópolis, Dra. Paula Botke e Silva, na decisão atacada, entendeu pela existência de lei penal mais benéfica em decorrência da vigência da Lei n. 13.964/19, retificando o cálculo de benefícios ao agravado nos seguintes termos:
Trata-se de processo de execução criminal em que figura como reeducando DARLAN SOUZA DE OLIVEIRA, em que foi formulado pedido de adequação da fração para fins de progressão de regime, por conta da superveniência de lei penal mais benéfica ao sentenciado, a saber, a Lei n.º 13.964/19 (Evento 54).
Instado, o Ministério Público opinou no Evento 59.
Vieram-me os autos conclusos.
Fundamento e decido.
Analisando-se detidamente o caderno processual, verifico que o reeducando fora condenado, nos autos n.º 0000310-95.2018.8.24.0045 que tramitou na 1ª Vara Criminal da Comarca de Palhoça, à pena corporal de 22 (vinte e dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão, por infração aos art. 121, §2º, I, III e IV, e art. 211, ambos do Código Penal, sendo reconhecida durante a dosimetria de sua pena a agravante da reincidência (art. 61, I, do Código Penal), vez que o apenado possuía uma condenação transitada em julgado, advinda dos autos n.º 0003503-65.2011.8.24.0045.
Assim, nos termos do art. 2º, §2º, da Lei n.º 8.072/90, com a redação dada pela Lei n.º 11.464/07, para fins de progressão, o apenado deveria cumprir 3/5 (três quintos) da pena, eis que reincidente em crime doloso e registra condenação pela prática de crime hediondo praticado depois da vigência da Lei n.º 11.464/07.
Ocorre que, em 23 de janeiro de 2020, entrou em vigência a Lei nº 13.964/19, a qual revogou aquele dispositivo, passando a progressão de regime a ser regulada exclusivamente pelo art. 112 da Lei de Execução Penal, o qual prevê:
[...]
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
[...]
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
Em outras palavras, tem-se que, para fins de progressão, os condenados pela prática de crime hediondo ou equiparado, acaso primários em delitos desta espécie, devem cumprir 40% (quarenta por cento - o que corresponderia a 2/5 na antiga previsão) da pena, enquanto os que ostentarem reincidência específica devem cumprir 60 % (sessenta por cento - o que corresponderia a 3/5 na antiga previsão).
Desse panorama, verifica-se que a simples reincidência não detém o cunho de agravar a fração de cumprimento da pena, devendo, pois, incidir a reincidência em crimes da mesma natureza.
Do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. INSURGÊNCIA DA DEFESA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE PROGRESSÃO DE REGIME EM RAZÃO DO NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO OBJETIVO. PARCIAL ACOLHIMENTO. NECESSIDADE DE CUMPRIMENTO DE 40% DA PENA QUANTO AO CRIME HEDIONDO E DE 16% EM RELAÇÃO AO COMUM. APLICAÇÃO DA LEI N. 13.964/2019 "NOVATIO LEGIS IN MELLIUS" CASUÍSTICA. NECESSIDADE, CONTUDO, DE NOVO CÁLCULO COM BASE NOS PARÂMETROS MENCIONADOS, E ANÁLISE DO IMPLEMENTO DO REQUISITO SUBJETIVO NA ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 0000433-61.2020.8.24.0033, de Itajaí, rel. Des. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. 07-07-2020).
Do corpo do acórdão extrai-se:
"Frisa-se que, anteriormente, não havia especificação quanto à reincidência (genérica ou específica), tal como ocorre na nova redação, de modo que, a depender das circunstâncias do caso concreto, para fins de cálculo de progressão de regime, aplicar-se-á integralmente o regramento mais benéfico ao réu (Lei n. 13.964/19 ou a redação anterior).
"Diz-se isso porque "não é permitido ao magistrado, diante de conflito de leis no tempo, mesclar as partes benéficas de cada norma, criando uma terceira, não prevista pelo legislador; a avaliação da lex mitior acontece casuisticamente, a fim de que, a depender do resultado da aplicação na íntegra de uma ou outra, se decida pela ultra-atividade da lei revogada ou a retroatividade da lei nova. [grifei]"
Neste diapasão, inafastável o direito individual fundamental ínsito no art. 5º, XL, da Constituição Federal, prevendo que: "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu". Desta forma, evidente a ressalva constitucional de sentido negativo na qual se verifica que, quando mais benigna a nova lei, possível a sua aplicação em benefício do cumpridor da pena.
Entende Luiz Luisi que:
"A atual Constituição brasileira merece encômios por ter disposto de forma clara a retroatividade quando beneficia ao réu. Isto importa que sempre a lei penal retroage quando em favor do réu, ainda quando haja sentença com trânsito em julgado. Ao contrário da legislação penal peninsular, a nossa lei penal, por abarcar todas as hipóteses possíveis consagra que mesmo no caso de uma sucessão de leis, se aplica dentre elas a mais favorável, mesmo quando tenha havido condenação definitiva." (in Os princípios constitucionais penais, 2. ed., Sérgio Antônio Fabris Editor, pg. 29)
Por outro lado, sedimentando junto à legislação ordinária, preceitua o art. 2º do Código Penal que:
"Art. 2.º Ninguém pode ser punido por fato que a lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos da sentença condenatória.
Parágrafo Único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado."
Com efeito, conforme se depreende do caderno processual, bem assim analisando-se a vida pregressa do apenado, consoante supra mencionado, este possuía uma condenação transitada em julgado, a saber: autos n.º 0003503-65.2011.8.24.0045 (por infração aos art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06 e art. 16, caput, Lei 10.826/03), em que restou condenado ao cumprimento da pena de 07 (sete) anos e 02 (dois) meses de reclusão, em regime inicialmente fechado.
Registra-se que apesar de a certidão de antecedentes criminais constante dos autos primários fazer referência à infração do art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06 (pág. 782 daqueles autos), a condenação imposta nos autos n.º 0003503-65.2011.8.24.0045, que serviu de base para o reconhecimento da reincidência, diz respeito à figura do tráfico privilegiado, pois o julgador reconheceu a aplicação da causa especial de diminuição da pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n.º 11.343/06, conforme cópia do decisum acostado no Evento 61.
Outrossim, há que se ponderar que a prática do delito previsto no art. 16, caput, da Lei n.º 10.826/03 se deu à época em que ainda não revestia-se de hediondez, isto é, em meados de 2011, visto que a superveniência da normativa gravosa ocorreu em 26/10/2017, com o advento da Lei n.º 13.497/2017.
Então, tendo em vista que a condenação anterior que deu origem ao reconhecimento da reincidência diz respeito a conduta que não possui natureza de crime equiparado a hediondo, faz-se necessária in casu a readequação da fração para obtenção da progressão de regime para 2/5 (dois quintos - equivalente a 40% - quarenta por cento - na nova nova previsão) .
A propósito: "O tráfico de entorpecentes privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.313/2006) não se harmoniza com a hediondez do tráfico de entorpecentes definido no caput e § 1º do art. 33 da Lei de Tóxicos. 2. O tratamento penal dirigido ao delito cometido sob o manto do privilégio apresenta contornos mais benignos, menos gravosos, notadamente porque são relevados o envolvimento ocasional do agente com o delito, a não reincidência, a ausência de maus antecedentes e a inexistência de vínculo com organização criminosa" (STF; Habeas Corpus n.º 118533, Rel. Mina. Carmen Lúcia, Tribunal Pleno, j. em 23/06/2016).
Diante do exposto, procedo à readequação da fração referente a progressão de regime para 2/5 (dois quintos) de cumprimento da pena referente à condenação do crime previsto no art. 121, §2º, I, III e IV, imposta nos autos n.º 0000310-95.2018.8.24.0045 (presente PEC).
Diante da readequação, a nova previsão de preenchimento do requisito objetivo para a progressão ao regime semiaberto fica estabelecida para o dia 11/09/2026, conforme cálculo anexo (ev. 63).
Logo de início, urge...

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