Acórdão Nº 5078991-55.2021.8.24.0023 do Segunda Câmara Criminal, 19-04-2022

Número do processo5078991-55.2021.8.24.0023
Data19 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5078991-55.2021.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

AGRAVANTE: MAICON DE OLIVEIRA JANUARIO (AGRAVANTE) ADVOGADO: ANGELA CONCEICAO MARCONDES (OAB sc031700) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de agravo de execução penal intentado por Maicon de Oliveira Januário, não conformado com o teor da decisão do Sequencial do PEP 0016681-93.2010.8.24.0020 (SEEU), por meio da qual o Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de São José homologou Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) no qual foi reconhecida a prática de falta grave, decretou a regressão do regime semiaberto para o fechado, revogou 1/3 dos dias remidos e alterou a data-base para a fruição de futuros direitos.

Informa o Agravante que cumpriu mais de 17 anos de sua pena, "sem nenhuma falta de natureza grave que pudesse interferir em benefícios, tanto que progrediu para o regime semiaberto" e, no dia 5.10.20, evadiu-se do estabelecimento prisional, sendo recapturado em 24.5.21.

Alega que "possui bom comportamento carcerário, já foi beneficiado por diversas vezes com saídas temporárias, sempre retornando no prazo previsto", e que, "não fossem os problemas de saúde de sua mulher, que não tinha notícias desde que iniciou o momento pandêmico, jamais cometeria tal fato definido como falta grave", pois "conhecia sua situação prisional, ou seja, estava próximo de adquirir o direito a progressão para o regime aberto".

Pondera que "o reconhecimento da falta neste caso não é medida proporcional e razoável, pois as justificativas apresentadas foram suficientes e plausíveis", e que "o estabelecimento de uma nova data-base para requerer novos benefícios é punição suficiente para reprovar o ato praticado".

Aponta que, "observados os critérios de necessidade, utilidade, razoabilidade e proporcionalidade", "não há a necessidade de regressão de regime para reprovar o ato praticado".

Sob tais argumentos, requer "que seja mantido o regime semiaberto [...] bem como o estabelecimento de uma nova data-base para a obtenção de novos benefícios" (eproc1G, Evento 1, doc1).

O Doutor Juiz de Direito manteve a decisão resistida (eproc1G, Evento 8).

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (eproc1G, Evento 14).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pela Excelentíssima Procuradora de Justiça Cristiane Rosália Maestri Böell, manifestou-se pela anulação da decisão resistida, "determinando-se o retorno dos autos ao juízo singular, para adoção de providências acerca da oitiva do apenado, conforme previsto no art. 118, §2º, da Lei de Execução Penal", ou, acaso assim não entendido, pelo desprovimento do agravo (eproc2G, Evento 5).

VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

1. Contra o Agravante Maicon de Oliveira Januário foi instaurado o PAD 127/2021 da Colônia Penal Agrícola de Palhoça, imputando-lhe a prática da falta grave prevista no art. 50, II, da Lei de Execução Penal, porque, no dia 5.10.20, empreendeu fuga da unidade prisional, vindo a ser recapturado em 25.5.21.

Durante o trâmite do PAD, o Agravante foi ouvido na presença de Excelentíssima Advogada constituída, a qual apresentou defesa escrita, e o Conselho Disciplinar exarou parecer pelo reconhecimento de falta grave, que foi acolhido pelo Administrador da unidade prisional e, assim, foi julgado procedente o PAD para reconhecer a ocorrência da infração disciplinar tipificada no art. 50, II, da Lei de Execução Penal (SEEU, Sequencial 44).

Na fase judicial, após manifestação das Partes (SEEU, Sequenciais 47 e 52), o Magistrado de Primeiro Grau homologou o PAD e aplicou as sanções de sua competência (SEEU, Sequencial 54).

Conforme ponderou a Excelentíssima Procuradora de Justiça Cristiane Rosália Maestri Böell, a decisão está eivada de nulidade.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que é dispensável nova oitiva do apenado quando ela ocorreu no PAD, reserva-se aos casos em que não há regressão de regime.

Por outro lado, "a matéria em discussão está pacificada no âmbito das Turmas criminais que compõem a Terceira Seção deste Superior Tribunal, no sentido de que é imprescindível, para a regressão definitiva de regime carcerário, a prévia oitiva do apenado em juízo" (AgRg no HC 502.016, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 28.5.19).

Da Quinta Turma:

Por fim, esta Corte possui orientação no sentido de ser desnecessária a realização de audiência de justificação para homologação de falta grave, se ocorreu a apuração da falta disciplinar em regular procedimento administrativo, no qual foi assegurado, ao reeducando, o contraditório e ampla defesa, inclusive com a participação da defesa técnica (HC n. 333.233/SP, Rel. Ministro Félix Fischer, Quinta Turma, DJe 6/11/2015). Ressalte-se, por oportuno, que o artigo 118 da LEP exige a oitiva prévia do apenado apenas nos casos de regressão definitiva de regime prisional, o que não é a hipótese dos autos, porquanto não houve regressão do sentenciado a regime mais gravoso. Precedentes (AgRg no HC 693.599, Rel. Min. Felix Fischer, j. 28.9.21).

Da Sexta Turma:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE. REGRESSÃO DE REGIME. AUSÊNCIA DE OITIVA JUDICIAL DO APENADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. 1. Esta Corte já se manifestou no sentido de que, "nos termos do art. 118, § 2º, da Lei de Execução Penal, é imprescindível, para a regressão definitiva de regime carcerário, a prévia oitiva do apenado em juízo, sob pena de nulidade" (HC n. 407.808/SP, relatora a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe de 13/10/2017). 2. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no HC 651.089, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 24.8.21).

Semelhante posicionamento é adotado pacificamente por este Tribunal de Justiça, vide Recursos de Agravo 0011978-65.2019.8.24.0033, Primeira Câmara Criminal, Rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. 20.2.20; 0000953-21.2020.8.24.0033, Segunda Câmara Criminal, deste relator, j. 15.9.20; 0001741-65.2020.8.24.0023, Terceira Câmara Criminal, Rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 15.9.20; 0000435-64.2020.8.24.0022, Quarta Câmara Criminal, Rel. Des. Alexandre d'Ivanenko, j. 17.9.20 e 0000915-13.2020.8.24.0064, Quinta Câmara Criminal, Rel. Des. Antônio Zoldan da Veiga, j. 10.9.20.

Não é o caso, entretanto, de anulação integral da decisão resistida; a eiva deve ser reconhecida somente no ponto em que decretou a regressão definitiva do regime prisional sem antes oportunizar a oitiva do Agravante.

Isso porque nenhuma mácula há quanto à aplicação das demais sanções, para as quais a renovação da oitiva em Juízo é dispensável (STJ, AgRg no REsp 1.753.692, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 28.3.19; REsp 1.765.936, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 21.3.19; HC 498.827, Rel. Min. Félix Fischer, j. 14.5.19; e AgRg no REsp 1.704.696, Rel. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 8.2.18).

Se a regressão de regime é o fator determinante para a anulação da decisão, enquanto o procedimento para aplicação das demais sanções encontra-se correto, somente quanto àquela pena é que há de ser refeito o ato judicial.

A decisão é, inegavelmente, um ato processual. É ato complexo caso destine-se a pôr fim a uma acumulação de pedidos independentes, como neste caso, pois ela homologou o PAD que reconheceu a prática de falta grave; revogou dias remidos; alterou a data-base para fruição de futuros benefícios; e decretou a regressão de regime prisional. A acumulação de pedidos corresponde a uma acumulação de ações, que atende aos fins da economia processual e da razoável duração do processo. Constatado vício insanável quanto a um dos pedidos, que não é sucessivo, eventual ou acessório, mas independente dos demais, não é viável, então, anular toda a decisão, senão apenas a parte contaminada.

Renato Brasileiro de Lima, ao tratar do art. 573 do Código de Processo Penal, esclarece, quanto ao seu § 1º, que, por força do princípio da causalidade (efeito expansivo), "também conhecido como princípio da extensão, da sequencialidade, da contaminação ou da consequencialidade, a nulidade de um ato provoca a invalidação dos atos que lhe forem consequência ou decorrência". Contudo, ao cuidar do § 2º da norma, aclara:

Princípio da conservação dos atos processuais (confinamento da nulidade): funciona como o reverso do princípio da causalidade. Por força do princípio da conservação dos atos processuais, deve ser preservada a validade dos atos processuais que não dependam de ato anterior declarado inválido. Este princípio consta expressamente do art. 281, in fine, do novo Código de Processo Civil, que prevê que, anulado o ato, consideram-se de nenhum efeito todos os subsequentes que dele dependam, todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras que dela sejam independentes. Ilustrativamente, imagine-se que, por ocasião do julgamento de apelação interposta contra sentença condenatória, conclua o Tribunal que o regime inicial de cumprimento da pena fixado pelo juízo a quo não tenha sido devidamente fundamentado. Se a falta de fundamentação se deu exclusivamente no tocante à fixação do regime, não há por que se declarar a ineficácia integral da decisão impugnada. Logo, deverá o Tribunal anular a sentença apenas parcialmente, determinando-se o suprimento do ponto omisso. Como se percebe, este princípio da conservação dos atos processuais aplica-se aos atos complexos. Portanto, a parte inválida de determinado ato processual não prejudica as outras partes válidas do mesmo ato. Essa regra, todavia, não se aplica à sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, que é indivisível em face da concentração e incomunicabilidade dos jurados. Exemplificando, se acaso determinado objeto que não estava nos autos venha a ser exibido aos jurados, contrariando a regra da juntada prévia de 3 (três)...

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