Acórdão Nº 5083775-41.2022.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 01-09-2022

Número do processo5083775-41.2022.8.24.0023
Data01 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5083775-41.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

AGRAVANTE: ANDREI LAPA BRISOLA (AGRAVANTE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Na comarca da capital, o apenado Andrei Lapa Brisola interpôs recurso de agravo em execução penal contra decisão da Vara de Execuções Penais que, nos autos do Processo de Execução da Pena de Multa (PEPM) n. 5002750-40.2021.8.24.0023, rejeitou a exceção de pré-executividade oposta pelo reeducando (autos do PEPM, doc. 25).

O agravante alegou, em síntese, que "o Ministério Público, quando ajuizou a execução da pena de muita, não mais se constituía parte legítima para promover a demanda executiva, visto que ajuizada intempestivamente, considerando-se o prazo de 90 dias já estabelecido pela Corte Constitucional", conforme o julgamento da ADI n. 3150 pelo Supremo Tribunal Federal e a Orientação n. 13/2020 da Corregedoria-Geral de Justiça deste Tribunal (autos do agravo, doc. 2, fls. 5 e 7).

Ainda, narrou que a pena de multa do tráfico de drogas é inconstitucional, pois afronta os primados constitucionais da individualização da pena, da proporcionalidade, da isonomia e da dignidade da pessoa humana, de maneira que, "cumprida a pena corporal, sua punibilidade" deve ser "declarada extinta independentemente do pagamento da multa", sobretudo porque "a imposição de multa nos valores previstos pela Lei 11.343/2006 milita no sentido de obstaculizar a reintegração social dos condenados, que terão dívida impagável pendente por anos" (autos do agravo, doc. 2, fls. 8 e 14-15).

Além disso, aventou que, após as mudanças promovidas pela Lei n. 13.964/2019, a multa passou a ser considerada dívida de valor e, por isso, sua execução deve obedecer às normas relativas à dívida ativa da Fazenda Pública, de modo que, por haver "lei e regulamento expressos no sentido de não haver, no estado catarinense, ajuizamento de cobrança de valores iguais ou abaixo de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais)", o título em questão seria inexigível (autos do agravo, doc. 2, fls. 15-16).

Sustentou, ainda, que a multa imposta é desproporcional à reduzida capacidade econômica do apenado, portanto, também nos termos do distinguishing realizado pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp n. 1785383, seria a sanção pecuniária inexigível (autos do agravo, doc. 2, fls. 17-20).

Diante disso, requereu a reforma da decisão, "a fim de que seja reformada a decisão agravada, acolhendo-se as teses ventiladas na exceção de pré-executividade, especialmente para fins de se extinguir a execução da pena de multa em curso" (autos do agravo, doc. 2, fl. 23).

O Ministério Público apresentou contrarrazões, pugnando pelo conhecimento e desprovimento do recurso (autos do agravo, doc. 5).

A decisão foi mantida por seus próprios fundamentos (autos do agravo, doc. 6).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Excelentíssimo Senhor Doutor Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do agravo (doc. 6).

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.

Inicialmente, o agravante alegou que o Ministério Público não teria legitimidade para ajuizar a execução da pena de multa, porque deixou transcorrer in albis o prazo de 90 (noventa) dias previsto na ADI n. 3.150/DF e na Orientação n. 13/2020 da CGJ deste Tribunal.

Adianto que sem razão, no entanto.

A ADI n. 3.150/DF, na qual a Suprema Corte definiu natureza de sanção penal da pena de multa, restou assim ementada:

Ementa: Execução penal. Constitucional. Ação direta de inconstitucionalidade. Pena de multa. Legitimidade prioritária do Ministério Público. Necessidade de interpretação conforme. Procedência parcial do pedido.1. A Lei nº 9.268/1996, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não retirou dela o caráter de sanção criminal, que lhe é inerente por força do art. 5º, XLVI, c, da Constituição Federal.2. Como consequência, a legitimação prioritária para a execução da multa penal é do Ministério Público perante a Vara de Execuções Penais.3. Por ser também dívida de valor em face do Poder Público, a multa pode ser subsidiariamente cobrada pela Fazenda Pública, na Vara de Execução Fiscal, se o Ministério Público não houver atuado em prazo razoável (90 dias).4. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga parcialmente procedente para, conferindo interpretação conforme à Constituição ao art. 51 do Código Penal, explicitar que a expressão "aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição", não exclui a legitimação prioritária do Ministério Público para a cobrança da multa na Vara de Execução Penal.Fixação das seguintes teses: (i) O Ministério Público é o órgão legitimado para promover a execução da pena de multa, perante a Vara de Execução Criminal, observado o procedimento descrito pelos artigos 164 e seguintes da Lei de Execução Penal; (ii) Caso o titular da ação penal, devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de 90 (noventa) dias, o Juiz da execução criminal dará ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública (Federal ou Estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria Vara de Execução Fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/1980.(ADI 3150, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 13/12/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-170 DIVULG 05-08-2019 PUBLIC 06-08-2019, grifei).

A Orientação n. 13/2020 da CGJ, por sua vez, apenas regulamenta o procedimento para a execução da pena de multa no sistema Eproc, conforme as determinações constantes do precedente acima reproduzido.

Como se pode observar da ementa da ação de controle de constitucionalidade, a legitimidade do Ministério Público para a execução da pena de multa é prioritária, ao passo que a Fazenda Pública detém legitimidade apenas subsidiária.

Acrescente-se, ademais, que não há qualquer previsão legal de que o prazo de 90 (noventa) dias seja decadencial ou peremptório, tampouco dispõe a ADI n. 3.150/DF nesse sentido. O prazo serve somente para que, decorridos os 90 (noventa) dias, a Fazenda Pública passe a ter legitimidade concorrente para cobrar a pena de multa.

No mesmo sentido, do Superior Tribunal de Justiça:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO INTEGRAL DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. INADIMPLEMENTO DA PENA DE MULTA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. INVIABILIDADE. LEGITIMIDADE PRIORITÁRIA DO MP PARA EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA. CARÁTER DE SANÇÃO CRIMINAL RECONHECIDO PELO STF NA ADI 3150/DF (DJE 6/8/2019). EFEITO VINCULANTE. RESTABELECIMENTO DO ACÓRDÃO DO AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL N. 7006377-53.2016.8.26.0050.1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI n. 3.150/DF, declarou que, à luz do preceito estabelecido pelo art. 5º, XLVI, da Constituição, a multa, ao lado da privação de liberdade e de outras restrições - perda de bens, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos -, é espécie de pena aplicável em retribuição e em prevenção à prática de crimes.2. O Ministério Público tem legitimidade, ainda que não exclusiva, mas prioritária, para cobrar a multa decorrente de condenação criminal transitada em julgado. A legitimidade da Fazenda Pública para propor execução fiscal é subsidiária, dependendo da hesitação do órgão ministerial dentro de prazo, foi fixado em 90 dias contados a partir da intimação para a execução da reprimenda.3. O Ministério Público é o órgão legitimado para promover a execução da pena de multa, perante a Vara de Execução Criminal, observado o procedimento descrito pelos artigos 164 e seguintes da Lei de Execução Penal; (ii) Caso o titular da ação penal, devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de 90 (noventa) dias, o Juiz da execução criminal dará ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública (Federal ou Estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria Vara de Execução Fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/1980. (ADI n. 3150, Ministro Marco Aurélio, Relator p/ Acórdão Ministro Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe 6/8/2019).4. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI n. 3.150/DF, ocorrido em 13/12/2018, firmou o entendimento de que "a Lei n. 9.268/96, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não retirou dela o caráter de sanção criminal que lhe é inerente por força do art. 5º, XLVI, c, da CF. Como consequência, por ser uma...

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