Acórdão Nº 5101104-66.2022.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 10-11-2022

Número do processo5101104-66.2022.8.24.0023
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5101104-66.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

RECORRENTE: JULIO CESAR SAMPAIO CARDOSO (RECORRENTE) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Julio Cesar Sampaio Cardoso, imputando-lhe a prática do delito previsto no art. 121, § 2º, III, IV e VII, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, conforme o seguinte fato narrado na inicial acusatória (autos da Ação Penal - AP, doc. 2):

Segundo consta do Inquérito Policial, no dia 20 de setembro de 2021, por volta das 09:35 horas, na Rua General Liberato Bittencourt, n. 1518, Canto, Florianópolis/SC, o denunciado Julio Cesar Sampaio Cardoso, com manifesto animus occidendi, por motivo torpe, mediante recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, meio que causou perigo comum e contra agente de segurança pública no exercício da função, enquanto dirigia o veículo Chevrolet Agile, placas MKS-7221, tentou matar Jamir Gonçalves Rachadel ao efetuar manobra com o automóvel que dirigia em alta velocidade de modo a direcionar o veículo para atropelar a vítima, que realizava policiamento a pé na referida via, provocando-lhe as lesões descritas no laudo pericial1 e prontuário médico da vítima juntados aos autos2 .

Durante a investigação, restou demonstrado que o denunciado Júlio César, com a ação, tinha como objetivo atropelar o miliciano, roubar-lhe a arma e atirar contra os demais policiais militares que se encontravam no local, esperando que, com tal atitude, os policiais militares revidassem os tiros e viessem a alvejá-lo. Contudo, seu intento restou frustrado, tendo em vista que o veículo atingiu a parede do estabelecimento comercial Míni Kalzone, acionando o airbag do automóvel e impedindo que o denunciado saísse do carro com facilidade.

Cumpre destacar que a morte da vítima somente não aconteceu por razões alheias à vontade do denunciado, tendo em vista que Jamir foi socorrido por uma guarnição da Polícia Militar e duas viaturas do Corpo de Bombeiros, que logo chegaram ao local. Ademais, a vítima foi encaminhada até o Hospital Governador Celso Ramos, onde recebeu rápido e eficaz atendimento médico, evitando, assim, o resultado fatal.

A tentativa de homicídio causou perigo comum, visto que o denunciado Júlio César, conduzindo o veículo em alta velocidade e a fim de atropelar o policial militar, jogou o automóvel sobre a calçada assumindo o risco de atingir outros transeuntes que passassem pelo local.

Além disso, a tentativa de homicídio foi cometida mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, tendo em vista que o veículo atingiu o policial militar enquanto esse encontrava-se de costas, de forma que foi surpreendido com a ação e sequer teve a possibilidade de perceber a aproximação do veículo e assim tentar fugir ou se defender.

Importante mencionar que o crime foi praticado contra Policial Militar, no regular exercício de suas funções de agente de segurança pública, estando inclusive fardado e havendo uma viatura caracterizada no local.

Recebida a denúncia (autos da AP, doc. 4) e citado pessoalmente (autos da AP, doc. 12), o acusado apresentou resposta à acusação (autos da AP, doc. 24).

Processado o feito, sobreveio decisão que admitiu a acusação e pronunciou "o réu JULIO CESAR SAMPAIO CARDOSO, nascido em 23/09/1956, filho de Jaime Humberto Sampaio Cardoso e Orlandina Cardoso, pelo crime do art. 121, § 2º, incisos III, IV e VII, c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, a fim de que seja submetido a julgamento pelo egrégio Tribunal do Júri desta Comarca" (autos da AP, doc. 59).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs recurso em sentido estrito (autos da AP, doc. 63).

Em suas razões (autos da AP, doc. 67), preliminarmente, aventou a nulidade da decisão de pronúncia, pois, malgrado defesa e acusação tenham se manifestado pela absolvição imprópria, sobreveio pronúncia de inimputável, calcada no art. 385 do Código de Processo Penal, que é inconstitucional (fl. 3).

Ainda em sede de prefacial, sustentou a nulidade da decisão de pronúncia, porque em nítida afronta ao art. 93, IX, da Constituição Federal, e art. 315, § 2º, I, do Código de Processo Penal, uma vez que "não houve fundamentação suficiente por parte do julgador a respeito da extensão da aplicação do art. 385 do CPP para a hipótese de pronúncia de acusado inimputável, cuja defesa técnica se baseia exclusivamente na tese de inimputabilidade, quando postulada pelo Ministério Público absolvição imprópria" (fls. 5 e 7).

No mérito, almejou a absolvição imprópria, com base no art. 415, parágrafo único, do Código de Processo Penal, vez que a tese defensiva está lastreada, unicamente, na inimputabilidade (fls. 7-9).

Além disso, aduziu que, "Quanto ao tempo máximo para cumprimento de medida de segurança, diversamente do fundamentado na decisão de pronúncia, não há qualquer empecilho a que a definição seja feita pelo julgador singular, desde que se observe a interpretação mais benéfica ao acusado", in casu, "a aplicação da pena máxima abstratamente cominada ao crime de homicídio simples" e a posterior redução pela tentativa no patamar de 2/3, "ante as lesões sofridas pela vítima e o iter criminis percorrido" (fls. 9-10).

Por fim, pretendeu o prequestionamento da matéria (fl. 11).

Foram apresentadas contrarrazões pelo órgão ministerial, o qual suscitou a preliminar de "nulidade da decisão de pronúncia por afronta ao artigo 415, parágrafo único, do Código de Processo Penal" e, na hipótese de entendimento diverso, manifestou-se pelo "parcial provimento do recurso interposto por Julio Cesar Sampaio Cardoso, absolvendo-o impropriamente o recorrente para que seja internado em Hospital Psiquiátrico" (autos da AP, doc. 70).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Genivaldo da Silva, manifestando-se pelo "afastamento das preliminares e, no mérito, pelo conhecimento e provimento do recurso" (doc. 3).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso é próprio (art. 581, IV, do Código de Processo Penal), tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

A princípio, em sede de proemial, o acusado arguiu a existência de nulidades na decisão de pronúncia, enfatizando a inconstitucionalidade do art. 385 do Código de Processo Penal e a afronta aos arts. 93, IX, da Constituição Federal, e 315, § 2º, I, do Código de Processo Penal.

Aliás, o Promotor de Justiça, em preliminar de contrarrazões, sustentou a nulidade da decisão de pronúncia por afronta ao artigo 415, parágrafo único, do Código de Processo Penal.

Na hipótese dos autos em específico, uma vez que o mérito será benéfico ao acusado, inclusive, como pretendem e convergem defesa e o integrante do Parquet, deixo de apreciar as prefaciais, com base na aplicação por analogia do art. 282, § 2º, do Código de Processo Civil.

Nesse diapasão:

APELAÇÃO CRIMINAL. POSSE ILEGAL DE ACESSÓRIO DE USO RESTRITO (ART. 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/03). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINARES. PLEITO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO FEITO, PELA AUSÊNCIA DE APLICAÇÃO INTEGRAL DO RITO ORDINÁRIO, APÓS A CISÃO DOS AUTOS. ALEMEJADO O RECONHECIMENTO DA ILICITUDE DA APREENSÃO DO ARTEFATO BÉLICO, POR VIOLAÇÃO AOS LIMITES DO MANDADO DE BUSCA. PRESCINDIBILIDADE DE APRECIAÇÃO DAS PREFACIAIS. MÉRITO FAVORÁVEL AO APELANTE. EXEGESE DO ART. 282, § 2º. DO CPC. "Quando puder decidir do mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato, ou suprir-lhe a falta" (CPC, art. 282, § 2º)" (TJSC, Recurso em Sentido Estrito n. 0001306-10.2016.8.24.0063, de São Joaquim, rel. Getúlio Corrêa, Terceira Câmara Criminal, j. em 18/12/2018).MÉRITO. REQUERIDA A ABSOLVIÇÃO PELA ATIPICIDADE DA...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT