Acórdão nº 5827698 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Público, 26-07-2021

Data de Julgamento26 Julho 2021
Número do processo0000827-54.2016.8.14.0076
Data de publicação09 Agosto 2021
Acordao Number5827698
Classe processualCÍVEL - DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE
ÓrgãoSeção de Direito Público

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0000827-54.2016.8.14.0076

APELANTE: MUNICIPIO DE ACARA
REPRESENTANTE: PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO DE ACARÁ

APELADO: SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLICOS MUNICIPAIS DE ACARA

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

AÇÃO DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE/ABUSIVIDADE DO DIREITO DE GREVE. DIREITO CONSTITUCIONAL DE GREVE. SAÚDE PÚBLICA MUNICIPAL. SERVIÇO ESSENCIAL. PROPOSTA PERANTE O JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. CAUSA DE PEDIR ENVOLVENDO DISSÍDIO DE GREVE. INCOMPETÊNCIA RECONHECIDA DE OFÍCIO. NULIDADE DA SENTENÇA. REMESSA DOS AUTOS ORIGINÁRIOS PARA A COMPETÊNCIA DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO DESTE E. TJ/PA, CONFORME O ART. 29, I, ALÍNEA “J”, DO RITJE/PA.


1. O Supremo Tribunal, no Mandado de Injunção n.º 670, 708 e 712, assentou que os tribunais de justiça são competentes para decidir sobre a legalidade da greve envolvendo servidores públicos municipais ou estaduais.


2. No caso, como a ação originária foi proposta perante juízo errôneo, deve ser reconhecida a sua incompetência, determinando-se a remessa ao juízo competente, no caso, a Seção de Direito Público desta Corte.


3. RECONHECIMENTO DA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU, DE OFÍCIO. À UNANIMIDADE.


ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Público, à unanimidade, em, DE OFÍCIO, RECONHECER A INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA, nos termos do voto da eminente Desembargadora Relatora.


Belém (Pa), 26 de julho de 2021.


Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

Relatora

RELATÓRIO



Tratam os autos de APELAÇÃO CÍVEL proposta pelo Município de Acará, contra sentença do MM. Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Acará, que, nos autos de Ação Declaratória de Ilegalidade/Abusividade do Direito de Greve, ajuizada contra Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Acará, julgou improcedente a demanda, nos termos do art. 487, I, do CPC.

A parte autora declara na inicial, e suma, que o movimento paredista foi mínimo e sem a comunicação prévia à Municipalidade e aos usuários dos serviços de saúde, os grevistas trancaram o portão da UMS e obstruíram a entrada de pacientes, familiares e demais servidores não grevistas nas dependências destas unidades de saúde, impedindo a prestação de serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade acaraense, deflagrando a abusividade e ilegalidade do movimento grevista, ante a essencialidade do serviço público de saúde (Id. 2854854 - Pág.2/11).

Em suas razões, sustenta o apelante a perda superveniente do objeto da ação, ante a falta de interesse de agir, eis que o Município de Acará teria dado atendimento ao pedido do sindicato, antes da prolação da sentença de mérito.

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso (Id 2854887-Pág.2/9).

Apesar da apelada ter sido regularmente intimada, não apresentou as contrarrazões consoante ID 2854887 - Pág. 20.

Coube-me a relatoria do feito por distribuição.

Recebi o recurso no duplo efeito devolutivo, conforme o disposto no artigo 1.012, caput, do CPC (Id. 2878295 - Pág. 1).

Em seguida foram os autos remetidos ao Órgão Ministerial, que na qualidade de Fiscal da Ordem Jurídica, manifestou-se preliminarmente, pelo reconhecimento da incompetência do juízo de primeiro grau, declarando-se a nulidade dos atos processuais, a partir da sentença, remetendo-se os autos, por conseguinte, a Seção de Direito Público, competente para processar e julgar a ação originária, na forma do art. 29, I, “j”, do Regimento Interno do TJPA. No mérito, manifesta-se pela procedência do pedido contido na inicial, para declarar abusivo e ilegal o movimento grevista em destaque (Id. 2964097-Pág.1/11)

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço da presente ação, pelo que passo à sua análise.

Pois bem, o apelante pugna pela totalidade da reforma da sentença, prolatada pelo juízo de origem, que julgou improcedente a Ação Declaratória de Ilegalidade/Abusividade do Direito de Greve, ajuizada contra Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Acará nos termos do artigo 487, I, do CPC.

Sem adentrar ao mérito da questão, verifico desde logo, a incompetência do Juízo de origem para o julgamento do feito, eis que estamos diante de dissídio grevista envolvendo servidores públicos, sendo, no caso, de competência originária do Tribunal de Justiça, especificamente da Seção de Direito Público, julgar o feito, nos termos do art. 29, I, alínea “j”, do RITJEPA, “in verbis”:

“Art. 29. A Seção de Direito Público é composta pela totalidade dos Desembargadores das Turmas de Direito Público e será presidida pelo Desembargador mais antigo integrante desta seção, em rodízio anual, e a duração do mandato coincidirá com o ano judiciário, competindo-lhes: I – processar e julgar:

...

j) os dissídios de greve que envolvam servidores públicos. ...” (grifei)

Dessa forma, tratando de direito de greve de servidores públicos lotados em Unidades Mista de Saúde do Município de Acará - a competência para decidir a matéria é originária deste Tribunal de Justiça, conforme decidiu o STF no precedente a seguir reportado:

“RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA PROCESSAR E JULGAR AÇÃO JUDICIAL SOBRE A LEGALIDADE DO EXERCÍCIO DO DREITO DE GREVE POR SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PRECEDENTES. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. [...] 6. No julgamento dos Mandados de Injunção 670, 708 e 712, este Supremo Tribunal decidiu que, até a edição da lei regulamentadora do direito de greve, previsto no art. 37, inc. VII, da Constituição da República, as Leis n. 7.701/1988 e 7.783/1989 poderiam ser aplicadas provisoriamente para possibilitar o exercício do direito de greve pelos servidores públicos. Este Supremo Tribunal assentou ainda que os tribunais de justiça seriam competentes para decidir sobre a legalidade da greve. [...] 8. Assim, por discutir-se na Ação Cautelar Inominada n. 2009.064601-6 e na Ação Declaratória n. 2009.073888-3/000100 a legalidade da greve deflagrada pelos servidores públicos da Secretaria Estadual de Saúde de Santa Catarina, a competência para processar e julgar as ações é do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, conforme interpretação do art. da Lei n. 7.701/1988, dada pelo Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção n. 670, 708 e 712. [...] (Rcl 13218/SC, relª. Minª. Carmen Lúcia, j. 13.4.2012 - negritei)

Neste mesmo sentido, a jurisprudência pátria mais atual:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DE GREVE. DECISÃO DETERMINANDO A INTERRUPÇÃO DO MOVIMENTO PAREDISTA. ALEGADA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA DE PRIMEIRO GRAU. ACOLHIMENTO. PRECEDENTES DA SUPREMA CORTE. RECURSO PROVIDO. À luz de precedentes do Supremo Tribunal Federal ao julgar mandados de injunção, a competência jurisdicional para apreciar a legalidade de movimentos grevistas de servidores públicos é dos Tribunais de Justiça, por aplicação da Lei n. 7.783/89. Logo, é de reconhecer-se a incompetência do Juízo a quo para apreciar a ação em foco, determinando-se a remessa dos autos a esta Corte.” (TJ-SC - AI: 20130774930 Xanxerê 2013.077493-0, Relator: João Henrique Blasi, Data de Julgamento: 08/07/2014, Segunda Câmara de Direito Público)

“AÇÃO DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DE DESCONTO DOS VENCIMENTOS DE SERVIDORES PÚBLICOS - GREVE DE SERVIDORES MUNICIPAIS - COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA - ILEGALIDADE DO MOVIMENTO PAREDISTA - AUSÊNCIA DE CONDUTA ILÍCITA DO ENTE PÚBLICO - DESCONTO PROPORCIONAL NOS VENCIMENTOS RELATIVO AOS DIAS NÃO TRABALHADOS - POSSIBILIDADE. As questões inerentes ao desconto no pagamento dos servidores municipais grevistas relativos aos dias não trabalhados devem ser resolvidas pelo Tribunal de Justiça. Precedentes do STF e deste eg. TJES. Declarada a ilegalidade do movimento grevista por decisão transitada em julgado, sem que existam provas de eventual compensação dos dias de paralisação, bem como de que o movimento paredista foi deflagrado por conduta ilícita atribuída à própria Administração Pública, como o atraso no pagamento ou situações excepcionais capazes de justificar o afastamento episódico da suspensão do contrato de trabalho, é legítimo o ato do ente público ao realizar o desconto proporcional dos vencimentos dos servidores públicos participantes da greve, diante da suspensão do vínculo funcional.”(TJ-ES - Procedimento Comum: 00010276820098080013, Relator: NEY BATISTA COUTINHO, Data de Julgamento: 01/02/2018, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: 09/02/2018)

“AGRAVO REGIMENTAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DECLARATÓRIO DE ILEGALIDADE DE GREVE. APLICAÇÃO DA LEI 7.783/89 ENQUANTO NÃO EDITADA A LEI A QUE SE REFERE O ART 37, VII, DA CF/88. REQUISITOS AUTORIZADORES DO DIREITO DE GREVE. NÃO OBSERVADOS. SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO. I - O STF no julgamento dos Mandados de Injunção nº 670, 708 e 712, após reconhecer a mora legislativa no tema da regulamentação do direito de greve dos servidores públicos, firmou a orientação segundo a qual deve ser aplicada disciplina das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989, enquanto não editada a lei a que se refere o art. 37, VII, da CF. II - Também já pacificou o STF entendimento de que o Tribunal de Justiça Estadual é competente para conhecimento de demanda que visa discutir a legalidade de movimento grevista de servidores públicos Estaduais ou Municipais, nos termos do art. 6º da Lei 7.701/88 aplicado por analogia. III - E ilegal o movimento grevista quando não observados os requisitos legais autorizadores do direito de greve, preestabelecidos na lei nº 7.783/1989. IV - Agravo Regimental conhecido e desprovido.” (TJ-MA - AGR: 0275682015 MA 0004199-90.2015.8.10.0000, Relator: LUIZ GONZAGA ALMEIDA FILHO, Data de...

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