Acórdão nº 7000375-94.2017.822.0001 de TJRO. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, Segundo Grau, 14-01-2022

Data de Julgamento14 Janeiro 2022
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo7000375-94.2017.822.0001
Órgão1ª Câmara Cível
ESTADO DE RONDÔNIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
1ª Câmara Cível / Gabinete Des. Rowison Teixeira



Processo: 7000375-94.2017.8.22.0001 - APELAÇÃO CÍVEL (198)

Relator: ROWILSON TEIXEIRA



Data distribuição: 25/05/2020 09:11:20

Data julgamento: 30/11/2021

Polo Ativo: SANTO ANTÔNIO ENERGIA S.A. e outros
Advogados do(a) APELANTE: RAFAELA PITHON RIBEIRO - BA21026-A, JULIA PERES CAPOBIANCO - SP350981-A, ARI BRUNO CARVALHO DE OLIVEIRA - RO3989-A, JULIANA SAVENHAGO PEREIRA - RO7681-A, LUCIANA SALES NASCIMENTO - RO5082-A, CLAYTON CONRAT KUSSLER - RO3861-A
Polo Passivo: EDILMA PEREIRA DE OLIVEIRA e outros
Advogados do(a) APELADO: LUIS GUILHERME MULLER OLIVEIRA - RO6815-A, GUILHERME TOURINHO GAIOTTO - RO6183-A

RELATÓRIO
Recurso: Apelação interposta pela empresa ré SANTO ANTÔNIO ENERGIA S.A.
Ação: Indenização por danos materiais e morais por alagamento decorrente do aumento do nível do Rio Madeira, fenômeno que teria sido ocasionado pela grande vazão de água e sedimentos devido ao deplecionamento do reservatório da requerida-apelada
Sentença:
Ante o exposto, com fundamento no inciso I do art. 487 do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, e, por consequência condeno a parte requerida SANTO ANTÔNIO ENERGIA S/A ao pagamento, em favor de cada parte autora, da quantia já atualizada de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de compensação por danos morais. Condeno ainda a ré, a título de danos materiais, ao pagamento de R$ 14.138,28 (quatorze mil, cento e trinta e oito reais e vinte e oito centavos), cujo valor deverá ser monetariamente corrigido do laudo pericial e juros de mora de 1% ao mês da citação. Condeno a parte requerida ao pagamento de honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do Novo Código de Processo Civil.

Nas razões recursais, a apelante argui as seguintes preliminares: nulidade da sentença por falta de fundamentação e ausência de enfrentamento de todos os argumentos de defesa e nulidade do laudo pericial.
No mérito, alega que não ficou configurada a sua responsabilidade civil, porquanto ausente prova de que o exercício das atividades da Usina de Santo Antônio extrapolaram os limites impostos pelo Poder Público para seu funcionamento ou que a exploração do empreendimento incorreu direta e, exclusivamente, em danos extraordinários ao da prova.
Sustenta que o fenômeno conhecido, popularmente, como terras caídas é verificado ao longo do Rio Madeira com alta intensidade, não podendo ser dito que as ações da recorrente foram responsáveis pelo citado fator, tendo em vista que há tempo se verifica sua ocorrência, tratando-se de fenômeno conhecido pela população local, não sendo alterada a dinâmica do Rio Madeira com a construção da usina.
Contrarrazões: pelo não provimento do recurso (fl. 2919).
VOTO
DESEMBARGADOR SANSÃO SALDANHA
Nulidade da Sentença
A apelante suscita preliminar de nulidade da decisão por ausência de fundamentação, o que, em tese, representaria ofensa às disposições do art. 93, inc. IX, da Constituição Federal.
O referido artigo estabelece que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.
No caso dos autos, verifica-se, da leitura da decisão, que foi estabelecida a premissa lógica e o motivo pelo qual foi decidido pela procedência da ação indenizatória com resolução de mérito (art. 487, inc. I, do CPC) em favor dos apelados.
Eventual interpretação de forma contrária aos interesses da parte não pode caracterizar ausência de fundamentação na decisão, nem mesmo o fato de esta ter sido proferida de forma concisa, se dela se extrai a devida apreciação das questões postas em discussão.
Sobre o assunto, há o entendimento do STJ firmado na ocasião do julgamento do AgInt no REsp 1601549/MG, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 25/10/2016, DJe 10/11/2016.
O Supremo Tribunal Federal, na apreciação de questão de ordem, com repercussão geral, consolidou o entendimento de que o art. 93, inc. IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão (AI 791292 QO-RG, julgado em 23/6/2010, DJe de 13/8/2010).
O juiz não tem obrigação de emitir um juízo de valor sobre todos os seus argumentos, como se fosse um perito que deve responder os quesitos um a um, mas sim enfrentar todas as questões capazes de, por si sós, e em tese, infirmar a sua conclusão sobre os pedidos formulados, ou seja, fundar seu convencimento.

Nulidade do Laudo Pericial
O laudo pericial confeccionado por expert nomeado pelo juiz possui presunção de veracidade, cabendo à parte que o impugnar produzir provas técnicas aptas a elidir a presunção. Não existindo prova em sentido contrário, prevalece a conclusão do laudo técnico.
No caso, verifica-se que, apesar de a apelante discordar da conclusão do laudo pericial realizado nos autos, não apresentou razão alguma capaz de desconstituir sua presunção de veracidade, ou seja, trouxe, em preliminar, impugnação com meros argumentos desprovidos de comprovação.
Superadas as preliminares, passo à análise do mérito recursal propriamente dito.
INTRODUÇÃO AO VOTO
Destaco que se trata de apelação em ação cível, cujo objeto são os efeitos danosos – materiais e morais – nas comunidades circunvizinhas de Porto Velho e extensão à jusante do Rio Madeira, decorrentes da gestão da instalação e operação do empreendimento Santo Antônio Energia S. A., em face das águas das chuvas sazonais da região do Rio Madeira.
A Santo Antônio Energia tem adotado a linha de defesa, para se escusar da responsabilidade objetiva, centrada na assertiva de que a causa de tudo foram as chuvas intensas que se alastraram na região. Chuvas que provocaram a cheia do Rio Madeira, o que, por ser um fenômeno da natureza, não pode ser de sua responsabilidade.
A tese jurídica majoritária, que tem motivado a corte de apelação no sentido de não reconhecer a responsabilidade da empresa Santo Antônio Energia, é que a inundação decorreu, de fato, da enchente do Rio Madeira, que, por sua vez, foi ocasionada por fenômeno natural, impondo reconhecer a ausência de nexo de causalidade entre os danos sofridos pelos moradores da região afetada e o empreendimento relativo à construção da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, de modo que é incabível a responsabilização civil da empresa para fins de reparação.
A propósito, são os seguintes precedentes, alguns dos quais já foram submetidos ao art. 942 do CPC. A nós, parece que o assunto foi tratado a título de meteorologia, data venia:
Apelação cível. Prova emprestada. Julgamento antecipado da lide. Usina Hidrelétrica de Santo Antônio. Enchente. Distrito de São Carlos. Nexo de Causalidade. Não verificado.
Possível a utilização de prova emprestada de lide em que a controvérsia é idêntica à dos autos, a fim de verificar o nexo de causalidade entre o ato praticado pela parte ré e os danos alegados pela parte autora.
Não verificado o nexo causal, fica afastada a responsabilidade da Usina de Santo Antônio pelos danos decorrentes da enchente ocorrida no Distrito de São Carlos no ano de 2014. (TJRO - Apelação Cível n. 7020943-68.2016.822.0001, Rel. Des. MORI, Kiyochi, 2ª Câmara Cível, julg. 17/10/2019)

Ação indenizatória. Direito ambiental. Construção de Usina Hidrelétrica. Ofensa ao princípio da dialeticidade. Preliminar rejeitada Concessionária de serviço público. Responsabilidade objetiva. Nexo de causalidade entre as obras da requerida e os danos causados aos autores. Comprovação. Dano material e moral. Ocorrência. Recurso provido.
Evidenciado que a apelação traz expressa impugnação aos fundamentos da sentença, apresentando razões pelas quais se busca sua modificação com base na prova constante dos autos, está caracterizado o requisito da dialeticidade a permitir o conhecimento do recurso.
Com a sistemática da responsabilidade objetiva, é irrelevante, na espécie, a discussão da conduta do agente (culpa ou dolo) para atribuição do dever de reparação do dano causado, cabendo à concessionária de serviço público provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente, nem ensejou os prejuízos causados aos autores.
Demonstrado que a inundação decorrente de enchente de 2014 foi ocasionada por fenômeno natural, impõe-se reconhecer a ausência de nexo de causalidade entre os danos sofridos pelos moradores da região afetada e o empreendimento relativo à construção da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, de modo que incabível a responsabilização civil da empresa a fins de reparação. (TJRO - Apelação Cível n. 0012733-21.2014.822.0001, Rel. Des. MORAES, Isaias Fonseca Moraes, 2ª Câmara Cível, julg.15/10/2019)
CONTEXTUALIZAÇÃO DOS FATOS E MOTIVAÇÕES
CONTEXTO I (Autos n. 7019187-58.2015.8.22.0001):
Consta do voto condutor do acórdão:
Na espécie, o dano é incontroverso, visto que a apelada teve sua residência atingida pela cheia ocorrida em 2014, restando perquirir acerca do nexo de causalidade com a construção da usina pela apelante (fizemos o destaque).
Cumpre destacar que o relevo que caracteriza a bacia amazônica é de “planície de inundação” ou “várzea”, altamente suscetível a alagamentos. Isto é, terrenos baixos que, atuando na manutenção do equilíbrio hidrológico da bacia, são alagados quando ocorrem cheias ou enchentes.
A perícia colacionada aos autos, ID 6760341 – fl. 11, é categórica ao afastar a responsabilidade da apelante pela enchente ocorrida em 2014, quando assim estabelece:
[…]
Destarte, com fulcro no retro exposto, a perícia infere não existirem elementos que ofereçam supedâneo e assertiva da autora de que a requerida tenha contribuído em qualquer grau para o fenômeno das enchentes, e, como consequência, impossível imputar responsabilidade à ré por suposto agravamento da cheia ocorrida em 2014.
[…]
Com efeito, tem-se por afirmado na
...

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