Acórdão Nº 8000225-78.2023.8.24.0018 do Segunda Câmara Criminal, 11-04-2023

Número do processo8000225-78.2023.8.24.0018
Data11 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 8000225-78.2023.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


AGRAVANTE: ELESSANDRO PADILHA ADVOGADO(A): LUIZ ANTONIO ANDRIGGE (OAB SC036405) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de agravo de execução penal intentado por Elessandro Padilha, não conformado com o teor da decisão do Sequencial 71 do PEP 0000940-09.2016.8.24.0018, por meio da qual o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Chapecó, "diante da impossibilidade de combinação de leis", indeferiu pedido "para ver aplicada a fração de 2/5 (ou 40%) ao apenado".
Sustenta o Agravante, em síntese, que, por não ser reincidente específico em delito de natureza hedionda ou equiparada, deve ser exigida, para a progressão de regime referente ao delito desta natureza pelo qual cumpre pena, a porcentagem de 40%, nos termos do art. 112 da Lei de Execução Penal, com a redação que lhe foi dada pela Lei 13.964/19, cuja aplicação retroativa é devida.
Sob tais argumentos, requer "que seja reformada a decisão combatida, para que seja concedido [...] o ajuste da fração de cumprimento de pena para 2/5" (eproc2G, Evento 1, doc4).
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões recursais pelo "parcial provimento, para aplicação a fração de 50% do crime hediondo, com resultado morte para progressão de regime, vedando a concessão de livramento condicional e saída temporária" (eproc2G, Evento 1, doc6).
O Doutor Juiz de Direito manteve a decisão resistida (eproc2G, Evento 1, doc7).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Gilberto Callado de Oliveira, manifestou-se pelo parcial provimento do reclamo (eproc2G, Evento 6)

VOTO


O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.
O Agravante Elessandro Padilha cumpre pena de 16 anos de reclusão pela prática de crime de homicídio qualificado consumado ocorrido em 1.2.14 (SEEU, relatório da situação processual executória).
Na sentença condenatória foi reconhecida a reincidência (SEEU, Sequencial 1, doc1.35), uma vez que ele possui duas condenações anteriores pela prática de crimes de furto (SEEU, Sequencial 68).
Vigia, à época desse delito hediondo, o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90, com redação dada pela Lei 11.464/07, que dispunha que "a progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo (hediondos e equiparados), dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente".
Especificamente quanto a estas frações da progressão de regime o Superior Tribunal de Justiça orienta que, "ante a unificação das penas, a condição de reincidente do apenado determina o cumprimento de 3/5 sobre o total", de modo que "não há falar em aplicação do percentual de 2/5 para a progressão de regime, em relação à primeira condenação, pois, unificadas as penas, conforme determina o art. 111 da LEP, a reincidência deve incidir sobre o somatório das penas e não apenas na segunda condenação", pois "pacificou entendimento no sentido de que a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum ou específica. Assim, havendo reincidência, ao condenado deverá ser aplicada a fração de 3/5 da pena cumprida para fins de progressão do regime" (HC 427.803, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 4.10.18).
Todavia, em 23.1.20 entrou em vigor a Lei 13.964/19, que expressamente revogou o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90 (art. 19) e fixou novos percentuais para a progressão de regime na Lei de Execução Penal, a qual passou a centralizar a matéria.
Dispõe o atual art. 112 da Lei de Execução Penal:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
[...]
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.
Além disso, o art. 122, § 2º, da Lei de Execução Penal passou a determinar que "não terá direito à saída temporária a que se refere o caput deste artigo o condenado que cumpre pena por praticar crime hediondo com resultado morte".
Ao interpretarem a nova redação do art. 112 da Lei de Execução Penal, as Cortes Superiores assentaram o entendimento de que, quando se tratar de reincidente não específico em delito hediondo ou equiparado sem resultado morte, a porcentagem de progressão a ser exigida para esta categoria de delitos é atualmente mais favorável do que era ao tempo em que perpetrado o delito, de modo que, nessa hipótese, por força da garantia individual prevista no art. 5º, XL, da Constituição Federal e nos termos do art. 2º, parágrafo único, do Código Penal, a fração prevista, a partir da vigência da Lei 13.964/19, no art. 112, caput, V, da Lei de Execução Penal, deve ter aplicação retroativa (STF, Tema 1.169, ARE 1.327.963; STJ, Tema 1.804, REsps 1.910.240 e 1.918.338. Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 26.5.21).
No caso, todavia, o crime pelo qual cumpre pena o Agravante Elessandro Padilha é um homicídio qualificado consumado, ou seja, delito hediondo com resultado morte, o que, por si, descarta o pleito recursal de aplicação da razão de 40%, pois esta é reservada a crimes sem resultado morte.
Na decisão resistida, o Magistrado de Primeiro Grau, em atenção ao decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1.084, entendeu que não poderia ser aplicada retroativamente a nova redação do art. 112 da Lei de Execução Penal:
Apesar de toda discussão provocada pela vigência da Lei n. 13.964/19 e sua redação confusa, vejo que o caso prático é pacífico em não permitir qualquer retroação.
Isso porque como sobredito o crime hediondo praticado pelo apenado foi consumado e envolveu resultado morte.
Outrossim, o apenado, no édito condenatório, foi reconhecido como reincidente.
É verdade que a hipótese não encontra específica previsão legal no novo art. 112 da LEP, que assim ficou redigido:
[...]
Contudo, o STJ já enfrentou a matéria e, em sede de recurso representativo de controvérsia, disse que aos réus condenados por crimes hediondos ou equiparados cometidos com resultado morte e que sejam reincidentes não se aplica a fração de 2/5, isto é, há que se manter os 3/5 da antiga redação da Lei n. 8.072/90, porque o Pacote Anticrime trouxe restrições à saída temporária e ao livramento condicional para tais ilícitos.
[...]
Dessa maneira, diante da impossibilidade de combinação de leis, vejo que o reeducando não pode ser beneficiado pela vigência da Lei n. 13.964/19.
Ante o exposto, indefiro o pedido defensivo para ver aplicada a fração de 2/5 (ou 40%) ao apenado, o que faço com fundamento no REsp representativo de controvérsia acima mencionado (REsps 1.910.240 e 1.918.338) (SEEU, Sequencial 71).
No entendimento pessoal deste relator, embora tenham vindo com parte do regramento disposto em um mesmo dispositivo a partir da Lei 13.964/19 (LEP, art. 112, caput, VI, "a"), por se tratarem a progressão de regime e o livramento condicional de direitos distintos com requisitos diversos, não ocorre a vedada combinação de Leis - com criação de uma terceira norma não legislada quando se modifica o percentual da progressão de regime e mantém-se o direito, em tese, ao livramento condicional. Na mesma linha segue a compreensão com relação à vedação de saída temporária, positivada em comando legal diverso (LEP, art. 122, § 2º).
A propósito, do Superior Tribunal de Justiça, mutatis mutandi:
Muito embora a Lei 13.964/19 tenha alterado a redação do inciso II do art. 1º da Lei 8.072/1990 (Lei de Crimes Hediondos) para nele incluir o roubo circunstanciado pelo emprego de arma de fogo, tal modificação não pode retroagir para atingir o condenado por crime cometido antes da entrada em vigor da novatio legis, em respeito ao princípio da anterioridade (art. 5º, XL, CF e art. 1º do CP). 8. Não há que se falar em indevida combinação de leis quando se está diante de duas leis que tratam de temas distintos e que, circunstancialmente, vieram a ser alteradas pela mesma norma...

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