Acórdão Nº 8000253-83.2023.8.24.0038 do Segunda Câmara Criminal, 18-04-2023

Número do processo8000253-83.2023.8.24.0038
Data18 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 8000253-83.2023.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL


AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA AGRAVADO: DANIEL DA SILVA BORGES ADVOGADO(A): SARA SARANA DE JESUS (OAB SC046533)


RELATÓRIO


Trata-se de Agravo em Execução Penal interposto pelo Ministério Público, contra a decisão proferida pelo Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Joinville, que deferiu remição de 133 dias pela aprovação no ENCCEJA/2021, nível médio, em favor do Apenado Daniel da Silva Borges.
Sustenta o Órgão Ministerial, em síntese, que a base de cálculo utilizada pelo Magistrado de origem encontra-se equivocada, uma vez que deveriam ser considerados dez dias para cada matéria aprovada, acrescidos de 1/3 pela conclusão do ensino médio, totalizando 66 dias de remição.
Pugna, assim, pela reforma da decisão atacada, a fim de que seja reduzido o total de dias remidos para 66.
Apresentadas as Contrarrazões (Evento1, PET5), e mantida a decisão Agravada (Evento 1, OUT6), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 7).
Este é o relatório

VOTO


O recurso deve ser conhecido, por próprio e tempestivo.
No mérito, porém, não comporta acolhimento. Vejamos.
Ao conceder a remição pela aprovação no ENCCEJA nível médio, o Magistrado de origem consignou:
1. Remição pelo ENCCEJA:
A defesa juntou a grade de notas (seq. 29.2).
O Ministério Público manifestou-se pelo reconhecimento de 66 dias de remição (seq. 68).
Pois bem.
Dispõe o art. 3º, caput e parágrafo único, da Resolução n. 391/2021, do Conselho Nacional de Justiça:
Art. 3º O reconhecimento do direito à remição de pena pela participação em atividades de educação escolar considerará o número de horas correspondente à efetiva participação da pessoa privada de liberdade nas atividades educacionais, independentemente de aproveitamento, exceto, quanto ao último aspecto, quando a pessoa tiver sido autorizada a estudar fora da unidade de privação de liberdade, hipótese em que terá de comprovar, mensalmente, por meio da autoridade educacional competente, a frequência e o aproveitamento escolar.
Parágrafo único. Em caso de a pessoa privada de liberdade não estar vinculada a atividades regulares de ensino no interior da unidade e realizar estudos por conta própria, ou com acompanhamento pedagógico não-escolar, logrando, com isso, obter aprovação nos exames que certificam a conclusão do ensino fundamental ou médio ( Encceja ou outros) e aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio - Enem, será considerada como base de cálculo para fins de cômputo das horas visando à remição da pena 50% (cinquenta por cento) da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino, fundamental ou médio, no montante de 1.600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1.200 (mil e duzentas) horas para o ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio, conforme o art. 4o da Resolução no 03/ 2010 do Conselho Nacional de Educação, acrescida de 1/3 (um terço) por conclusão de nível de educação, a fim de se dar plena aplicação ao disposto no art. 126, § 5o, da LEP.
Vale dizer, em caso de aprovação no ENCCEJA (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos), que certifica a conclusão do Ensino Fundamental, a remição pode totalizar 67 (sessenta e sete) dias (base de cálculo: 50% de 1600 horas dividas por 12).
Contudo, em razão de decisão do Supremo Tribunal Federal no habeas corpus n. 165.084, de Santa Catarina, cumpre dar distinta solução ao caso, mormente no tocante à base de cálculo de horas.
Nos termos decididos pelo STF, deve ser homenageado o princípio da intepretação in bonam partem, porque o preso, inclusive pelo ambiente inóspito em que está custodiado, talvez tenha que estudar muito mais horas que os alunos do ensino médio regular para alcançar o mesmo objetivo de aprovação no ENEM.
Há que se interpretar a norma (Resolução n. 391/2021, do CNJ), com base no princípio da proporcionalidade. Sobre o mencionado princípio Cesar Roberto Bitencourt leciona:
O modelo político consagrado pelo Estado Democrático de Direito determina que todo o Estado - em seus três Poderes, bem como nas funções essenciais à Justiça - resulta vinculado em relação aos fins eleitos para a prática dos atos legislativos, judiciais e administrativos. Em outros termos, toda atividade estatal é sempre vinculada axiomaticamente pelos princípios constitucionais explícitos e implícitos. As consequências jurídicas dessa constituição dirigente são visíveis. A primeira delas verifica-se pela consagração do princípio da proporcionalidade, não como simples critério interpretativo, mas como garantia legitimadora/limitadora de todo o ordenamento jurídico infraconstitucional. Assim, deparamo-nos com um vínculo constitucional capaz de limitar os fins de um ato estatal e os meios eleitos para que tal finalidade seja alcançada. Conjuga-se, pois, a união harmônica de três fatores essenciais : a) adequação teleológica: todo ato estatal passa a ter uma finalidade política ditada não por princípios do próprio administrador, legislador ou juiz, mas sim por valores éticos deduzidos da Constituição Federal - vedação do arbítrio (Ubermassverbot); b) necessidade (Erforderlichkeit): o meio não pode exceder os limites indispensáveis e menos lesivos possíveis à conservação do fim legítimo que se pretende; c) proporcionalidade "stricto sensu": todo representante do Estado está, ao mesmo tempo, obrigado a fazer uso de meios adequados e de abster-se de utilizar meios ou recursos desproporcionais. (Bitencourt, Cesar Roberto. Tratado de Direito Penal, Parte Geral 1. 17ª Edição. Editora Saraiva. 2012. p. 64-65).
Nos termos destacados pelo Supremo Tribunal Federal, é evidente que, para um detento em ambiente de cárcere, as dificuldades impostas pelos estudos são maiores que para um estudante de curso regular ou de curso na modalidade EJA, pois, tanto um quanto outro são beneficiados pela tutoria de professores, bem como pelo uso de materiais escolares direcionados. Por outro lado, o reeducando que escolhe estudar por conta própria, com os materiais disponíveis e sem acompanhamento, emprega esforços maiores para alcançar seus objetivos, tornando sua conquista algo louvável.
Salienta também o Tribunal guardião da Constituição que valorizar a conquista em voga trará consequências positivas à sociedade, pois servirá de incentivo para todos aqueles que vislumbrarem os benefícios do estudo, principalmente para aqueles que já acreditaram nos "benefícios" de uma vida delituosa. Portanto, seria desproporcional diminuir todo o esforço empregado e considerar o empenho demonstrado como algo mínimo e comparável à modalidade de curso com a menor carga horária para o cálculo da remição.
No caso, em consonância à brilhante decisão do Supremo Tribunal Federal, fulcrada nos princípios da proporcionalidade e reintegração social, crê-se que seja adequado afastar parcialmente as orientações da Resolução n. 391/2021, do CNJ, para, a partir de uma interpretação in bonam partem das demais leis que regulamentam a situação, aplicar ao cálculo da remição da carga horária mínima do Ensino Médio regular , 800 horas anuais e 2.400 horas para os três anos de curso (Lei n. 9.394/2006, art. 24, inciso I).
Outrossim, especificamente no que se refere ao ENCCEJA, destaca-se julgado do Superior Tribunal de Justiça no qual restou decidido que [...] a base de cálculo de 50% da carga horária definida legalmente para o ensino fundamental deve ser considerada 1.600 horas, a qual, dividida por doze, resulta em 133 dias de remição em caso de aprovação em todos os campos de conhecimento[...](HC...

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