Acórdão Nº 8000794-19.2023.8.24.0038 do Terceira Câmara Criminal, 03-10-2023

Número do processo8000794-19.2023.8.24.0038
Data03 Outubro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 8000794-19.2023.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA


AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA AGRAVADO: KLEITON LUIZ GRUDZIEN ORTIZ ADVOGADO(A): SIDIMAR LAZZAROTTO (OAB PR055736)


RELATÓRIO


Trata-se de agravo de execução penal interposto pelo Ministério Público contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara de Execuções Penais da Comarca de Joinville que 1) deferiu a concessão de indulto ao apenado Kleiton Luiz Grudzien Ortiz, com fundamento no art. 5º do Decreto n. 11.302/2022, e declarou extinta a pena de 01 (um) ano imposta nos autos n. 0001650-52.2014.8.24.00333; e 2) indeferiu o pedido por si formulado de revogação da prisão domiciliar do apenado Kleiton Luiz Grudzien Ortiz e designou audiência de justificação (Seq. 172.1 dos autos n. 0024428-50.2013.8.24.0033).
Inconformado, o Órgão Ministerial sustenta, em síntese, que o art. 5º do Decreto n. 11.302/2022 seria inconstitucional, uma vez que, apesar de afigurar como ato privativa do Presidente da República, teria sido editado com desvio de finalidade e em afronta ao princípio da separação de Poderes. Acrescenta que, dada a amplitude do indulto concedido, seria possível equipará-lo à anistia, ato de competência exclusiva do Congresso Nacional (art. 48, VIII, da Constituição Federal) e que o decreto expedido afrontaria igualmente os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, isonomia e individualização da pena. Em relação ao indeferimento da revogação da prisão domiciliar, aduz que "diante do número de violações registradas, por ter isolado a tornozeleira para encobrir seus deslocamentos e pela ausência de plausibilidade das justificativas apresentadas, fica evidente que o apenado não soube assimilar os propósitos da lei penal, não sendo merecedor de cumprir o restante de sua pena distante da unidade prisional". Com isso, requer o provimento do recurso, a fim de que 1) seja reconhecido incidentalmente a inconstitucionalidade art. 5º do Decreto n. 11.302/2022 e a reforma da decisão, para que seja indeferido o indulto; e 2) seja revogada a prisão domiciliar concedido ao apenado.
Foram apresentadas as contrarrazões (Evento 1, PET15).
A decisão agravada foi mantida (Evento 1, OUT16).
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Genivaldo da Silva, o qual opinou pelo conhecimento e parcial provimento do reclamo, "para revogar a prisão domiciliar concedida ao apenado, eis que verificado o descumprimento das condições lhe impostas, mantendo-se, no mais, intocado o r. decisum do seq. 172.1 dos autos de execução (no tocante ao indulto concedido e o afastamento da inconstitucionalidade arguida pelo ora agravante), pelos seus próprios fundamentos" (Evento 12 - segundo grau).
Este é o relatório

VOTO


Presentes os seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos, conhece-se do presente recurso.
O agravo em execução manejado pelo Ministério Público objetiva reformar a decisão que 1) deferiu a concessão de indulto ao apenado Kleiton Luiz Grudzien Ortiz, com fundamento no art. 5º do Decreto n. 11.302/2022, e declarou extinta a pena de 01 (um) ano imposta nos autos n. 0001650-52.2014.8.24.00333; e 2) indeferiu o pedido por si formulado de revogação da prisão domiciliar do apenado Kleiton Luiz Grudzien Ortiz e designou audiência de justificação (Seq. 172.1 dos autos n. 0024428-50.2013.8.24.0033).
Não foram levantadas preliminares.
1. Indulto
No mérito, o Ministério Público inicialmente, referente à concessão do indulto, sustenta que o art. 5º do Decreto n. 11.302/2022 seria inconstitucional, uma vez que, apesar de afigurar como ato privativa do Presidente da República, teria sido editado com desvio de finalidade e em afronta ao princípio da separação de Poderes. Acrescenta que, dada a amplitude do indulto concedido, seria possível equipará-lo à anistia, ato de competência exclusiva do Congresso Nacional (art. 48, VIII, da Constituição Federal) e que o decreto expedido afrontaria igualmente os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, isonomia e individualização da pena. Com isso, requer o reconhecimento incidental do referido dispositivo e a revogação do reconhecimento da causa extintiva da punibilidade.
Sem razão, no entanto.
Registra-se inicialmente que refoge da competência deste Órgão Fracionário reconhecer eventual inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. Vislumbrado possível vício dessa natureza na norma ordinária questionada, cabe a este Órgão suspender o julgamento e, em respeito ao princípio da reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal e Súmula Vinculante n. 10), remeter os autos ao Órgão Especial, competente para a apreciação da matéria, seguindo o procedimento previsto no art. 948 e seguintes do Código de Processo Civil (cisão funcional de competência no plano horizontal).
Não se vislumbra, no entanto, a inconstitucionalidade incidentalmente suscitada.
Esclarece-se de antemão que tanto o indulto (individual ou coletivo), como a anistia são espécies de perdão (clemência estatal) e, embora ambos os institutos estejam ligados a medidas de político-criminais e sejam causas extintivas da punibilidade (art. 107, II, do Código Penal), diferenciam-se pelo Órgão competente para sua concessão e os efeitos penais deles decorrentes.
De acordo com Nucci:
12. Anistia: é a declaração pelo Poder Público de que determinados fatos se tornam impuníveis por motivo de utilidade social. O instituto da anistia volta-se a fatos, e não a pessoas. [...] Pode ocorrer a anistia antes da condenação definitiva - anistia própria - ou após o trânsito em julgado da condenação - anistia imprópria. Tem a força de extinguir a ação e a condenação. Primordialmente, destina-se a crimes políticos, embora nada impeça a sua concessão a crimes comuns. Aliás, o próprio constituinte deixou isso bem claro ao dispor, no art. 5.º, XLIII, não caber anistia para crimes hediondos, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e terrorismo, querendo dizer, portanto, que, se o Poder Público quisesse, poderia concedê-la a delitos comuns (como o tráfico ilegal de drogas). Pode ser condicionada ou incondicionada, vale dizer, pode ter condições a serem aceitas pelo beneficiário ou não. Se for condicionada, pode ser recusada; do contrário, não cabe recusa. De um modo ou de outro, uma vez concedida, não pode mais ser revogada. É oportuno falar, ainda, em anistia geral ou parcial. A primeira favorece a todos os que praticaram determinado fato, indistintamente. A segunda beneficia somente alguns (ex.: os não reincidentes). Finalmente, ela pode ser irrestrita ou limitada, conforme abranja todos os delitos relacionados ao fato criminoso principal ou exclua alguns deles. A anistia só é concedida por meio de lei editada pelo Congresso Nacional. Possui efeito ex tunc, ou seja, apaga o crime e todos os efeitos da sentença, embora não atinja os efeitos civis. Serve, também, como já mencionado anteriormente, para extinguir a medida de segurança, nos termos do art. 96, parágrafo único, do Código Penal. Deve ser declarada a extinção da punibilidade, quando concedida a anistia, pelo juiz da execução penal. Tratada no art. 107 do Código Penal como excludente de punibilidade, na verdade, a sua natureza jurídica é de excludente de tipicidade, pois, apagado o fato, a consequência lógica é o afastamento da tipicidade, que é adequação do fato ao tipo penal.
[...]
15. Indulto coletivo: é a clemência destinada a um grupo de sentenciados, tendo em vista a duração das penas aplicadas, podendo exigir requisitos subjetivos (tais como primariedade, comportamento carcerário, antecedentes) e objetivos (v. g., cumprimento de certo montante da pena, exclusão de certos tipos de crimes). O indulto pode ser total, quando extingue todas as condenações do beneficiário, ou parcial, quando apenas diminui ou substitui a pena por outra mais branda. Neste último caso, não se extingue a punibilidade, chamando-se comutação. Controversa é a possibilidade de concessão do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT