Artigos 468 a 470

AutorCinara Rosa Figueiró
Páginas256-267

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CAPÍTULO III Da alteração

O contrato de trabalho é de trato sucessivo e vocacionado à vigência por prazo indeterminado, por isso está sujeito a alterações que modificam os direitos e obrigações ajustadas pelas partes, de modo a adequá-lo às necessidades que surgem periodicamente. Estas alterações podem ser objetivas ou subjetivas, sendo que sua validade depende da observância de determinadas condições.

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Parágrafo único - Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

O empregador assume os riscos da atividade econômica e, observados certos limites, pode introduzir alterações não substanciais nas condições de trabalho. As alterações que geram maior controvérsia dizem respeito ao que foi ajustado quanto à forma e quantidade de remuneração, ao local de trabalho e às funções do emprego.

A obrigação de prestar trabalho, embora determinada qualitativa e quantitativamente, traz em si certa indeterminação no conteúdo das prestações singulares, podendo o empregador de forma válida no exercício do poder de comando estabelecer regras para disciplinar a execução normal do trabalho.

O artigo 468 estabelece, como regra geral, que o contrato de trabalho não pode ser modificado unilateralmente pelo empregador, buscando concretizar o princípio da proteção ao hipossuficiente que inspira o Direito do Trabalho. Essa limitação somente é afastada nas hipóteses legais e nos casos de flexibilização facultada pela Constituição da República, mediante convenção ou acordo coletivo. A licitude das alterações está condicionada ao mútuo consentimento e ausência de prejuízos ao empregado, diretos ou indiretos.

O empregador assume os riscos da atividade econômica e, observados certos limites, pode introduzir alterações não substanciais nas condições de trabalho, sendo que aquelas que geram maior controvér- * Juíza do Trabalho no TRT-IV, Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNISC-RS.

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sia dizem respeito ao que foi ajustado quanto à forma e quantidade de remuneração, ao local de trabalho e às funções do emprego.

Questão tormentosa está em estabelecer o limite do jus variandi do empregador e, em contraponto, o alcance do jus resistentiae do empregado, que pode se opor a determinações ilícitas oriundas do empregador e, em algumas situações específicas, até mesma àquelas que são lícitas.

As alterações serão lícitas, em princípio, se forem bilaterais e não acarretarem prejuízo ao empregado. Por outro lado, as alterações unilaterais somente serão toleradas se realizadas no exercício regular do jus variandi.

No que tange ao regulamento de empresa, embora suas cláusulas sejam originalmente estabelecidas de forma unilateral pelo empregador, aderem, de forma tácita ou expressa, ao contrato de trabalho, passando a integrar os contratos individuais, fazendo surgir para os empregados garantia quanto a alterações prejudiciais. Nessa linha, o entendimento vertido na Súmula n. 51 do E. TST.

O critério adotado para validar ou não as alterações contratuais promovidas pelo empregador tem sido o prejuízo experimentado pelo empregado, ainda que elas resultem de mútuo consentimento. Este prejuízo poderá ser direto quando diminui o patrimônio atual do empregado ou indireto quando impede um acréscimo que era esperado normalmente por ele. O prejuízo pode ser ou não de natureza econômica, bastando que seja efetivo e identificável. Assim, o prejuízo pode ter natureza patrimonial, atingindo a remuneração do empregado, bem como pode ser de natureza funcional ou de natureza moral ou psicológica, hipótese em que uma alteração que aparentemente é vantajosa, na prática, pode revelar-se, prejudicial ao empregado, inclusive em projeção futura. Destarte, para análise do prejuízo é indiferente que seja imediato ou mediato ou que seja previsível ou não no ato da novação.

No exercício do jus variandi, que está amparado no poder de comando, tem sido facultadas pequenas alterações unilaterais que não retratem alteração significativa e não importem em prejuízo ao empregado. No entanto, ele deve ser exercitado com razoabilidade, não se tratando de um direito absoluto, servindo de parâmetro para identificar todas as espécies de abusos ou desvios que possam ser cometidos pelo empregador. Nesse particular, a Lei garante ao empregado o direito de se opor às modificações que lhe causem prejuízos ou sejam ilegais, que é definido como jus resistentiae.

Segundo GRILLO, do ponto de vista econômico, que propõe uma maior flexibilidade para a modificação das condições de trabalho, há uma ampliação do poder diretivo com a finalidade de melhorar a produção, enquanto sob a ótica do Direito do Trabalho, que não deixa de reconhecer o poder diretivo do empregador, há uma tentativa de impor limites com a finalidade de evitar abusos, assegurando ao empregado um tratamento condigno e a manutenção de direitos que já tenham se incorporado ao seu patrimônio jurídico.1

O art. 468 da CLT concretiza o princípio da inalterabilidade contratual lesiva, originário do Direito Civil, traduzido na expressão pacta sunt servanda. Assim, o contrato é definido como fato criador de direitos e obrigações, a partir da manifestação de vontade das partes, feita em consonância com a ordem jurídica2.

Considerando que o contrato gera normas jurídicas individuais, ao prever direitos e obrigações apenas para os contratantes e que devem ser fielmente cumpridos, pode-se afirmar que é intangível e imutável, desde que estipulado de forma válida. Desta forma, em regra, somente poderá ser alterado por vontade de ambas as partes (e, ainda assim, devem ser observados certos limites) ou nas hipóteses de caso fortuito ou força maior (artigo 1.058 do Código Civil).

Todavia, no âmbito do Direito Civil, o princípio do pacta sunt servanda tem sido atenuado a partir da revisão judicial, oportunidade em que o juiz afasta a regra da imutabilidade para atender aos interesses da realidade social ou aos princípios gerais de Direito, usando para isso da chamada cláusula rebus sic stantibus.

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A intervenção judicial, no entanto, deveria ficar restrita aos casos mais graves, com alcance geral, tendo por base acontecimentos realmente extraordinários e imprevistos que tornem a prestação de uma das partes extremamente onerosa e que não deixem dúvidas quanto à anormalidade ou imprevisibilidade da circunstância de fato suscitada como fonte da mudança significativa no que foi previsto. A utilização generalizada revisão com base na cláusula rebus sic stantibus não é recomendada porque gera insegurança jurídica às partes.

No contrato de trabalho, assim como nos contratos do Direito Civil, em função do progresso técnico que gera a mudança dos métodos de produção na empresa e, por conseguinte, novas condições de trabalho, é possível que as alterações na forma de trabalhar sejam consideradas legítimas, desde que respeitados os limites do artigo 468 da CLT. Elas têm origem em fatores externos à relação de emprego, como, por exemplo, a utilização de novo equipamento ou adoção de diferente método de trabalho, a necessidade de implementar nova tecnologia ou, ainda, a alteração do local do estabelecimento por conta de legislação ambiental. Estas alterações podem acarretar necessidade de mudança do local da prestação de serviços e/ou modificações expressivas na rotina de trabalho, e até mesmo das funções desempenhadas pelo empregado. Por efeito, é possível sustentar a aplicação da revisão com base na cláusula rebus sic stantibus, sem esquecer que o limite, como sempre, é o prejuízo.

Há significativo avanço doutrinário e jurisprudencial compreendendo que alterações contratuais devem guardar respeito aos direitos fundamentais do funcionário. Em especial, deve-se observar que alterações de atribuições não podem implicar desrespeito à honra, saúde e dignidade do obreiro.

A partir desses critérios, as alterações funcionais horizontais, como por exemplo, as progressões horizontais, em princípio, são lícitas. É claro que existem situações em que é possível defender que são proibidas, como na hipótese de implicar rigor excessivo, risco à integridade física do empregado; significar situações humilhantes ou contrárias aos bons costumes. Ou, ainda, acaso representem uma mudança tão significativa, que acabem por desconfigurar completamente a qualificação do empregado. Esses podem ser, igualmente, os limites para as alterações decorrentes de fatores externos e que justificam a aplicação da cláusula rebus sic stantibus ao contrato de trabalho.

A validade da alteração passa pela investigação das razões determinantes. Por exemplo, se a empresa altera seu ramo de atividade em consequência de renovação do mercado ou do produto elaborado para atender as exigências dos consumidores, e caso não reste prejuízo para o empregado, o empregador estaria agindo dentro dos limites do legítimo exercício do jus variandi.

No caso das promoções, que são alterações verticais ascendentes e, de regra, representam uma melhoria da situação funcional do empregado, e sendo vantajosa, há alteração bilateral. Todavia, o empregador não pode impor a promoção, e o empregado sempre tem direito de recusa. O fundamento está no artigo 468 da CLT, na medida em que, uma promoção que se mostre aparentemente vantajosa, pode, no futuro revelar-se prejudicial. Um critério de distinção, pode ser o proposto por RUSSOMANO, segundo o qual uma promoção é válida sempre que as vantagens que dela resultem sejam superiores ou proporcionais às maiores responsabilidades que o empregado terá por conta dela, o que...

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