Me chame pelo seu nome? A ressignificação do direito ao nome após o Código Civil de 2002

AutorPaloma Braga Araújo de Souza e Roxana Cardoso Brasileiro Borges
Páginas225-242
Capítulo 8A
ME CHAME PELO SEU NOME1?
A RESSIGNIFICAÇÃO DO DIREITO AO NOME APÓS O
CÓDIGO CIVIL DE 2002
Paloma Bra ga Araújo de Souza2
Roxana Cardoso Bra sileiro Borges3
1. Introdução
O nome da pessoa natural é um dos principais aspectos de
identificação da pessoa na coletividade, ao lado da imagem. Com o advento
do Código Civil de 2002, sua disciplina sai do campo registral para integrar
os direitos de personalidade. Neste âmbito, o direito ao nome se afasta de
um tratamento patrimonialista e publicista para tutelar a dignidade da
pessoa humana no aspecto da identidade.
Esta perspectiva do direito ao nome enquanto tutela da identidade
é percebida, atualmente, na busca de maior espaço de autonomia que vários
sujeitos empreendem pela alteração de seus nomes a fim de os adequarem
aos seus modos de ser e às suas histórias de vida. Assim ocorre, por
exemplo, em decorrência de laços familiares socioafetivos e em relação às
pessoas transgênero, embora com muita resistência na teoria jurídica, na
prática dos tribunais e na atuação dos cartórios de registros civis no Brasil.
1 Título, em portugu ês, do livro Call me by your na me”, de André Aciman, que também
tem versão em filme.
2 Doutoranda e Mestra em Direito pela Universidade Federal da Bahia, Professora de
Direito Civil da Universidade Salvador (UNIFACS), Advogada, Vice-presidenta do
Instituto Baiano de Direito e Feminismos - IBADFEM (2021-2023), Membro dos grupos
de pesquisa Vida e Conversas Civilísticas.
3 Doutora em Direito das Relações Sociais (Direito Civil) pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC/SP-2003), Mestre em Instituições Jurídico-Políticas (Direito
Ambiental e Civil) pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC-1999), Bacharela
em Direito pela Universidade Católica do Salvador (UCSal - 1996), Professora Associada
de Direito Civil na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia.
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A partir dessa observação, o escopo do presente trabalho é analisar
a evolução do tratamento jurídico dado ao direito ao nome no Brasil,
especialmente a partir do seu reconhecimento com Direito de
personalidade pelo Código Civil. Para tanto, serão investigados o
regramento legislativo do direito ao nome desde a codificação anterior, o
posicionamento da jurisprudência sobre pedidos de alteração de nome e
normas administrativas.
A pesquisa tem objetivo explicativo e valeu-se do procedimento
de análise bibliográfica e documental com abordagem qualitativa.
2. O reconhecimento do direito ao nome como um atributo da
personalidade
Costuma-se dizer que o nome é o primeiro bem jurídico que a
pessoa recebe de sua família. Composto de prenome, simples ou duplo,
sobrenome ou apelidos de família e, eventualmente, de agnome, é o
primeiro elemento de identificação do indivíduo na sociedade. Contudo, a
despeito desta importância na vida civil da pessoa, apenas com a
Codificação de 2002 e a respectiva proteção legal da personalidade, o nome
é expressamente apresentado como um direito da personalidade
propriamente dito.
No Código Civil de 1916, a única referência ao nome como um
direito exsurge da sanção contida no artigo 324, somente revogada pela Lei
do Divórcio,4 que dispunha: “A mulher condenada na ação de desquite
perde o direito a usar o nome do marido.”
Curiosamente, embora a norma sancionadora se refira ao uso do
nome do marido como um direito, este uso era, em verdade, um dever do
casamento, imposto apenas às mulheres, como previsto no artigo 240 do
mesmo Código.
A Lei de Registros Públicos,5 de 1973, tratou do nome ao regular
os assentos de nascimento e casamento, sem, porém, afirmá-lo
efetivamente como um direito da pessoa.
O Código Civil de 2002, ainda que fruto de um projeto inicial da
década de 1970 e, portanto, sem tantas inovações condizentes com as
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