Decisão Monocrática Nº 0000268-10.2010.8.24.0083 do Segunda Vice-Presidência, 27-10-2020

Número do processo0000268-10.2010.8.24.0083
Data27 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCorreia Pinto
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0000268-10.2010.8.24.0083/50001, de Correia Pinto

Recorrente : Júnior Cesar da Silva
Advogados : Marlon Charles Bertol (OAB: 10693/SC) e outro
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Procs.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça) e outro
Interessado : Sebastião do Prado Gonçalves
Advogado : Osny Bittencourt Batista (OAB: 544/SC)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Júnior Cesar da Silva, com fulcro no art. 105, III, "a", da Constituição da República, interpôs Recurso Especial contra os acórdãos proferidos pela Quarta Câmara Criminal, que decidiu, por unanimidade, "conhecer e dar parcial provimento ao recurso do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, conhecer e negar provimento aos recursos dos réus Sebastião do Prado Gonçalves e Júnior César da Silva; e arbitrar honorários ao advogado nomeado exclusivamente para apresentar contrarrazões" (fls. 820 - 832 dos autos principais), e rejeitar os respectivos Embargos de Declaração (fls. 10 - 13 do incidente n. 50000).

Em suas razões, alegou violação, primeiramente, aos arts. 232 do Código de Processo Penal e 297 do Código Penal, pois não absolvido das imputações em razão da atipicidade da conduta.

Sustentou afronta, igualmente, ao art. 171 do Código Penal, porque não foi condenado pelo crime de estelionato tentado, o que viabilizaria a aplicação da Súmula 17 do STJ, e apontou ofensa, ainda, ao art. 619 do Código de Processo Penal, já que não sanados os vícios apontados nos Embargos de Declaração.

Ao final, requereu a atribuição de efeito suspensivo ao reclamo (fls. 1 - 14).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 24 - 33), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

De plano, adianta-se que o Recurso Especial não reúne as condições de ascender à Corte de destino.

1. Da violação aos arts. 232 do Código de Processo Penal e ao art. 297 do Código Penal

Alegou a defesa, inicialmente, que "embora a confecção da urna com fundo falso seja uma conduta reprovável, com as devidas vênias, não se trata de falsificação de documento público" (fl. 7), especialmente porque, a seu ver, "A característica fundamental do documento reside no fato de ser ele escrito, a exemplo do que dispõe o artigo 232 do Código Processual Penal" (fl. 7).

Assim, não reconhecida que a conduta praticada pelo recorrente era atípica, teria a Corte estadual violado os arts. 232 do Código de Processo Penal e 297 do Código Penal.

Veja-se como foi mantido o édito condenatório, com a análise da questão relativa à atipicidade da conduta:

Analisar-se-á, inicialmente, o apelo interposto pelas defesas dos réus, que pretendem a absolvição do delito previsto no art. 297, §1º, do Código Penal, que assim prevê:

[...]

Nessa rumo, vislumbra-se que a materialidade e a autoria delitivas encontram-se comprovadas através do boletim de ocorrência n. 674 (fls. 78-87), da ata de eleição da mesa diretora da Câmara Municipal de Vereadores de Ponte Alta realizada no dia 15/12/2009 (fls. 88-91), do auto de exibição e apreensão (fl. 204), do laudo pericial n. 0947187/2010 (fls. 244-248), do laudo pericial n. 0956253/IC/2010 (fls. 257-269) e das provas testemunhais em ambas as fases procedimentais.

Ao revés do que aponta o conjunto probatório, os réus Júnior e Sebastião negam que tenham falsificado a urna de votação, bem como negam que tenham falsificado nove cédulas de votação (fls. 102; 213-214 e 215; mídias de fls. 13-14).

Por outro lado, o vereador Horácio Morais esclareceu que um pouco antes da apuração dos votos para a mesa diretora da Câmara, pegou a caixa que serviu que urna para averiguá-la, oportunidade em que constatou a presença de um fundo falso na caixa contendo as cédulas depositadas pelos vereadores que votaram. Descreveu que o réu Júnior tentou retirar a caixa das mãos da testemunha, dando início a uma confusão, que foi apaziguada pelos policiais que faziam a segurança do local (fls. 211-212 e mídia de fl. 54).

No mesmo caminho os vereadores Claudemir Pereira dos Santos, Edison Portela Alves, José Oliveira Tobias Pereira e José Raniel Bartsen exararam em ambas as fases em que foram ouvidos que no início da contagem dos votos, o vereador Horácio pegou a urna e a chacoalhou, momento em que percebeu existir mais votos dentro da caixa, o que desencadeou uma briga com o réu Júnior César. Após os policiais que estavam no local acalmarem os ânimos, constataram que os votos retirados da urna para contagem favoreciam a chapa dos acusados (fls. 205; 206; 208; 209-210 e mídias de fl. 54).

O vereador Moacir Lourenço dos Santos ainda esclareceu que antes de iniciaram a votação pediram para verificar a urna, mas não foi autorizado (fls. 216-217 e mídia de fl 54).

O secretário da câmara, Fernando Beninca, disse que era sua responsabilidade confeccionar a urna para votação da mesa diretora da Câmara, bem como imprimir cédulas para quantidade exata de votantes, ou seja, nove vereadores. Contudo, os réus eximiram o secretário da obrigação de confeccionar a urna, pois disseram que eles mesmos a providenciariam. Além disso, o réu Sebastião pediu para o secretário imprimir mais 9 (nove) cédulas, as quais foram assinadas e ficaram na posse do acusado Sebastião (fl. 218 e mídia de fl. 54).

Os policiais que procederam a segurança da Câmara de Vereadores no dia dos fatos relataram que o réu Sebastião, presidente da Câmara à época, chegou na sessão carregando a urna de votação e logo depois iniciou os trabalhos. Quando iniciaram a contagem dos votos para a mesa diretora, o vereador Horácio apanhou a caixa que serviu de urna e constatou haver um fundo falso, momento em que iniciou-se uma confusão, que foi contida pelos policiais (fls. 234; 235 e mídia de fl. 54).

Nesse contexto, infere-se inegavelmente que os acusados Sebastião do Prado Gonçalves e Júnior César da Silva, em unidade de desígnios, falsificaram a urna de votação da eleição para a mesa diretora da Câmara de Vereadores, confeccionando um fundo falso e nele depositando cédulas de votação também falsificadas, todas rubricadas pelo réu Sebastião e preenchidas, sendo que a maioria destes votos favoreciam a chapa dos acusados.

A autoria delitiva extrai-se cristalina nos autos através das palavras do secretário de câmara, Fernando, que afirmou que foram os acusados que providenciaram a caixa que serviu de urna para votação. Além disso relatou que o réu Sebastião solicitou a impressão de mais 9 (nove) cédulas de votação, que foram assinadas por ele e ficado todas em sua posse.

Corroborando o exposto pelo secretário, os vereadores presentes na sessão foram unânimes em relatar que após a votação, quando do início da contagem dos votos, o vereador Horácio, ao apanhar a urna, constatou a presença de um fundo falso e que os votos retirados pelo réu Sebastião para contagem, pela parte de baixo da caixa, eram fasificados e favoreciam a chapa dos apelantes, restando os votos dos vereadores presentes retidos no compartimento superior da urna.

Além disso, tem-se o interrogatório dos réus que, em que pese tenham negado a falsidade, ambos afirmaram que, no dia dos fatos, foi o réu Júnior quem arrumou a caixa e a deixou na sala da secretaria, onde outros vereadores não tiveram acesso. Depois disso, conforme relatado pelos policiais e alguns vereadores, o acusado Sebastião levou o objeto para a sessão onde foi realizada a eleição. Nesse rumo, observa-se que a caixa que serviu de urna esteve na posse somente dos acusados, indicando, assim, a autoria do fundo falso, onde foram depositadas as cédulas falsas.

E não há falar em atipicidade de conduta, pois, acerca do referido delito, a doutrina leciona que para a consumação basta a configuração da falsidade, sendo imprescindível a comprovação do dano, que é presumido:

[...]

Entendemos ser o delito de perigo abstrato, como os demais crimes de falsificação. Assim, para configurar risco de dano à fé pública, que é presumido, basta a contrafação ou modificação do documento público. (NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito parte especial:: arts. 213 a 361 do código penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 404, grifou-se).

Outrossim, quanto à tese defensiva de que as falsidades foram uma armação política contra os apelantes, conforme bem exaltou o Magistrado de primeira instância: "é absolutamente pueril pressupor que, visando prejudicá-los, os oponentes políticos os elegeriam para o mais alto cargo do legislativo municipal, cuja atribuição traria status e prestígio político, notadamente em uma cidade com apenas 5 mil habitantes. A propósito, embora não tenha sido efetivamente comprovado nos autos, tal encargo daria bonificação salarial ao presidente da mesa diretora (interrogatório de Sebastião do Prado Gonçalves; fl. 399)".

Também não prospera a tese de falsificação grosseira. Isto porque durante a votação nenhum dos presentes tenham percebido qualquer dissonância na urna, sendo descoberta a falsidade apenas quando o vereador Horácio apanhou a urna e a chacoalhou, percebendo, assim, a presença de um fundo falso com mais cédulas já preenchidas. Ademais, a perícia técnica não apontou serem os documentos falsidades grosseiras.

Melhor sorte não assiste à defesa, quanto à incidência da Sumula 17 do STJ, que assim dispõe: "Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido". Visto que o crime de estelionato não foi confirmado na sentença, impossível a absorção do crime previsto no art. 297 do Código Penal.

Dessa forma, a negativa exarada pelos acusado é elemento único e destoante nos autos, cujo arcabouço probatório é uníssono, harmônico e aponta, sem dúvidas,os apelantes Sebastião do Prado Gonçalves e Júnior César da Silva como autores do crime previsto no art. 297, §1º, do Código Penal. (fls. 825 - 829 dos autos principais)

Como se vê, em atenção ao...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT