Decisão Monocrática Nº 0000917-89.2019.8.24.0040 do Segunda Vice-Presidência, 16-10-2020

Número do processo0000917-89.2019.8.24.0040
Data16 Outubro 2020
Tribunal de OrigemLaguna
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0000917-89.2019.8.24.0040/50001, de Laguna

Rectes. : Ismael João Freitas e outro
Advogada : Milena Aragao Dryll de Souza (OAB: 18443/SC)
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Proc.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Ismael João Freitas, Rosangela de Jesus Freitas, com fulcro no art. 105, III, "a", da Constituição da República, interpôs Recurso Especial contra os acórdãos proferidos pela Primeira Câmara Criminal, que decidiu, por unanimidade, "conhecer parcialmente do recurso do apelante Ismael João Freitas e, na parte conhecida, negar-lhe provimento e conhecer do recurso de Rosângela de Jesus Freitas e negar-lhe provimento" (fls. 805 - 846 dos autos principais), e rejeitar os respectivos Embargos de Declaração (fls. 8 - 16 do incidente n. 50000).

Em síntese, a defesa alegou violação ao art. 386 do Código de Processo Penal, diante da insuficiência de provas para a manutenção da condenação da recorrente Rosângela pelos crimes de tráfico e associação ao tráfico de drogas.

Requereu, igualmente, a absolvição do recorrente Ismael pelo furto de energia elétrica, sob a tese de desconhecimento da ligação clandestina (fls. 1 - 9).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 13 - 24), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

De plano, adianta-se que o Recurso Especial não reúne as condições de ascender à Corte de destino.

1. Da violação ao art. 386 do Código de Processo Penal

Alegou a defesa, inicialmente, que em relação aos crimes de tráfico e associação ao tráfico de drogas, "não houve comprovação que a autora era a realizadora do delito, havendo apenas a confirmação da realização do crime por parte exclusiva de seu companheiro, ISMAEL JOÃO" (fl. 5).

Veja-se como a questão foi debatida no acórdão:

A materialidade e a autoria dos crimes estão caracterizadas pelo Auto de Prisão em Flagrante (fls. 305-366), Boletim de Ocorrência (fls. 307-310), Auto de Apreensão (fl. 313), Laudo de Constatação Preliminar (fl. 327), Laudo Pericial (fls. 552-553), Relatório de Interceptação Telefônica (fls. 234-252) e pela prova oral produzida em ambas as fases procedimentais.

O teor dos documentos (Termo de Exibição e Apreensão, Laudo de Constatação Provisório e Laudo Pericial Definitivo), todos acostado aos autos, consignam, em especial o último, a natureza e a quantidade de droga apreendida: 1 (uma) porção de pó branco, acondicionada individualmente em embalagem de plástico incolor, apresentando a massa bruta de 18,5g (dezoito gramas e cinco decigramas), contendo cocaína, sendo que essa substância capaz de causar dependência física e/ou psíquica, estando seu uso proibido em o o território nacional, consoante Portaria n. 344/98 da ANVISA.

A autoria dos delitos, igualmente, está comprovada nos autos e evidenciada pela prova testemunhal colhida na fase policial e em Juízo, bem como pelo relatório de investigação, dando conta de que os apelantes estavam envolvidos com o comércio espúrio e associados para tanto.

[...]

A credibilidade da tese defensiva é rechaçada pelos dados extraídos do relatório de investigações, bem como pelo laudo pericial efetuado nos aparelhos telefônicos, os quais foram confirmados pela palavra dos policiais que efetuaram a prisão em flagrante dos recorrentes, que não deixam dúvidas sobre a narcotraficância perpetrada por Ismael e Rosângela e pela associação para o tráfico praticada por ambos, pois revelam suas condutas e o comércio de entorpecentes.

Como dito, ao todo, foram apreendidos com os apelantes, no interior de sua residência, além de quantia em dinheiro (R$1.508,00 em diversas notas), caderno de anotações, bicarbonato de sódio, petrecho este de comercialização espúria, e a droga 18,5g de cocaína), denotando a evidente intenção da traficância.

[...]

Como se vê, Ismael e, posteriormente, Rosângela, estavam sendo investigados pelo crime de tráfico de drogas e associação para o tráfico, sendo comprovado por meio das informações da supra mencionada declaração e, também, mediante os depoimentos das testemunhas de acusação (como se verá adiante), que os recorrentes negociavam e vendiam drogas, as quais, eram mantidas por eles em depósito ou guardada, para posterior comercialização.

A transcrição referida acima coaduna-se às robustas provas orais dos agentes de segurança pública envolvidos na ocorrência, os quais prestaram depoimentos harmônicos e coerentes entre si, em sentido totalmente contrário à narrativa da defesa, demonstrando o envolvimento dos recorrentes com o tráfico de drogas.

[...]

Salienta-se que os depoimentos prestados pelos agentes estatais, somados aos dados extraídos do relatório de investigação, são suficientes para sustentar o decreto condenatório, porquanto suas alegações, além de estarem em consonância com as demais provas dos autos, são dotadas de presunção de veracidade e legitimidade.

[...]

Assevera-se que a defesa não ofereceu contradita durante a audiência de instrução e julgamento (art. 214 do CPP), bem como não apresentou provas que enfraqueçam a atuação proba dos agentes de segurança pública comprometidos na ocorrência.

Com efeito, o livre convencimento motivado do juiz, princípio vigente na legislação processual penal brasileira, permite ao magistrado utilizar todos os subsídios que julgar necessários e não forem proibidos por lei, para, de forma fundamentada, julgar os casos que lhe são apresentados, revestindo-se, nesse sentido, as declarações dos policiais robustas a embasar a condenação.

Registra-se, além disso, que o flagrante do ato de mercancia não é imprescindível para configuração do crime de tráfico:

[...] para a configuração do crime de tráfico é irrelevante a ausência do estado flagrancial no tocante a venda de tóxico a terceiros, pois trata-se de crime permanente, onde só a detenção pelo agente da substância proibida, para fins de comércio, basta ao reconhecimento da conduta incriminada no art. 33 da Lei 11.343/2006 (MARCÃO, Renato. Tóxicos: Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006: Lei de Drogas. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 159).

Portanto, considerando-se a droga apreendida no dia dos fatos, os petrechos de comercialização encontrados (como caderno de anotações, bicarbonato de sódio, embalagens plásticas, valor em dinheiro - R$1.50800), bem como o depoimento conciso dos policiais que realizaram a abordagem e invetigação, mostra-se escorreita a prolação do decreto condenatório em desfavor dos recorrentes quanto à mercancia de entorpecentes, nos termos do art. 33, caput, da Lei de Drogas.

Os policiais militares narraram detalhadamente como que ocorreu a operação, bem como que ela foi realizada depois de muitas notícias de que os acusados praticavam o comércio espúrio de entorpecentes naquele local.

Não há dúvidas, portanto, que o recorrente Ismael vendia entorpecentes, pois conhecia outros traficantes poderosos. Sua operação, ajudada pela sua companheira e apelante Rosângela.

[...]

Do mesmo modo que está amplamente configurado o delito de tráfico de drogas, as provas angariadas nos autos são contundentes de que os acusados estabeleceram um vínculo associativo estável e permanente para a prática do comércio ilícito. Portanto, o vínculo associativo transparece manifesto.

Para a caracterização do crime de associação criminosa é imprescindível a demonstração concreta do vínculo permanente e estável entre duas ou mais pessoas, com a finalidade de praticarem os delitos do artigo 33, caput e §1º e/ou do artigo 34, da Lei de Drogas.

Colhe-se do dispositivo legal que a associação deve ter o desígnio de executar qualquer dos crimes previstos nos artigos 33, caput, e §1º, e 34, da Lei de Drogas, bastando, para tanto, que esta associação seja realizada para cometer apenas um desses delitos, reiteradamente ou não.

No caso dos autos, as provas colacionadas apontam que o apelantes possuíam vínculo associativo para a prática do comércio ilícito de entorpecentes. Como já mencionado, a agência de inteligência da Polícia Civil produziu extensa investigação dos acusados, detalhando as funções de cada um e o modus operandi de todo o esquema criminoso.

Logo, entende-se que os autos demonstram, de maneira suficiente, que os apelantes agiam em associação, em comunhão de vontades, para que juntos realizassem a venda de drogas, um aderindo à vontade do outro, auxiliando-se reciprocamente na empreitada criminosa, não se suas condenações pela prática do crime de associação para o tráfico de drogas.

Deste modo, é incontestável a autoria delitiva dos recorrentes Ismael e Rosângela no delito de associação para o tráfico, já que devidamente comprovado, que Ismael chefiava a associação criminosa de ambos voltada à prática do comércio espúrio, na qual a apelante Rosângela estava diretamente envolvida com o mesmo objetivo.

Importante referir a imprescindibilidade, para a configuração do crime de associação para o tráfico de drogas, da vinculação subjetiva dos indivíduos e a estabilidade capazes de indicarem a existência de entidade criminosa.

Neste norte, sustenta-se que o ilícito previsto no art. 35 da Lei de Drogas exige, como elemento indissociável do tipo, a estabilidade e não o mero concurso eventual dos indivíduos. Tal exigência da legislação remete-se a prova, inequívoca, de que a conjugação de esforços para a concretização do crime de tráfico seja anterior à conduta típica descrita na denúncia, cuja demonstração, apreciada sob o crivo do contraditório judicial, seja capaz de comprovar a estabilidade dos agentes para a prática do delito.

E é exatamente o que se verificou no caso em tela, uma vez que restou demonstrado o ânimo associativo dos envolvidos mediante as provas existentes nos autos.

Sem maiores...

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