Decisão Monocrática Nº 0000970-26.2017.8.24.0045 do Segunda Vice-Presidência, 22-11-2019

Número do processo0000970-26.2017.8.24.0045
Data22 Novembro 2019
Tribunal de OrigemPalhoça
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0000970-26.2017.8.24.0045/50001, de Palhoça

Recorrente : Hélton Souto de Araújo
Advogado : Osvaldo José Duncke (OAB: 34143/SC)
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Proc.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça)
Interessada : Andresa Pereira Mickosz

DECISÃO MONOCRÁTICA

Hélton Souto de Araújo, com fulcro no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, interpôs recurso especial ontra acórdão da Quarta Câmara Criminal, que, à unanimidade, negou provimento à apelação defensiva e manteve sua condenação à pena de 12 (doze) anos de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de 572 (quinhentos e setenta e dois) dias-multa, por infração aos arts. 15 e 16, parágrafo único, IV, ambos da Lei n. 10.826/2003 e art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 (fls. 374-395 dos autos principais).

Em síntese, suscita negativa de vigência e interpretação divergente a lei federal (fls. 01-36 do incidente n. 50001).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 40-55 do mesmo incidente), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

De plano, adianta-se que o recurso especial não reúne condições de ascender à Corte de destino.

1. Alínea "a" do art. 105, III, da CRFB/88:

1.1 Da ausência de indicação dos dispositivos supostamente violados:

Inicialmente, frisa-se que a admissão do reclamo especial exige, quer pelas alíneas 'a' e 'b', quer pela alínea 'c' do permissivo constitucional (CF, art. 105, III), além da indicação dos dispositivos de lei federal contrariados ou objetos de interpretação divergente por outra Corte, a impugnação dos fundamentos da decisão recorrida ao interpretá-los, requisito imprescindível à compreensão da controvérsia jurídica e à comprovação do dissenso pretoriano.

Contudo, o recorrente olvida-se de indicar de forma clara e objetiva qual(is) dispositivo(s) de lei(s) federal(is) teria(m) sido violado(s), de modo que não é possível apreender, com a exatidão exigida nesta esfera recursal especial, as teses jurídicas veiculadas.

Assim, a insurgência encontra óbice na Súmula 284 do STF, aplicável ao apelo especial por similitude: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

Nesse norte:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO. NULIDADES. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DOS DISPOSITIVOS LEGAIS VIOLADOS. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO. SÚMULA 284 DO STF.

1. Nas razões do apelo nobre, a defesa acusou a ocorrência de diversos vícios que, supostamente, ensejariam a nulidade do feito, deixando, contudo, de indicar os dispositivos infraconstitucionais que teriam sido violados.

2. A falta de indicação dos dispositivos legais infringidos pela decisão recorrida demonstra a patente deficiência na fundamentação do apelo extremo, o que impossibilita a exata compreensão da controvérsia, fazendo incidir, na espécie, o óbice previsto na Súmula n. 284/STF.

[...] 4. Agravo regimental não provido." (AgRg no REsp 1.581.633/PR, rel. Min. Jorge Mussi, j. em 04/10/2018)

A deficiência da fundamentação, por ser incompreensível, evidencia a inobservância ao princípio da dialeticidade.

Nada obstante, o presente reclamo encontra outros óbices para sua ascensão.

1.1.1 Da alegada interferência da testemunha de acusação:

O recorrente sustenta que "uma das testemunhas de acusação, um policial militar, permaneceu assistindo a audiência de instrução e julgamento e por várias oportunidades interferiu nos depoimentos das demais testemunhas e nos interrogatórios dos acusados" (fl. 07 deste incidente).

Sobre o tema, destaca-se da decisão impugnada (fls. 377-379 dos autos principais):

Ab initio, no tocante à "preliminar" do apelo, verifica-se que, a despeito de ter sido aventada a interferência de uma testemunha policial militar durante a audiência de instrução e julgamento, não foi formulado qualquer pedido de nulidade.

Ademais, verifica-se que a argumentação foi exposta nos seguintes termos (fl. 312):

Antes de adentrar-se ao mérito, necessária se faz a exposição de fatos que trouxeram prejuízos ao Apelante, haja vista que uma das testemunhas de acusação, um policial militar, permanecera assistindo a audiência de instrução e julgamento e por várias oportunidade interferiu nos depoimentos das demais testemunhas e nos interrogatórios.

Tal fato pode ser averiguado no decorrer dos depoimentos. Em várias oportunidades este policial atrapalhou, corrigiu os relatos de seus colegas, concordando e discordando com os fatos narrados por aqueles.

A defesa solicitou que se mantivesse quieto, o que fora também solicitado pela Magistrada. Tais fatos colocam em cheque os depoimentos, haja vista que puderam, por intermédio de intervenções, "arrumar" seus relatos.

Ocorre que a admissilidade do recurso depende do preenchimento de alguns requisitos, "para que a utilização das vias recursais não se transforme em instrumento de abuso de direito ou de mera satisfação de curiosidade acadêmica" (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 21. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017. p. 966).

Outrossim, conquanto a argumentação da defesa no âmbito do processo penal possa ser exígua, exige-se, ao menos, explanação acerca do pedido formulado, possibilitando-se que a parte contrária possa rebater os argumentos lançados. Ausentes os fundamentos do inconformismo, há clara afronta ao princípio da dialeticidade recursal.

[...]

Portanto, além de sequer ter havido requerimento de qualquer natureza, percebe-se que não foram indicadas as interferências ou prejuízos concretos da suposta interferência da testemunha - que tampouco é possível verificar quem seria -, tratando-se de pleito genérico.

Logo, no ponto, o reclamo não pode ser conhecido. "

Dessarte, verifica-se que a pretensão recursal ora reiterada sequer foi conhecida pela Câmara de origem, a qual considerou o pedido genérico, bem como ausente a demonstração do efetivo prejuízo à defesa.

Assim, a insurgência recursal transborda as funções do Superior Tribunal de Justiça de primar pela correta interpretação do direito federal infraconstitucional e uniformizar a jurisprudência pátria, porquanto a alteração do entendimento citado demandaria a reelaboração da moldura fática delineada no aresto combatido - o que é vedado nesta via, conforme preconizado na Súmula 07 do STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial".

Nada obstante, o entendimento exarado na decisão combatida se coaduna com a jurisprudência da Corte destinatária, a qual considera que o reconhecimento de nulidades no processo penal exige a demonstração de efetivo prejuízo:

"AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. PRESCINDIBILIDADE. APENADO OUVIDO EM SINDICÂNCIA, NA PRESENÇA DA DEFESA TÉCNICA. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. AFASTAR OU ALTERAR A CLASSIFICAÇÃO DA INFRAÇÃO. VIA ELEITA INADEQUADA. PERDA DOS DIAS REMIDOS. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

[...]

2. Os Tribunais Superiores possuem o entendimento de que, tanto na nulidade relativa quanto na absoluta, é imprescindível a demonstração de efetivo prejuízo, em observância ao princípio pas de nullité sans grief. Porém, no caso concreto, a defesa não cumpriu com essa obrigação.

[...]

5. Agravo regimental desprovido." (AgRg no HC 533904/SP, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. em 22/10/2019)

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CONCUSSÃO. CRIMES DA LEI DE LICITAÇÕES. NULIDADE. NÃO OBSERVÂNCIA DO ART. 514 DO CPP. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. ART. 563 DO CPP. TRANCAMENTO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. VÍCIOS NÃO VERIFICADOS. RECURSO IMPROVIDO.

1. Prevalece no moderno sistema processual penal que eventual alegação de nulidade deve vir acompanhada da demonstração do efetivo prejuízo. Como é cediço, não se proclama uma nulidade sem que se tenha verificado prejuízo concreto à parte, sob pena de a forma superar a essência. Vigora, portanto, o princípio pas de nullité sans grief, a teor do que dispõe o art. 563 do Código de Processo Penal.

2. A ação penal foi precedida por procedimento investigatório, o que revela a desnecessidade de observância do procedimento previsto no art. 514 do CPP, cuidando-se, inclusive, de entendimento sumulado no verbete n. 330 desta Corte. Ainda que assim não fosse, não se observa em que consistiria eventual prejuízo acarretado pela não observância do referido dispositivo legal, principalmente diante da efetiva existência de investigação prévia.

[...]

6. Recurso improvido." (RHC 85785/RJ, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 15/10/2019)

Portanto, incide na hipótese a Súmula 83 do STJ ("Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida."), também aplicável, consoante iterativa jurisprudência da Corte Superior, a recurso especial fundado na alínea "a" do permissivo constitucional (STJ, AgRg no AREsp 1441188/SC, Rel. Min. Jorge Mussi, j. em 15/08/2019).

Com efeito, se a decisão combatida observa a jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria, não se vislumbra qualquer ofensa ao direito federal infraconstitucional, de modo que contra ela é inadmissível o recurso especial.

1.1.2 Da pretensão absolutória:

O insurgente também pugna pela absolvição quanto ao cometimento do delito de tráfico de drogas, sob a assertiva de insuficiência probatória apta à mantença da condenação que lhe foi imposta.

Sobre a questão, destaca-se do aresto impugnado (fls. 379-387 dos autos principais):

"O apelante busca a absolvição sob o argumento de que o conjunto probatório é inidôneo a...

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