Decisão Monocrática Nº 0000992-20.2012.8.24.0026 do Primeira Câmara de Direito Civil, 31-01-2020
Número do processo | 0000992-20.2012.8.24.0026 |
Data | 31 Janeiro 2020 |
Tribunal de Origem | Guaramirim |
Órgão | Primeira Câmara de Direito Civil |
Classe processual | Apelação Cível |
Tipo de documento | Decisão Monocrática |
Apelação Cível n. 0000992-20.2012.8.24.0026 de Guaramirim
Apelante : Clara Kasmirski Martendal
Advogado : Ademir Sprung (OAB: 18050/SC)
Apelada : Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S/A
Advogados : Paulo Antonio Müller (OAB: 30741/SC) e outro
Relator: Des. Gerson Cherem II
DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA
Trata-se de apelação cível interposta por Clara Kasmirski Martendal, irresignada com a sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Guaramirim que, nos autos da ação de cobrança aforada em face de Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S.A., julgou improcedente o pleito inicial, nos seguintes termos (fls.348/349):
Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, rejeito os pedidos formulados por Clara Kasmirski Martendal contra Metroplitan Life Seguros e Previdencia Privada S/A.
Tendo em vista a sucumbência integral da parte autora, condeno-a ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), com espeque no artigo 85, §2º, do Código Processual Civil.
Inconformada, a demandante alegou a incidência do Código de Defesa do Consumidor, a fim de que a avença fosse interpretada de maneira favorável à consumidora. Sustentou que a doença laboral equiparava-se ao acidente de trabalho para fins securitários. Por fim, pleiteou a reforma da sentença para julgar-se procedente a pretensão indenizatória (fls. 353/363).
Com as contrarrazões (fls. 367/382), ascenderam os autos a este Sodalício.
É o relatório.
Presentes os requisitos legais, conheço do recurso.
1) Do agravo retido interposto pela seguradora:
Antes de adentrar-se no exame do apelo, cabe anotar que, malgrado a interposição de agravo retido pela ré (fls. 290/298), inexiste preliminar nas contrarrazões do recurso de apelação, na qual se peça expressamente a análise do reclamo.
Tal requisito era imprescindível à regular apreciação do mérito, conforme determinação do art. 523, § 1º, do CPC/73, vigente à época: "não se conhecerá do agravo se a parte não requerer expressamente, nas razões ou na resposta da apelação, sua apreciação pelo Tribunal".
Nesse sentido:
AGRAVO RETIRO - AUSÊNCIA DE REEDIÇÃO NAS RAZÕES DE APELAÇÃO - NÃO CONHECIMENTO. O não atendimento do § 1º, do art. 523 do CPC, pedido nas razões ou contrarrazões recursais para que o Tribunal aprecie o agravo retido, constitui óbice para a admissibilidade do mesmo. (AC n. 2012.021362-8, rel. Des. Guilherme Nunes Born, j. em 24.04.2012).
Assim, não se conhece do agravo retido em comento.
2) Do apelo da autora - Da indenização securitária:
A insurgente pleiteia a aplicabilidade do CDC, asseverando que a doença laboral que a acomete equipara-se ao acidente de trabalho para fins securitários.
Melhor sorte não lhe acode, todavia.
De plano, vale destacar o escólio de Arnaldo Rizzardo, para quem o seguro configura-se no negócio jurídico em que "um dos contratantes se obriga a indenizar o outro, ou terceiros, mediante o recebimento de determinada importância, denominada prêmio, de prejuízos decorrentes de riscos futuros e especificamente previstos" (in Contratos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 539).
Com efeito, nos contratos de seguro torna-se possível listar as limitações à abrangência do risco, sobre o qual o prêmio é computado. As seguradoras não estão obrigadas a indenizar o bem submetido a qualquer tipo de dano, sem restrições, o que poderia inviabilizar a própria atividade delas.
Todavia, tais ressalvas devem seguir os ditames do Código de Defesa do Consumidor, cujo § 4º, do art. 54, determina:
Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
[...]
§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.
Se persistirem dúvidas acerca do significado e alcance dos termos contratuais, especialmente aqueles limitativos de direitos do consumidor, a solução é dada pelo comando do art. 47 do CDC, que determina: "as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor". Aliás, o art. 46, do CDC, enuncia a imprescindibilidade da cognição prévia do contrato aos que a ele anuírem. Confira-se dos referidos dispositivos:
Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.
Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.
Sobre o tema, leciona Nelson Nery Junior:
Os princípios da teoria da interpretação contratual se aplicam aos contratos de consumo, com a ressalva do maior favor ao consumidor, por ser a parte débil da relação de consumo. Podemos extrair os seguintes princípios específicos da interpretação dos contratos de consumo: a) a interpretação é sempre do que à literalidade da manifestação de vontade (art. 85, Código Civil); c) a cláusula geral de boa-fé reputa-se ínsita em toda relação jurídica de consumo, ainda que não conste expressamente do instrumento do contrato (arts. 4º, caput e nº III, e 53, nº IV, do CDC); d) havendo cláusula negociada individualmente, prevalecerá sobre as cláusulas estipuladas unilateralmente pelo fornecedor; e) nos contratos de adesão as cláusulas ambíguas e contraditórias ser fazem contra sitpulatorem, em favor do aderente (consumidor); f) sempre que possível interpreta-se o contrato de modo a fazer com que suas cláusulas tenham aplicação, extraindo-se delas um máximo de utilidade (princípio da conservação). (Grinover, Ada Pelegrini; et. al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 7. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 488/489).
Por outro lado, torna-se impossível a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC), porquanto "tal benefício não exclui a obrigação do recorrente de carrear aos autos elementos probatórios mínimos a corroborar seus argumentos" (AC n. 2013.059228-0, rel. Des. Jairo Fernandes Gonçalves, j. em 30.06.2014).
Cumpre observar, ainda, que as seguradoras fazem parte do Sistema Nacional de Seguro Privados (SNSP), encabeçado pelo Ministério da Economia, responsável por formular a política de seguros privados, estabelecer as normas e fiscalizar as operações no mercado nacional, o qual é igualmente integrado pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), com competência para regulamentar a oferta e fiscalizar a comercialização dos contratos de seguro.
O CNSP editou a Resolução n. 117/2004, consolidando as regras de funcionamento e os critérios para operação das coberturas de risco oferecidas em plano de seguro de pessoas, ao passo que a SUSEP publicou a Circular n. 302/2005, com regras complementares de funcionamento e os critérios para operação das coberturas de risco oferecidas em plano de seguro de pessoas, passando a prever as seguintes coberturas relacionadas à incapacidade do segurado: invalidez permanente por acidente (IPA); invalidez laborativa permanente total por doença (ILPD); e invalidez funcional permanente total por doença (IFPD).
Da mencionada Circular n. 302/2005, extraem-se vários conceitos:
Art. 11. A cobertura de invalidez permanente por acidente garante o pagamento de uma indenização relativa à perda, à redução ou à impotência funcional definitiva, total ou parcial, de um membro ou órgão por lesão física, causada por acidente pessoal coberto.
[...]
Art. 15. Garante o pagamento de indenização em caso de invalidez laborativa permanente total, conseqüente de doença.
§ 1º Para todos os efeitos desta norma é considerada invalidez laborativa permanente total por doença aquela para a qual não se pode esperar recuperação ou reabilitação, com os recursos terapêuticos disponíveis no momento de sua constatação, para a atividade laborativa principal do segurado.
§ 2º Atividade laborativa principal é aquela através da qual o segurado obteve maior renda, dentro de determinado exercício anual definido nas condições contratuais.
§ 3º Consideram-se também como total e permanentemente inválidos, para efeitos da cobertura de que trata este artigo, os segurados portadores de doença em fase terminal atestada por profissional legalmente habilitado.
§ 4º Não podem configurar como segurados, para a cobertura de invalidez laborativa permanente total por doença, pessoas que não exerçam qualquer atividade laborativa, sendo vedado o oferecimento e a cobrança de prêmio para o seu custeio, por parte da sociedade seguradora.
[...]
Art. 17. Garante o pagamento de indenização em caso de invalidez funcional permanente total, conseqüente de doença, que cause a perda da existência independente do segurado.
§ 1º Para todos os efeitos desta norma é considerada perda da existência independente do segurado a ocorrência de quadro clínico incapacitante que inviabilize de forma irreversível o pleno exercício das relações autonômicas do segurado, comprovado na forma definida nas condições gerais e/ou especiais do seguro.
§ 2º Consideram-se também como total e permanentemente inválidos, para efeitos da cobertura de que trata este artigo, os segurados portadores de doença em fase terminal atestada por profissional legalmente habilitado.
Doutro viso, o Superior Tribunal de Justiça reconhece a validade das normas regulamentares. Confira-se:
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO COM ADICIONAL DE COBERTURA POR INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA - IFPD. PATOLOGIA DA COLUNA LOMBAR CONTROLADA POR...
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