Decisão Monocrática Nº 0001342-89.2018.8.24.0125 do Segunda Vice-Presidência, 21-04-2020

Número do processo0001342-89.2018.8.24.0125
Data21 Abril 2020
Tribunal de OrigemItapema
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0001342-89.2018.8.24.0125/50001, de Itapema

Recorrente : Arival Júnior Pioli
Advogado : Luiz Eduardo Cleto Righetto (OAB: 18453/SC)
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Procs.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça) e outro

DECISÃO MONOCRÁTICA

Arival Júnior Pioli, com fulcro no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição da República Federativa do Brasil, interpôs Recurso Especial contra acórdão da Segunda Câmara Criminal, que, por unanimidade, negou provimento ao recurso em sentido estrito da defesa, mantendo a decisão que o pronunciou pela prática, em tese, dos crimes s previstos nos arts. 121, caput, do Código Penal e 306 do Código de Trânsito Brasileiro; e rejeitou os embargos de declaração (fls. 11-14 do incidente 50000).

Em síntese, alegou violação ao art. 302, § 3º, do Código de Trânsito Brasileiro, porque rejeitada a desclassificação dos delitos dos arts. 121, caput, do CP e 306 do CTB, para o crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, bem como divergência jurisprudencial envolvendo a matéria (fls. 01-17 deste incidente).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 21-31 deste incidente), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

De início, cumpre ressaltar que a admissão do especial é ato que envolve apenas a verificação de pressupostos processuais, sem análise de mérito, razão pela qual a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que "(...) o juízo de admissibilidade do recurso especial não enseja o impedimento do Desembargador prolator da decisão que tenha participado do julgamento de recurso anterior atinente àquele feito" (EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 338.492/RJ, rel. Min. Humberto Martins, j. em 20/03/2014, DJe 27/03/2014).

De tal sorte:

[...] II. Nada obsta que o Desembargador Relator do recurso de apelação exerça, após assumir a Presidência (ou a Vice-Presidência, conforme o caso) do Tribunal de 2º Grau, o juízo de admissibilidade dos recursos de índole extraordinária interpostos contra o acórdão por ele próprio Relatado. Precedente. III. Nessa hipótese, não há que se falar em impedimento, pois a vedação do inciso III do mencionado dispositivo legal é de atuação do mesmo Magistrado no mesmo processo, mas em Instâncias diferentes, além de que, no juízo de admissibilidade dos recursos, não se aprecia o mérito (acerto ou desacerto) do aresto recorrido, mas tão-somente os requisitos legais previstos para o recebimento dos recursos. [...]." (STJ, HC 87.132/SP, relª. Minª. Jane Silva (Desª. convocada do TJ/MG), Sexta Turma, j. 18-12-2008 - grifou-se).

Dito isso, passa-se ao exame da admissibilidade e, adianta-se, que o Recurso Especial não reúne condições de ascender à Corte de destino.

1. Alínea "a" do art. 105, III, da Constituição da República

1.1 Da alegada negativa de vigência ao art. 302, § 3º, do Código de trânsito brasileiro

A pretensão recursal deduz controvérsia a respeito das premissas fáticas fixadas no acórdão recorrido, pressupondo reexame de provas, e não sua mera revaloração, o que é vedado em sede de recurso especial, em conformidade com a Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial".

Com efeito, não é possível cotejar as conclusões exaradas no acórdão com aquelas defendidas no recurso a respeito da possível configuração de dolo eventual na conduta do acusado sem revisar as provas atinentes à forma como os fatos ocorreram durante à conduta delituosa.

É que a possibilidade de dolo eventual foi admitida com base nos elementos probatórios a respeito do acidente e suas circunstâncias, conforme se depreende do seguinte excerto da decisão de pronúncia (fl. 1297):

A soma desses fatores (isto é, a condução de veículo com a capacidade psicomotora alterada pela ingestão de álcool, a imposição de velocidade excessiva no automóvel e a aparente indiferença ao resultado nefasto ocasionado), é considerada como indício suficiente a amparar a alegação da configuração do dolo eventual.

Como se vê, concluiu-se no acórdão que o acusado pode ter assumido o risco de provocar o resultado morte com o modo como os fatos ocorreram, sendo inviável descartar, a princípio, a possibilidade de dolo eventual.

Assim, considerando que para rever essa posição demandar-se-ia o reexame dos elementos probatórios acostados aos autos, a insurgência transborda as funções do Superior Tribunal de Justiça de primar pela correta interpretação do direito federal infraconstitucional e uniformizar a jurisprudência pátria.

A respeito do assunto, oportuno mencionar os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça, mutatis mutandis:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. HOMICÍDIO. DIREÇÃO SOB EFEITO DE ÁLCOOL. PRONÚNCIA. DOLO EVENTUAL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 302 DA LEI N. 9.503/1997 - CTB). NECESSIDADE DE ANÁLISE APROFUNDADA DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL AFETA AO TRIBUNAL DO JÚRI. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

[...]

2. Afirmar se o agente agiu com dolo eventual ou culpa consciente é tarefa que deve ser analisada pelo Tribunal do Júri, juiz natural da causa, de acordo com a narrativa dos fatos constantes da denúncia e com o auxílio do conjunto fático-probatório produzido no âmbito do devido processo legal, o que impede a análise do elemento subjetivo de sua conduta por este Sodalício. Precedentes.

3. A pretensão de desclassificar o crime de homicídio doloso para a modalidade culposa esbarra na necessidade de se aprofundar no exame do conjunto fático-probatório que deu ensejo à condenação, o que é vedado na via estreita do habeas corpus (AgRg no HC 356.380/MS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 8/8/2017, DJe de 16/8/2017).

4. Habeas corpus não conhecido. (HC 531.206/PR, Rel. Ministro Reynaldo Soares Da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 17/09/2019, DJe 24/09/2019)

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO NO TRÂNSITO. DECISÃO DE PRONÚNCIA. TESE DE REVALORAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS. IMPOSSIBILIDADE. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO HOMICÍDIO DOLOSO PARA CULPOSO. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N.7 DA SÚMULA/STJ. EMBRIAGUEZ COMPROVADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. REVISÃO QUE DEMANDA REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. - SUM 7 DO STJ. EXCESSO DE LINGUAGEM. NÃO COMPROVAÇÃO. MEDIDA CAUTELAR. IMPROPRIEDADE DE REEXAME NESTA INSTÂNCIA RECURSAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

[...]

2. A pretendida desclassificação de homicídio doloso para culposo no trânsito não merece amparo, pois seria necessário o revolvimento fático-probatório dos autos, procedimento inviável nesta instância recursal, por óbice do enunciado n. 7 da Súmula/STJ. Precedentes:

3. Outros meios de prova foram capazes de aferir a embriaguez do agravante. Reverter tal entendimento encontra óbice no enunciado n.7 da Súmula/STJ. Precedentes.

[,,,]

6. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no REsp 1.684.709/SP, rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. em 01/03/2018) [grifou-se]

PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO. CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR EM ALTA VELOCIDADE (RACHA) E SOB O EFEITO DE ÁLCOOL. DOLO EVENTUAL. DESCARACTERIZAÇÃO. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. INEXISTÊNCIA DE PROVAS DA CONDUTA DOLOSA. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. PRONÚNCIA. NULIDADE. EXCESSO DE LINGUAGEM NÃO CONFIGURADO.

1. A decisão de pronúncia não revela juízo de mérito mas apenas de admissibilidade da acusação, direcionando o julgamento da causa para o Tribunal do Júri, órgão competente para julgar os crimes dolosos contra a vida. Para tanto, basta a demonstração da materialidade do fato e a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, conforme disciplina o art. 413 do Código de Processo Penal.

2. Verificando-se que a imputação diz respeito a morte ocasionada por acidente de trânsito em suposto contexto de "racha", tem-se a materialidade, consistente na morte da vítima, bem como os indícios de autoria, uma vez que o recorrente conduzia o outro veículo envolvido na disputa. É isso que se requer, sucintamente, para autorizar o juízo de pronúncia.

3. Assim, tratando-se de crime contra a vida, presentes indícios da autoria e materialidade, deve o acusado ser pronunciado, em homenagem ao princípio do in dubio pro societate, cabendo ao Tribunal do Júri respectivo proferir o juízo de mérito aplicável ao caso, bem como se o crime aconteceu com dolo eventual ou culpa.

4. Ademais, o pedido de reconhecimento da inexistência absoluta de provas de que tenha o recorrente assumido conduta dolosa, com a consequente desclassificação da conduta para culposa, não prescinde de acurado revolvimento do acervo fático-probatório, vedado em sede de recurso especial, nos moldes da Súmula 7/STJ.

[...]

6. No presente caso, verifica-se que o julgador de primeiro grau foi detalhista, analisando ponto a ponto, porém, em momento algum, declinou um juízo de convicção a respeito da culpabilidade da recorrente, cuidando apenas de apresentar elementos de prova mínimos - e estritamente necessários - para reconhecer a prova da materialidade e indícios da autoria e participação de crime doloso contra a vida, a ser julgado pelo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT