Decisão Monocrática Nº 0001917-03.2013.8.24.0019 do Quinta Câmara de Direito Público, 24-08-2021

Número do processo0001917-03.2013.8.24.0019
Data24 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Apelação Nº 0001917-03.2013.8.24.0019/SC

APELANTE: CLEUZA BEATRIZ SPANHOL (AUTOR) ADVOGADO: PATRICIA SALINI (OAB SC014940) ADVOGADO: MAURI JOAO GALELI (OAB SC013472) ADVOGADO: SERGIO GUARESI DO SANTO (OAB SC009775) ADVOGADO: AFONSO HENRIQUE NIEMEYER AGNOLIN (OAB SC039161) ADVOGADO: JOAO HENRIQUE WIGGERS TORTELLI (OAB SC039323) ADVOGADO: SERGIO GUARESI DO SANTO APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: OS MESMOS

DESPACHO/DECISÃO

Cuida-se de recursos de apelações cíveis interpostos mutuamente por ambas as partes contra sentença que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da "ação condenatória" de n. 0001917-03.2013.8.24.0019, ajuizada por Cleuza Beatriz Spanhol contra Estado de Santa Catarina.

1.1 Desenvolvimento processual

Adota-se o relatório da sentença, proferida pela magistrada de Primeiro Grau Letícia Bodanese Rodegheri (evento 126):

"Cleuza Beatriz Spanhol, qualificada, ingressou com "ação condenatória" em face de Estado de Santa Catarina, também qualificado.

Alega, em síntese, que exerce a função de professora (mediante concurso público) desde 2002, mas no ano de 2007, com a posse da nova diretora Sra. Terezinha Vicente Parisotto, começou a sofrer perseguições e assédio moral. Asssim, em decorrência do assédio sofrido alega que teve abalos psíquicos. Requer, liminarmente o afastamento da diretora e, no mérito, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes do assédio moral perpetrado pela superiora hierárquica, em montante a ser arbitrado pelo juízo (fls. 4-34). Acostou documentos (fls. 35-61/67-72).

Indeferiu-se o pedido liminar e concedeu-se a gratuidade de justiça (fls. 74-76).

Agravo de instrumento (fls. 83-95), sendo que, no mérito, foi indeferido o pedido de tutela recursal (fls. 362-366).

A autora acostou novos documentos (fls. 98-159).

Citado (fl. 166), o réu apresentou contestação (fls. 169-205). Preliminarmente, requereu a denunciação da lide em relação à diretora Terezinha Vicente Parisotto. No mérito, aduziu que a presente ação é o meio inadequado para afastar a diretora do cargo; ausência de assédio moral; falta de comprovação da conduta ilícita e nexo de causalidade; ausência de omissão do Estado; ausência de causa de pedir e pedido em relação aos danos materiais e o mero aborrecimento em relação aos danos morais; teceu comentários sobre eventual quantum indenizatório, juros de mora e correção monetária. Requereu, portanto, a improcedência dos pedidos (fls. 169-205). Acostou documentos (fls. 207-227).

Houve réplica (fls. 231-247). Acostou documentos (fls. 249-257). Manifestou-se novamente às fls. 268-271 noticiando os resultados dos processos administrativos.

O Ministério Público manifestou-se pela não intervenção no feito (fl. 266).

Em decisão, indeferiu-se a denunciação da lide, deferiu-se a produção de prova testemunhal e designou-se audiência de instrução e julgamento (fl. 277).

Em audiência, foi proposta a conciliação, não havendo acordo. Foram ouvidas 4 testemunhas arroladas pela parte autora, 6 testemunhas arroladas pela parte ré. Deferiu-se o pedido para apresentação de documentos (fls. 302). Mídias acostadas à fl. 378. A parte ré requereu a produção de prova emprestada (fls. 305-307). Deferida à fl. 310. Documento juntado às fls. 317-328/331-336.

A parte ré apresentou alegações finais (fls. 338-349), requerendo a improcedência da demanda.

A parte autora apresentou alegações finais (fls 357-360), requerendo a total procedência da inicial.

A parte autora acostou ao feito dois depoimentos e alegações finais do Ministério Público na ação civil pública movida em face da Sra. Terezinha Vicente Parisotto e do Estado de Santa Catarina (fls. 373-375). Mídia acostada na fl. 379.

Vieram os autos conclusos.

Relato do necessário.

Decido".

Foi atribuído à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), quando do ajuizamento da ação, em 18-3-2013.

1.2 Da sentença

A MM. Juíza Letícia Bodanese Rodegheri (evento 126) proferiu sentença de procedência, nos seguintes termos:

"Trata-se de ação de indenização por assédio moral no trabalho ajuizada por Cleuza Beatriz Spanhol em face do devidamente qualificados nos autos, em que a autora requer a condenação do Estado ao pagamento de indenização por danos morais em razão do alegado assédio moral.

Não havendo questões preliminares pendentes de apreciação, bem como estando o feito em ordem, sem verificar nulidades processuais, passo ao julgamento de mérito.

Adianto a procedência dos pedidos da autora.

Responsabilidade do ente estadual

De imediato, anote-se que a hipótese vertente deve ser analisada sob a ótica da responsabilidade civil subjetiva, em que devem estar configurados: o evento danoso, o dano, o nexo causal e a culpa (art. 186 c/c 927, ambos do CC).

Ademais, registre-se que a responsabilidade objetiva não é aplicável ao caso, porquanto a norma prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal prega tal regime quando o agente público cause prejuízo a outrem, mas não quando a vítima seja o próprio agente (que é o caso dos autos).

Aliás, quando a vítima é o próprio agente do ente público, é aplicável o disposto no art. 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal, segundo o qual o trabalhador tem direito de obter a reparação dos danos a que o empregador estiver obrigado "quando incorrer em dolo ou culpa".

Cumpre destacar também a incidência, ao caso, da regra geral sobre o ônus da prova, prevista no art. 373 do CPC, que assim dispõe: "O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.".

Pois bem, quanto à responsabilidade civil da administração pública, como já dito, não se aplica a regra geral da responsabilidade objetiva, mas a responsabilidade subjetiva (teoria da culpa anônima ou falta do serviço), quando se tratar de conduta omissiva, devendo ser comprovada a culpa da administração. Ou seja, deve ser comprovado que a administração atuou de forma deficiente, contribuindo decisivamente para o evento danoso. (Interesse Público - Revista Bimestral de Direito Público, ed. Notadez, ano 2005, n. 33, p. 161, n. 6814).

Antes de analisar os pressupostos evento danoso e nexo de causalidade, cumpre tecer alguns comentários sobre o assédio moral.

Assédio moral

O assédio moral é caracterizado quando o empregado ou servidor público é exposto, pelo empregador ou pelo superior hierárquico, a situações humilhantes e constrangedoras, de forma reiterada e prolongada, com o objetivo de causar desequilíbrio e sofrimento, provocando sentimentos de humilhação, menosprezo e desvalorização.

Da doutrina, colhe-se:

O assédio moral se caracteriza por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego e deteriorar o ambiente de trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções (NASCIMENTO, Sônia Mascaro, Assédio Moral no ambiente e Trabalho, Revista Ltr, São Paulo: v. 68, n. 08, agô .2004, p. 922-930).

E também:

O assédio moral é o resultado da ação de uma chefia, que no uso de suas prerrogativas, literalmente, tortura o subordinado, seja no campo do trabalho privado ou público. Muitas táticas são utilizadas para o exercício dessa nociva atuação, prejudicando sistematicamente a atuação laboral da vítima. Ignoram-se suas sugestões ou solicitações, reduzindo-lhe o poder hierárquico ou, deliberadamente, fazendo-lhe críticas negativas, levando-o a humilhação constante, expondo a vítima a situações constrangedoras e humilhantes, por repetição e prolongamento. (LEITE, José Roberto Dias. Assédio Moral. Revista Justilex, ano V, n. 53, p. 31, maio 2006).

Da Jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de Santa Catarina: "[...] 3. O assédio moral, mais do que provocações no local de trabalho - sarcasmo, crítica, zombaria e trote -, é campanha de terror psicológico pela rejeição (TJSC, Apelação Cível n. 0300052-03.2017.8.24.0027, de Ibirama, rel. Des. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 13-08-2019)."

Conclui-se, portanto, que a configuração do assédio moral depende da comprovação de condutas abusivas, de natureza psicológica, praticadas de forma repetitiva e prolongada, com o objetivo de expor o empregado ou servidor a situações humilhantes e constrangedoras.

No caso concreto, objetiva a autora o reconhecimento de que sofreu tratamento abusivo de forma repetitiva e prolongada, em situações humilhantes e constrangedoras, configurando o evento danoso.

Quanto ao requisito de nexo de causalidade, aduz que consistiram nas humilhações, públicas, constrangedoras, repetitivas e prolongadas perpetradas no ambiente de trabalho pela sua superiora hierárquica, diretora Terezinha Vicente Parisotto.

Dito isso, anoto que a autora comprovou, de maneira cristalina, que a superiora hierárquica à época dos fatos cometeu o assédio moral relatado na inicial.

Com efeito, Edisselda Santi de Avila, informante arrolada pela parte autora, afirmou que: foi secretária da escola em que a parte autora laborou; trabalhava na mesma sala da Sra. Terezinha e sempre presenciou os xingamentos; Terezinha tratava mal todos os professores e funcionários da escola; Cleusa é uma pessoa questionadora e a Sra Terezinha afirmava que Cleusa era assim porque era uma pessoa "mal amada", "mal comida", "faltava homem", "faltava pau". Os atestados apresentados pelas pessoas eram contestados, afirma que estava com preguiça e falava "tomara que morra mesmo". Flagrou Cleusa chorando em decorrência do tratamento dispensado pela diretora do colégio (mídia de fl. 378).

Priscila Biffe, testemunha da parte autora ouvida em juízo, afirmou que: trabalhou com a parte autora; confirmou a escritura pública de fls. 58-59 e condizem com a...

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