Decisão Monocrática Nº 0004318-35.2012.8.24.0075 do Quarta Câmara de Direito Público, 17-01-2019

Número do processo0004318-35.2012.8.24.0075
Data17 Janeiro 2019
Tribunal de OrigemTubarão
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0004318-35.2012.8.24.0075 de Tubarão

Apelante : Município de Tubarão
Promotora : Layla da Silva Perito Volpato (OAB: 20364/SC)
Apelada : Erondina Mendes de Souza
Advogada : Hilda Lorenzi Schneider (OAB: 27203/SC)

Relator(a) : Desembargadora Vera Lúcia Ferreira Copetti

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Trato de ação ordinária proposta por Erondina Mendes de Souza, na Comarca de Tubarão, contra o Município de Tubarão, sob a alegação, em suma, de que é portadora de obstrução arterial crônica, hipertensão venosa crônica e trombose, necessitando fazer uso contínuo dos medicamentos Cebralat 100 mg, Vecasten, Lyrica 75mg e Buferin 81mg. Aduziu que não possui condições financeiras de custear o tratamento e que, postulado o fornecimento administrativo dos fármacos, o réu negou o pedido, sob a justificativa de que estes não se acham padronizados para o tratamento da moléstia que acomete a parte autora.

Requereu a concessão de tutela antecipada para determinar ao réu o imediato fornecimento dos medicamentos e, ao final, a procedência do pedido, com a condenação deste, em definitivo, na obrigação de fazer (pp. 49-55). Acostou documentos (pp. 56-67).

Pela decisão de pp. 72-81 foi deferida a medida liminar.

Citado, o réu ofereceu contestação às pp. 102-134.

Houve réplica (pp. 137-140).

Durante a instrução do feito foi realizada prova pericial médica, cujo laudo pericial aportou aos autos às pp. 206-209, sobre o qual o Município réu ofereceu manifestação às pp. 214-215. A parte autora não se manifestou (p. 216).

Sobreveio a sentença de pp. 221-227, estando o dispositivo assim redigido:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para determinar que o réu forneça à parte autora os medicamentos Cebralat (Cilostazol) 100mg, Vecasten, Lyrica 75mg e Buferin 81mg, na forma prescrita à fl. 16.

Mantenho a decisão de fls. 25-34 que antecipou os efeitos da tutela.

Condeno o réu ao pagamento dos honorários periciais (já adiantados), deixando de condená-lo ao pagamento das custas processuais, em atenção ao que dispõe o art. 35, 'i', da Lei Complementar Estadual n. 156/97.

Arcará o réu com os honorários advocatícios que, atento ao § 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil, fixo em R$ 800,00 (oitocentos reais).

Fixo em R$ 692,00 (seiscentos e noventa e dois reais) a remuneração da defensora dativa nomeada, Hilda Lorenzi Schneider (fl. 11), valor correspondente, hoje, a 10 URH's. Serve a presente decisão como título executivo judicial.

Como o direito controvertido nesta ação é de valor certo não superior a 60 (sessenta) salários mínimos, esta sentença não está sujeita a reexame necessário (art. 475, § 2º, do CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Oportunamente, arquivem-se.

Inconformado com a decisão, o Município de Tubarão interpôs recurso de apelação (pp. 230-249), sustentando, preliminarmente, falta de interesse de agir e desrespeito à ampla defesa e ao contraditório, pelo julgamento antecipado, sem realização de estudo social para comprovar a hipossuficiência da parte autora e de prova pericial médica para indicar a necessidade do tratamento postulado em detrimento daquele oferecido pelo Município.

No mérito, sustentou que há desrespeito à coletividade, com a concessão de medicamentos por força de decisões judiciais, para beneficiários individualizados, em detrimento de toda a população; que há interferência do Poder Judiciário em atribuições do Poder Executivo, no tocante à execução de políticas públicas e que a falta de dotação orçamentária específica para o cumprimento das ordens judiciais prejudica as finanças municipais.

Requereu o conhecimento e o provimento do recurso de apelação para julgar improcedentes os pedidos formulados na exordial.

Contrarrazões apresentadas às pp. 252-260.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Alexandre Herculano Abreu, pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação (pp. 273-278).

Pela decisão de pp. 281-282 foi suspenso o trâmite do feito até o julgamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, da questão de direito debatida na presente demanda - tema nº 106 de recursos repetitivos.

Finda a suspensão, vieram os autos conclusos.

Este é o relato do essencial.

Decido monocraticamente, amparada no art. 932, inciso VIII, do Código de Processo Civil e art. 36, inciso XVII, 'b', do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, uma vez que a matéria debatida está pacificada no âmbito da jurisprudência deste Sodalício.

Quanto ao juízo de admissibilidade, verifico que o recurso interposto preenche os requisitos processuais intrínsecos (adequação do recurso, legitimidade para recorrer e interesse recursal) e extrínsecos (tempestividade, regularidade formal e, no caso, há dispensa de preparo), razão pela qual deve ser conhecido.

Ab initio, cabe apreciar as alegações preliminares do apelante de falta de interesse de agir, pela existência de norma municipal que regulamenta a dispensação de medicamentos e, também, de desrespeito à ampla defesa e ao contraditório, pelo julgamento antecipado, sem realização de estudo social para comprovar a hipossuficiência da parte e de prova pericial médica que indique a necessidade do tratamento postulado em detrimento daquele oferecido pelo Município.

No que toca ao inconformismo manifestado pelo julgamento antecipado do feito sem a realização de estudo social, o que, segundo alega, impossibilita averiguar a hipossuficiência da parte autora, não prospera o argumento.

Motivado pelo contexto da judicialização na área da saúde, o Grupo de Câmaras de Direito Público deste e. Tribunal de Justiça instaurou o Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva - IRDR n. 0302355.11.2014.8.24.0054/50000, de relatoria do nobre Des. Ronei Danielli, o qual foi julgado em 09-11-2016, com o estabelecimento das seguintes teses jurídicas:

1.1 Para a concessão judicial de remédio ou tratamento constante do rol do SUS, devem ser conjugados os seguintes requisitos: (1) a necessidade do fármaco perseguido e adequação à enfermidade apresentada, atestada por médico; (2) a demonstração, por qualquer modo, de impossibilidade ou empecilho à obtenção pela via administrativa (Tema 350 do STF).

1.2 Para a concessão judicial de fármaco ou procedimento não padronizado pelo SUS, são requisitos imprescindíveis: (1) a efetiva demonstração de hipossuficiência financeira; (2) ausência de política pública destinada à enfermidade em questão ou sua ineficiência, somada à prova da necessidade do fármaco buscado por todos os meios, inclusive mediante perícia médica; (3) nas demandas voltadas aos cuidados elementares à saúde e à vida, ligando-se à noção de dignidade humana (mínimo existencial), dispensam-se outras digressões; (4) nas demandas claramente voltadas à concretização do máximo desejável, faz-se necessária a aplicação da metodologia da ponderação dos valores jusfundamentais, sopesando-se eventual colisão de princípios antagônicos (proporcionalidade em sentido estrito) e circunstâncias fáticas do caso concreto (necessidade e adequação), além da cláusula da reserva do possível. 2. Aplicação ao caso concreto: 2.1 Recursos do Município e do Estado conhecidos e parcialmente providos para excluir da condenação o fornecimento dos fármacos não padronizados. (grifei)

In casu, registro que a pretensão da parte autora envolve obrigação de fazer oposta aos entes públicos especificamente relacionada com o fornecimento de medicamento não padronizado no Sistema Único de Saúde, de modo que, em princípio, pode-se afirmar tratar-se de idêntica questão de direito a reclamar a aplicação dos enunciados do IRDR n. 0302355.11.2014.8.24.0054/50000, nos termos das teses jurídicas firmadas no item "1.2".

Desse ponto de vista, a hipótese em julgamento atende os parâmetros firmados no incidente supra indicado, consoante a disciplina do art. 985, do Código de Processo Civil, verbis:

Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada:

I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região;

II - aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986.

§1º Não observada a tese adotada no incidente, caberá reclamação.

§2º Se o incidente tiver por objeto questão relativa a prestação de serviço concedido, permitido ou autorizado, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.

Não se desconhece o julgamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, do tema nº 106 de repetitivos. Porém, a ação em tela não atrai o julgamento de acordo com as teses firmadas no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, representativo da controvérsia, já que a demanda sob judice foi ajuizada em 20-04-2012 (p. 49), ou seja, antes do lapso temporal fixado na modulação de efeitos1 do citado julgamento pelo STJ.

Tecidas essas considerações, de acordo com o decidido no IRDR acima citado, no que diz respeito à hipossuficiência, é necessária a demonstração de carência de recursos da parte postulante, não havendo exigência de que esta se dê estrita e necessariamente pela realização de estudo social, sendo possível a sua demonstração, pelo interessado, mediante documentação correspondente.

Por sua pertinência, transcrevo excerto do referido julgado:

[...] Nada obstante a assertiva do Estado de que o laudo social é o único meio de afirmar a hipossuficiência do enfermo e seus familiares, ...

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