Decisão Monocrática Nº 0004741-93.2018.8.24.0039 do Segunda Vice-Presidência, 18-03-2020

Número do processo0004741-93.2018.8.24.0039
Data18 Março 2020
Tribunal de OrigemLages
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0004741-93.2018.8.24.0039/50000, de Lages

Recorrente : Lucas Eduardo Gamas
Advogado : Robson Antonio Galvão da Silva (OAB: 46876/SC)
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Procs.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça) e outro
Interessado : Adrian Péricles de Oliveira Ferreira
Interessado : Assistente da Acusação
Advogada : Samira Rafaeli Gomes (OAB: 46003/SC)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Lucas Eduardo Gamas, com fulcro no art. 105, III, "a", da Constituição da República, interpôs Recurso Especial contra o acórdão proferido pela Terceira Câmara Criminal, que, por unanimidade, deu provimento à Apelação interposta pelo Ministério Público ''para condenar Lucas Eduardo Gamas à pena de 13 (treze) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, e 07 (sete) dias-multa, em regime fechado, mantidas as demais disposições da sentença e negar provimento aos apelos das defesa'' (fls. 904 - 931 dos autos digitais).

Em síntese, alegou violação ao art. 7º, XXI, da Lei n. 8.906/94, pelo não reconhecimento da nulidade do interrogatório procedido na fase policial sem a presença de advogado.

Sustentou ofensa, igualmente, ao art. 29, § 2º, do Código Penal, uma vez não reconhecida a cooperação dolosamente distinta, pleiteou sua absolvição ao argumento de que a conduta praticada é atípica, e por fim, pugnou pelo afastamento da majorante prevista no art. 29, § 2º, parte final, do Código Penal (fls. 1 - 18)

Apresentadas as contrarrazões (fls. 26 - 36), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

De plano, adianta-se que o Recurso Especial não reúne as condições de ascender à Corte de destino.

1. Da violação ao art. art. 7º, XXI, da Lei n. 8.906/94

Sob a alegação de que ''é direito do advogado assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório'' (fl. 7), a defesa alegou que a decisão colegiada violou, primeiramente, o art. 7º, XXI, da Lei n. 8.906/94.

Ao afastar a preliminar alegada, assim foi consignado no acórdão recorrido:

I. Preliminar

- Recurso das defesas: nulidade dos interrogatórios realizados extrajudicialmente sem o acompanhamento de advogado e na presença dos policiais militares que efetuaram a prisão em flagrante

Aduz a defesa, em suma, que "os interrogatórios dos réus em sede policial foram realizados sem a presença de advogado - e concidentemente desses interrogatórios teriam surgidos supostas confissões - verifica-se que os referidos atos se encontram eivados de nulidade absoluta que gerou inquestionável prejuízo (já que o Ministério Público tem usado esses depoimentos para fundamentar sua pretensão recursal condenatória)" (fl. 793).

Busca, assim, o desentranhamento dos autos.

Sem razão.

Em primeiro lugar, ressalto que eventuais irregularidades ocorridas na fase do inquérito policial, peça informativa destinada à sustentação da inicial acusatória, não contaminam a ação penal.

Em segundo, friso que, conforme entendimento pacífico da Corte Superior, a ausência de advogado no interrogatório policial não causa nulidade, por se tratar o inquérito de procedimento administrativo de cunho eminentemente inquisitivo.

Em terceiro, ressalvo que, ao serem ouvidos na Central de Plantão Policial de Lages/SC os apelantes foram cientificados dos fatos em seu desfavor e dos seus direitos constitucionais, entre os quais o de permanecer em silêncio, tendo optado voluntariamente por prestar depoimento sem a presença de advogado, conforme Termo de Importação de fl. 41.

Assim, diante de todo o exposto, não há falar em cerceamento de defesa, não havendo qualquer nulidade a ser sanada.

Dito isso, afasto a prefacial e passo à análise do mérito. (fls. 911 - 913 dos autos digitais).

Pelo que se observa, o Órgão Colegiado aplicou o entendimento de que ''eventuais irregularidades ocorridas na fase do inquérito policial, peça informativa destinada à sustentação da inicial acusatória, não contaminam a ação penal' (fl. 912), posicionamento que não difere da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Veja-se:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO ORDINÁRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRÁFICO DE DROGAS. 1. NULIDADE. PROVAS OBTIDAS MEDIANTE INFORMAÇÕES PRESTADAS PELO DEA (DRUG ENFORCEMENT ADMINISTRATION). MATÉRIA NÃO DEBATIDA NA ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. VÍCIO NA FASE DE INVESTIGAÇÃO QUE NÃO SE TRANSMITE PARA A AÇÃO PENAL. 2. INOBSERVÂNCIA DO RITO DO ART. 55 DA LEI N. 11.343/2006. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. 3. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ACESSO AO CONTEÚDO DAS GRAVAÇÕES. PRODUÇÃO DE PROVA. DISCRICIONARIEDADE DO JUIZ. 4. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE FALTA DE JUSTA CAUSA. INDÍCIOS DE AUTORIA E PROVA DA MATERIALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

3. Os vícios ocorridos na primeira fase da persecução não maculam nem inviabilizam o exercício da ação penal. Isto porque o inquérito policial é peça meramente informativa, na qual não se produzem provas, mas apenas são amealhados elementos informativos com o objetivo de dar suporte ao órgão acusador para eventual oferecimento de denúncia.

- Nesse diapasão, esta Corte Superior de Justiça possui entendimento pacífico no sentido de que eventuais irregularidades ocorridas no inquérito policial não contaminam a ação penal. Precedentes: AgRg no HC n. 549.109/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019 e RHC n. 112.336/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 7/11/2019, DJe 2/12/2019) HC n. 533358/SP. Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca. Quinta Turma. J,. 03/03/2020).

Igualmente:

RECURSO EM HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. CUSTÓDIA PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. PERICULOSIDADE CONCRETA DO AGENTE. ELEMENTOS IDÔNEOS. EVENTUAIS IRREGULARIDADES DO INQUÉRITO NÃO CONTAMINAM A AÇÃO PENAL. SUBSTITUIÇÃO POR PRISÃO DOMICILIAR. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. INEVIDENTE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PARECER ACOLHIDO.

[...]

2. É assente nesta Corte que as ilegalidades ocorridas na fase do inquérito policial não têm o condão de contaminar a ação penal (RHC n. 113.732/SP, Ministro Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ/PE), Quinta Turma, DJe 18/10/2019) e que a conversão da prisão em flagrante em preventiva torna superado o argumento de irregularidades na prisão em flagrante, diante da produção de novo título a justificar a segregação (RHC n. 103.110/PE, Ministro Joel Ilan Parcionik, Quinta Turma, DJe 28/10/2019). (RHC n. 119233/PA. Rel. Min. Sebastião Reis Júnior. Sexta Turma. J. 03/12/2019)

A preliminar aventada pela defesa, importa observar, foi ainda refutada com base no entendimento de que ''a ausência de advogado no interrogatório policial não causa nulidade, por se tratar o inquérito de procedimento administrativo de cunho eminentemente inquisitivo' (fl. 912), o que também encontra-se em consonância com o entendimento do STJ:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. TRÁFICO DE DROGAS E POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. LAVRATURA DE AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE. ACOMPANHAMENTO POR ADVOGADO. PRESCINDIBILIDADE. CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. NULIDADE PELA AUSÊNCIA DE PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DA ACUSAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRISÃO PREVENTIVA. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. SEGREGAÇÃO JUSTIFICADA PARA A ORDEM PÚBLICA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES DO ART. 319 DO CPP. INVIABILIDADE. COAÇÃO ILEGAL NÃO DEMONSTRADA.

Inexiste nulidade do interrogatório policial por ausência do acompanhamento do paciente por um advogado, sendo que esta Corte acumula julgados no sentido da prescindibilidade da presença de um defensor por ocasião do interrogatório havido na esfera policial, por se tratar o inquérito de procedimento administrativo, de cunho eminentemente inquisitivo, distinto dos atos processuais praticados em juízo. (HC 162.149/MG, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 24/4/2018, DJe 10/5/2018). (HC n. 474322/MG. Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca. Quinta Turma. J. 12/02/2019).

No mesmo sentido:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO E LESÃO CORPORAL CULPOSOS NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. NULIDADE. AUSÊNCIA DO ADVOGADO DURANTE O INTERROGATÓRIO EXTRAJUDICIAL. PRESCINDIBILIDADE DE DEFESA TÉCNICA NESTA FASE. COAÇÃO ILEGAL. AUSÊNCIA. FALTA DE LAUDO PERICIAL COMPROBATÓRIO DO NEXO DE CAUSALIDADE. INSTRUÇÃO CRIMINAL NEM SEQUER INICIADA. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME SOBRE A OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO, INDISPENSÁVEL AO RECONHECIMENTO DA NULIDADE.

1. Este Superior Tribunal possui entendimento no sentido da prescindibilidade da presença do advogado durante o interrogatório extrajudicial. (RHC n. RHC 94584/RS. Rel. Min. Sebastião Reis Júnior. Sexta Turma. J. 17/09/2019).

Logo, verifica-se que o entendimento exarado no acórdão impugnado está em harmonia com a jurisprudência da Corte Superior, pelo que deve incidir como óbice à admissão recursal o enunciado da Súmula 83 do STJ, que dispõe: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida".

Oportuno registrar, "É possível a aplicação da Súmula 83 do STJ aos recursos especiais interpostos pela alínea "a" do artigo 105, III, da Constituição Federal, de acordo com a jurisprudência do STJ" (AgRg no AREsp 1072977/DF. Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca. Quinta Turma. J. 03/08/2017).

No mesmo viés:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTO DE INADMISSÃO NÃO IMPUGNADO (ENUNCIADO N.º 83 DA SÚMULA DO STJ). ÓBICE QUE ABRANGE AS ALÍNEAS A E C DO INCISO III DO ART. 105 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO INDICAÇÃO DE PRECEDENTE CONTEMPORÂNEO OU SUPERVENIENTE AO REFERIDO NA DECISÃO AGRAVADA. DECISÃO DE INADMISSIBILIDADE INCINDÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT