Decisão Monocrática Nº 0006597-05.2012.8.24.0039 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 19-05-2020

Número do processo0006597-05.2012.8.24.0039
Data19 Maio 2020
Tribunal de OrigemLages
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0006597-05.2012.8.24.0039 de Lages

Apelante : Banco Bradesco S/A
Advogados : Amandio Ferreira Tereso Junior (OAB: 32256/SC) e outro
Apelado : Binotto S/A Logística Transporte e Distribuição
Advogados : Vitor Hugo de Melo (OAB: 21875/SC) e outros
Relator: Desembargador Monteiro Rocha

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Binotto S/A Logística Transporte e Distribuição ajuizou ação de revisão de contrato contra Banco Bradesco S/A, aduzindo ter firmado com o requerido contrato de abertura de crédito fixo com garantia de alienação fiduciária (Finame automático n. 06794645).

Alegou abusividade das cláusulas contratuais que preveem a cobrança de juros remuneratórios, capitalização de juros, comissão de permanência e tarifas bancárias.

Requereu o acolhimento da pretensão para, mediante aplicação do Código de Defesa do Consumidor e inversão do ônus da prova, declarar a nulidade das cláusulas abusivas e determinar a repetição em dobro do indébito.

Determinada a emenda da inicial, a autora procedeu a retificação do valor atribuído à causa para o proveito econômico pretendido de R$ 169.486,43.

Citado, o requerido ofertou contestação (fls. 77-88), repisando os argumentos exordiais e defendendo a regularidade do contrato. Requereu a improcedência dos pedidos iniciais.

Houve réplica (fls. 114-125).

Em seguida, o feito foi suspenso em decorrência do processamento da recuperação judicial da empresa autora.

Após o decurso do prazo, as partes foram intimadas para se manifestarem, oportunidade em que a autora requereu a desistência da ação e o réu, por sua vez, não concordou e pugnou pela improcedência da ação.

Sobreveio sentença (fls. 136-145), com o seguinte dispositivo:

"Diante do exposto, julqo procedente em parte o pedido formulado na presente Ação Revisional de Contrato Bancário para: a) determinar a revisão do contrato descrito na inicial firmado entre as partes, rejeitar a impugnação ao valor da causa e declarar a legalidade da taxa de juros remuneratórios contratada e sua capitalização, porquanto expressamente previstas; b) afastar a cumulação da comissão de permanência com juros moratórios, remuneratórios e multa, fixando o INPC como indexador do contrato, nos termos da fundamentação; c) afastar a tese de descaracterização da mora, prejudicada a análise da cobrança TAC e reconhecer a validade da cláusula que prevê o vencimento antecipado das parcelas, nos termos da fundamentação; d) reconhecer a ilegalidade da cláusula que prevê a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais e a eleição de foro diverso do domicílio do consumidor; e) condenar o réu à restituição simples dos valores cobrados em desacordo com a presente sentença, conforme apurado em liquidação por arbitramento.

Tendo o réu decaído de parte mínima do pedido, condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios os quais fixo em R$1.000,00 (mil reais), a teor do art. 85, § 8°, do CPC, considerando a complexidade da causa e duração".

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o réu interpôs apelação cível (fls. 150-157), sustentando a impossibilidade de revisão do contrato, em observância ao princípio do pacta sunt servanda.

Aduziu que inexiste cláusula contratual que prevê a cobrança de comissão de permanência, incidindo apenas os encargos de mora para o período de inadimplência.

Alegou que é lícita a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais conforme ajustado no pacto.

Requereu o provimento do recurso para reformar a sentença e julgar totalmente improcedentes os pedidos iniciais.

Sem contrarrazões.

O recurso envolve matéria pacificada em firme jurisprudência e o princípio da colegialidade informa a desnecessidade de submeter ao colegiado questão que não encontra dissenso entre os emitentes pares.

- Da revisão contratual

Aduz o apelante que "o contrato ora discutido deve ser cumprido em todos os seus termos, em virtude do princípio pacta sunt servanda" (fl. 152).

Alega que "todas as cláusulas contratuais era conhecidas da apelada no momento da assinatura do contrato e que todas as condições de pagamento e valores das contraprestações foram combinadas entre ela e o apelante, não se justifica a pretensão da apelada de alteração na avença livremente firmada" (fl. 153).

Razão não lhe assiste.

O decisum proferido pelo magistrado a quo declarou a possibilidade de revisão contratual, com fundamento no CDC.

Sobre a aplicação do CDC às ações de revisão contratual, o Superior Tribunal de Justiça dirimiu a questão com a edição da Súmula 297, que dispõe: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Conforme depreende-se do artigo 6º, inciso V, do CDC, a relação jurídica pactuada entre as partes permite a sua revisão:

"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas"

Diante da hipossuficiência do consumidor, buscou a referida lei equilibrar as relações contratuais, protegendo a parte hipossuficiente de eventuais abusos e desvantagens excessivas.

Nesse sentido, segue entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

"A jurisprudência do STJ se posiciona firme no sentido de que a revisão das cláusulas contratuais pelo Poder Judiciário é permitida, mormente diante dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, devendo ser mitigada a força exorbitante que se atribuía ao princípio do pacta sunt servanda." (STJ, Segunda Seção, AgRg no Ag 1383974/SC. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em. 13.12.2011).

Mutatis mutandis, traz-se aos autos entendimento jurisprudencial desta Câmara:

- "[...] DEFENDIDA A INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O AFASTAMENTO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INSUBSISTÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR SOBRE O PACTO FIRMADO ENTRE AS PARTES, COM A CONSEQUENTE INVERSÃO PROBATÓRIA. RECURSO NÃO ACOLHIDO [...]" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., rel.ª Des.ª Soraya Nunes Lins, ACV n. 0308120-08.2017.8.24.0005, j. 27-09-2018).

- "[...] INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REVISÃO DA RELAÇÃO CONTRATUAL QUE É POSSÍVEL EM FACE DA ONEROSIDADE EXCESSIVA. ARTIGOS 6º, INCISOS IV E V, E 51, INCISO IV, AMBOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, E SÚMULA N. 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA [...]

1. Os contratos bancários podem ser revisados à luz das regras protetoras do Código de Defesa do Consumidor" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., rel. Des. Jânio Machado, ACV n. 2011.004539-0, j. 07-11-2013).

E de minha relatoria:

"[...] INAPLICABILIDADE DO CDC - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 297 DO STJ - ALEGAÇÃO AFASTADA [...]

Como é aplicável às instituições financeiras o Código de Defesa do Consumidor, analisa-se as abusividades contratuais constatadas" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., ACV n. 0014442-43.2013.8.24.0075, j. 30-08-2018).

De fato, a parte autora é uma empresa de pequeno porte, o que permite inferir sua condição de hipossuficiência em relação ao banco fornecedor, sendo o que basta à configuração da relação de consumo, conforme Teoria Finalista Mitigada adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, verbis:

- "A jurisprudência desta Corte entende que se aplica a teoria finalista de forma mitigada, permitindo-se a incidência do CDC nos casos em que a parte, embora não seja destinatária final do produto ou serviço, esteja em situação de vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica em relação ao fornecedor" (STJ, 2ª Turma, rel. Min. Og Fernandes, AgInt no REsp 1.250.347/RS, j. 15-8-2017).

- "A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o Código de Defesa do Consumidor não se aplica no caso em que o produto ou serviço é contratado para implementação de atividade econômica, já que não estaria configurado o destinatário final da relação de consumo, podendo no entanto ser mitigada a aplicação da teoria finalista quando ficar comprovada a condição de hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica da pessoa jurídica" (STJ, 4ª Turma, rel. Min. Marco Buzzi, EDcl no AREsp 265.845/SP, j. 18-6-2013).

Logo, por se tratar de relação jurídica subordinada às disposições do Código de Defesa do Consumidor, a revisão do contrato é permitida, objetivando maior equidade na relação contratual entre a correntista e a instituição financeira.

Assim, nega-se provimento ao pleito recursal do banco/réu.

- Da comissão de permanência

Insurge-se o réu/recorrente contra sentença que determinou o afastamento da cobrança da comissão de permanência, aduzindo que o encargo não está previsto no contrato.

Razão lhe assiste.

A comissão de permanência foi criada quando ainda não se admitia a cobrança da correção monetária nos débitos judiciais e tinha como objetivo facultar às instituições financeiras a proteção dos efeitos inflacionários, evitando que o devedor, em mora, promovesse o pagamento tão somente dos juros moratórios e, com isso, enriquecesse indevidamente.

A cobrança de tal encargo foi autorizada pelo CMN - Conselho Monetário Nacional - nos termos do art. 4º, IX, da Lei 4.595/64, sendo instituída inicialmente pela Resolução 15/66 e, após alterações, pela Resolução 1.129/86.

Com tais regramentos, Paulo Jorge Scartezzini conceituou a comissão de permanência:

"A comissão de permanência, é uma taxa acrescida ao valor principal, devida sempre que houver impontualidade no cumprimento da obrigação pelo devedor. Teria assim por fundamento, o fato de necessitar, a instituição financeira mutuante, no período de 'prorrogação forçada' da operação, de uma compensação." (A comissão de permanência cobrada pelos bancos frente ao Código de Defesa do Consumidor. Revista dos Tribunais. Vol. 781/79,...

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