Decisão Monocrática Nº 0010044-50.2019.8.24.0008 do Segunda Vice-Presidência, 25-11-2020

Número do processo0010044-50.2019.8.24.0008
Data25 Novembro 2020
Tribunal de OrigemBlumenau
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0010044-50.2019.8.24.0008/50000, de Blumenau

Recorrente : Leo Ricardo
Advogado : Altamir França (OAB: 21986/SC)
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Proc.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Leo Ricardo, com fulcro no art. 105, III, "a", da Constituição da República Federativa do Brasil, interpôs Recurso Quarta Câmara Criminal, que, por unanimidade, negou provimento ao seu apelo e manteve a sentença que o condenou ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 683 dias-multa, fixados em 1/30 do salário mínimo, por infração ao art. 33, caput, da Lei 11.343/2006 (fls. 477-493, dos autos principais).

Em síntese, alegou violação aos arts. 240, § 1º, e 155, caput, ambos do Código de Processo Penal, ao art. 10 do Código de Processo Civil, 59 do Código Penal, 8º, 2, "g", do Pacto de San Jose da Costa Rica, bem como ao art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Aduz, ainda, violação a artigo de lei federal, pois o veículo apreendido não lhe foi restituído. Por fim, requer como consequência da alteração da pena a fixação de regime inicial mais brando e a substituição da reprimenda por penas restritivas de direitos (fls. 1-17 deste incidente).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 21-38, deste incidente), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

De plano, adianta-se, o Recurso Especial não reúne condições de ascender à Corte de destino.

1 Alínea "a" do art. 105, III, da Constituição da República Federativa do Brasil

1.1 Da alegada violação ao art. 240, § 1º, do Código de Processo Penal

O recorrente sustenta contrariedade ao dispositivo legal mencionado e busca o reconhecimento da nulidade das provas obtidas mediante invasão de domicílio.

Ao discutir a configuração delitiva do caso em tela, o Tribunal estadual decidiu (fls. 483-486, dos autos principais):

1.1 Do ingresso domiciliar

Principia o acusado alegando a nulidade das provas obtidas, uma vez que supostamente angariadas com violação de domicílio, já que os policiais não estariam na posse de mandado judicial e não havia fundadas razões para fundamentar o ato.

[...] No caso em exame, após análise dos elementos reunidos nos autos, depreende-se a regularidade do ingresso domiciliar, devidamente justificado pelos agentes públicos, pois, não bastasse o aporte prévio de informações acerca da realização do comércio espúrio pelo apelante, com o apontamento de que este poderia estar armazenando os estupefacientes em local diverso do residencial, especificamente nas proximidades da Rua São Paulo, há também a breve campana realizada na residência do acusado, a qual já era objeto de busca e apreensão, quando os policiais, considerando suspeita a movimentação realizada, optam por segui-lo para averiguar eventual transação, confirmando as suspeitas prévias por meio da ação que interrompeu o ilícito em curso.

Embora o recorrente ignore, certo é que a faina do serviço policial de inteligência, aprimorado dia a dia pelo crescimento desenfreado do tráfico de entorpecentes, entrega aos agentes públicos uma condição ímpar para aferir a realização do ilícito (e o sucesso da operação questionada é prova disso). Denúncias anônimas são verificadas in loco, e o policial, em campo e descaracterizado, conquista uma capacidade inigualável não apenas de identificar a prática criminosa, mas também de fazê-la cessar imediatamente, incumbindo-lhe, em reduzido período de tempo, sopesar a possibilidade, urgência e importância de interromper o delito em andamento com eventual necessidade de maior e melhor apuração.

[...] Assim, inexiste mácula a ser reconhecida, na medida em que a operação policial deu-se em respeito às normas constitucionais e legais.

Consequência disso, afasta-se a preliminar, restando prejudicado o pedido de absolvição que, nos moldes como foi fundamentado, dependia necessariamente da nulidade das provas.

Como se vê, a Câmara de origem, embasada no exame do acervo probatório, rejeitou a alegação de nulidade, assentando que o ingresso dos policiais na residência deu-se de maneira escorreita, destacando, inclusive, a campana realizada pelos milicianos, bem como as circunstâncias da prisão em flagrante.

Nessa conjuntura, compreensão diversa demandaria a reelaboração da moldura fática delineada no aresto combatido, o que é vedado nesta via, conforme preconizado na Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial".

Ademais, o recurso especial não tem como ascender porque o acórdão objurgado, embasado nos fundamentos destacados, decidiu em harmonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, incidindo, pois, o entendimento consolidado na sua Súmula 83, que prevê: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida".

A respeito:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ARMAS DE FOGO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO EM FLAGRANTE. NULIDADE. BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR SEM MANDADO JUDICIAL. ALEGADA VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. CRIMES PERMANENTES QUE CARACTERIZAM ESTADO DE FLAGRÂNCIA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PREVENTIVO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. [...] II - Tratando-se de crimes de natureza permanente, como é o caso do tráfico internacional de armas de fogo e da organização criminosa, mostra-se prescindível o mandado de busca e apreensão para que os policiais adentrem o domicílio do acusado, não havendo se falar em eventuais ilegalidades relativas ao cumprimento da medida. Precedentes (HC 508.248/MS, rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo (Des. convocado do TJ/PE), Quinta Turma, j. 1-10-2019, grifou-se).

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO E POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO RESTRITO OU PROIBIDO. FLAGRANTE EM CRIME PERMANENTE. DESNECESSIDADE DE MANDADO JUDICIAL. PRECEDENTES. NULIDADE DA SENTENÇA. INEXISTÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO REDUTOR. REINCIDÊNCIA. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. SÚMULA 7/STJ. ARTS. 12 E 16 DA LEI 10.826/2006. CONSUNÇÃO. INADMISSIBILIDADE. CONCURSO FORMAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. [...] 2. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que nos crimes de natureza permanente, como é o caso do tráfico ilícito de entorpecentes, mostra-se prescindível o mandado de busca e apreensão para que os policiais adentrem na residência do acusado quando se tem por objetivo fazer cessar a atividade criminosa, dada a situação de flagrância, conforme ressalva o art. 5º, inciso XI, da Constituição da República" (AgRg no AREsp 1.234.131/RN, rel. Min. Reynaldo Soares Fonseca, j. 15-3-2018, grifou-se).

Frisa-se que o teor da Súmula 83 do STJ também é "aplicável ao recurso especial interposto com fundamento na alínea 'a' do permissivo constitucional" (STJ, AgRg no AREsp 1.441.188/SC, rel. Min. Jorge Mussi, j. 15-8-2019).

1.2 Da alegada violação aos arts. 155 do Código de Processo Penal e 10 do Código de Processo Civil

Aduz a defesa também nulidade da decisão proferida, ao argumento de que foram produzidas provas de ofício, pelo Magistrado, mas não foi concedido prazo para a defesa se manifestar sobre elas.

Ao analisar a quaestio, concluiu a Corte (fls. 486-487, dos autos principais):

1.2 Da nulidade por prova produzida ex officio

Roga a defesa pelo reconhecimento de nulidade da sentença, porquanto o magistrado teria fundamentado o perdimento do bem em prova produzida produzida ex officio da qual não pôde se manifestar, violando então o art. 10 do CPC e o art 155, caput, do CPP.

A insurgência, mais uma vez, não é digna de provimento.

Inicialmente, necessário destacar que a possibilidade/necessidade de restituição do veículo apreendido foi amplamente debatida por ambas as partes em sede de alegações finais (fls 166-183 e 190-206).

Ademais, "o princípio do pas de nullité sans grief exige, em regra, a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício, podendo ser ela tanto a nulidade absoluta quanto a relativa, pois não se decreta nulidade processual por mera presunção" (STF, AgRg no HC 132.149, rel. Min. Luiz Fux, j. em 2.6.2017).

Não fosse isso bastante, em análise da sentença, verifica-se que o magistrado, em que pese tenha anexado consulta ao Detran/SC acerca de outro veículo registrado em nome da esposa do apelante, consignou sobre o perdimento do bem que, "mesmo que o veículo não fosse produto da mercancia espúria, não há dúvidas de que ele era utilizado para a prática do delito, visto que no seu interior foram apreendidas 12 (doze) porções de maconha, pesando aproximadamente 214,3g e 8 (oito) porções de cocaína, pesando aproximadamente 19,3g, sendo utilizado para transportar e entregar entorpecentes dentro da comarca de Blumenau/SC, fato este afirmado pelo réu em seu interrogatório judicial" (fl. 228).

Isto posto, ainda que a defesa sustente a aquisição lícita do bem, porquanto condizente com os rendimentos auferidos pela esposa do apelante, argumento posto em dúvida pela prova produzida ex officio, o perdimento não está relacionado a este fato, e ocorre independentemente da aquisição lícita ou ilícita, uma fez que fundamentado, de forma escorreita, na utilização do automotor na prática da traficância, amplamente demonstrada nos autos.

Trocando em miúdos, independentemente do veículo ter sido adquirido de forma lícita ou ilícita, é certo e incontroverso que estava sendo utilizado para prática do comércio espúrio, o que, a teor do disposto no art. 63, I, da Lei n. 11.343/06 e no art. 243, parágrafo único, da CF/88.

Repele-se, pois, a aventada nulidade.

Dessarte, vislumbra-se que a Câmara de origem, a...

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