Decisão Monocrática Nº 0015754-92.2010.8.24.0064 do Quarta Câmara de Direito Público, 29-05-2019

Número do processo0015754-92.2010.8.24.0064
Data29 Maio 2019
Tribunal de OrigemSão José
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação / Remessa Necessária n. 0015754-92.2010.8.24.0064 de São José

Apelante : Município de São José
Procs.
Municípi : Alessandra Cristina Laurindo Arruda (OAB: 39854/SC) e outro
Apelada : Fornecimento de Medicamentos
Advogado : Irineu Voss (OAB: 5992/SC)

Relator(a) : Desembargadora Vera Copetti

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Trato de ação de obrigação de fazer ajuizada por Vilma Stolk Francisco, na Comarca de São José, contra o Município de São José, alegando que padece de transtorno da retina - degeneração macular (CID H35.9), necessitando fazer uso contínuo do medicamento denominado Lucentis (Ranibizumabe).

Pontuou que não possui condições de custear o tratamento e que solicitado seu fornecimento, administrativamente, o pedido foi negado pelo réu, sob o fundamento de que o fármaco não se acha padronizado, nos programas oficiais do Ministério de Saúde, para tratamento da moléstia que acomete a autora.

Requereu o deferimento de antecipação de tutela e, ao final, a procedência dos pedidos (pp. 44-47). Juntou documentos (pp. 48-54).

Pela decisão de pp. 56-57 foi deferida a antecipação de tutela.

Citado, o réu ofereceu contestação (pp. 64-81), seguida de réplica pela autora (pp. 92-93).

O togado singular, à p. 101, determinou o envio dos autos à Justiça Federal, para apreciação do pedido formulado pela parte ré de chamamento ao processo da União Federal.

Distribuído o feito à 5ª Vara Federal e Juizado Especial Federal Cível de Florianópolis, às pp. 111-116 foi indeferido o pedido de chamamento ao processo da União Federal e reconhecida a incompetência do Juízo Federal, com a determinação de retorno dos autos ao Juízo Estadual, cuja decisão foi confirmada em grau recursal (pp. 117-120).

Redistribuídos aos autos à Vara da Fazenda Pública da Comarca de São José, foi determinada a intimação da autora para juntada de laudo médico atualizado, o que foi às pp. 151 e 170-171, bem como intimado seu médico assistente, para prestar esclarecimentos, cujas informações prestadas foram encartadas aos autos às pp. 181-183.

Sobreveio a sentença, de procedência, de pp. 237-242, estando o seu dispositivo assim redigido:

"Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, os pedidos formulados por Vilma Stolk Francisco na presente "Ação Ordinária c/c Liminar (tutela antecipada)" movida contra o Município de São José e, em consequência, confirmo a tutela de urgência anteriormente deferia e condeno o Município de São José a fornecer às suas expensas o medicamento EYLIA (6 ampolas), na forma do receituário da fl. 123.

Deve o Autor continuar a apresentar a cada 180 (cento e oitenta) dias, declaração médica atualizada, referente aos medicamentos de uso contínuo, sob pena de presumir-se que não mais necessitar deles.

CONDENO o Réu ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (um mil e reais), de acordo com o que prevê o art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil.

Sem custas (art. 33 do Regimento de Custas e Emolumentos do Estado de Santa Catarina).

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (art. 496, I, do Código de Processo Civil).

Decorrido o prazo para interposição de recursos voluntários e, transitada em julgado e não havendo manifestação das partes no prazo de 30 (trinta) dias, arquivem-se, anotando-se as devidas baixas.

Publique-se. Registre-se.Intimem-se."

Irresignado, o Município de São José apelou (pp. 247-258), defendendo, em linhas gerais, que não detém competência para fornecimento do medicamento pleiteado, que é de alto custo e não se acha contemplado na listagem de medicamentos da atenção básica.

Sustentou, ainda, a impossibilidade de fornecimento de medicação não padronizada nas políticas públicas, sob pena de violação aos princípios da igualdade e da reserva do possível.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença e afastar a condenação do apelante ao fornecimento do medicamento.

Não foram apresentadas contrarrazões (p. 268).

Os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça, inclusive para reexame necessário da sentença, por determinação do togado singular.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Rogê Macedo Neves, pelo conhecimento e desprovimento do recurso (pp. 276-281).

Vieram os autos conclusos.

Este é o relato do essencial.

Decido monocraticamente, o que faço amparada pelo disposto no art. 932, inc. VIII, do Código de Processo Civil (CPC) e art. 132, inc. XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, eis que a matéria posta à apreciação encontra-se pacificada no âmbito deste Sodalício.

Quanto ao juízo de admissibilidade do apelo manifestado pelo Município de São José, é próprio e foi interposto tempestivamente, razão pela qual é conhecido.

Conheço, igualmente, do reexame necessário, tendo em vista o alto valor do medicamento - R$ 4.250,00 (quatro mil, duzentos e cinquenta reais) cada aplicação (p. 51), cuja condenação, resultante da soma das parcelas vencidas e vincendas, considerando que a antecipação de tutela foi deferida ainda no ano de 2010 (p. 57), supera o patamar legal de 100 (cem) salários mínimos nacionais estabelecido pelo art. 496, §3º, inciso III, do CPC.

Quanto ao mérito do apelo, adianto, não procede o inconformismo.

Há muito está assentado na jurisprudência pátria que a responsabilidade pelo fornecimento de medicamentos ou procedimentos médicos/cirúrgicos é solidária entre os entes federados.

É o que se infere das disposições contidas no art. 196, da Constituição Federal e o art. 153 da Constituição do Estado de Santa Catarina.

Ademais, já está consolidado o entendimento de que "os entes federativos são solidariamente responsáveis pela garantia do direito à saúde e assistência social aos cidadãos, sendo facultado ao paciente que demonstre a condição de pessoa carente buscar de um ou de todos os entes públicos o cumprimento do dever estatal" (Apelação n. 0004358-22.2013.8.24.0062, de São João Batista, rel. Des. Nelson Schaefer Martins, j. 30-06-2016).

Diante disso, o(a) interessado(a) pode escolher em face de qual(is) ente(s) federado(s) irá propor a demanda - se contra a União, o Estado ou o Município - recaindo a responsabilidade sobre qualquer deles, não podendo ser fracionada.

É, portanto, responsabilidade solidária dos entes públicos promover o fornecimento dos medicamentos postulados, não sendo suficientes para afastar esta obrigação alegações de cunho financeiro ou administrativo, nem a invocação de normas hierarquicamente inferiores aos preceitos constitucionais que agasalham a pretensão deduzida na inicial.

Nesse sentido, da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e, do Superior Tribunal de Justiça, destaco:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SEPARAÇÃO DOS PODERES. VIOLAÇÃO. NÃO CONFIGURADA. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. PRECEDENTES. HIPOSSUFICIÊNCIA. SÚMULA 279/STF. 1. É firme o entendimento deste Tribunal de que o Poder Judiciário pode, sem que fique configurada violação ao princípio da separação dos Poderes, determinar a implementação de políticas públicas nas questões relativas ao direito constitucional à saúde. 2. O acórdão recorrido também está alinhado à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, reafirmada no julgamento do RE 855.178-RG, Rel. Min. Luiz Fux, no sentido de que constitui obrigação solidária dos entes federativos o dever de fornecimento gratuito de tratamentos e de medicamentos necessários à saúde de pessoas hipossuficientes. 3. A controvérsia relativa à hipossuficiência da parte ora agravada demandaria a reapreciação do conjunto fático-probatório dos autos, o que não é viável em sede de recurso extraordinário, nos termos da Súmula 279/STF. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 894085 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 15/12/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-029 DIVULG 16-02-2016 PUBLIC 17-02-2016, grifei)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE.

MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS.

LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. POSSIBILIDADE DE LITIGAR CONTRA QUALQUER UM DOS OBRIGADOS. FACULDADE DO CREDOR.

[...]

II - É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual, o funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, sendo qualquer deles, em conjunto ou isoladamente, parte legítima para figurar no polo passivo de demanda que objetive a garantia de acesso a medicamentos adequado para tratamento de saúde.

III - Não se trata de litisconsórcio passivo necessário, podendo a parte intentar a demanda contra qualquer um dos entes federativos (solidariamente passivos) para responder pela totalidade da dívida; a faculdade do autor-credor de litigar com qualquer um dos co-obrigados é decorrência legítima da solidariedade passiva.

[...]

VIII - O Agravante não apresenta, no agravo, argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida.

IX - Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 1617502/PI, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 02/08/2017, grifei).

Deste e. Tribunal de Justiça colaciono:

APELAÇÃO CÍVEL - REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO COMINATÓRIA C/C ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - VALOR DA CONDENAÇÃO INFERIOR AO LIMITE ESTABELECIDO NO § 2º DO ART. 475 DO CPC/1973 - SENTENÇA PUBLICADA ANTERIORMENTE AO ADVENTO DO CPC/2015 - NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL QUE SE IMPÕE - INSURGÊNCIA QUANTO A MEDICAMENTO NÃO PADRONIZADO - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. ART. 196 DA CRFB/88 - REQUISITOS FIRMADOS EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE...

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