Decisão Monocrática Nº 0016520-94.2011.8.24.0005 do Quinta Câmara de Direito Público, 18-10-2019

Número do processo0016520-94.2011.8.24.0005
Data18 Outubro 2019
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0016520-94.2011.8.24.0005 de Balneário Camboriú

Apelante : Município de Balneário Camboriú
Proc.
Município : Fabiana Thiesen Bührer (OAB: 6906/SC)
Apelado : Rubens Carlos Pereira
Defª.
Dativa : Analize Potrich Paggi (OAB: 27314/SC)
Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

1. O Rubens Carlos Pereira opôs embargos à execução fiscal que lhe move o Município de Balneário Camboriú.

A sentença pronunciou a prescrição intercorrente: os créditos de IPTU são de 1996 e a ação, ajuizada em 2000, só teve causa interruptiva quanto ao embargante (que figura como executado em face de redirecionamento, pois se descobriu que o devedor original não era há muito o proprietário do imóvel) em 2006. Ponderou-se que, embora possa ter constado nos registros da Prefeitura a incorreção, na serventia extrajudicial o cadastro existia com perfeição - o que não justifica, portanto, a incidência da Súmula 106 do STJ -, de maneira que "a demora na localização do real devedor não pode ser imputada ao Poder Judiciário, mas à inércia do credor".

Nesta apelação o Poder Público defende que o fato extintivo não ocorreu porque no momento da propositura o bem relacionado ao fato gerador constava em seus cadastros em nome do executado original, só descobrindo que houvera mudança na propriedade do imóvel no curso do processo - cuja alteração cabia ao contribuinte como obrigação acessória, nos termos da legislação local -, daí por que requereu o redirecionamento em face do atual detentor, sendo equivocado o entendimento da magistrada ao considerar como interrompido o lustro no momento dessa postulação.

Quer a reforma da decisão, com a continuidade da execução.

2. Antes de tudo, um pouco de teoria.

Com o fato gerador tributário (uma decorrência da hipótese de incidência), surge também a obrigação tributária, isto é, o vínculo jurídico que une o poder tributante e o correspondente sujeito passivo, tendo por objeto a prestação relacionada ao tributo.

Ela, porém, não é dotada de eficácia, quer dizer, corresponde a um vínculo jurídico de caráter tênue, pois relaciona credor e devedor, mas sem deferir àquele poder de coerção.

O crédito tributário, subsequente à obrigação, é que lhe empresta sequelas jurídicas, dotando-a de poder coercitivo. Por sua vez, o lançamento é o ato que dá vida ao crédito. Advém de conduta privativa da autoridade pública, que reconhece a ocorrência da obrigação, declarando formalmente a sua pretérita configuração. O lançamento, bem por isso, ratifica a existência da obrigação tributária. É dizer, não cria propriamente o tributo. Sua missão é essencialmente declaratória. O lançamento, todavia, dá nascimento ao crédito tributário. São aspectos coevos. O crédito - a vertente ativa da obrigação - é dependente do lançamento; ele se reporta à obrigação, mas faz surgir o crédito.

Correlatamente, vem o conceito de exigibilidade, rotineiramente confundido com a constituição do crédito tributário. São situações sutilmente diferentes. O crédito, como dito, é a formalização da obrigação; a apuração administrativa da sua ocorrência, que se dá mediante o lançamento. Feito, ele deve ser comunicado ao sujeito passivo, que tem o direito de impugná-lo (art. 145 do CTN). É a notificação. No transcurso do prazo de defesa ou durante o período pelo qual subsista o processo administrativo que resultou da impugnação, o crédito não é dotado de exigibilidade, quer dizer, não pode gerar efeitos desfavoráveis ao devedor. Nesse interregno, classicamente define o STF, "não mais ocorre prazo para decadência, e ainda não se iniciou a fluência do prazo de prescrição" (RE 91.019-SP, rel. Min. Moreira Alves), cujo período, depois, a jurisprudência passou a simplesmente denominar de "hiato" (STJ, REsp 435.896/SP, rel. Min. Eliana Calmon).

Superadas as possibilidades de defesa, o crédito (já constituído pelo lançamento) fica livre de amarras. Por isso, o art. 174 do CTN diz que "A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva".

Só que é preferível fazer uma ponderação, na linha do destacado pelo STJ em Recurso Especial Repetitivo: "naturalmente, ate´ o u´ltimo dia estabelecido para o vencimento, e´ assegurado ao contribuinte realizar o recolhimento volunta´rio, sem qualquer outro o^nus, por meio das age^ncias banca´rias autorizadas ou ate´ mesmo pela internet, ficando em mora ta~o somente a partir do dia seguinte. Desse modo, tem-se que a pretensa~o executo´ria da Fazenda Pu´blica (actio nata) somente surge no dia seguinte a` data estipulada para o vencimento do tributo".

Daí veio esta ementa:

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. IPVA. DECADÊNCIA. LANÇAMENTO DE OFÍCIO. REGULARIDADE. PRESCRIÇÃO. PARÂMETROS.

1. O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) é lançado de ofício no início de cada exercício (art. 142 do CTN) e constituído definitivamente com a cientificação do contribuinte para o recolhimento da exação, a qual pode ser realizada por qualquer meio idôneo, como o envio de carnê ou a publicação de calendário de pagamento, com instruções para a sua efetivação.

2. Reconhecida a regular constituição do crédito tributário, não há mais que falar em prazo decadencial, mas sim em prescricional, cuja contagem deve se iniciar no dia seguinte à data do vencimento para o pagamento da exação, porquanto antes desse momento o crédito não é exigível do contribuinte.

3. Para o fim preconizado no art. 1.039 do CPC/2015, firma-se a seguinte tese: "A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação."

4. Recurso especial parcialmente provido. Julgamento proferido pelo rito dos recursos repetitivos (art. 1.039 do CPC/2015). (REsp 1.320.825-RJ, rel. Min. Gurgel de Faria)

Quer dizer, constituído o crédito de IPTU, o prazo prescricional de cinco anos tem início no dia seguinte à data do vencimento para o pagamento do tributo.

A partir daí, vencida a cota única ou a primeira parcela, não havendo pagamento, há exigibilidade e consequentemente a possibilidade de ser apresentada execução.

Este Tribunal de Justiça tem decidido desta forma:

A) APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. EXERCÍCIOS 1996 E 1997. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. FLUÊNCIA DO PRAZO A PARTIR DO VENCIMENTO DA PRIMEIRA PARCELA OU COTA ÚNICA. DEMANDA AJUIZADA DENTRO DO QUINQUÊNIO LEGAL. PARCELAMENTO DO DÉBITO FORMALIZADO NO ANO DE 2001. MARCO INTERRUPTIVO DA PRESCRIÇÃO. TERMO AD QUEM QUE RETROAGE À DATA DE AFORAMENTO DA AÇÃO (§1º DO ART. 219 DO CPC). DEMORA NA CITAÇÃO NÃO IMPUTÁVEL À FAZENDA PÚBLICA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 106 DO STJ. PRESCRIÇÃO AFASTADA. DECISÃO REFORMADA. (TJSC, AC 2013.047386-3, da Capital, rel. Des. Edemar Gruber)

B) TRIBUTÁRIO. IPTU. EXECUÇÃO FISCAL. SENTENÇA QUE RECONHECEU A PRESCRIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO DIRETA. TERMO A QUO. DATA DO VENCIMENTO DA PRIMEIRA PARCELA. INTELIGÊNCIA DO ART. 243, § 3º, DO CTM. COBRANÇA RELATIVA AOS EXERCÍCIOS DE 1991, 1992, 1993, 1994 E 1996. AÇÃO AJUIZADA EM 30.8.96. OCORRÊNCIA DO TRANSCURSO DO LUSTRO LEGAL EM RELAÇÃO AO EXERCÍCIO DE 1991.

Tendo em vista que se almeja com a presente ação a cobrança da integralidade do tributo, e que "o atraso no pagamento de qualquer parcela implicará no vencimento das vincendas" (art. 243, § 3º, do CTM), conclui-se que é a data de vencimento da primeira parcela ou parcela única do tributo indicada na lei (último dia de fevereiro) o termo a quo para a contagem do prazo prescricional.

(...) (TJSC, AC 0051924-80.1996.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Francisco Oliveira Neto)

3. No caso, o crédito de IPTU discutido corresponde ao exercício de 1996, sendo tempestivo o ajuizamento ocorrido no ano 2000.

Só que a interrupção, como dito, é assunto regrado pela lei complementar, fazendo esse papel o art. 174 do CTN.

Ele, inicialmente, dizia que a interrupção se daria somente com a citação. A Lei Complementar 118/2005 modificou o dispositivo e dispôs como marco interruptivo o "despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal".

Seja de uma forma, seja de outra, surgem dificuldades.

Caso considerado o despacho ou mesmo se for valorizada a citação, haveria, em termos práticos, um problema. A prescrição combate a incúria do credor, tanto que se a demora for imputável ao Judiciário a prescrição não se confirma. Não se pode considerar como incauto aquele que ingressa oportunamente com sua demanda, ou seja, dentro do quinquênio, ainda que a manifestação judicial seja posterior.

Pode-se, portanto, dar interpretação sistemática ao CTN, adaptando-o ao regime do CPC (arts. 219 do CPC de 1973 e 240 do NCPC), que faz retroagir a interrupção da prescrição à simples distribuição, ainda que condicionando a eficácia desse fato à oportuna citação, a ser diligenciada pelo autor - ressalvado que, demorando a cientificação do réu em razão de fatores que lhe são alheios, o retardamento não lhe será imputável.

Nesse sentido, inclusive, é a observação de Theotônio Negrão e José Roberto F. Gouvêa (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 2d ao art. 40 da LEF, p. 1.484), tanto quanto assim decidiu o STJ:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE O FISCO COBRAR JUDICIALMENTE O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. (...)

(...)

13. Outrossim, o exercício do direito de ação pelo Fisco, por...

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