Decisão Monocrática Nº 0019351-09.2011.8.24.0008 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 19-05-2020
Número do processo | 0019351-09.2011.8.24.0008 |
Data | 19 Maio 2020 |
Tribunal de Origem | Blumenau |
Órgão | Quinta Câmara de Direito Comercial |
Classe processual | Apelação Cível |
Tipo de documento | Decisão Monocrática |
Quinta Câmara de Direito Comercial
Desembargador Monteiro Rocha
Apelação Cível n. 0019351-09.2011.8.24.0008, de Blumenau
Apelante : Banco Itaucard S/A
Advogados : Juliano Ricardo Schmitt (OAB: 58885/PR) e outros
Apelada : Delsina de Souza
Advogados : Thiago Moraes Di Ciero (OAB: 21143/SC) e outro
Relator: Desembargador Monteiro Rocha
Vistos etc.
Delsina de Souza ajuizou ação de revisão de contrato em face de Banco Itaucard S/A, aduzindo ter firmado com o requerido cédula de crédito bancário para aquisição de veículo Renault Clio EXP 16, placas AWH1749, Renavam 885124820, no valor de R$ 14.500,00, que seria pago em 42 prestações de R$ 535,40.
Alegou abusividade das cláusulas contratuais que preveem a quitação antecipada do contrato, a tarifa de abertura de crédito (TAC) e os juros remuneratórios.
Requereu o acolhimento da pretensão para revisar o contrato e, mediante aplicação do Código de Defesa do Consumidor e inversão do ônus da prova, declarar a nulidade das cláusulas contratuais abusivas e determinar a repetição de indébito.
A cédula de crédito bancário objeto de revisão foi juntada às fls. 24-31.
Em decisão de fls. 33-34, deferiu-se a gratuidade da justiça ao requerente e determinou-se a intimação da autora para emendar a inicial, a fim de especificar os encargos que pretende revisar, o que foi procedido às fls. 38-42.
Citado, o requerido ofertou contestação (fls. 48-73), repisando os argumentos da inicial e defendendo a regularidade do contrato. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos exordiais.
Houve réplica (fls. 87-90).
Sobreveio sentença (fls. 102-116), com o seguinte dispositivo:
"Ante o exposto, julgo procedentes em parte os pedidos deduzidos na inicial para afastar a cláusula de quitação antecipada do contrato, bem como determinar a repetição do indébito dos valores pagos a maior por ocasião de sua ocorrência em montante a ser apurado em sede de liquidação de sentença, considerando-se o total pago pela parte autora por ocasião da liquidação antecipada abatendo-se do respectivo montante os encargos consistentes em Tarifa de Cadastro e IOF que não podem sofrer redução proporcional uma vez que foram pagos na data da contratação.
Sobre o valor apurado deve ser acrescida de correção monetária incidente desde a data de desembolso de cada parcela paga a maior, aplicando-se como indexador o INPC-IBGE, conforme art. 1º do Provimento n. 13/1995 da Corregedoria Geral de Justiça do TJSC, mais juros de mora de 1% (um por cento) ao mês (arts. 406 e 407 do CC, c/c o art. 161, § 1º, do CTN; STJ-4ª T, AI 791.802, AgRg, Min. Aldir Passarinho Júnior, j. 11-12-2007, DJU 18-2-08; AgRg no Resp 1040784/RO, rela. Mina. Laurita Vaz, j. 18-5-2010, DJe 14-6-2010), computados desde a citação inicial (art. 405 do CC), aplicando-se, ainda, a dobra prevista no art. 42 parágrafo único do CDC.
Em consequência julgo extinto o presente processo, na forma do art. 487, I do Código de Processo Civil.
Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo no valor correspondente a 15% calculados sobre o valor atualizado da condenação, na forma do disposto no art. 85 § 2º do CPC.
Publique-se Registre-se Intime-se.
Em caso de apelação, verificado o cumprimento dos requisitos dos parágrafos 1º e 2º do art. 1.009 do CPC, ascendam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, nos termos do parágrafo 3º do art. 1.010.
Transitada em julgado, deverá a autora proceder a liquidação de sentença, na forma do art. 523 do Código de Processo Civil.
Procedida a respectiva liquidação e sendo intimado o réu, não havendo cumprimento espontâneo da obrigação, no prazo de 15 dias, incidirá sobre o montante devido, multa de 10%, a teor do disposto no art. 523§1ºdo Código de Processo Civil.
Havendo pagamento parcial, a multa incidirá sobre o montante devido e não pago. (art. 523§2º do Código de Processo Civil). Cumpra-se"
Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o réu interpôs apelação cível (fls. 143-155), sustentando a impossibilidade de modificação das cláusulas contratuais, em respeito ao princípio do pacta sunt servanda, a legalidade da tarifa de liquidação antecipada do contrato e o afastamento da devolução dos valores em dobro.
Requereu o provimento do recurso para julgar improcedentes os pedidos iniciais, determinando-se a inversão dos ônus sucumbenciais.
Intimada, a apelada apresentou contrarrazões (fls. 168-171).
Este é o relatório.
O recurso envolve matéria pacificada em firme jurisprudência e o princípio da colegialidade informa a desnecessidade de submeter ao colegiado questão que não encontra dissenso entre os eminentes pares.
- Da revisão contratual
Aduz o apelante que tendo a parte apelada manifestado livremente sua vontade, sem qualquer coação ou abuso, o cumprimento do contrato torna-se obrigatório entre as partes.
Por tal razão, alega a impossibilidade de modificação das cláusulas contratuais, em observância ao princípio do pacta sunt servanda.
Razão não lhe assiste.
O decisum proferido pelo magistrado a quo declarou a possibilidade de revisão contratual, com fundamento no CDC.
Sobre a aplicação do CDC às ações de revisão contratual, o Superior Tribunal de Justiça dirimiu a questão com a edição da Súmula 297, que dispõe: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
Conforme depreende-se do artigo 6º, inciso V, do CDC, a relação jurídica pactuada entre as partes permite a sua revisão:
"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas"
Diante da hipossuficiência do consumidor, buscou a referida lei equilibrar as relações contratuais, protegendo a parte hipossuficiente de eventuais abusos e desvantagens excessivas.
Nesse sentido, segue entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
"A jurisprudência do STJ se posiciona firme no sentido de que a revisão das cláusulas contratuais pelo Poder Judiciário é permitida, mormente diante dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, devendo ser mitigada a força exorbitante que se atribuía ao princípio do pacta sunt servanda." (STJ, Segunda Seção, AgRg no Ag 1383974/SC. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em. 13.12.2011).
Mutatis mutandis, traz-se aos autos entendimento jurisprudencial desta Câmara:
- "[...] DEFENDIDA A INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O AFASTAMENTO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INSUBSISTÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR SOBRE O PACTO FIRMADO ENTRE AS PARTES, COM A CONSEQUENTE INVERSÃO PROBATÓRIA. RECURSO NÃO ACOLHIDO [...]" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., rel.ª Des.ª Soraya Nunes Lins, ACV n. 0308120-08.2017.8.24.0005, j. 27-09-2018).
- "[...] INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REVISÃO DA RELAÇÃO CONTRATUAL QUE É POSSÍVEL EM FACE DA ONEROSIDADE EXCESSIVA. ARTIGOS 6º, INCISOS IV E V, E 51, INCISO IV, AMBOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, E SÚMULA N. 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA [...]
1. Os contratos bancários podem ser revisados à luz das regras protetoras do Código de Defesa do Consumidor" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., rel. Des. Jânio Machado, ACV n. 2011.004539-0, j. 07-11-2013).
E de minha relatoria:
"[...] INAPLICABILIDADE DO CDC - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 297 DO STJ - ALEGAÇÃO AFASTADA [...]
Como é aplicável às instituições financeiras o Código de Defesa do Consumidor, analisa-se as abusividades contratuais constatadas" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., ACV n. 0014442-43.2013.8.24.0075, j. 30-08-2018).
Logo, por se tratar de relação jurídica subordinada às disposições do Código de Defesa do Consumidor, a revisão do contrato é permitida, objetivando maior equidade na relação jurídica entre a contratante e a instituição financeira.
Assim, nega-se...
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