Decisão Monocrática Nº 0300362-67.2019.8.24.0082 do Primeira Câmara de Direito Civil, 30-04-2020

Número do processo0300362-67.2019.8.24.0082
Data30 Abril 2020
Tribunal de OrigemCapital - Continente
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática


Apelação Cível n. 0300362-67.2019.8.24.0082 da Capital - Continente

Apelante : Valda da Silva Amorim
Advogada : Thais Cristina Welprolts (OAB: 41686/SC)
Apelado : Banco Itaú Unibanco S/A
Advogado : Paulo Turra Magni (OAB: 34458/SC)
Relator: Des.
Gerson Cherem II

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Trata-se de apelação cível interposta por Valda da Silva Amorim, irresignada com a sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca da Capital - Continente que, nos autos da ação indenizatória aforada contra Banco Itaú Unibanco S/A, julgou parcialmente procedente o pleito inicial, nos seguintes termos (fl. 109):

Diante de tais considerações, e nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE procedentes os pedidos formulados por Valda da Silva Amorim, e, em consequência, CONDENO a requerida ao pagamento dos danos materiais no valor de R$ 701,22 (setecentos e um reais e vinte e dois centavos). O valor deve ser corrigido pelo INPC, acrescido de juros de mora de 1%, desde o respectivo desembolso.

Diante da sucumbência recíproca em partes iguais, condeno cada uma das partes ao pagamento, na proporção de 50%, das custas e honorários advocatícios, esses últimos que fixo em 20% sobre o valor atualizado da condenação, a teor do art. 85, § 2.° do CPC.

Sendo a autora beneficiária da justiça gratuita, ficam as obrigações decorrentes de sua sucumbência sob condição suspensiva de exigibilidade, nos termos do art. 98, § 3º do Código de Processo Civil.

Os embargos de declaração opostos pela autora (fls. 113/115) foram rejeitados às fl. 126.

Inconformada, a demandante alegou que, mesmo após a liminar, o réu não suspendeu os descontos efetuados, fazendo jus, portanto, ao ressarcimento em dobro de todas as parcelas descontadas. Sustentou, ademais, a ocorrência de dano moral no caso (fls. 129/133).

Com as contrarrazões (fls. 138/154), os autos alçaram ao Tribunal.

É o relatório.

Presentes os requisitos legais, conheço do recurso.

1) Do dano material:

Cuida-se de ação indenizatória em que a autora aponta que o banco realizava descontos indevidos em sua conta corrente, advindos de refinanciamento não pactuado pela demandante.

Ao tempo do protocolo da demanda, segundo a postulante, os descontos englobavam quatro parcelas.

Nada obstante as alegações do réu, a demanda foi julgada parcialmente procedente na primeira instância, tendo o magistrado reconhecido o desconto irregular de três prestações (consoante demonstrativo de fl. 30), determinando, consequentemente, a restituição em dobro.

A insurgente sustenta, todavia, que o sentenciante obrou em erro, pois mesmo com o deferimento da tutela antecipada para suspender as cobranças (fl. 37), a instituição financeira continuou realizando os débitos (fls. 102/105). Por isto, pugna pela restituição total dos valores indevidamente cobrados.

Tocante ao limite temporal da condenação, esclarece a apelante que a restituição das parcelas não pode ficar restrita àquelas apontadas na inicial - e parcialmente reconhecidas na sentença -, mas deve ser ressarcida de todas as quantias irregulares abatidas de sua conta corrente, especialmente porque descumprida a tutela de urgência pelo réu.

A pretensão encontra albergue no art. 323, do CPC:

Art. 323. Na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.

Haure-se dos ensinamentos de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero:

Note-se que no pedido não estão incluídas, fictamente, apenas as prestações que vencerem no curso do processo, mas também as prestações que vencerem após o trânsito em julgado da sentença. A sentença abarca todas as prestações periódicas enquanto "durar a obrigação" (STJ, 2ª Turma, REsp 31.164/RJ, rel. Min. Hélio Mosimann, j. em 20.11.1995, DJ 04.12.1995, p. 42.100). Alcança, pois, as prestações vencidas no curso da fase de conhecimento, as posteriores ao trânsito em julgado e, sendo o caso, as vencidas no curso da fase de cumprimento de sentença (Código de processo civil: comentado artigo por artigo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 300).

Segundo remansosa jurisprudência, não há óbice à pretensão. Existindo obrigações - mesmo que, como no caso, de não fazer - vencidas e vincendas no curso do processo, ficam estas últimas incluídas no comando jurisdicional, até o efetivo cumprimento da obrigação.

Em outras palavras, reconhecida a irregularidade dos descontos e descumprida a obrigação periódica de não fazer, deve o réu arcar com os ônus decorrentes do ilícito, durante todo o período em que verificada a cobrança irregular.

Ainda que quando do ajuizamento da demanda a autora tenha pugnado pela restituição das quatro parcelas até então indevidas, certo que se os descontos ilegais continuaram ocorrendo durante o trâmite processual - mesmo após o deferimento da tutela antecipada para suspendê-los -, a autora tem direito à repetição.

Mutatis mutandis, julgou o Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE ALUGUÉIS. DEFICIÊNCIA NA FORMAÇÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCLUSÃO DAS PARCELAS VINCENDAS. POSSIBILIDADE.

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

2. A falta de prequestionamento da matéria suscitada no recurso especial, a despeito da oposição de declaratórios, impede seu conhecimento, a teor da Súmula nº 211 do Superior Tribunal de Justiça.

3. Nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil de 2015, não há falar em prequestionamento ficto se a alegada matéria não foi discutida na origem, e nas razões do recurso especial não indicou a parte recorrente a contrariedade ao artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015.

4. A condenação nas parcelas vincendas no curso do processo deve ser considerada pedido implícito, a teor do que dispõe o artigo 323 do Código de Processo Civil de 2015 (art. 293 do CPC/1973). Precedentes.

5. Agravo interno não provido. (AgInt nos EDcl no AREsp n. 1329999/RJ, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 14.10.2019). (Grifei).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITOS AUTORAIS. COBRANÇA DO HOTEL PELA DISPONIBILIZAÇÃO DE TV POR ASSINATURA NOS QUARTOS DOS HÓSPEDES. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DE INADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL. OCORRÊNCIA. COBRANÇA DE DIREITOS AUTORAIS. POSSIBILIDADE. CAPTAÇÃO E TRANSMISSÃO DE RADIODIFUSÃO. FATOS GERADORES DISTINTOS. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. QUESTÃO EMINENTEMENTE JURÍDICA. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. ILEGITIMIDADE PASSIVA. QUESTÃO OBJETO DE INOVAÇÃO RECURSAL. INCLUSÃO DE PRESTAÇÕES VINCENDAS NA CONDENAÇÃO E ALTERAÇÃO OU MODIFICAÇÃO DO TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA. DESDOBRAMENTO DO ACOLHIMENTO DA PRETENSÃO RECURSAL CONDENATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE INOVAÇÃO RECURSAL. AGRAVO DESPROVIDO.

[...]

5. A inclusão de parcelas vincendas na condenação e a definição ou alteração do termo inicial dos juros de mora do montante da condenação constitui desdobramento do acolhimento da pretensão recursal condenatória, tratando-se de pedido implícito, a afastar eventual inovação recursal.

6. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 1126126/PR, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. em 14.10.2019).

E desta Corte:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. ALEGADA OMISSÃO. DECISÃO QUE CONDENOU A EMBARGANTE AO RESSARCIMENTOS DE TODAS AS DESPESAS RELACIONADAS À AQUISIÇÃO DO BEM SEM, CONTUDO, DEFINIR O ALCANCE DA CONDENAÇÃO, SE LIMITADA AO PEDIDO INICIAL OU MAIS AMPLA, NA FORMA DO ART. 323 DO CPC/15. QUESTÃO QUE MERECE SER ESCLARECIDA. PRETENSÃO QUE ABARCA PRESTAÇÕES PERIÓDICAS QUE, EMBORA NÃO INCLUÍDAS EXPRESSAMENTE NA INICIAL, DEVEM SER ABRANGIDAS PELA CONDENAÇÃO. RESSARCIMENTO QUE DEVE OCORRER ATÉ A EFETIVA TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE DO AUTOMÓVEL À EMBARGANTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (ED n. 0000335-72.2012.8.24.0028, rel. Des. Helio David Vieira Figueira dos Santos, j. em 27.02.2020).

Em decorrência, acolhe-se o reclamo no tópico, condenando-se o réu a restituir em dobro todos os descontos realizados na conta da autora, relativos às parcelas do refinanciamento atinente aos contratos ns. 1278614555 e 14088071-7.

Enfatizo que a repetição deve ocorrer em dobro, nos termos do parágrafo único, do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor: "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".

Grassa controvérsia acerca do âmbito de incidência do aludido dispositivo, matéria pendente de julgamento no Superior Tribunal de Justiça (Tema 929), cuja função é uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional (art. 105, inc. III, da CF). Imperioso ressaltar a ausência de ordem de suspensão nacional pela Corte Superior, que limitou o sobrestamento somente aos recursos especiais em tramitação.

Ademais, pondere-se haver divergência entre a 1ª e 2ª Seções do próprio STJ acerca do tema. A 1ª Seção, com competência para o direito público, assentou:

O STJ firmou o entendimento de que basta a configuração de culpa para o cabimento da devolução em dobro dos valores pagos indevidamente pelo consumidor na cobrança indevida de serviços públicos concedidos. Nesse sentido: AgRg no AREsp 143.622/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 26.6.2012; AgRg no Ag 1.417.605/RJ, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 2.2.2012; AgRg no Resp 1.117.014/SP, Rel. Ministro Humberto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT