Decisão Monocrática Nº 0300711-74.2018.8.24.0092 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 30-08-2019

Número do processo0300711-74.2018.8.24.0092
Data30 Agosto 2019
Tribunal de OrigemTubarão
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0300711-74.2018.8.24.0092 de Tubarão

Apte/Apdo : Banco do Brasil S/A
Advogada : Simone Sommer Ozorio (OAB: 21670/SC)
Apdos/Aptes : Eliana Genovez Backhauser e outros
Advogado : Marcelo Rocha Cardozo (OAB: 9844/SC)

Relator(a) : Desembargador Mariano do Nascimento

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Banco do Brasil S/A, MAR Indústria Têxtil e Tinturaria Ltda., Clóvis Batista Beckhauser e Eliana Genovez Beckhauser interpuseram recursos de apelação da sentença proferida nos autos dos embargos à execução n. 0300711-74.2018.8.24.0092, deflagrados em desfavor da casa bancária, na qual o magistrado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos:

Ante o exposto,

ACOLHO, em parte, os pedidos iniciais deduzidos nos presentes embargos e, em consequência, afasto a incidência da capitalização e da comissão de permanência.

Diante da sucumbência recíproca, em distribuição proporcional dos ônus, condeno os embargantes ao pagamento de 70% das custas processuais e a casa bancária aos 30% restantes. Quanto aos honorários, condeno os embargantes pagar à casa bancária 70% do equivalente a 10% do valor atualizado da causa, indo esta condenado a pagar àqueles 30% da mesma quantia (10% do valor atualizado da causa), nos termos do artigo 85, §§2º e 14 do Código de Processo Civil.

Junte-se cópia desta sentença na ação de execução, intimando-se o exequente para, naqueles autos, apresentar nova conta de seu crédito observados os parâmetros aqui definidos, em trinta dias, sob pena de arquivamento administrativo, o que já se determina na hipótese de silêncio.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Transitada em julgado, ao contador judicial para cálculo e procedimento de cobrança das custas devidas.

Oportunamente, arquive-se. (pp. 541-549 - grifo original)

Opostos embargos de declaração pelos executados, estes foram rejeitados (p. 560).

Inconformada, a instituição financeira interpôs recurso de apelação alegando, em suma, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, bem como a legalidade da capitalização de juros, mensal e trimestralmente. Pugnou, assim, pelo conhecimento e provimento do apelo. (pp. 564-578)

A parte embargante, por sua vez, utilizou-se igualmente da via recursal pugnando pelo reconhecimento de vícios contratuais ("lesão, coação e ofensa à função social") a fim de anular o pacto firmado entre as partes. Ainda, pleiteia a declaração da ilegalidade da cobrança de "taxas de serviço", bem como a desconsideração dos efeitos da mora e a redistribuição dos ônus sucumbenciais. (pp. 581-596)

Ofertadas contrarrazões (pela parte embargante às pp. 602-609 e pela casa bancária às pp. 610-619), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

Vieram-me os autos conclusos.

DECIDO.

De início, ressalto que ao relator é possível apreciar monocraticamente a quaestio juris, eis que presente a hipótese legal para tanto.

Cuida-se de embargos à execução ajuizada pelo Banco do Brasil S/A (processo n. 0301320-28.2016.8.24.0092) fundada em Cédula de Crédito Bancário n. 40/00457-0, no valor de R$ 510.000,00 (quinhentos e dez mil reais).

Ao proferir a sentença, o juízo singular acolheu em parte o pedido exordial (pp. 541-549), decisão essa mantida em razão do não provimento dos embargos de declaração opostos (decisão p. 560), tendo ambas as partes interposto recurso de apelação.

Porque satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso da casa bancária embargada e, conheço em parte do recurso dos embargantes, exceto no tocante ao pedido de afastamento da cobrança de "taxas de serviço" em razão da afronta ao princípio da dialeticidade.

Passo, assim, à análise das insurgências.

1. Do recurso da casa bancária

1.1. Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor

Afirmou a instituição financeira recorrente ser inviável a revisão contratual, argumentando que "a liberdade de contratar, a autonomia para firmar o contrato e o acordo bilateral de vontades, está (sic) plenamente identificado naqueles documentos, afastando, dessa forma, qualquer possível lesão que deles possam originar." (pp. 566-567). Sustenta, assim, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso.

Sem razão, adianta-se.

Encontra-se sumulado o entendimento de que "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras" (Súmula n. 297 do STJ), sendo um direito básico do consumidor "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas" (art. 6º, V, Lei n. 8.078/1990).

Logo, há de ser mitigado o princípio da pacta sunt servanda, mormente porque os contratos bancários apresentam nítido caráter de adesão, conforme disciplina o art. 54, caput e § 1º, do CDC:

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato.

Ainda, no tocante ao fato de uma das embargantes constituir pessoa jurídica, é preciso observar especificamente as condições da relação havida entre as partes.

O CDC dispõe, em seu art. 2º, que "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".

A expressão "destinatário final" é alvo de controvérsia na doutrina, de modo que a interpretação conferida pode ser mais restrita ou mais ampla conforme a teoria adotada.

Prevalece na jurisprudência nacional, porém, a teoria finalista, mas em sua versão mitigada, visando a atender situações em que o adquirente, ainda que pessoa jurídica, apesar de retirar o produto ou serviço do mercado para fins profissionais, apresenta vulnerabilidade em face do fornecedor.

Nesse sentido já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. SERVIÇO DE RASTREAMENTO E COMUNICAÇÃO DE DADOS. FALHA. ROUBO DE VEÍCULO. RESCISÃO CONTRATUAL. 1. OFENSA AOS ARTS. 165 E 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. TEMAS APRECIADOS PELAS INSTÂNCIAS DE ORIGEM. 2. APLICAÇÃO DO CDC. RELAÇÃO DE CONSUMO. TEORIA FINALISTA MITIGAÇÃO. 3. RESPONSABILIDADE. NEXO CAUSAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. 4. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. IMPOSSIBILIDADE. NOVA ANÁLISE DA SITUAÇÃO FÁTICA. 5. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Não viola os arts. 165 e 535 do CPC o acórdão que, integrado pelo julgamento proferido nos embargos de declaração, se pronuncia de forma suficiente para a solução da controvérsia deduzida nas razões recursais.

2. A jurisprudência desta Corte Superior tem mitigado a teoria finalista para aplicar a incidência do Código de Defesa do Consumidor nas hipóteses em que a parte, pessoa física ou jurídica, apesar de não ser tecnicamente a destinatária final do produto ou serviço, se apresenta em situação de vulnerabilidade [...] (STJ, AgRg no AREsp n. 601234, rel. Min. Marco Aurélio Belizze, j. 12-5-2015) (grifou-se).

Da mesma forma é o entendimento deste Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATOS BANCÁRIOS. SENTENÇA PUBLICADA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. [...].

2. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. AUTORA QUE NÃO FIGURA COMO DESTINATÁRIA FINAL DO CRÉDITO. APLICAÇÃO DA TEORIA FINALISTA MITIGADA. VULNERABILIDADE DA PARTE AUTORA EVIDENCIADA.

"'O avanço dos critérios jurisprudenciais no sentido de se admitir a mitigação do rigor excessivo defendido pela teoria finalista, permite, por exceção, a equiparação e a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor nas relações entre o fornecedor e o destinatário final fático, desde que evidenciada a vulnerabilidade deste último.' (Apelação Cível n. 2003.019372-3, de Criciúma, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 23-11-2009)" (Ap. Cív. n. 2014.042003-0, de São José, Segunda Câmara de Direito Comercial, rel. Des. Dinart Francisco Machado, j. em 14-6-2016) [...] (TJSC, AC n. 1021491-80.2013.8.24.0023, da Capital, rela. Desa. Janice Goulart Garcia Ubialli, j. 20-2-2018) (grifou-se).

Assim, à luz da teoria citada, tendo em vista a evidente vulnerabilidade técnica da sociedade empresária e dos demais embargantes diante da casa bancária integrante do sistema financeiro nacional, afiguram-se plenamente aplicáveis as regras consumeristas à hipótese presente.

Destarte é de ser mantida a decisão atacada neste ponto.

1.2. Capitalização de juros

De outra banda, a casa bancária recorrente sustentou a possibilidade de cobrança de juros capitalizados, mensal e trimestralmente, porquanto previstos no contrato em questão.

No que diz respeito à legalidade da incidência de capitalização mensal, o Superior Tribunal de Justiça sumulou posicionamento indicando que "é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001)" (Súmula n. 539).

Outrossim, o Enunciado n. 541 do Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendimento de que "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada".

Tendo em vista a orientação jurisprudencial acima transcrita, percebe-se que o entabulado em discussão, firmado em 16/11/2009 (pp. 234-246), assim estabelece:

ENCARGOS FINANCEIROS - Sobre parcela do principal referente ao SUBCRÉDITO "A", os valores lançados na conta vinculada ao presente financiamento, bem como o saldo devedor daí decorrente, sofrerão incidência de juros à taxa efetiva de 4,5% (quatro inteiros e cinco décimos pontos percentuais) ao ano (ano...

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