Decisão Monocrática Nº 0301519-58.2019.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Público, 30-08-2019

Número do processo0301519-58.2019.8.24.0023
Data30 Agosto 2019
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualRemessa Necessária Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



Remessa Necessária Cível n. 0301519-58.2019.8.24.0023


Remessa Necessária Cível n. 0301519-58.2019.8.24.0023, da Capital

Impetrante: Maria Ondina Strada - Eireli (Despachante Faxinal)

Impetrado: Diretor Estadual do Departamento de Trânsito de Santa Catarina/detran/sc

Relator: Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Maria Ondina Strada Eireli impetrou "mandado de segurança" contra ato do Diretor Geral do Departamento Estadual de Trânsito do Estado de Santa Catarina - Detran.

Alegou, em síntese, que teve seu pedido de credenciamento para o exercício da função de despachante indeferido em razão da ausência de procedimento licitatório pelo órgão de trânsito.

Postulou a expedição de ordem ao Detran para credenciá-lo como despachante de trânsito.

Em informações, a autoridade coatora sustentou que apenas está cumprindo as normativas estaduais (f. 49/59).

Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:

Ex positis, CONCEDO A SEGURANÇA pretendida e, em consequência, determino que a autoridade coatora analise o pedido administrativo de credenciamento para o exercício da atividade de despachante de transito exclusivamente sob a ótica da legislação federal.

Incabível na espécie a condenação no pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, nos termos da Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal e Súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça. (f. 75)

Sem recursos (f. 87), a d. Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou pela manutenção da sentença, em parecer da Dra. Eliana Volcato Nunes (f. 95/102).

DECIDO

A sentença proferida pelo MM. Juiz Luis Francisco Delpizzo Miranda merece ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais se adota como razão de decidir:

Trata-se de mandado de segurança envolvendo a costumeira negativa por parte do DETRAN do credenciamento de novos despachantes com base em dispositivos nitidamente inconstitucionais da Lei 10.609/97.

Sem maiores delongas, tenho que a celeuma já foi adequadamente deslindada quando analisei a medida liminar, litteris:

"Pois bem, consabido que o mandado de segurança deve ser manejado para, nos termos do art.1º da Lei 12.016/2009: "proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça"

"Hely Lopes Meirelles, sobre o tema, ensina que: "Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há que vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante; se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

""Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido, nem certo, para fins de segurança." (Mandado de Segurança e ações constitucionais, 33ª ed., São Paulo: Malheiros, 2011, p. 37-38).

"Na hipótese, a celeuma em foco não se trata de novidade nesta unidade jurisdicional, ao contrário, há muito a pretensão em foco vinha sendo acertadamente agasalhada pelo então titular e hoje Desembargador Hélio do Valle Pereira.

"Não vislumbro qualquer razão para tomar posicionamento diverso e, por corolário, desprezar o artigo 926 do NCPC que estabelece a defesa da estabilidade, coerência e integralidade das decisões judiciais em casosidênticos. É de se ter em mente que todo julgador integra um sistema de Justiça, não consiste um pequeno feudo.

"Acontece que a Lei Estadual n. 10.609/97, no seu art. 1º prevê que "a atividade de serviço autorizado de despachante de trânsito, de natureza privada, será exercida junto ao Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN - , e os demais órgãos estaduais de trânsito, por pessoa física, na forma da Lei.", todavia, apesar do caráter particular, exige no seu art. 5º "procedimentos administrativos para credenciamento", ou seja, submete o interessado a verdadeira licitação nos termos dos arts.6º e 7º, verbis:

" Art. 6º O número de vagas em cada município depende do número de despachantes credenciados, ressalvados os direitos e o número de vagas daqueles que se encontram em pleno e regular exercício da atividade na data de publicação desta Lei, observando-se os seguintes critérios:

""I o máximo de duas vagas para o município com até dez mil veículos registrados; e

""II mais uma vaga para cada grupo de dez mil veículos adicionais.

""§ 1º O DETRAN promoverá anualmente, o levantamento da frota de veículos registrados no ano anterior em cada município e o número de despachantes credenciados, para fixar o número de vagas.

""§ 2º Na ocorrência de morte ou invalidez permanente para o exercício da atividade de despachante de trânsito, o Diretor do DETRAN promoverá no prazo máximo de seis meses, a abertura de procedimentos administrativo para o preenchimento da vaga.

"E:

""Art. 7º O procedimento administrativo para o credenciamento deverá observar as seguintes etapas:

""I - publicação de Edital convocatório no Diário Oficial do Estado;

"II - inscrição dos interessados, com a apresentação dos documentos enumerados no art. 4º desta Lei, e do certificado expedido pelo DETRAN, relativo ao período em que o interessado exerceu a atividade de despachante ou preposto, devendo neste ser consignado as penalidades sofridas pelos mesmos, o que servirá de base para cálculo do título;

"III - realização de prova escrita e de prova oral sobre normas legais e regulamentares de trânsito, bem como da legislação pertinente a atividade de despachante de trânsito.

'§1º Os candidatos serão classificados pela soma dos pontos obtidos com a média aritmética das notas, não inferiores a cinco vírgula zero pontos, obtida nas provas escrita e oral, e os pontos relativos ao certificado expedido pelo DETRAN.

"[...];

""§ 3º Em caso de empate entre os interessados, a classificação se fará pelo critério de idade, tendo preferência o candidato mais idoso.

"§ 4º A pontuação do título expedido pelo DETRAN, será calculada pelo somatório dos pontos a cada ano em que o interessado exerceu a atividade de despachante ou preposto, diminuída pelo número de penalidades sofridas pelos mesmos durante este mesmo período, e cujos valores serão estabelecidos pelo Regulamento desta Lei, não podendo estes mesmos pontos serem superiores a vinte e cinco por cento dos pontos previstos nas provas escritas e oral."

""§5º As provas escrita e oral prevista no inciso III deste artigo será realizada por instituição de ensino superior mediante convênio com o DETRAN." (o destaque não consta do original).

"Revelado o normativo legal, pela pertinência e astúcia, entendo por bem transcrever parte da decisão de meu antecessor sobre a questão, litteris:

""Vê-se, entretanto, o esforço catarinense para manter uma reserva de mercado.

""Não vejo, em primeiro lugar, nenhum sentido em definir uma atividade como privada (como evidentemente é) e submetê-la simultaneamente a uma licitação (que sugestivamente nunca é feita). Com efeito, esse credenciamento só faria sentido para avaliar se o particular atende a requisitos normativos para o desempenho de certa atividade. Essa empreitada não terá cunho estatal, público, mas meramente haverá um interesse oficial na sua regulamentação, de maneira a apurar se os particulares que desejarem assumir esse compromisso atendem aos postulados de lei. É, dito de outro modo, uma maneira de exercer o poder de polícia.

""Sob outro prisma, é muito lamentável a força administrativa para dificultar essa atividade. Claro que existe interesse público sobre ela. É missão que envolve aspectos delicados e, em alguma medida, atinge a segurança coletiva. Mas é despropositado que se criem obstáculos totalmente ociosos para que se explore aquilo que, antes de mais nada, é uma empreitada econômica. Quer-se um capitalismo à brasileira no qual o Estado garanta lucros e impeça concorrência. Para isso, o bacharelismo é muito útil. Cria fórmulas dogmáticas para encobrir aquilo que é evidente: trazem-se empecilhos para preservar uma reserva de mercado."

"Fato.

"Lamentavelmente, quando interesses políticos e financeiros são postos à mesa, como na hipótese, o Estado de Catarina vem costumeiramente mantendo essa conduta omissiva e, por corolário, tem-se que o particular empreendedor permanece guardando a possibilidade de trabalhar em detrimento de uma casta de privilegiados que, com a concorrência impedida, navega em verdadeira e injustificável reserva de mercado.

"Lembre-se, aliás, que a Constituição Federal, ao disciplinar os Princípios Gerais da Atividade Econômica, no seu ao art. 170 da CF, prega que: "A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

""IV a livre concorrência:"

"De igual modo, a livre iniciativa e o valor do trabalho são dois principios fundamentais do Estado Brasileiro (art.1º, IV, CF).

"Discorrendo sobre o tema, o Ministro Luís Roberto Barroso, pondera: "O princípio da livre concorrência, corolário direto da liberdade de iniciativa, expressa a opção pela economia de mercado. Nele se contém a crença de que a competição entre os agentes econômicos, de um lado, e a liberdade de escolha dos consumidores, de outro,...

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